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drops ISSN 2175-6716

abstracts

português
Vivemos em uma cidade que beira a fantasia. Sabemos o que fazer por aqui? Para onde ir? Como será? Esse ensaio pretende, sem pretensões exageradas, lançar-se nessas perguntas, especular uma possibilidade, olhar à frente, projetar-se nessa cidade.

english
We live in a city that borders on fantasy. We know what to do here? Where to go? How it will be? This essay aims, without exaggerated pretensions launch into these questions, speculate a possibility, look ahead, project itself in that city.

español
Vivimos en una ciudad que limita con la fantasía. Sabemos qué hacer aquí? ¿A dónde ir? ¿Cómo lo hará? Este ensayo tiene como objetivo, sin afirmaciones exageradas, se lanzar en estas preguntas, especular una posibilidad, mirar hacia el futuro, para se pro

how to quote

SILVA, Ricardo Luis. Blurred City. Fábula da cúpula. Drops, São Paulo, ano 15, n. 091.01, Vitruvius, abr. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/15.091/5474>.


Cidade, 2015

Naquela determinada cidade latino-americana dos milhões de problemas e milhares de seres humanos, ou vice-versa, não importando tanto a (des)ordem dos fatores, dos fatores multiplicadores da ilimitada carga de efervescência da metropolização capitalista do novo século (2). Naquela megalópole, numa conhecida e infinitamente fotografada e ilusoriamente experimentada avenida, estão se encontrando e trocando virtualidades revolucionárias, e mesmo assim completamente desnecessárias e anuladas pelos próprios participantes do encontro, um sem número de artistas e agitadores culturais de todos os cantos da cultura-mundo (3) contemporânea.

Os artistas e pensadores ali reunidos, sob a elegante sigla FILE – carinhosamente transformada em Filé com fritas pela população superficialmente encantada e hipnotizada – são o perfeito reflexo da sociedade que os circunda. São todos homens unidimensionais (4), meio sólidos (5) e meio líquidos (6); homens gasosos que se desvencilharam da enferrujada sociedade industrial e com brados e manifestações intensas se intitularam de sociedade cibernética (7), falsamente substituindo a unidimensionalidade do trabalho pela unidimensionalidade do contato virtual.

No decorrer dos dias referentes a tal encontro, graças a condições climáticas – umidade do ar extremamente sufocante, temperatura escandalosamente moderada, direção e intensidade dos ventos característicos de um marasmo extremo – únicas e improváveis de ocorrer novamente nesse século, o colossal movimento virtual de informações e trocas cibernéticas sobre aquela parte da cidade-mundo-genérica-global gerou uma nuvem tão espessa e concretamente visível que se posicionou sutilmente no céu do lugar, e dali parecia que não sairia mais. No início, todos os habitantes da cidade e os estrangeiros-genéricos participantes do encontro, se sentiram ameaçados pela grande nuvem cibernética formada. Sensação que obviamente durou apenas alguns segundos – convertidos pelos mais aficionados em Mbps; logo todos se deram conta que aquela já monstruosa nuvem intensificava a velocidade de downloads e uploads de seus gadgets. A nuvem que cobria e sombreava toda a avenida e seu bairro de belas vistas se tornara naquele momento num ícone desejado e sacralizado.

Um dos artistas ali presentes, ninguém mais lembra da cara e do nome, teve uma brilhante ideia para coroar o evento. O artista apresenta à cidade o projeto de uma cúpula (8). Uma cúpula cobriria todo o território sombreado pela nuvem, evitando assim que ela se dissipasse e, ao mesmo tempo, auxiliasse e intensificasse seu trânsito de dados, numa espécie de aquário e antena parabólica simultaneamente.

Fascinados e entregues aos encantos e vantagens apresentados, o projeto da cúpula seduziu a todos. Alguns ainda tentaram se opor critica e filosoficamente, mas a voz de gigante da massa alucinada envolveu e absorveu os discursos contrários. Todos aprovaram a proposta, pensando nos novos amigos que fariam, nas novas e atualizadas informações que receberiam, nos trajetos rodoviários infalíveis e nos compartilhamentos curtidos sobre suas vidas íntimas que conseguiriam com a intensificação da nuvem.

Como a cúpula isolaria uma parte da cidade (9), o artista – com apoio do governo – deu algumas horas para a população decidir de que lado gostaria de ficar. O esperado aconteceu; naquele curto espaço de tempo, uma migração em fila indiana se formou para ir para o lado de dentro. Adoradores de maçãs, robozinhos verdes e tantos outros super sistemas, se misturavam aos curiosos típicos daquela terra que não se contém e aglomeram-se em filas e congestões humanas, como bois em uma cerca de abate, mesmo sem saber exatamente onde aquela movimentação daria.

Precisamente às 19h00 da hora da capital, sincronizada mundialmente pelo relógio atômico, a cúpula sela e condiciona parte da população da cidade juntamente com a grande nuvem. O auto-envolvimento típico e hipnótico da utilização de todos aqueles gadgets não deixou espaço para um questionamento básico: quando a cúpula seria retirada? Quando o lado de dentro voltaria a se conectar com o lado de fora? Ninguém se preocupou com isso, naquele instante o êxtase atingido com a taxa de downloads foi tamanho que nada mais passou pela cabeça de qualquer habitante da cúpula. Muito menos na cabeça dos que ficaram de fora. A proliferação instantânea de fotos, hashtags e tweets publicados pelos “internos” criou uma inveja tão intensa nos “externos” que tal questão, histórica e aparentemente relevante, foi deixada de lado completamente. Externamente decidiu-se que ninguém falaria ou comentaria sobre a cúpula. Ela simplesmente ficaria lá, com uma presença monstruosamente ausente, que logo se tornou virtual no cotidiano dos habitantes do restante da cidade-mundo.

50 anos depois

Como tudo dentro dessa sociedade do hiper-espetáculo (10), a cúpula um dia acabou “reaparecendo”, virou retrô, vintage.

Dois cientistas sociais e dois cineastas socialistas, todos sem muito trabalho nas universidades que lecionavam, ao ler um antigo e extinto instrumento de comunicação, se depararam com aquele assunto que ninguém tocaria: a cúpula intensificadora da nuvem cibernética. No mesmo instante pensaram: “ali encontraremos algo para investigar!”

Prontamente acionaram seus contatos institucionais e governamentais para retirarem a esquecida cúpula daquela região da cidade. Estavam extremamente entusiasmados com o que poderiam encontrar lá embaixo. Estudar aquela sociedade esquecida, entender seus hábitos, descobrir como tinham lidado com a clausura física e a liberdade ampliada virtual, certamente renderia a eles alguns livros best-sellers e outros tantos documentários NatGeo.

As autoridades, imbuídas de um masoquismo histórico e social, atenderam o pedido dos universitários. A cúpula foi retirada durante um imenso evento internacional, com bilhões de telespectadores (ou internetspectadores) acompanhando com igual entusiasmo. Os 4 cavaleiros eram os primeiros da fila, com seus cadernos etnográficos e suas filmadoras. Não faziam ideia do que encontrariam do lado de lá...

3 semanas depois...

As notícias do que os 4 encontraram lá dentro, na cidade chamada Blurred City, foi instantaneamente publicada na internet e compartilhada nas redes sociais como um tsunami. O mundo inteiro migrou em direção a Blurred City para conhecer e, por que não, adquirir todo aquele universo criado. A euforia foi tamanha que, em três semanas, todos os habitantes do planeta tinham em mãos aquilo que os 4 “descobriram” naquela cidade esquecida.

3 meses depois...

notas

NA – Referência direta e escandalosa ao Conto da Piscina de Rem Koolhaas, escrita em 1977 e publicado no livro Delirius New York em 1978. KOOLHAAS, Rem. Nova York delirante. São Paulo, Cosac Naify, 2008, p. 343-348.

1
Incorporação do debate apresentado por Rem Koolhaas nos textos Generic City e Junkspace, de 1994 e 2001, respectivamente. KOOLHAAS, Rem. Três textos sobre a cidade. Barcelona, Gustavo Gili, 2010.

2
LIPOVESKI, Gilles; SERROY, Jean. A cultura-mundo: resposta a uma sociedade desorientada. São Paulo, Companhia das Letras, 2012.

3
MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial: o homem unidimensional. Rio de Janeiro, Zahar, 1979.

4
BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo, Companhia das Letras, 1986.

5
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro, Zahar, 2001.

6
LEVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, Editora 34, 2010.

7
Referência ao projeto do arquiteto norte-americado Richard Buckminster Fuller para a ilha de Manhattan em 1960.

8
Referência ao projeto de 1972 de Rem Koolhaas para a tese de conclusão da Architectural Association, com colaboração de Madelon Vreisendorp, Elia Zenghelis, e Zoe Zenghelis, intitulada Exodus, or the voluntary prisoners of architecture, publicada posteriormente na revista italiana Casabella.

9
Apropriação do debate panfletário de Guy Debord e da Internacional Situacionista. DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo. Rio de Janeiro, Contraponto, 1997.

sobre o autor

Ricardo Luis Silva, professor do Centro Universitário Senac SP, é arquiteto formado pela Universidade Federal de Santa Catariana, mestre e doutorando em arquitetura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

 

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