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português
Luiz Fernando Janot faz uma análise sobre a falta de debate e esclarecimento dos projetos que estão em curso no Rio de Janeiro.
JANOT, Luiz Fernando. Urbanismo de oportunidades. Minha Cidade, São Paulo, ano 13, n. 155.03, Vitruvius, jun. 2013 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/13.155/4772>.
Ideias para valorizar a ambiência urbana da cidade do Rio de Janeiro são sempre bem vindas. No entanto, é necessário ressaltar que essas propostas devem possuir um embasamento urbanístico consistente para assegurar a sua adequabilidade aos locais onde serão implantadas. Infelizmente, uma boa parte dos recentes projetos de intervenção urbana no Rio foi decidida de afogadilho, sem que fossem avaliadas as consequências negativas para o futuro da cidade.
Em tempo de mega realizações, os prazos exíguos têm servido como estratagema para aprovar projetos e obras a qualquer custo e sem a transparência necessária. A cada dia que passa, as pressões dos grupos empresariais que gravitam em torno dos grandes eventos esportivos internacionais se tornam mais acirradas. Em nome de cumprir compromissos assumidos institucionalizou-se um absolutismo pragmático que rejeita qualquer espécie de contestação ao que foi planejado.
Um exemplo evidente desse procedimento equivocado encontra-se no plano de requalificação urbana da zona portuária. Transferir para empresas privadas o direito de planejar e administrar importantes áreas públicas por meio de concessões de longo prazo é, sem dúvida, uma temeridade. Os projetos disponibilizados publicamente pelo consórcio de empreiteiras responsável pelas obras do Porto Maravilha não passam de vídeos comerciais bem produzidos. Falta-lhes consistência urbanística e clareza de informação. Em decorrência, algumas questões que envolvem o planejamento da área ainda permanecem sem resposta.
Que espécie de modelagem urbana é essa que não leva em conta a beleza natural e os aspectos culturais da cidade? O que se espera extrair dessa gigantesca área quando se adota, como princípio estruturante, alguns modelos espetaculosos de arranha-céus copiados de cidades emergentes do Oriente Médio? Por que nivelar culturalmente o Rio a essas cidades artificiais? O que a extraordinária oferta de novas edificações na área portuária causará no mercado imobiliário do centro da cidade? Como se comportará essa área da cidade quando a sua população local passar dos 20 mil para os 100 mil habitantes previstos, sem considerar nesse cálculo as pessoas que frequentarão os grandes centros empresariais? Como foi planejada a circulação de veículos que irá transitar pela área, inclusive aqueles que terão acesso às garagens das gigantescas torres de escritórios? De que adiantou projetar uma via expressa subterrânea se o famigerado píer em “Y” irá impedir o livre acesso à beira do cais? Com que argumento se justifica a complacência das autoridades públicas ao aprovar o projeto desse píer e permitir que a licitação para as obras fosse executada?
Soma-se a esses questionamentos, a notícia de que a licitação para concessão do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) que irá interligar a zona portuária à área central da cidade já está decidida. Esse é mais um projeto de mobilidade urbana que não teve a transparência necessária e muito menos a avaliação técnica para apresentação de propostas alternativas para evitar impactos negativos no centro histórico da cidade. Ora, de que adianta o Rio ser a bola da vez no cenário mundial se a cidade se vê pressionada a atender aos grupos que fazem da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos o cenário propício para os seus interesses especulativos? Todavia, ainda há tempo para se exigir um debate aberto e transparente sobre essas e outras propostas polêmicas que circulam pela mídia. Se o Rio não resgatar dessas competições esportivas um legado que seja, de fato, consistente e duradouro pouco restará para ser comemorado ao final desses eventos (1).
notas
NE
Publicação original: JANOT, Luiz Fernando. Urbanismo de oportunidades. O Globo, Rio de Janeiro, 13 maio 2013.
1
Falando em legado, pergunta-se como andam as contratações dos projetos e das obras do “Morar Carioca” para urbanização das favelas cariocas até 2016?
sobre o autor
Luiz Fernando Janot, arquiteto urbanista, professor da FAU UFRJ.