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my city ISSN 1982-9922

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WISNIK, Guilherme. Nova cobertura da Praça Patriarca em São Paulo. Minha Cidade, São Paulo, ano 03, n. 029.01, Vitruvius, dez. 2002 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/03.029/2049>.



Foto Nelson Kon



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A nova cobertura para o acesso à galeria Prestes Maia, agora Masp-Centro, mal foi inaugurada, e já tem gerado muitos comentários. Tanto porque situa-se em um dos locais de maior fluxo da cidade – a praça do Patriarca, ponto de chegada do viaduto do Chá –, como pelo fato de ser a construção mais recente do arquiteto Paulo Mendes da Rocha.

Mas no que consiste a intervenção? Por um lado, na restauração da praça, que havia sido convertida em terminal de ônibus. Por outro, na sua transformação em um espaço novo: a obra tem despertado a curiosidade dos passantes devido à sua formalização “sui generis”, que excede a simples função de uma cobertura. Além disso, instalou no centro da cidade um canteiro de obras inusual, quase naval, com grandes perfis metálicos pré-fabricados, chapas curvas e máquinas de solda.

Ao lado dessa inquietação, a obra tem provocado também uma certa rejeição, dada a radicalidade com que se expõe e intervém no espaço urbano. Nostálgicos da cidade do século 19 ficaram insultados com o que parece ser uma intromissão na escala da praça. Ou, ainda, com a heresia de aparentemente ter-se obstruído a visão da igreja de Santo Antônio, que ali se encontra. Ora, sabemos que a particularidade de São Paulo, tanto na beleza quanto na feiúra, está na sua capacidade de se transformar. Característica que faz com que posturas exageradamente preservacionistas, que só se justificariam caso a praça ou suas edificações fossem exemplares significativos da nossa arquitetura, representem, ao fim, não mais do que questões deslocadas.

Neste projeto, não há lugar para um certo bom gosto de juízo ponderado, que prefere aplaudir o que entende como uma transgressão contida, conseguida por Mendes da Rocha no edifício da Pinacoteca do Estado, onde as “interferências” metálicas dialogam mais de perto com os elementos antigos. No pórtico da Praça Patriarca não há meio termo, ele é indesculpavelmente acintoso.

A idéia de que o pórtico encoste demais nas edificações vizinhas, possuindo proporções exageradas, também é um falso problema. Pois, se os pilares estivessem mais próximos à cobertura, ambos seriam percebidos como um objeto único, que se assenta sobre o terreno. No entanto, trata-se do contrário. O conjunto é uma realização espacial que ultrapassa a objetualidade auto-suficiente e a escala da praça isolada. Percebido como uma sucessão de planos interrompidos que emolduram a paisagem da cidade de diferentes modos – estáveis e instáveis –, o conjunto viga-pilar-marquise implanta-se como se quisesse atravessar os edifícios laterais, indicando um sentido ilimitado de passagem, como a direção transversal da rua São Bento, que corta a praça ligando a igreja de mesmo nome à de São Francisco.Realizando uma leitura da cidade, o projeto é um inteligente comentário sobre o desejo de não confinamento dos seus espaços, definindo, ao mesmo tempo, na escala local, uma praça aberta que pode ser lida como um átrio para a igreja. Essa anti-objetualidade expansiva de uma arquitetura que passa a dar sentido, por contraste, ao entorno, pode ser melhor compreendida se comparada à pirâmide do Louvre, que também protege o acesso a uma entrada subterrânea de museu, mas configura-se como um objeto ensimesmado (note-se também que o sentido de uma sombra ao ar livre revela o caráter tropical do projeto).Outra implicação fundamental do pórtico, que complementa as anteriores, é o seu caráter de medida. Como uma régua horizontal, dá parâmetros para a percepção da topografia da cidade, feita de vales e colinas, demonstração eloqüente do cenário em que esta surgiu. Assim, o poder de irônica suspensão de sua cobertura está ligado ao fato de permitir o livre fluxo urbano, pela comunicação com um plano mais baixo, que é o vale do Anhangabaú. Razão pela qual é fundamental que o acesso inferior à galeria nunca seja bloqueado, pois a qualidade de passagem é o que garante ao projeto sua inserção urbana, e em grande medida ampara o seu sentido espacial.
notas
[publicado na Folha de S. Paulo, 10 de agosto de 2002, caderno Ilustrada, com o título de “Projeto aponta não-confinamento da cidade”]
sobre o autor
Guilherme Wisnik é arquiteto, mestrando em história pela FFLCH-USP, e autor de Lucio Costa, Cosac & Naify, 2001.

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