Fundada em 1514, a cidade de Trinidad, a aproximadamente 300km de Havana, viveu seu apogeu no século 19 durante o cultivo de cana de açúcar na região. Como herança dessa época de grande prosperidade, a cidade ainda preserva ruas, palácios, igrejas e praças da era colonial e é considerada Patrimônio da Humanidade pela Unesco desde 1988 (1).
Compacta e tranquila, apesar de alguma movimentação de turistas, o vilarejo convida para uma caminhada por suas ruas de paralelepípedo, que nos revela alguns detalhes arquitetônicos bastante característicos. As fachadas baixas de cores fortes são pontuadas por janelas de madeira bastante longilíneas que vão desde o piso interior até a altura das portas de entrada. Por suas dimensões, esses vãos poderiam servir de acessos ao interior, não fossem os gradis fixados na fachada. Em algumas edificações essas janelas se repetem de forma a criar um ritmo.
Outro detalhe recorrente em Trinidad são os gradis de ferro colocados nos vãos das fachadas. Pintados de branco e ornamentados com padrões retos ou curvilíneos bem elaborados, esses gradis parecem competir entre si pelo posto de mais requintado. Ajudados pelo sol sempre presente do Caribe, criam interessantes jogos de luz e sombra sobre as janelas e portas que protegem.
Para o turista observador, surge uma dúvida: qual a função de tais gradis? Garantir segurança numa cidade pacata no interior de Cuba? Fazer a transição interior-exterior? Ou apenas servir de composição estética?
Enriquecendo o valor arquitetônico dessa pequena cidade, o piso e algumas paredes de grande parte das casas são revestidos por ladrilhos hidráulicos dos mais diversos padrões. Interessante notar que não é nem preciso entrar nas residências para notá-los: as soleiras das casas já nos dão uma amostra desde a rua. E, para os olhares mais curiosos, muitas janelas são deixadas abertas para a entrada do ar e luz, escancarando o interior das casas.
Cuba possui uma tradição na produção de ladrilhos hidráulicos. Com origem na Espanha, essa tecnologia foi introduzida no país caribenho em 1886. No início, as fábricas cubanas sofriam grande concorrência dos modelos importados. Porém, a explosão construtiva no início do século XX e a popularidade desse tipo de revestimento levaram a uma procura crescente por esse revestimento. Muitas fábricas de prestígio foram surgindo no país, propiciando o desenvolvimento da técnica e a variedade dos desenhos, que foram assumindo estilo próprio, mais coloridos e com motivos florais mais complexos e ornamentais se comparados aos espanhóis. A dimensão mais comum era de 20x20cm. Partindo da capital Havana, podemos perceber que essa tradição chegou a outras regiões, como foi o caso de Trinidad.
Além de sua beleza arquitetônica bastante peculiar, a cidade de Trinidad pode servir de ponto de partida para conhecer a história dos engenhos e explorar as belezas naturais da região de Sancti Spíritus.
nota
1
Trinidad and the Valley de los Ingenios. In: UNESCO World Heritage Centre 1992-2015 <http://whc.unesco.org/en/list/460>.
sobre o autor
Victor Sena é arquiteto formado pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e publicitário formado pela Estácio de Sá. Atualmente trabalha como arquiteto na Organização das Nações Unidas. Além disso, participa do projeto Memória em Ladrilhos.
