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A autora Eliane Lordello resenha o livro Todas as cidades, a cidade.

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The author Eliane Lordello reviews the book Todas as cidades, a cidade.

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LORDELLO, Eliane. Desfiando leituras nos tecidos urbanos de Todas as cidades, a cidade. Resenhas Online, São Paulo, ano 15, n. 175.02, Vitruvius, jul. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/16.175/6107>.


Centro do Rio de Janeiro
Foto Abilio Guerra

A cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.
Ferreira Gullar, “Poema Sujo”

O livro de Renato Cordeiro Gomes desafia-nos a desfiar e fiar a cidade. O autor, mestre e doutor em Letras, e professor de Literatura Brasileira na Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ e na Pontifícia Universidade Católica – PUC dessa cidade, faz neste livro um exercício que busca depreender a legibilidade da metrópole construindo possíveis leituras, lendo a escrita da cidade e a cidade como escrita.

O prefácio, pela professora Eneida Maria de Souza, inicia qualificando como mais bela obra coetânea a Todas as cidades, a cidade, o livro Atlas, do escritor argentino Jorge Luis Borges. Na obra de Borges, segundo a professora, “as cidades são revividas graças ao poder de rememoração de quem adquiriu o hábito de percorrer bibliotecas como cidades de sonhos”.

Pois bem, é justamente essa viagem de Borges que a autora do prefácio vê expandida na leitura que Gomes faz do que  ela  intitula  de “escrita-desenho” da metrópole moderna. Souza assinala que este livro “aponta para o encontro das formas literárias com o desenho urbano” (1) (desenho urbano tomado como traçado, grafia, não na acepção de campo disciplinar).

Dessa forma, a idéia de paisagem que se descortina é a da cidade como uma Babel, um mundo vicário de signos a ser lido em sua escritura, considerando, também, seu teor de ilegibilidade. Dessa forma, a abordagem dessa paisagem-Babel se faz por um exercício caracterizado pelos verbos vinculados à leitura: soletrar, decifrar; e também do desenho: redesenhar e registrar a escrita desaparecida da cidade. Para tanto, fundamenta-se na semiologia, destacadamente nos estudos de Roland Barthes, e também nas abordagens urbanas de Walter Benjamin; nos estudos filosóficos de Michel Foucault, sobretudo no tocante às palavras e ao discurso. Vale-se ainda das formulações e proposições teóricas e críticas contidas nos ensaios de Italo Calvino em Seis propostas para o próximo milênio.

“Ler a escrita da cidade e a cidade como escrita é buscar o legível num jogo aberto e sem solução” (p. 16), assume o autor logo de início. Sua abordagem tentará penetrar nas redes textuais das cidades e investigar sua tessitura. Considerando as redes textuais e a consequente pluralidade das entradas, parte do princípio benjaminiano, declarado em Imagens do pensamento, de que uma cidade ajuda a ler outra.

É dessa forma que a paisagem-Babel vai sendo apresentada. À medida que o autor trilha as redes textuais e urbanas, nas quais percorre instâncias cujos termos reforçam a idéia de Babel. São labirintos, montagens, registros, emblemas, metáforas e parábolas.

O livro se divide em duas partes. Na primeira, percorre cidades literárias em poesias, e textos bastante diversos entre si, tais como As cidades invisíveis de Italo Calvino e A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de Engels, obra clássica da cidade moderna. Na segunda parte, intitulada Suíte Carioca, se atém ao estudo do caso da cidade do Rio de Janeiro investigando como os textos do século 20 leram a antiga capital do Brasil, desde o projeto de modernização promovido pelo prefeito Pereira Passos.

Seu percurso é bastante rico, e nele há muito o que ressaltar, todavia, para efeitos desta resenha, consideramos de  especial importância destacar na abordagem do autor as leituras de poesias que descortinam a cidade. Por esse motivo, ressaltamos seu comentário para o poema Retrato de uma cidade, de Carlos Drummond de Andrade. Embora opte por não apresentar o poema na íntegra, fazendo somente referência a trechos dele, o autor demonstra a exaltação do Rio de Janeiro pelo poeta como “uma ‘festa colorida’ que se renova a cada dia como a natureza com a qual está indissoluvelmente ligado”.

Após essa leitura, Gomes faz um comentário que consideramos relevante sublinhar, por encerrar uma premissa que enxergamos como um objeto de pesquisa: a de que a cultura e a natureza garantem a formação e permanência de uma memória do lugar. Eis como o explica Gomes:

“Se o desenho urbano, em sua realidade histórica foi-se tornando indecifrável, pelas superposições sucessivas, resultado da fúria demolidora da burguesia, só resta, como possível visão total, apelar para as manifestações culturais da tradição (o carnaval, o futebol, a religião popular). Em sua continuidade, elas garantem a permanência, ao lado da natureza, que está sempre ali” (nota ii, p. 28).

Esse pensamento sugere a consideração pelo autor de que a única possibilidade para uma leitura integral da cidade só acontece se ancorada na paisagem e nas tradições culturais, como se a narrativa da paisagem construída não oferecesse a necessária legibilidade para a compreensão do lugar. Eis mais um objeto de pesquisa a se discutir.

Gomes lê a cidade em outras obras ao longo do livro, sempre considerando o caráter vicário dos signos que a compõem. Na segunda parte, em que seu olhar se detém  sobre o Rio de Janeiro, o que nos parece mais significativo, pelo escopo desta resenha, é o conteúdo que se apresenta  sob o título Cidade sem aura. Nele, o autor percorre a cidade, mais intensamente seu centro, no conto A arte de andar nas ruas do Rio de Janeiro, de Rubem Fonseca, e fala de uma proximidade impeditiva do olhar panorâmico, perpassado pela distância, o olhar do paisagista.

Nesta abordagem, assevera que quando tudo parece muito próximo desaparecem o espetáculo e a cena, perdendo-se uma promessa de significação. Trata-se de uma leitura em que o personagem principal, Augusto, jamais descreve a paisagem natural, tão onipresente no Rio de Janeiro. Na análise do autor, Augusto não o faz por não ter o “encantamento do longínquo”, expressão tomada à clave de leitura de Nelson Brissac Peixoto (2). Em sua visão, o que Augusto faz é uma escrita da cidade com seus passos.

Lendo, relendo, caminhando, decifrando, este livro oferece ao leitor arquiteto um banquete de significações. É um festim que, na pressa do dia a dia, no pulsar do cotidiano, pode passar despercebido, mas que, nesta obra, se oferece por inteiro ao leitor.

notas

1
SOUZA, Eneida Maria. Prefácio. In: GOMES, Renato Cordeiro. Todas as cidades, a cidade. Rio de Janeiro, Rocco, 1994, s/n.

2
Cf.  PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens urbanas. São Paulo: Senac/Marca d’Água, 1996; PEIXOTO, Nelson Brissac. Cenários em ruínas: a realidade imaginária contemporânea. São Paulo, Brasiliense, 1987.

sobre a autora

Eliane Lordello é arquiteta e urbanista (UFES,1991), Mestre em Arquitetura (UFRJ, 2003) e Doutora em Desenvolvimento Urbano na área de Conservação Integrada (UFPE, 2008).  É arquiteta da Gerência de Memória e Patrimônio da Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo.

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Todas as cidades, a cidade

Todas as cidades, a cidade

Renato Cordeiro Gomes

1994

175.02
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