Adepto de uma estratégia inusitada – a de elogiar o vazio ao invés do cheio, a mobilidade ao invés da fixidez – o arquiteto Carlos M. Teixeira propõe neste livro uma subversão do olhar voltado para a formação e o futuro das nossas cidades. O autor questiona os marcos e monumentos como formas estáveis da memória da cidade, e investe, precisamente, em seu contrário: na ausência de símbolos estruturados, na anti-construção e na complexa vitalidade do aqui e agora. Ao tomar como ponto de partida a história descontínua da capital mineira, Teixeira flagra um processo inerente a quase todas as metrópoles brasileiras – quiçá dos países emergentes –, dilaceradas entre o apego a formas fixas, canônicas, e o desenraizamento total.
Esse conflito, Teixeira transporta-o para a estrutura mesma do livro, cujo entrelaçar de textos e imagens se assemelha, em muitos aspectos, à complexa malha viária de uma grande cidade. Daí seu recurso a uma escala bastante ampla de referências: da história clássica da arquitetura ao cinema, com inúmeras incursões pela música, literatura e artes plásticas. Como se só no cruzamento de várias vias, na ramificação quase infinita das linguagens, pudéssemos apreender – de forma urgente e vital – a energia que circula pelos vazios e espaços públicos da cidade.
É, portanto, com grande prazer que a Romano Guerra traz ao público a segunda edição, revisada e ampliada, do livro Em obras: história do vazio em Belo Horizonte.
Estrutura do livro
Em capítulos incisivos como lâminas, Em Obras opera cortes radicais no tempo, passando em revista as inúmeras tentativas de ordenação da capital mineira.
“Do cartão-postal” discute a relação entre imagem e memória das cidades. Entrelaçando história do urbanismo e da fotografia, a visão de BH é ditada pelos fotógrafos da cidade moderna, agentes culturais que buscavam fazer cartões-postais da jovem capital que, no início de sua história, era um mar de vazios urbanos.
“Urbana e suburbana” descrevem o plano urbano de Aarão Reis para depois exaltar a zona suburbana de Belo Horizonte, a zona que melhor representa a cidade, que “consome coisas” e que “devorou a Zona Urbana” – para usar as considerações destruidoras-construtivas que o modernista Oswald de Andrade fez em sua profética visita a capital.
“Liberdade, ela é o vazio” propõe os vazios urbanos, a improvisação, o dispêndio, as festas e os jogos como algo fundamental em uma cidade que já foi só “vazios”, passou a ser só “cheios” e que, ironicamente, poucas vezes conseguiu se expressar pelos cheios.
O último capítulo são “Projetos” que propõem soluções e curtos-circuitos na cidade. Serra do Curral propõe a conversão de sua área minerada em um gigantesco parque em meio à paisagem violenta feita de curvas escalonadas de minério de ferro. Tumor benigno, proposta mais radical, é uma vingança da natureza que reocupa todo o centro, fazendo da zona urbana um imenso parque municipal. E, por fim, o Teatro dos vazios prega um toque de saída conclamando todos à ocupação dos poucos vazios que restam na cidade para, assim, “gerar energias positivas e negativas”.
Sobre o autor
Formado em arquitetura pela UFMG, Carlos M Teixeira é mestre em urbanismo pela Architectural Association e doutorando pela FAUP. Publicou os livros Em obras: história do vazio em Belo Horizonte (Cosac Naify, 1999), O condomínio absoluto (C/ Arte, 2009), Ode ao vazio (Romano Guerra/Nhamerica, 2017) e é um dos organizadores de Espaços colaterais (Cidades Criativas, 2008). Já expôs seus trabalhos no Palácio das Artes (Belo Horizonte), Viaduto das Artes (Belo Horizonte), Festival International des Jardins (França), UABB Bi-City Biennial de Hong Kong e Shenzhen, Galleria Campo (Roma), Bienal de Arquitetura de Veneza, Victoria & Albert Museum (Londres), Bienal de Arte de São Paulo e Bienal de Arquitetura de São Paulo, entre outros. Em 2002, fundou o escritório de arquitetura Vazio S/A.
Sobre a editora
A Romano Guerra Editora, especializada em livros de arquitetura, arte e cultura de alto padrão gráfico e editorial, é comandada pelos arquitetos e editores Abilio Guerra, Fernanda Critelli e Silvana Romano Santos. Publica monografias sobre arquitetos e escritórios brasileiros – Rino Levi, Paulo Mendes da Rocha, Lina Bo Bardi, Brasil Arquitetura, David Libeskind, João Filgueiras Lima (Lelé), Rosa Kliass, Marcos Acayaba, Abrahão Sanovicz, João Kon, Vilanova Artigas, dentre outros – e livros de crítica e história da arte, arquitetura e cultura. Suas edições se caracterizam pela qualidade gráfica e conceitual, e ganharam diversos prêmios, dentre eles três Jabutis.