A derrubada do elevado da perimetral é uma das mais representativas ações decorrentes processo de transformação ao qual a cidade do Rio de Janeiro vem sendo submetida. Para além dos transtornos causados por sua desastrada inserção no tecido urbano da zona portuária, o elevado se consolidou como um importante dispositivo de conexão viária da metrópole carioca. Construído entre os anos 50 e 70, a estrutura existiu por meio século até que em abril de 2014 foi concluído seu ambicioso plano de demolição. Apesar de sua destruição ter sido massivamente divulgada e amplamente usada como ferramenta política, pouco se sabe sobre o plano de requalificação dos espaços gerados pela sua ausência.
Menos de um ano depois da derrubada, o projeto Cota 10 surge no contexto da mostra de ocupação artística “Permanências e destruições”, que ocupou diversos lugares da cidade entre Janeiro e Fevereiro de 2015. Através da construção de uma estrutura temporária o projeto promove um espaço de reflexão sobre a demolição do elevado na altura da praça XV, aonde chegam todos os dias milhares de pessoas através das barcas que cruzam a Baía de Guanabara.
A proposta consiste em uma escada em estrutura tubular que conduz o público até uma plataforma que se eleva a 10 metros do nível do solo da praça XV – precisamente a mesma altura da extinta bandeja da perimetral. A estrutura é implantada no trecho onde se erguia um dos pilares que sustentava o viaduto.
A partir desta cota experimenta-se a praça XV de forma nunca antes explorada. Descortina-se a Baía de Guanabara por trás da estação das barcas, as copas das árvores se alinham com o horizonte, o ir e vir dos transeuntes se torna distante. Onde antes havia uma pesada infraestrutura agora há o vazio, o vento, a fragilidade de uma estrutura efêmera.
O corpo pode demorar-se onde um dia passou veloz.
Aspectos construtivos
O método construtivo empregado foi determinado por fatores que derivam tanto da natureza do espaço no qual se implantou a estrutura, quanto do limite orçamentário e de cronograma destinados á sua construção.
As restrições de circulação de automóveis de carga no centro do Rio limitou o período de acesso ao local de implantação do projeto das 4am às 6am. Todo material usado na construção deveria ser descarregado neste horário. O custo disponível para a montagem da estrutura era de 14.000R$, e o tempo de licença concedido pela prefeitura da cidade era de apenas uma semana, incluindo os processos de montagem e desmontagem.
O projeto Cota 10 é composto por módulos de estrutura tubular em aço (andaimes), o que possibilitou a montagem do conjunto dentro do orçamento previsto e sua montagem em apenas 36h, liberando a maior parte do tempo de licença para a visitação pública e gratuita. Foram gastos 118 R$ para cada m² construído.
O baixo custo de implantação é garantido pelo reaproveitamento de suas peças em outras construções temporárias, sejam elas relativas à estrutura de grandes eventos ou ao aparato necessário ás obras de construção e reparo de construções ‘permanentes’. As peças que constituem o Cota 10 se reuniram na praça XV durante uma semana, e depois desse período voltaram a se separar, se distribuindo pelas construções da cidade. Com o sistema de andaimes a ideia de reuso ganha dimensões ainda inalcançáveis para grande parte das arquiteturas.
A possibilidade de reaproveitamento de suas peças se dá, em grande parte, por conta da característica de suas junções. Não existem conexões definitivas. A solda é substituída por simples encaixes que respondem à geometria requerida por cada situação de projeto. Os módulos de andaime funcionam como um sistema aberto, permitindo que sejam feitos ajustes sem que a integridade do todo seja comprometida.
Também não existem fundações, a conexão física entre arquitetura e terreno se dá unicamente através da distribuição de suas cargas entre dezoito pontos apoiados diretamente sobre o solo da praça. Sua estabilidade é garantida por oito blocos de concreto, com uma tonelada cada, apoiados sobre o piso e ligados ao patamar superior (nível + 10m) por meio de cabos de aço tensionados. O peso total dos blocos de concreto é de 8 toneladas, enquanto o restante da estrutura totaliza apenas 3 toneladas.
A dimensão dos módulos em planta é de 2,10m por 2,80m, enquanto as das peças verticais são da ordem de 2,00m, com rosetas a cada 50 centímetros, permitindo uma maior liberdade na regulação em altura. As escadas, patamares e guarda-corpo também foram executados em estruturas pré-fabricadas da mesma natureza. Nenhum elemento estrutural ou de revestimento que fosse estranho ao processo de montagem de andaimes foi utilizado na construção.
dados técnicos
projeto
Pedro Varella e Júlio Parente
curadoria
João Paulo Quintella
produção executiva
Daniela Moreira e Bebel Kastrup
assistência de curadoria
Claudio Seichi Kawakami Savaget
montagem e apoio
MVD
data de conclusão
01/2015
endereço
Praça XV, Rio de Janeiro