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Na busca por caminhos possíveis, o Comuns foi composto por exercícios de imaginação coletiva para outros futuros, onde saberes ancestrais e questões urbanas contemporâneas dialogaram mediante a um olhar interdisciplinar
Foram dez encontros calorosos, apesar de virtuais. Fizeram parte profissionais da arquitetura, do urbanismo e das artes, atuantes em projetos tanto sociais como ecologicamente regenerativos e desde uma posição de borda. Mulheres e homens de diversas localidades, nos debruçamos, desde nossas vivências enquanto povo latino americano, na construção de panoramas e conexões possíveis norteadas por tópicos chave para a compreensão da nossa prática nos dias de hoje: materiais e técnicas, poéticas, participação e estratégias. Investigamos coletivamente processos projetuais que potencializam os escassos recursos disponíveis, no intuito de transformar os territórios através de práticas espaciais, críticas e pedagógicas, em atuações situadas e colaborativas. Diante da lógica hegemônica própria do urbanismo das cidades latino americanas, baseada em um projeto de especulação, remoção e exclusão de uma diversidade de populações que, colocadas em situação de extrema vulnerabilidade, perdem seus direitos à terra, à casa, à água e à própria existência, como se criam projetos de produção do comum e de garantia do “direito à cidade” (Harvey, 2003; Lefebvre, 2001)?
Na busca por caminhos possíveis, o laboratório virtual Comuns foi composto essencialmente por exercícios de imaginação coletiva para outros futuros, onde saberes ancestrais e questões urbanas contemporâneas dialogaram mediante a um olhar interdisciplinar. Ao longo de um mês, formou-se uma comunidade de aprendizagem com cerca de 60 integrantes de diversos países do nosso continente: Argentina, Brasil, Colômbia, Equador, México, Peru e Uruguai.
A proposta, foi criar uma arena de compartilhamento e circulação de ideias e práticas sócio-espaciais a fim de revelar relações, táticas e afetos, além de materiais, técnicas, poéticas, metodologias de participação e estratégias de implementação, sempre em torno dos eixos que pautaram os encontros. Pretendeu-se, dessa forma, compreender, na sua complexidade, não apenas as dinâmicas de poder, mas também as alianças e relações de reciprocidade, entre consensos e dissensos, que acontecem a partir de interações individuais e coletivas em projetos urbanos. Fez-se, assim, uma cartografia de práticas situadas e colaborativas que lutam pelo direito à cidade, que utilizam a arquitetura como ferramenta de transformação social. Tratam-se de outras perspectivas ao redor dos modos de pensar e fazer arquitetura na América Latina, materializadas em projetos urbanos, reformas, ações culturais e intervenções temporárias em espaços de uso comunitário.
Ao contrapor a elaboração e realização de diversos projetos por meio dos encontros, foram investigados os processos de produção social e cultural dos espaços públicos e comunitários onde estes se desdobram. Quais os ecossistemas férteis para a emergência de práticas espaciais situadas e colaborativas? O que podemos aprender com os coletivos de arquitetas e arquitetos urbanistas que têm um papel protagonista nesta discussão, seja desde a crítica, o projeto ou a construção de espaços comuns e democráticos na América Latina do século XXI? Quais ferramentas e estratégias podem ser úteis a coletivos emergentes? Como criar uma política de constelações temporárias capaz de formar redes onde possamos reconhecer nossas semelhanças e singularidades na busca de aprendizado mútuo e colaboração?
Não é novidade que o contexto político, social e econômico em que vivemos, na periferia do capitalismo, encontra-se sedimentado acima de camadas históricas de opressões, violências, desigualdades e extrativismos. Entre contradições e polaridades, a sociedade clama por um novo paradigma de ação sobre o território e modos mais integrados de transformação da paisagem, seja ela cultural ou ambiental. Nos perguntamos então, como, a partir da arquitetura e urbanismo, é possível gerar um impacto positivo no território. Como fomentar a autonomia de pensamento e ação da população envolvida em processos de um projeto urbano? Como pensar as relações de trabalho no canteiro, na sua diversidade de possibilidades de cooperação? Como considerar interesses diversos de troca e aprendizagem, desenhando processos de organização coletiva (construção em mutirão, por exemplo)? Como valorizar práticas e formas de trabalho que os territórios já produzem, convidando mestres locais para capacitarem aprendizes? Como deixar o paradigma da precarização do trabalho e atuar na valorização do saber empírico e de técnicas populares?
Como trabalhar dentro dos limites do possível, operando com criatividade na improvisação de um processo vivo? Como lidar com os limites e amarras materiais, mas também financeiras, jurídicas, geográficas e psicológicas? Notamos que as hierarquias, relações de poder e contradições estão imbricadas nas relações ao longo de todo processo de um projeto urbano ou arquitetônico, trazendo determinados impactos neste: na falta de materiais, ou na escolha por uso de matéria prima local ou reuso de materiais residuais; na falta de recursos financeiros, ou na colaboração com investimento estrangeiro; na ilegalidade, ou na dependência da burocratização dos processos e tempo lento do governo; na impossibilidade de trânsito pelos territórios, ou na liberdade de cruzar fronteiras; e por fim, na lógica do medo e da falta de confiança. A dificuldade de apropriação e empoderamento por parte dos atores envolvidos, refletidos em questões de autoestima e orgulho do seu território, é mais um traço que nos faz refletir sobre a necessidade de refletirmos sobre o “depois”, mas especialmente o “durante” de todo projeto que envolve a prática arquitetônica. Quais as vantagens de escapar às lógicas de mercado que promovem que o término do processo construtivo determine o fim da relação da arquiteta ou arquiteto com o território e a comunidade?
Neste sentido, a criação de identidades individuais e coletivas ao longo de processos participativos em territórios periféricos ou de vulnerabilidade (sejam essas periferias geográficas, sociais ou políticas) acaba por instigar outros “amanhãs”. O projeto espacial materializa no mundo uma possibilidade de porvir: tangibiliza um discurso, transformando-se em símbolo que permite a atribuição de diversos significados no tempo; materializa possibilidades antes impensáveis; constrói afeto e valor compartilhado. Valor este apropriado pelas memórias afetivas que participaram e significaram esta experiência, servindo de ferramenta para sensibilizar demais atores, ampliando e fertilizando um campo de sonhos e realidades. O impacto que se gera é inegável, porém igualmente difícil de medir (apontando para a necessidade de recriação dos indicadores que medem o “sucesso” de um projeto): são revelados questionamentos sobre modos de vida, desejos e imaginários hegemônicos para, então, sustentar o campo do indeterminado, daquilo que não é útil. Do que ainda não tem função ou finalidade e que, no entanto, emerge do encontro, da cultura, do comum e da vida cotidiana, ainda que momentaneamente mediada por telas e dispositivos. É aquilo que está em nós, antes de virarmos a expectativa de uma profissão.
Quer saber mais?
Alguns dos projetos dos coletivos convidados foram publicados na edição 235 da revista Projetos do portal Vitruvius como um desdobramento da primeira edição de Comuns. Este laboratório virtual de arquitetura experimental e participativa foi organizado por Marcella Arruda e Marina Frúgoli, em colaboração com Paula Monroy, André Moraes e o Centro Cultural Marieta, em São Paulo, Brasil. O evento se realizou entre 16 de setembro e 21 de outubro de 2020, contou com um júri formado por membros do portal Vitruvius e dos coletivos PermaSampa e A Casa de Jajja, e com a presença dos seguintes convidados: Al Borde (Equador), a77 (Argentina), Mouraria 53 (Brasil); Colectivo Arrabal (México), Micrópolis (Brasil), Goma Oficina (Brasil); Terceira Margem (Brasil), Ruta4 (Colômbia), Eleazar Cuadros (Peru); Arquitectura Expandida (Colômbia), Comunal (México), e SePlan Conde (Brasil).
Agradecemos aos participantes que criaram conosco esse laboratório de imaginação de futuros possíveis:
Agostina Macchi, Bogotá, Colômbia
Ana Paula Damasio Martins Ferreira, Vila Velha/ES, Brasil
Andrea Muner, São Paulo/SP, Brasil
Andressa Melo Rodrigues, Brasília/DF, Brasil
Bernardo Nascimento Soares, Rio De Janeiro/RJ, Brasil
Bruna Tabajara Brilmann, Porto Alegre/Taquara/RS, Brasil
Bruno De Albuquerque Ferreira Lima, Recife/PE, Brasil
Camila Alejandra Proaño Reyes, Quito, Equador
Camila Gomes Sant' Anna, Goiás, Brasil
Carla Freitas Pacheco Pereira, Brasília/DF, Brasil
Caroline Rodrigues Fortes de Almeida, São Paulo/SP, Brasil
Cássia Dias Roriz, Niquelândia/GO, Brasil
Cristina Gabriela Loya Cárdenas, Sangolquí, Equador
Daniel da Silva Lima, João Pessoa/PB, Brasil
Daniela Tatsch Baptista, Porto Alegre/Taquara/RS, Brasil
Danilo Lima De Souza, Barreiras/BA, Brasil
Débora Didonê Sanches, Salvador/BA, Brasil
Felipe Gonzalez Zapata, Bogotá, Colômbia
Fernanda Carlovich, São Paulo/SP, Brasil
Francisco Lang, Porto Alegre/Taquara/RS, Brasil
Gabriela Rudge, São Paulo/SP, Brasil
Helena Cavalheiro, São Paulo/SP, Brasil
Isabela Giorgiano, Uberlândia/MG, Brasil
Isabella Echeverri Holguín, Pereira, Colômbia
Jennifer Cabral, Mogi das Cruzes/SP, Brasil
Julia Brasil, Curitiba/PR, Brasil
Júlia de Fáveri, Florianópolis/SC, Brasil
Julia Figueiredo, São Carlos/SP, Brasil
Júlia Oliveira Ho, Belo Horizonte/MG, Brasil
Juliana Santos Arruda, Belém/PA, Brasil
Kleber Colombo, Porto Alegre/Taquara/RS, Brasil
Larissa Silva Barreto, Marechal Floriano/ES, Brasil
Laura Melissa Cuadros Lancheros, Bogotá, Colômbia
Leticia Notini, Belo Horizonte/MG , Brasil
Lívia De Salvi Lazaneo, Limeira/SP, Brasil
Lucía Segalerba Vanni, Montevideo, Uruguai
Luciana Varkulja, São Paulo/SP, Brasil
Luna Bibas, Belém/PA, Brasil
Luiz Souza Neto, Siriri/SE, Brasil
Manoele Scortegagna, Berlim, Alemanha
Maria Amélia Santos Miranda, São Paulo/SP, Brasil
María Del Ángel Rejón Santana, Mérida, México
María José Fernández Sandoval, Xalapa, México
Maria Luiza de Barros Rodrigues, São Paulo/SP, Brasil
Marina Liesegang, São Paulo/SP, Brasil
Martin Funes, Mendoza, Argentina
Mauro Bock González, Curitiba/PR, Brasil
Michaela Iwanow de Araújo, São Paulo/SP, Brasil
Óscar Soto Cortés, Puerto Vallarta, México
Pâmela Rodrigues Castro, Campinas/SP, Brasil
Pedro de Andrade Lima Britto, Recife/PE, Brasil
Petrus Fernandes de Oliveira Barboza, João Pessoa/PB, Brasil
Rafael Fogel, Rio de Janeiro, Brasil
Rubén Manuel Ramírez Aguirre, Guadalajara, México
Sandy Vieira da Silva, Recife/PE, Brasil
Sofia Olival, São Paulo/SP, Brasil
Talita Xavier Maboni, Brasília/DF, Brasil
Thais Viyuela, São Paulo/SP, Brasil
Thays Teixeira Guimarães, São Paulo/SP, Brasil
Tomas Vannucchi, São Paulo/SP, Brasil
Valéria Boa Sorte Amorim, São Paulo/SP, Brasil
Valeria Cabrer Rodríguez, Ciudad de México, México
Veruska Bichuette Custodio, Uberaba/MG, Brasil
Virgínia Stela Bueno Lambert, Cambuí/MG, Brasil
Viviane Zerlotini da Silva, Belo Horizonte/MG, Brasil
Sobre as autoras
Marcella Arruda é arquiteta e urbanista pela Escola da Cidade, permacultora pelo Coletivo Permasampa (2017), estudou Interactive Media Design na Holanda (2014).
Marina Frúgoli é curadora graduada em arquitetura e urbanismo pela FAU USP (2017), com estudos complementares em paisagismo na Amsterdam Academy of Architecture (2015).
Pedro Britto, exercício de imaginação, Recife PE Brasil
Michaela Iwanow, exercício de imaginação, São Paulo SP Brasil
Laura Cuadros, exercício de imaginação, Bogotá Colombia
Yapó arquitetura consciente, exercício de imaginação, Porto Alegre RS Brasil