1. Considerações conceituais
Nossa proposta para o Projeto do Parque Ponte do Bilhares se baseia numa certa leitura da realidade urbana da cidade de Manaus: suas possibilidades e limitações como metrópole industrial, suas peculiaridades como um importante pólo cultural da Amazônia brasileira, sua diversidade étnica e humana, suas carências econômicas e sociais e suas relações conflituosas com a construção de uma consciência e memória históricas propriamente urbana.
De nossos entendimentos desse fenômeno urbano surgem as premissas que nortearam o projeto para este pequeno fragmento da cidade.
O território do Parque, formado por duas áreas descontínuas cortadas por importante eixo de circulação urbana e um dos maiores igarapés da cidade, já deixa claro num primeiro momento o desafio proposto pelo concurso: incorporar estes dois fragmentos ao espaço da cidade como coisa una, contínua e integrada.
Os eixos viários e suas pontes, o igarapé do Mindu, o entorno construído, a vegetação remanescente, o relevo e as clareiras são elementos pré-existentes desta paisagem que orientam as decisões projetuais, no sentido de potencializar a desejada inserção do Parque na malha urbana.
2. Plano de usos
Propomos uma reflexão sobre as possibilidades de usos para um Parque desta natureza tomando como base os parâmetros fixados pelo Termo de Referência, mas buscando agregar condições de atratividade que ampliem e fidelizem o público alvo, identidade no sentido de reforçar sua vocação temática em relação à memória dos serviços de Bonde de Manaus, sustentabilidade econômica e ambiental e complementariedade em relação a outros equipamentos congêneres na cidade.
Assim, ao plano de usos proposto pelo Edital acrescentamos uma variedade maior de atividades esportivas que se justifica pela carência de equipamentos públicos desta natureza e pela pertinência desse uso em relação aos objetivos do Parque.
Julgamos importante também a criação de usos voltados para a difusão de informações históricas referentes aos serviços de Bonde de Manaus implantados pela empresa Manaós Tramway Co. no final do séc. XIX e da própria memória da formação urbana da Cidade.
Enfim, um espaço para celebrar o direito ao lazer público, mas também o direito à Memória desta Cidade, apropriando o Bonde como elemento para lembrar também de outras estórias de sua rica História.
Portanto estruturamos nossa proposta de usos para o Parque na implantação de 3 Pólos de atividades: um Pólo Cultural, um Pólo da Memória e um Pólo Esportivo.
3. Partido urbanístico
Examinando a morfologia das áreas, as condições de acesso e circulação, os usos existentes na vizinhança (consolidados ou não), procuramos estabelecer as possibilidades de ocupação e as vocações de uso de cada uma das áreas que formam o território do Parque.
O setor A, situado a leste da avenida Constantino Nery, porção de menores dimensões, inscrito entre os dois grandes eixos viários, com sua vizinhança cercada por shoppings e lojas, sem presença vegetal relevante, entendemos como uma área vocacionada à implantação do Pólo Cultural, formado pela Arena da Cultura, o Café Belle Epòque (um bistrô Caboclo) e a Estação Djalma do Bonde, apoiados pelo estacionamento de visitantes, bicicletário, playground infantil e Mirante do Mindu.
Já o setor B, por sua maior área territorial, entorno predominantemente residencial, presença importante de massas verdes preservadas e grandes clareiras, sugeriu a implantação do Pólo Esportivo e do Pólo da Memória.
O Pólo Esportivo inclui, além das pistas de caminhada e ilhas com equipamentos para ginástica, a implantação de 6 quadras esportivas, sendo duas poliesportivas pavimentadas, três de vôlei de areia, um campo de futebol de areia para peladas com uma pequena arquibancada, o Café Malhação (um cyber café geração saúde), a Estação Flores do Bonde, apoiado por estacionamento, bicicletário, ilhas para ginástica e playground infantil.
O Pólo da Memória se localiza próximo à Ponte dos Bilhares e é formado pela Estação Bilhares do Bonde, o Largo da Memória (com Museu a céu aberto do Bonde de Manaus), a banca de Tacacá e o Coreto.
O partido urbanístico adotado parte da idéia de criar um eixo único de ligação entre os três Pólos do Parque, tratado como uma grande praça linear ao longo da qual se desdobram as circulações: pista de caminhada, ciclovia e linha do bonde - e as diversas atividades propostas. Esse grande calçadão animado pela presença das pessoas, equipado com sinalização, lixeiras para reciclagem, bancos e ciclovia tem a vantagem de concentrar a intervenção reduzindo impactos ambientais e custos de implantação e manutenção.
Dois tipos de circulação para pedestres criam os circuitos de caminhada principal com 1 km de percurso (ida e volta) e as trilhas interpretativas que partindo da Praça da Malhação percorrem os espaços mais isolados do Parque. Mirantes junto aos dois igarapés criam a oportunidade de chegar próximo a esses cursos d’água.
A indispensável continuidade de circulação entre os Pólos sugeriu a criação de uma ponte multiuso que conecta as duas margens do igarapé à altura da porção leste da ponte nova da Av. Constantino Nery. Com vão total de 25 metros e 7 metros de largura em estrutura metálica, a nova Ponte, desenhada com vigas do tipo virandel, proporciona a circulação de pedestres, do Bonde e de ciclistas, conectando o grande eixo de circulação na direção leste-oeste.
A implantação da nova ponte possibilita que o Bonde deixe de ser exclusivamente uma referência histórica para realizar plenamente sua função como equipamento urbano, transportando pessoas em direção aos pólos de atividades, aos estacionamentos, etc. O circuito do bonde tem comprimento aproximado de 500 m e conta com 3 estações, uma junto à Djalma Batista, uma segunda no espaço sob a Ponte dos Bilhares e a terceira no Pólo Esportivo em frente ao Café Malhação.
4. Arquitetura dos equipamentos do parque
A Arquitetura dos pequenos edifícios que apóiam as atividades do Parque - Cafés, Administração, Estações do Bonde, Portal de Acesso e Coreto - é conceituada a partir de três vertentes:
Em primeiro lugar nos anima a perspectiva histórica da herança de cultura Arquitetônica da Manaus Antiga, predominantemente portuguesa e inglesa, com ênfase no legado de experiências de adequação ao meio amazônico, onde o Mercado Adolpho Lisboa é sua maior manifestação.
Precisamos também reconhecer a importância das experiências realizadas pelos arquitetos na segunda metade do séc. XX, onde à luz do movimento moderno realizaram uma poética da Amazônia com exemplares importantes que em muitos momentos são referências inspiradoras das possibilidades de evolução de uma arquitetura contemporânea apropriada à cidade de Manaus.
Precisamos afirmar a possibilidade de realizar uma arquitetura pública que reúna qualidade espacial e construtiva, adequação ambiental ao meio amazônico e postura crítica em relação ao status quo da maior parte dessa produção.
Assim, estabelecemos no projeto das edificações do Parque uma linguagem que, partindo do resgate de elementos da arquitetura histórica, sem nenhum tipo de pastiche, afirma suas virtudes e pertinência na solução dos problemas de abrigo de suas atividades:
a. Portal de Entrada: formado por um grande caramanchão em estrutura metálica tubular e ripas de madeira, marcando a entrada do público pela avenida Djalma Batista com arcadas sombreadas e floridas.
b. Café Belle Epòque e Café Malhação: um telhado cerâmico estruturado em aço, que conta com um lanternim em venezianas para tiragem de ar, e um pergolado em estrutura metálica e ripas de madeira que expande sua área de utilização oferecendo sombreamento e conforto aos freqüentadores.
c. Estações do Bonde: as coberturas em estrutura metálica e telhas de barro que também contam com lanternim para tiragem de ar - cobrem as plataformas de embarque e desembarque dos passageiros.
d. Arena da Cultura: se constitui num espaço aberto para apresentações culturais, com bancos e piso de concreto, palco revestido em tijolos cerâmicos, implantado em clareira existente.
e. Coreto: um pequeno coreto junto à Praça da Memória cria as condições para pequenas atividades artísticas neste espaço que celebra o Bonde de Manaus, seguindo o partido construtivo das demais edificações.
f. Administração: tem acesso com estacionamento próprio, e abriga as dependências requeridas para a operação e administração do parque, em edificação singela que segue partido construtivo das demais edificações.
Esses equipamentos urbanisticamente se organizam ao redor de Praças temáticas que incrementam animação e identidade os espaços do Parque: Praça do Café Belle Epòque, Praça da Arena Cultural, Largo da Memória do Bonde e Praça da Malhação.
5. Paisagismo
A estratégia de tratamento paisagístico dos espaços do Parque parte do reconhecimento dos conjuntos vegetais existentes, trabalhando sua complementação com espécies arbóreas, arbustivas e gramíneas no sentido de atingir os seguintes objetivos:
a. Preservação da arborização existente, em especial a mata ciliar, e sua integração com as novas espécies a serem plantadas reforçando o caráter natural do Parque.
b. A utilização de espécies regionais adaptadas ao solo e ao clima de Manaus, promovendo assim a valorização da flora amazônica, em especial as belas palmeiras da região como o açaí, tucumã e a pupunha.
c. Pensar o Parque como local ameno e convidativo ao uso das pessoas com densa arborização ao longo dos percursos e espaços de permanência.
d. Resgatar uma iconografia dos jardins históricos através da adoção de espécies e geometria especificas, enfatizando assim o tema do Parque.
As perspectivas apresentadas procuram, nos limites de um anteprojeto, esboçar as intenções acima.
6. Programação visual e mobiliário do parque
Apresentamos em nossa proposta um estudo de viabilidade para um programa de identidade visual para o Parque Ponte dos Bilhares, que julgamos indispensável para a complementação da infraestrutura do Parque.
O tema histórico sugeriu a adoção do Bonde como elemento de referência para o Parque e a incorporação de sua imagem à uma logomarca, reforçado pela tipologia adotada para as letras, desenho dos suportes, letreiros das edificações, cores etc.
Visando organizar os elementos de mobiliário nessa delicada paisagem imaginamos reunir as demandas por lixeira, poste de iluminação, suporte para sinalização e para telefones públicos em um único objeto, que se desenvolve ao longo da praça linear como um renque de luz marcando esse eixo principal.
ficha técnica
Autor
Antonio Roberto Moita Machado
Colaboradores
Maurício Rocha Carvalho (arquiteto co-autor), Antoine Giuseppe Viera (Cadista), George B. Kiss (computação gráfica), Rodrigo Guizzi Buso (computação gráfica), Salomão Torres Monteiro (diagramação) e Glauco Francesco Luzeiro (programação visual)