A fotografia faz parte de nossa civilização, na arte contemporânea ela tem um lugar de destaque, no dia a dia da cidade ela está em todos os cantos, há um fascínio em registrar tudo que se vê. Na rua, no trabalho, no bar, no restaurante, no aniversário, na praia, no museu, profissionais ou amadoras, elas fazem a festa.
As câmaras fotográficas invadem até privacidades, chegam a incomodar, principalmente celebridades. Mas a câmara de Jamison Pedra é discreta e intencional, tem um objetivo claro, documentar a solidão anônima no cotidiano das cidades e construir uma poética da luz e espaço.
“Ao invés de apenas registrar a realidade, as fotografias se tornaram o modelo de como as coisas se apresentam para nós, mudando assim a própria idéia de realidade e realismo” (Susan Sontag). As cidades de Jamison são realidades inventadas a partir daquelas outras observadas e vividas pelo artista.
A fotografia é também ficção e fantasia, uma invenção de um olhar particular, o do fotógrafo, ou melhor, do arquiteto pintor que vive entre duas realidades: a solidão do atelier que não tem nem mais a visita esporádica do modelo, dispensada pela pintura moderna, e a multidão das cidades formada por pessoas solitárias e indiferentes. Portanto, ninguém melhor do que o artista para perceber a solidão cotidiana que passa despercebida, como um destino reservado às pessoas que vivem nas cidades. O fotógrafo arquiteto torna visíveis instantes inesperados da paisagem urbana, em preto e branco, num jogo mágico de luz e sombra, congela um tempo que não mais existe. Por isto mesmo, das fotografias de “Tributo ao Cotidiano”, exalam um perfume cinza de nostalgia das coisas que se foram.
O cenário da foto é um paralelo do real. Esse fotógrafo é um voyeur solitário de cidades, que, sem fazer barulho, sem flash, rouba a cena insignificante e a enriquece nos detalhes do enquadramento, nos cortes, no controle da luz, nas variações de cinzas e no acabamento final do laboratório. Olhar é um ato de um sonhador solitário que interroga a realidade e descobre no estado de solidão uma poesia e a vantagem de não ser solicitado ou interrogado.
nota
Publicação original: ALMANDRADE. Voyeur e intérprete da solidão. A Tarde, Salvador, 26 jan. 2011. A publicação em Vitruvius, autorizada pelo autor, aconteceu em janeiro de 2011, em procedimento de acerto da periodicidade da revista "Resenhas Online".
sobre o autor
Antônio Luiz M. de Andrade (Almandrade) é artista plástico, poeta e arquiteto.