Uma análise compositiva sobre o projeto vencedor do concurso realizado em 2007
A cidade de Barcelona tem como importante setor econômico o setor de prestação de serviços como o turismo, mas também o setor de informação e desenvolvimento de conhecimento. Esses dois setores atraem para a cidade de Barcelona e sua região metropolitana milhares de visitantes mensalmente. Além do forte turismo por sua arquitetura e por ser uma importante cidade litorânea, Barcelona tornou-se tradicional em exposições internacionais depois da Exposición Universal de 1888 e a Exposición Internacional de 1929. Devido a essa tradição foi criada em 1932 a Fira Internacional de Barcelona e incorporada ao governo da Catalunha no ano 2000.
Segundo Affonso Orciuoli,
“Com as baixas taxas de crescimento econômico, a solução é atrair o capital proveniente de atividades relacionadas a um setor conhecido como ‘sociedade do conhecimento’, que inclui serviços, hotelaria, comércio, universidades e empresas que se dedicam ao setor da informação. Destacam-se ainda atividades culturais, esportivas, acadêmicas, lúdicas, de turismo, congressos, feiras e suas consequentes necessidades de infraestrutura. Essa atividade, no caso da Espanha, é a principal fonte de ingresso econômico no país, superando os 50% do PIB” (1).
Devido a essa importância visível, sendo considerada a segunda cidade europeia mais tradicional por suas feiras de setores diversos e com um calendário movimentado o ano todo, Barcelona decide ampliar os pavilhões da Fira Internacional de Barcelona ocupando uma área da cidade de L’Hospitalt de Llobregat, na região metropolitana ao sul, que faz parte do Plano de Desenvolvimento Metropolitano e da criação e ampliação de novas vias de acesso ao Aeroporto Interacional de Barcelona – El Prat.
No prolongamento da Gran Via, avenida que conecta o aeroporto ao centro da cidade foi criada a praça da Europa, projetada pelo arquiteto Albert Viaplana, e o conjunto de novos pavilhões da Fira Internacional de Barcelona projetados pelo arquiteto Toyo Ito. Seguindo sua tradição de boa arquitetura, o novo distrito de desenvolvimento Gran Via não difere e conta com edifícios de arquitetos renomados como o anteriormente mencionado Toyo Ito, que além dos pavilhões da Fira cria também a Torre Realia BCN e o Hotel Porta Fira, Nicanor Garcia e Helio Piñón com a Torre Inbisa, Alonso & Balaguer com torres residenciais, Oscar Tusquets com o Edifício Copisa, Jean Nouvel com o Hotel Catalonia, um pequeno edifício do grupo RCR e não muito distante está a Cidade da Justiça, de David Chipperfield.
Como já visto em casos anteriores, a cidade de Barcelona tem como preferência a utilização de áreas degradas da cidade para a implementação de novos equipamentos públicos, geralmente utilizados em eventos internacionais de grande porte como o caso das exposições de 1888 e 1929 e as Olimpíadas de 1992. Para a criação da nova praça, a Fira e os edifícios residenciais e comerciais previstos no novo plano de desenvolvimento da grande região metropolitana de Barcelona, foi necessário o reassentamento de parte da população expropriada que vivia na área onde atualmente estão localizados os Pavilhões 5 e 7. Para o reassentamento a empresa responsável pela expropriação, Fira 2000 S.A., cria um concurso público para o projeto do novo Conjunto Habitacional que transladou 60 famílias para uma nova moradia a menos de 200 metros de distância e similar à sua anterior porém com aproximadamente 20% a mais de área construída como forma de compensar a troca forçada. O concurso para as novas moradias foi vencido pelo escritório catalão ONL Arquitectura dos arquitetos Joan Nogué, Txema Onzain e Félix López no ano de 2007.
O projeto se propõe a cumprir as exigências previstas na Modificação Pontual do PGM de repor as moradias expropriadas em novas edificações com fachada voltada para a Calle Ciencias e praça interna entre o bloco de edificações multifamiliares e os novos pavilhões da Fira.
O projeto criado em 2007 e executado entre os anos de 2008 e 2009, possui área construída de 10.613,17 m² e um custo aproximado de construção de 6.750.818 €. O terreno do projeto ocupa uma área de quase 3.000m², com dimensões aproximadas de 170m na fachada voltada para a Calle Ciencias e 16,50m na fachada oeste e menor, voltada para a esquina da Fira Internacional de Barcelona.
Quanto à sua implantação, o projeto proposto pelo escritório catalão alinha a edificação no limite da Calle Ciencias com o objetivo de criar maior área de comércio na base da edificação. A base comercial tem como característica física e visual um bloco sólido com cores escuras para uma maior sensação de robustez. O alinhamento e a solidez da base auxiliam no isolamento físico e acústico do pátio interno solicitado do conjunto habitacional. Sob essa base comercial encontramos estacionamento para os moradores e sobre ela cinco torres residenciais, distantes 3 metros uma da outra, criando assim um ritmo nas fachadas. As torres possuem 4 pavimentos cada, seguindo a volumetria de maior parte dos edifícios residenciais da cidade de L’Hospitalet de Llobregat. Esse respeito à volumetria e às alturas faz parte das intenções dos arquitetos de mostrar a nova cara e o futuro da cidade porém considerando o entorno, como é visto na cidade vizinha.
Das 5 torres, 4 delas são similares com dimensões de 28m na fachada norte e 13 metros na fachada, e a torre localizada na esquina oeste possui 44 metros de fachada para a Calle Ciencias pelos mesmo 13 metros das demais. As 5 torres são conectadas pela base porém independentes entre si e, apesar dessa independência, possuem planta similar e são acessadas individualmente por escadaria localizada na fachada voltada para a Calle Ciencias e elevador localizado no meio do edifício. Cada uma das 5 torres possui 3 unidades habitacionais, diferentes entre si atendendo às necessidades de todas as famílias reassentadas. Na implantação das unidades habitacionais foi considerada a localização das áreas de uso diário e comum, sendo elas voltadas para o interior do terreno onde está localizada a praça interna, e as áreas de uso noturno e individualizado voltadas para o exterior na fachada principal da edificação. A intenção projetual era de localizar as cozinhas e as áreas de estar na fachada sul e os dormitórios na fachada norte. Essa diferenciação de usos é percebida nas fachadas, mais leve e aberta na face interior do edifício e mais maciça e pesada na face voltada à rua.
A planta do pavimento tipo com área de 364m², em formato retangular é tradicional, compatível com as habitações contemporâneas e é composta por circulação vertical, escada e elevador, e horizontal, corredores de dimensões mínimas necessárias para a população na parte central, que dá acesso à 3 unidades de habitação.
As unidades de habitação possuem as características similares às plantas de habitações contemporâneas com a sala de estar e jantar dividindo o mesmo ambiente, cozinha integrada as salas e sem área para refeições, lavanderia composta por somente máquina de lavar roupas e o tanque, localizada dentro de um armário não sendo considerada um cômodo. As plantas diferem-se basicamente pela quantidade dormitórios e pela disposição na planta tipo. Sendo essas diferenças:
Planta 01: é composta em sua área íntima por uma suíte, dois dormitórios, um banheiro auxiliar. Os dormitórios, áreas de uso noturno, voltados para a rua com pequenas aberturas em fitas verticais. As salas, áreas de uso diurno e diário, voltados para a praça interna, com grandes aberturas conectadas a uma sacada que se estende por toda a extensão do apartamento. A cozinha permanece sem aberturas para o exterior, conectando-se apenas com o hall e a sala de jantar.
Planta 02: é composta em sua área íntima por dois dormitórios e um banheiro auxiliar. Área social de menor tamanho que as outras unidades de habitação. A planta 02 é a que mais se difere das outras duas que compõe a planta tipo por possuir fachada voltada para a rua, sendo as aberturas dos dormitórios e das salas de estar e jantar voltadas para o pátio interno. As salas de estar e jantar conectam-se com a sacada que se estende ao logo da planta.
Planta 03: é composta em sua área íntima por uma suíte, três dormitórios e um banheiro auxiliar. Os dormitórios, voltados para a rua com pequenas aberturas em fitas verticais. As salas, voltados para a praça interna, com grandes aberturas conectadas a uma sacada que se estende por toda a extensão do apartamento. A cozinha possui abertura em fita, voltada para o pátio interno e somente o banheiro auxiliar não possui ventilação externa.
A fachada é condizente com as plantas que compõe o edifício e com as intenções plásticas dos arquitetos. A fachada sul, voltada para o pátio interno e onde estão as sacadas e as aberturas das áreas de uso diurno, possuem um fechamento leve de brises metálicos que se modificam e adaptam conforme as necessidades de cada morador ao longo do dia e de cada estação do ano. A fachada norte, por ser voltada para a rua de tráfego intenso, é sólida, com pequenas aberturas verticais, a cor forte (amarela) torna a fachada menos sóbria destacando-se da base escura e maciça. Essa diferença de tratamentos nas fachadas não se dá somente pelas soluções construtivas e pela disposição dos ambientes internamente, a solução é também uma diferenciação das faces do edifício frente aos seus dois observadores. A fachada externa e fechada possui um ar sólido e seguro, quase impenetrável e que condiz com a região comercial em que está inserida, já a fachada interna possui um caráter doméstico e amável, com os brises, as grandes aberturas, a variedade de cores e a ocupação dos moradores tornando mais agradável a vista para os seus moradores que utilizam o pátio interno.
Um design sem grandes extravagâncias, geometrias simples e puras que acompanham a linha do terreno e que segue às exigências do concurso, se torna um bom exemplo de reassentamento de moradias em um Conjunto Habitacional. O escritório ONL Arquitectura busca soluções simples e inteligentes que sigam a filosofia do escritório de unir em equilíbrio a forma, a função e a tecnologia adaptando as novas moradias ao novo terreno e criando a arquitetura da nova cidade.
notas
NA/NE – Agradecemos a Marc Torrellas, do escritório de arquitetura ONL, pelo envio da documentação do projeto e autorização para publicá-lo.
1
ORCIUOLI, Affonso. Cidade em construção: Barcelona e a eterna construção de novos centros. AU – Arquitetura e Urbanismo, São Paulo, n. 236, nov. 2013 <http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/236/artigo301126-2.aspx>.
websites consultados
http://www.barcelona-tourist-guide.com/en/business/fira-barcelona-gran-via-barcelona.html
http://www.firabarcelona.com/gran-via
http://concursosdeprojeto.org/2012/12/23/conjuntohabitacional-barcelona/
http://www.recity.com.br/project-620-onl-arquitectura-conjunto-habitacional-barcelona
http://elpais.com/diario/2007/04/11/catalunya/1176253655_850215.html
ficha técnica do projeto
projeto
Conjunto Habitacional Fira de Barcelona – L’Hospitalet de Llobregat
local
Barcelona, Espanha
autores
Arquitetos Joan Nogué, Txema Onzain, Felix Lopez / ONL Arquitectura
colaboradores
Arquitetos Topo Abe, Cristina Ribera, Marina Berbel, Silvia Ocaña, Massimo Pietrobon, Cèlia Monfort e Arquiteto Técnico Joan Puig
datas
Projeto: 2007
Construção: 2008-2009
área
10.613,17 m²
construção
Construtor: Fira 2000 SA
Instalações: Font i Armengol AS
Estrutura: BIS Arquitectes
Orçamento: 6.750.818 Euros
sobre a autora
Mariana Pedrollo Bez é arquiteta (UniRitter, 2009) e mestranda em Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em projeto como investigação e cidade, pela UniRitter / Mackenzie. Possui máster em Desenvolvimento Urbano e Territorial pela UPC – Universidade Politécnica da Catalunha.