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Guilherme Mazza Dourado comenta a exposição "Burle Marx. Arte, Paisagem e Botânica", que acontece no Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia — MuBE, em São Paulo, até 17 de março de 2019.

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DOURADO, Guilherme Mazza. Chegou 2019, ano de Burle Marx. Resenhas Online, São Paulo, ano 18, n. 205.05, Vitruvius, jan. 2019 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/18.205/7235>.


Qual o sentido de homenagear Roberto Burle Marx em 2019, quando ele faria 110 anos de nascimento e seu sítio-laboratório em Barra de Guaratiba completa 70 anos de existência? Sua contribuição para a cultura brasileira do século 20 foi imensa, com realizações que atravessam campos das artes visuais tão variados quanto a pintura, o desenho, a gravura, a azulejaria, a escultura, a tapeçaria, o mosaico, a joalheira e a cenografia. Sua atividade em paisagismo foi ímpar e responsável por colocar o Brasil, pela primeira vez, na linha de frente do cenário paisagístico internacional. Como nenhum de seus pares, empreendeu uma série importante e pioneira de expedições botânicas para estudo e coleta de novas espécies com potencial paisagístico pelo Brasil afora, impulsionando a formação de seu principal centro de pesquisas — o antigo Sítio Santo Antônio da Bica, que hoje leva seu nome e constitui Unidade Especial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional — Iphan. E ainda bradou como uma voz singular na defesa e conscientização ambiental a partir da ditadura militar de 1964, protestando abertamente na imprensa, organizando conferências e debates públicos e cobrando diretamente as responsabilidades dos governantes e empresários pelo crescimento da devastação florestal no território brasileiro.

Vista geral da exposição no MuBE
Foto Guilherme Mazza Dourado

Dando início às programações especiais dedicadas a ele aqui e no exterior, o Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia — MuBE, em São Paulo, apresenta até 17 de março a exposição Burle Marx. Arte, Paisagem e Botânica (1). Segundo o texto de abertura, o evento destaca basicamente o ativismo ecológico de Burle Marx e a gênese do projeto paisagístico da entidade. Desta obra, propõe revelar desenhos inéditos e simular, por meio da aplicação temporária de película plástica negra, os mosaicos de piso nas áreas externas da instituição, descartados ao longo do processo criativo, que foi terminado por Haruyoshi Ono e sua equipe, após o desaparecimento do mestre. Contudo, não é bem isso o que prevalece e chama a atenção na mostra e sim um apanhado do trabalho de Burle Marx em artes visuais e design de objetos.

Sem título, acrílica sobre tela, 1992
Foto Guilherme Mazza Dourado [Coleção Sítio Roberto Burle Marx]

Dificilmente a exposição se sustentaria apenas pelo modo com que aborda a proposta de paisagismo do museu, resumido a quatro pranchas (embora existam mais peças gráficas arquivadas no escritório do paisagista, no Rio de Janeiro), um vídeo com rápidos depoimentos de Mendes da Rocha e de Ono e a reconstituição efêmera dos mosaicos, sem maiores análises e nenhuma tentativa de mensurar o significado desta realização no conjunto do trabalho paisagístico burlemarxiano. Por outro lado, a exibição também não se sustentaria pela forma vaga e displicente de focalizar a atuação na crítica e preservação ambiental, optando tão somente por dispersar frases do próprio Burle Marx acerca do assunto aqui e ali, sem mais e nem menos, entre alguns grupos de quadros. E pior, deixando passar a oportunidade de investigar a fundo uma das menos conhecidas atividades do profissional e mesmo de criar debates oportunos neste início de novo governo federal, que dá sinais de pouca afeição aos problemas ambientais.

Sem título, acrílica sobre tela, 1992
Foto Guilherme Mazza Dourado [Coleção Sítio Roberto Burle Marx]

Na ausência de um projeto curatorial inventivo e bem explicado, que ousasse propor novos enfoques de interpretação e recortes temáticos ainda não explorados, a exposição acaba por replicar a surrada fórmula de panoramas anteriores que juntam, à maneira de colcha de retalhos, um pouco de tudo o que fez o paisagista-artista ao longo de sua carreira. Nesse contexto, resta ao visitante aproveitar a ocasião para ao menos fruir algumas pinturas e desenhos artísticos de boa qualidade, pertencentes à fase inicial figurativa e sobretudo ao período abstrato. Em matéria de artes visuais, são exibidas dezessete telas, entre pequenos e grandes formatos, quatro desenhos a nanquim, três litografias, quatro esculturas em bronze, uma tapeçaria de amplas dimensões, dois objetos em vidros e seus esboços preparatórios, uma túnica feminina e duas toalhas de mesa, provenientes de instituições públicas (caso do Sítio, que fez o maior empréstimo de peças), e de acervos particulares (Airton Queiroz, Fundação Edson Queiroz, Hecilda Fadel, Alfredo Turbay, Luiz Carlos Ritter, Ricardo Brito e Nanuza Menezes).

Toalha de mesa, acrílica sobre lona, 1989
Foto Guilherme Mazza Dourado [Coleção Sítio Roberto Burle Marx]

A abertura da exibição se faz com três interessantes naturezas-mortas, de 1941 e 1942, uma cedida por Hecilda Fadel e duas, por Airton Queiroz. São obras que ilustram a etapa figurativa e as primeiras influências decantadas pelo artista a partir de mestres do pós-impressionismo e da arte moderna — de Vincent Van Gogh a Paul Cézanne, de Pablo Picasso a Cândido Portinari -, embora nada disso seja explicado ao público. Dá-se um salto temporal e os quadros seguintes já são abstratos, como a tela Mangue azul, de 1963, e os quatro desenhos a nanquim da série Pithecolobium tortum, de 1961, todos pertencentes ao Sítio, e novamente fica-se devendo ao visitante comentários sobre como foi a passagem e o fortalecimento da pesquisa abstrata.

Vaso com flores, óleo sobre tela, 1941 (ambos)
Foto Guilherme Mazza Dourado [Coleção Airton Queiroz (Fortaleza) / Coleção Hecilda Fadel (Rio de Janeiro)]

Após três décadas experimentando de tudo um pouco em matéria de figurativismo, inclusive associando referências antagônicas, Burle Marx trilhou os anos 1960 inventando um abstracionismo com identidade própria. E, nesse processo, serviu-se tanto da inspiração plástica sugerida por estruturas de galhos e tramas vegetais captadas na natureza quanto das conquistas formais testadas em seus projetos de paisagismo. Vale lembrar que seu paisagismo atingira um caminho inovador uma década e meia antes de sua pintura e foi justamente esse mesmo paisagismo que funcionou como um dos motores para superar os impasses de sua pintura figurativa. Desse momento em diante e até às vésperas de seu falecimento, em 1994, Burle Marx criou uma abstração potente e significativa no contexto da arte moderna brasileira, agigantando cada vez mais os formatos, conforme pode ser visto na exposição – do painel da década de 1970, cedido por Ricardo Brito, passando pelas 4 derradeiras grandes telas executadas entre 1991 e 1992 e hoje de propriedade do Sítio, até as extensas toalhas de mesa, de 1989, também emprestadas pela mesma instituição.

Escultura e telas da maturidade criativa de Burle Marx
Foto Guilherme Mazza Dourado

Espraiando-se pela porção central da sala, há duas mesas maiores com a produção paisagística, ilustrada por dez obras, entre estudos coloridos, perspectivas originais e cópias heliográficas de pranchas finais (boa parte dela procedente do escritório de Burle Marx, no Rio de Janeiro). Para não fugir à regra geral, também nada se fala sobre estes trabalhos e tão pouco se arrisca alguma observação que os relacione às demais produções criativas, principalmente diante do que ocorreu a partir da década de 1960 — os traçados abstratos dos jardins migram e ganham complexidade nas telas abstratas do artista. A primeira mesa reúne velhos conhecidos: desde os jardins iniciais, como as três perspectivas de encargos públicos no Recife, entre 1935 e 1937 (Casa Forte, Cactário da Madalena e Palácio do Governador), até obras da maturidade, como o plano geral do Parque del Este, em Caracas, de 1958 (exemplificando os traçados curvilíneos que se tornaram marca-registrada de Burle Marx), e uma cópia de trecho do calçadão da avenida Atlântica, em Copacabana, de 1970 (que ilustra a geometrização e o enrijecimento formal característicos da última fase do paisagista).

Mesas que apresentam a produção paisagística
Foto Guilherme Mazza Dourado

Na mesa seguinte, comparecem duas pranchas coloridas da antiga residência Ema Kablin, de 1956, hoje fundação cultural e parceira do MuBE na exposição, uma folha com vários estudos para o Recife, entre 1935 e 1937 (sem identificação talvez por desconhecimento), e duas pranchas do paisagismo do edifício Itália, de 1966, com arquitetura de Paulo Mendes da Rocha (possivelmente para situar colaboração anterior do paisagista com o arquiteto do MuBE). No entanto, o que se vê neste segundo conjunto são escolhas dispensáveis e pouco representativas da carreira de Burle Marx. Próximo à rampa de saída, um mosaico de fotos atuais dos jardins busca complementar as informações sobre os desenhos de paisagismo, mas a distância entre eles é tal que dificilmente o público irá associar uma coisa a outra.

Apesar deste início titubeante, o ano certamente promete. Entre os eventos já confirmados, estão os do Jardim Botânico de Nova Iorque, entre 6 de junho e 29 de setembro, particularmente a exposição de artes visuais que cobre o período de 1964 a 1994, a cargo de Edward Sullivan. Quem sabe se seremos então positivamente surpreendidos! 

Toalha de mesa, acrílica sobre lona, 1989
Foto Guilherme Mazza Dourado [Coleção Sítio Roberto Burle Marx]

nota

1
Exposição “Burle Marx: arte, paisagem e botânica”, curadoria de  Cauê Alves. Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia – MuBe, de 15 de dezembro de 2018 a 17 de março de 2019.

sobre o autor

Guilherme Mazza Dourado é arquiteto, historiador de paisagismo e autor do livro Modernidade Verde. Jardins de Burle Marx.

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