Chegamos à bela capital da Andaluzia cortada pelo rio Guadalquivir no meio da tarde e nos hospedamos no Pateo de la Alameda, um hotel bem agradável, tipicamente espanhol, com pátios, ladrilhos, gradis de ferro fundido, vasos floridos nos peitoris e muitas, muitas plantas. Foi nosso segundo hotel preferido. O primeiro, o de Porto, claro! Enfim, depois de nos acomodarmos, saímos para comer e passear.
Tapas, viños, sangrias e postres, aqui vamos nós.... Tudo muito bom! A cidade é arejada, ampla, arborizada e o que me impressionou, além da quantidade, da qualidade e da limpeza de largos e praças, foi o piso das calçadas e das vias do Centro Histórico – ladrilhos regulares, sem grandes desníveis entre calçadas e ruas, formando um todo harmonioso e onde se percebia um acordo tácito de respeito entre todos os que frequentavam aqueles espaços – dúzias de ciclistas, pedestres, carrinhos de bebês, idosos com ou sem bengalas, turistas distraídos com suas máquinas fotográficas em punho, carros, bondes.... A velocidade? 50 quilômetros por hora, fora do Centro Histórico. No Centro Histórico, nas chamadas áreas pacificadas, a velocidade chegava a 30km/h e as faixas de pedestres eram totalmente respeitadas. E o que mais nos surpreendeu: ninguém reclamava, ninguém parecia ter pressa, todos transitavam sem estresse, sem buzinas, sem agressividade! Um banho de civilidade! Aliás, também já me referi a isso ao falar de Portugal, o respeito aos pedestres e aos turistas é admirável.
Nosso roteiro sempre procurou aproveitar o máximo do incomparável legado cultural e arquitetônico dos lugares que visitamos. Na nossa primeira tarde em Sevilha, o lugar mais próximo da nossa lista era a Plaza de la Encarnación, revitalizada em 2011. A fantástica obra do arquiteto alemão Jurgen Mayer (1965), o Parasol-Metropol, mais conhecida como as Setas de Sevilha, é uma estrutura de ferro e madeira que se percorre do subsolo (museu arqueológico, lojinha e entrada para o elevador), até o quarto andar, de onde saem as rampas para o último andar, o mirante, a 30 metros do chão. Como Sevilha é plana, lá do alto, tem-se uma vista de 360 graus da cidade...
Ao longe, destacavam-se a torre vermelha do Centro Cultural de Sevilha, o mais novo arranha-céu da cidade e cuja construção foi polêmica, a cúpula da grande catedral ao lado da Giralda, a torre-minarete que domina a paisagem local, e a Ponte Alamillo, outra obra de Santiago Calatrava, também para a Exposição Universal de 1992...
À note, tapas e sangria, claro! Na Espanha, as tapas são essenciais na culinária, sobretudo na Andaluzia, mas mais do que isso: são formas de se relacionar. Lá tapear é um ritual social a ser cumprido. E as chamadas terrazas, as mesinhas nas calçadas, inundam a cidade. Além das tapas, o flamenco é outra marca registrada e tradição em Sevilha, mas também ficamos sem assistir a uma apresentação. Vai para lista, junto com o bairro Triana. A lista da próxima viagem já está ficando bem grande...
Segundo dia em Sevilha – através da minha filhota, descobrimos a existência das fantásticas e democráticas “free walking tours”: passeios a pé pelo Centro Histórico com guias educados, animados e muito bem preparados, com informações corretas e extensas... Os passeios são oferecidos em vários idiomas. Ficamos com o guia em espanhol. Aliás, fica a dica. Os grupos com guias que falam espanhol são bem menores; nosso grupo, por exemplo, tinha sete pessoas, fora Rocio, nossa simpática guia, enquanto o grupo com guia que falava em inglês tinha 22 pessoas. Várias agências oferecem os passeios. Nós escolhemos o grupo da Pancho Tours, identificado com a cor laranja, nas camisetas e no infalível guarda-chuva. Ah, sim! A inscrição deve ser feita pela internet e com antecedência.
Demos um passeio excelente pela capital da Andaluzia, de quase três horas, vimos e ouvimos falar da história da cidade, de seus povos, dos principais monumentos, arte e estilos. O passeio começava atrás da Catedral, percorria o Centro Histórico, passando pelo Arquivo das Índias, com um riquíssimo acervo de documentos; pela torre do Ouro, construção de 1220, cujo tom dourado, provavelmente, derivava da areia da região...
Prosseguia pela antiga fábrica de tabaco (que inspirou a ópera Carmem), onde hoje funciona a sede e alguns cursos da Universidade de Sevilha; por belos jardins e parques, como o lindíssimo Parque Maria Luíza e...
Culminou com a magnífica Praça de Espanha, idealizada pelo arquiteto Aníbal Gonzalez, com direito à estátua na rua lateral que dá acesso à praça. A sede da Expo Ibero-americana de 1929 marcou o final apoteótico de nosso passeio!
Depois de um almoço leve, já no meio da tarde, rumamos para a Igreja Santa Maria de la Sede de Sevilha, cuja construção como mesquita e seu minarete ocorreu entre 1184-1198. Toda construída em tijolos, após a reconquista espanhola, a mesquita foi consagrada como catedral (1248) e, com o correr dos séculos, foram feitos trabalhos e ornamentações em variados estilos: no século 15, a partir de 1434, a parte gótica; no século 16, trabalhos renascentistas, como os corpos superiores da torre que constituem o atual campanário; nos séculos 17 e 18, as obras barrocas; no século 18 e no início do 19, as últimas obras significativas da catedral, como o término dos três maiores pórticos. Declarada Patrimônio Mundial pela Unesco, em 1987, a catedral abriga os restos mortais de Cristóvão Colombo e de vários reis espanhóis.
Naquele horário, 50 minutos antes do encerramento das visitas, já quase não havia filas. Entramos e percorremos o edifício, boquiabertos com o espaço, a decoração do altar principal, as capelas, as obras de arte, as esculturas, os detalhes, a imponência... e também, convenhamos, em função do curto tempo que nos restava para a visita. Foi rápido, mas proveitoso. No final, os 34 andares da torre-minarete, La Giralda, que chega a 96 metros de altura. De novo, as deslumbrantes vistas de 360 graus a partir do topo e o Pátio das Laranjeiras, lá embaixo, junto à saída... Mas o mais interessante da subida na torre é que não há escadas e, sim, rampas! Meus joelhos agradeceram muitíssimo! Portanto, não desanimem. Vale a pena subir até lá...
Dia seguinte, só tínhamos tempo para visitar o Real Alcazar de Sevilha, inacreditável complexo de fortaleza e edifícios de diferentes épocas, jardins e pátios, já que nosso voo de volta estava marcado para aquela noite. Chegamos meia hora antes da abertura dos portões e a fila já era grande, mas ficamos firmes e, depois de uma hora, entramos.
A fortificação de mais de mil anos teve origem em um assentamento romano, a antiga Hispalis romana, depois começou a ser construído na Idade Média, acolheu o califado de Córdoba e, a partir daí, com o desenrolar da história de conquistas e reconquistas, foi remodelado, alterado e expandido incorporando, portanto, arte islâmica, mudéjar (mão de obra muçulmana sob direção cristã), elementos românicos, góticos, renascentistas, maneiristas e barrocos.
Espaços inacreditáveis: pisos, pedras, mármores, cores, azulejos, arcos, fontes baixas, laranjeiras, uma infinidade de plantas, os mais antigos jardins da cidade e em diferentes estilos.... Até hoje os reis espanhóis se hospedam lá, quando em Sevilha. Valeu a espera para ver de perto esse Patrimônio Mundial, desde 1987!
Finalmente, após a visita, comemos nossa última refeição, no El Badulaque, um restaurante muito simpático perto do hotel. Merluza com legumes, salada e sangria para nos despedirmos da Espanha. Sevilha me encantou! Tim-Tim! Depois, era esperar o horário de ir para o aeroporto, agradecer e fazer a longa viagem de volta pela diferença de cinco horas com o Brasil. No dia seguinte, chegamos bem, graças aos lugares premium que a gentil Priscila da Atlantis turismo nos conseguiu, com o corpo um pouco cansado da maratona, o coração muito feliz e a mente cheia de informações a serem processadas. Agora, é tempo de descansar, trabalhar muito e preparar a próxima!
notas
NA – Diversas das informações foram pesquisadas em websites especializados em turismo:
https://www.cultuga.com.br
https://www.oportoencanta.com
https://viajenaviagem.com.br
https://dicasdeportugal.com.br
https://manualdoturista.com.br/arquitetura-portuguesa
http://www.monumentos.gov.pt
NE – Quarto e último artigo da série da série “Na península ibérica”. Os artigos publicados são os seguintes:
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Porto e arredores (parte 1). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 140.07, Vitruvius, nov. 2018 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/12.140/7176>.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Aveiro, Coimbra e a rota dos mosteiros (parte 2). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 141.03, Vitruvius, dez. 2019 <http://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/12.141/7201>.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Lisboa e Sintra (parte 3). Arquiteturismo, São Paulo, ano 12, n. 142.01, Vitruvius, jan. 2019 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/12.142/7221>.
DI MARCO, Anita. Na península ibérica. Sevilha (parte 4). Arquiteturismo, São Paulo, ano 13, n. 144.01, Vitruvius, mar. 2019 <www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/13.144/7281>.
sobre a autora
Anita Di Marco é arquiteta e tradutora.