O projeto
O projeto da Ecovila de Papel partiu de Trabalhos Finais de Graduação apresentados à FAUUSP, tendo como objetivo a reestruturação da antiga Vila dos Ferroviários, localizada na Estação Guanabara e pertencente à Cia. Mogiana de Estradas de Ferro, em Campinas.
A Ecovila faz parte, juntamente com o CETEA – Centro de Tecnologia e Educação Ambiental –, de uma proposta de intervenção que visa a requalificação e reintegração do local à cidade, seguindo as proposições da Agenda 21 – comunidades sustentáveis ambiental, econômica e socialmente. Para tanto, pretende-se que o CETEA seja o catalisador desse processo, interagindo com a comunidade e conscientizando-a de seu papel em relação ao meio ambiente, através da educação ambiental e da vivência em uma área qualificada por uma arquitetura de baixo impacto ambiental. Os edifícios propostos, ao mesmo tempo em que contrastam com o conjunto histórico, respeitam e mantêm a sua memória.
Histórico e Situação Atual
Desde 1999, o grupo de edifícios da Estação Guanabara (Edifício Principal da Estação – Gare, a antiga Vila dos Ferroviários e o Estádio da Mogiana) está em processo de tombamento pelo CONDEPACC – Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas.
Inaugurada em 1883, a Estação da Guanabara foi um dos símbolos da economia cafeeira na região de Campinas. A estação e seu conjunto impulsionaram a estruturação do bairro Guanabara a partir da década de 1920, mas sua desativação no início da década de 1980 levou ao seu progressivo abandono, resultando, nos dias de hoje, em uma área abandonada e desarticulada do entorno.
A Vila dos Ferroviários ainda hoje abriga cerca de 60 famílias de ferroviários aposentados da Fepasa. Apesar de ainda manter alguns aspectos dos vilarejos caipiras da década de 30, apresenta-se degradada e bastante descaracterizada, pois algumas casas, originalmente de madeira, foram sendo ampliadas por meio de cômodos em alvenaria e outras foram invadidas, prejudicando todo o conjunto.
Ecovila de Papel - Projeto e Uso do Papelão na Construção Civil
A proposta para a Vila dos Ferroviários é baseada na sustentabilidade ambiental do conjunto: opção por materiais construtivos de baixo impacto ambiental, uso racional e otimizado dos recursos naturais, buscando ao máximo o emprego de fontes de energia renováveis e não poluentes e a redução de efluentes. Assim, propõe-se a coleta e a reutilização de águas pluviais para usos não-nobres, o uso de banheiros secos e o emprego de painéis fotovoltaicos instalados na cobertura de cada unidade habitacional.
A disposição das habitações no terreno forma caminhos e pátios públicos e semipúblicos, permeados por jardins produtivos e canteiros coletivos. Além disso, favorece a iluminação natural e a ventilação de cada unidade. Decks de madeira associados a escadas e rampas fazem a transição entre espaço público e privado, propiciando o acesso às unidades residenciais, já que estas são elevadas do solo não só para proteger sua estrutura de papelão da umidade, mas para adaptá-las ao relevo existente com o mínimo de alterações e permitir a ventilação entre o piso e o terreno.
Sistema Construtivo em Papelão
O sistema construtivo em papelão é utilizado na estrutura, cobertura e vedação das casas. O papel/ papelão foi escolhido por ser um material não convencional e de baixo impacto ambiental, viabilizando construções rápidas e econômicas. É leve, barato e resistente para suportar as cargas de uma construção, além de ser reciclado e reciclável e, portanto, atrativo sob o ponto de vista da sustentabilidade ambiental.
A partir da combinação entre montagem racional de elementos pré-fabricados e técnicas construtivas tradicionais, busca-se, com esse sistema, o desenvolvimento de uma habitação durável, provando que o papelão pode ser usado em caráter permanente. O uso do papelão na construção pode trazer benefícios a longo prazo, através da redução do desperdício de energia e materiais, assim como oferecer uma alternativa para reduzir os custos da construção de habitações.
O papel é um material leve e de fácil manuseio, reduzindo não só o custo com as fundações, como também o tempo de transporte e montagem de sistemas construtivos que o utilizem como principal componente. Ainda possibilita a ampliação ou reforma da edificação sem afetar sua estrutura, já que o sistema estrutural é independente das vedações e modulado, permitindo a combinação e a repetição dos elementos.Pilar, viga de alma cheia e viga-vagão são feitos de tubos de papelão. Com o uso da viga-vagão, foi possível vencer vãos maiores com diâmetros menores de tubos de papelão, dimensionados de acordo com bitolas comerciais, atualmente produzidos para a indústria têxtil.Painéis compostos por sanduíches de papelão e colméias de papel são utilizados como elementos de vedação. Nos painéis externos, é agregada, ainda, uma placa de tetrapak reciclado moído, protegendo o papelão da umidade. O mesmo material é usado na cobertura, associado ao forro de embalagens longa-vida reutilizadas, visando um melhor desempenho térmico da habitação, através da reflexão de parte da radiação solar pela camada de alumínio. O conforto térmico também é obtido pela própria composição dos painéis, já que cada 1 cm de espessura de papelão ondulado tem desempenho térmico equivalente ao de uma parede de alvenaria de 10 cm (INO, Akemi, Papelão Ondulado, Viabilidade de Utilização na Construção. São Carlos, 1984) e, sendo utilizadas 4 placas de papelão de 5 mm de espessura para os painéis, obtém-se o equivalente a 20 cm de alvenaria.A alvenaria é empregada somente no módulo hidráulico, possibilitando que as casas sejam geminadas por essa área, além de contribuir para o contraventamento da estrutura de papelão. Toda a estrutura deve ser protegida das chuvas, fogo e mudanças de temperatura através do uso de tratamentos nas camadas de papel dos tubos. Colas especiais resistentes à umidade e temperatura devem ser utilizadas no processo de fabricação dos tubos. Nesse sentido, materiais com baixo impacto ambiental devem ser pesquisados para que o papelão seja melhor utilizado na construção.É importante observar que o uso do papelão na construção civil depende da observação e análise de edifícios e protótipos existentes, para que a durabilidade das construções seja determinada. Pesquisas multidisciplinares ainda devem ser realizadas por arquitetos, engenheiros e químicos, associados à própria indústria de papelão, para que se viabilize a utilização do papelão na construção civil, aumentando a sua durabilidade e reduzindo custos e o impacto ambiental ainda causado pelos produtos químicos envolvidos no processo.