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Resenha de autoria de Roberto de Almeida Bottura sobre o livro “O espaço terciário: o lugar, a arquitetura e a imagem do comércio” da arquiteta urbanista e economista Heliana Comin Vargas.

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BOTTURA, Roberto. Espaços do terciário e cidade. Resenhas Online, São Paulo, ano 17, n. 202.01, Vitruvius, out. 2018 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/17.202/7136>.


Após sua primeira edição em 2001, o livro O espaço terciário: o lugar, a arquitetura e a imagem do comércio da arquiteta urbanista e economista Heliana Comin Vargas, volta agora em 2018 em uma nova edição revisada e complementada. Editado pela Manole e com projeto gráfico renovado, preciso e com formato de melhor manuseio, oferece-se novamente uma oportunidade de adentrar em temas relevantes que pedem um debate entre os que pensam a cidade.

Esta obra, fruto da tese de livre docência da autora (professora titular do curso de Arquitetura e Urbanismo da FAU USP), possui um arco histórico de amplo fôlego já que, além de introduzir conceitos sobre a lógica do terciário, analisa espaços arquitetônicos e inserções urbanas em seus respectivos contextos sociais e culturais, abrindo aos futuros pesquisadores possíveis frentes de investigação e posteriores aprofundamento de questões.

Passados dezessete anos da versão original – que se encontrava esgotada e tornou-se referência nos estudos na área – podemos destacar dois importantes aspectos neste período. Em primeiro lugar, o conceito de compra e consumo vem se transformando ao longo desta trajetória, para atender as demandas de um capital cada vez mais flexível e dinâmico, que se associa amplamente a arquitetura (incluindo muitos dos star system architects) como estratégia de negócio, localização e marketing. Dessa forma, a relação entre comércio e cidade parte de uma relação umbilical de origem – como cita a autora no começo do livro – e chega à cidade contemporânea, onde novas formas de vivenciar o urbano se cruzam com novas atividades comerciais e diversas manifestações de prestações de serviços. Dada a dominância do consumo na vida cotidiana, coloca-se em evidência a necessidade de desvendar a lógica do terciário, para que nos limites disciplinares da arquitetura e do urbanismo, se possa intervir dominando suas fragilidades e realçando suas potencialidades para a vida urbana. Neste ponto, aparece então o segundo aspecto desta observação. Se em 2001 poucos estudos e autores contemplavam análises entre comercio e cidade, hoje a realidade torna-se visível na crescente produção de conhecimento no tema (dissertações, teses, eventos na área etc.), estando esse relançamento inserido num contexto emergencial de conhecer e compreender para intervir com melhor propriedade nos espaços relacionados ao terciário.

Estruturado em quatro capítulos, a autora inicia suas primeiras argumentações em “ideias sobre o comércio”, onde esclarece a troca como atividade social e discorre sobre a origem de eventuais pré-conceitos ante o terciário. Aqui, pode-se ler sobre os escolásticos cristãos que condenavam a prática do comércio e os modernos que acreditavam esta ser uma atividade improdutiva. Na sequência, percebe-se a complexidade do tema ao examinar sobre a “localização do terciário num contexto de mudança”, merecendo o destaque de algumas teorias econômicas como a neoclássica, behaviorista e estruturalista junto à teorias locacionais varejistas, cujos modelos desenvolvidos por Christaller são referência para estas análises. Olhando o fator localização como o cerne da questão comercial, aqui a autora consegue revelar um conceito principal que muitas vezes é esquecido: o setor de comércio e serviços é atraído pelo fluxo e não o revés (salvos raros casos de tradicionais ruas de comércio especializados e clusters multifuncionais como shopping centers e hipermercados). Neste ponto, conflui uma miríade de agentes que incidem sobre a escolha da localização, explicados um a um no capítulo, tais como o trabalho, o capital, a demanda, os transportes, os fluxos, a organização empresarial, as políticas públicas, o contexto sociocultural e a tecnologia.

Ao tratar sobre “arquitetura de negócios”, pode-se aqui perceber a veia arquitetônica da autora, cujo principal (e mais extenso) capítulo do livro faz desfilar por suas páginas análises de espaços arquitetônicos e lugares em que o comércio representa um protagonismo social, econômico e cultural, percorrendo desde os bazaars árabes, a ágora grega, os mercados, os fóruns romanos, as praças medievais, as feiras, os edifícios de mercados bem como as passagens, os grands magasins até os shopping-centers contemporâneos. Tal promenade não se dá por capricho e sim pelo encadeamento construído ao longo do texto da relação simbiótica entre cidade, comércio, arquitetura e sociedade, demonstrando como determinadas formas de viver a cidade estão atreladas a manifestações de comércio próprias de um momento, cuja dialética renova e fortalece as trocas materiais e imateriais.

O derradeiro capítulo investiga “a imagem do comércio”, explorando a dimensão sensível e psicoemocional que o ato da compra evoca, tanto por parte do comércio quanto do consumidor. Efeitos como o da comunicação, da poluição visual, da vitrine, das fachadas e da publicidade são citados enquanto agentes que incidem na espacialidade e guardam impactos visuais e comportamentais.

A facilidade com que a autora passeia pelos mais distantes períodos do tempo analisando momentos a partir de olhares distintos, ora pela economia, ora pela arquitetura, advém de sua múltipla formação e dos múltiplos enfrentamentos requeridos nas questões do terciário. Pensar o rebatimento espacial deste setor considerando sua ênfase urbana é um resgate dos valores das cidades tradicionais, presentes em estudos de autores como Jane Jacobs, Jan Ghel, Kevin Lynch, Robert Venturi e outros, onde há sempre um reconhecimento do setor de comércio e serviços como agente de urbanidade e sociabilidade. Não há bairros aprazíveis, diversos e com uma rica vida urbana sem a presença do comércio, dinamizando o cotidiano e costurando relações sociais. Esse é um pouco o caminho defendido pela professora Heliana, em que frente à crítica do consumo enquanto força alienante do capital, percebemos os aspectos de urbanidade que o comércio evoca, favorecendo o encontro, a tertúlia e a vida de bairro.

Tal como um alerta, a autora indica que o terciário está aí, criando e resolvendo problemas, de modo que urgem reflexões e análises frente a complexidade do terciário no espaço urbano vislumbrando intervenções que realmente possam aunar os interesses dos usuários da cidade com os do setor de comércio e serviços, de olho em uma vida urbana com mais qualidade para todos.

sobre o autor

Roberto Bottura é arquiteto e urbanista pela Puc-Campinas e Mestre em Teoria e História da Arquitetura pela Universitat Politècnica de Catalunya – UPC. É professor da FAU-UFT (Palmas-TO) atuando principalmente nas áreas de projeto arquitetônico e crítica.

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