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architectourism ISSN 1982-9930

Bairro do Pacaembu ao anoitecer. Foto Abilio Guerra

abstracts

português
A sequência de fotografias mostra elementos da morfologia urbana da hoje cidade de Diamantina, Patrimônio Mundial da Unesco, que se desenvolveu no século 18, no Vale do Rio Jequitinhonha, a partir da exploração do ouro e dos diamantes.

english
The sequence of photographs shows elements of the urban morphology from today the city of Diamantina, Unesco World Heritage, which developed in the 18th century, in the Vale do Rio Jequitinhonha from the exploration of gold and diamonds.

español
La secuencia de fotografías muestra elementos de la morfología urbana de hoy ciudad de Diamantina, Patrimonio de la Humanidad por la Unesco, que se desarrolló en el siglo 18, en el valle del río Jequitinhonha, de la exploración de oro y diamantes.


how to quote

MORONI FILHO, Elio. Diamantina: ensaio visual comentado. Arquiteturismo, São Paulo, ano 16, n. 180.02, Vitruvius, mar. 2022 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/16.180/8492>.


A sequência de fotografias documentais mostra elementos remanescentes da morfologia urbana dos séculos 18 e 19, do antigo Arraial do Tejuco, hoje cidade de Diamantina e Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura — Unesco, que se desenvolveu no século 18, na Cordilheira do Espinhaço, cercada pela Serra dos Cristais, no Vale do Rio Jequitinhonha, a partir da exploração do ouro e, principalmente, dos diamantes.

Priorizaram-se, na escala da rua, que corresponde ao espaço abrangido pelo campo de visão do autor, elementos morfológicos que singularizam o espaço urbano de Diamantina e, simultaneamente, aproximam-na de outras cidades das Minas setecentistas e do Brasil colonial: solo/pavimento, edifício, lote, fachada, logradouro, rua, monumento, vegetação e mobiliário urbano. A totalidade do ambiente não possui fronteiras rígidas, de modo que uma imagem pode documentar mais de um elemento morfológico: monumento, que é o tema principal da imagem, mas também solo/pavimento, vegetação e fachada.

Neste ensaio, os registros visuais são acompanhados de textos explicativos, que se assemelham à verbetes, tornando a leitura mais fluida para todos os tipos de leitores. Contudo, leitores especializados poderão encontrar, ao final deste ensaio, as referências dos autores consultados na elaboração dos textos (1). Não se pretende esgotar o tema, mas antes despertar o interesse do leitor pelo patrimônio cultural do interior do Brasil, especificamente, as cidades do século 18, em Minas Gerais. Parte das imagens integra, desde setembro de 2021, a exposição virtual permanente Relíquias da Serra dos Cristais, hospedada no site do Museu do Cerrado.

Foto 1 – A serra

A paisagem rochosa e árida da Serra dos Cristais, que emoldura a cidade de Diamantina, é parte da Cordilheira do Espinhaço, cadeia montanhosa que corta de Norte a Sul Bahia e Minas Gerais, em linha quase reta. Foi a partir da geologia e da topografia da Serra dos Cristais que se construiu a cidade de Diamantina.

Foto 2 – A serra e a cidade

A Serra dos Cristais e o casario de influência portuguesa (lotes de larguras diferentes; geminação; porta única de abertura para a rua) formam a composição indissociável de cultura e natureza que caracteriza o conjunto paisagístico de Diamantina, tendo sido decisiva para a inclusão do sítio na lista de Patrimônio Mundial da Unesco.

Foto 3 – Beco no centro histórico

O território preexistente — a Serra dos Cristais — determinou a forma da cidade: a conformação estreita e tortuosa desse beco é típica do centro histórico de Diamantina, que sobe cento e cinquenta metros pela encosta da serra, com ruas sinuosas e irregulares seguindo a topografia natural. Esse aspecto da morfologia urbana foi notado pelos viajantes naturalistas, no século 19. O botânico escocês George Gardner, que visitou o Brasil entre 1836 e 1841, refere-se a Diamantina como um aglomerado de grandes casas caiadas de branco, entremeadas de inúmeras igrejas, que se elevam gradualmente umas acima das outras nas íngremes encostas da serra.

Foto 4 – Pavimento em pedra

A pavimentação em pedras cinzentas também é parte do espaço urbano de Diamantina, contrastando com as paredes brancas e as esquadrias de cores fortes dos edifícios. Esse calçamento, constituído de lajes de formato irregular com a face aparente trabalhada, foi assentado no século 20, sendo elemento morfológico estranho ao Tejuco dos séculos 18 e 19. O lajeado cinzento substituiu o calçamento em pé de moleque, também denominado calçada portuguesa ou seixo rolado, técnica que consiste no assentamento sobre barro, de pedras redondas de rio, formando mosaicos à feição mourisca, conforme definição de Sylvio de Vasconcellos. A composição geométrica do extinto pavimento em pé de moleque pode ser vista nos registros de Erich Joachim Hess, primeiro fotógrafo contratado pelo então Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional — Sphan, que fotografou Diamantina, em 1938. A cidade de Tiradentes também trocou, no século 20, o calçamento em pé de moleque pelo lajeado, havendo resquícios do pavimento de seixo rolado em alguns becos e nos meios-fios de algumas ruas. Em Mariana, parte do núcleo histórico mantém o calçamento em pé de moleque, como a praça Minas Gerais, a rua Barão de Camargos e a rua das Mercês, não existindo, contudo, pedras dispostas em motivos geométricos.

Foto 5 – O sobrado e a portada

A ladeira suave, onde está situado o sobrado de Chica da Silva e a portada da extinta capela doméstica de Santa Quitéria, revela outro aspecto de Diamantina: edificações alinhadas, com um ou dois pavimentos, pintadas de cores vivas sobre fundo branco. A sequência contínua de casas térreas e sobrados (padrão das cidades coloniais brasileiras) é comum a outras cidades mineiras setecentistas, a exemplo do casario na rua Sinval Lins (rua do Gambá), em Serro Frio, e do casario na rua do Carmo, em São João del-Rei.

Foto 6 – Igreja de Nossa Senhora do Amparo 

A estrutura contínua de casas homogêneas termina na Igreja de Nossa Senhora do Amparo (1756), que possui torre única centralizada e tendência à verticalização. A integração da igreja ao casario diferencia Diamantina de outras cidades mineiras, onde as igrejas estão isoladas das casas e ocupam lugares de destaque na paisagem urbana, como a Igreja de São Francisco de Assis (1762) e da Igreja de Nossa Senhora do Carmo (1784), implantadas na praça Minas Gerais (Mariana), incluindo templos modestos, como a Capela de Santana (século 18), também em Mariana, construída numa elevação, isolada por muros e destacada do casario.

Foto 7 – Fachadas

Os edifícios ocupam inteiramente as testadas dos lotes, dispondo apenas das fachadas para a comunicação com o espaço urbano. As fachadas são os elementos de transição entre a vida coletiva do espaço urbano e a vida privada das edificações. Esses invólucros visíveis da massa construída, que moldam a imagem de Diamantina, obedecem ao equilíbrio de cheios e vãos, à simetria — a cada porta, no pavimento inferior, corresponde uma janela, no pavimento superior — e à repetição de elementos estruturais e decorativos em portas, janelas e sacadas, expressando imobilidade, agregação e rigidez formal. O esforço estético está concentrado no segundo pavimento, destacando-se janelas rasgadas de vergas retas vedadas por folhas duplas de pinázios. Em contraste com as linhas retas do edifício, círculos e semicírculos são as formas geométricas dominantes das bandeiras envidraçadas. As bases das sacadas são de madeira e os gradis, de ferro fundido em arabescos. Pinhas coloridas de vidro enfeitam as sacadas. A homogeneidade do conjunto é favorecida pelo emprego das mesmas cores e materiais construtivos; azul, branco e amarelo predominam no colorido sóbrio da praça reproduzido sistematicamente na cidade. Em Diamantina, a coesão do conjunto arquitetônico alcança até mesmo os logradouros privados, como o pátio do sobrado de Chica da Silva, com fundo branco dominante combinado com elementos estruturais e decorativos de madeira geométricos, em cores fortes.

Foto 8 – Arcos abatidos

O arco sobrebaixado — também denominado arco abatido, erradamente — é especialmente empregado para aliviar cargas verticais sobre vergas de cantaria ou qualquer outro material, servindo de auxílio a outro arco incapaz de suportar a alvenaria que fica por cima. O arco sobrebaixado foi extensamente utilizado nas fachadas coloniais brasileiras, mantendo-se como opção estética, em vez de ressalva sobre vergas que os construtores queriam preservar de rupturas. Na praça Conselheiro Matta, a antiga Casa da Intendência dos Diamantes e a agência bancária destacam-se pelos arcos sobrebaixados das janelas e portas pintadas de ocre, amarelo e azul.

Foto 9 – Muxarabi

Pavimento superior da Biblioteca Antônio Torres, que possui o único muxarabi inteiro remanescente do Brasil Colônia, tipo de balcão de origem luso-islâmica inteiramente vedado em treliças de madeira. O professor Estêvão Pinto afirma que o muxarabi está ligado à ideia de proteção, preservando da vista de estranhos os moradores da casa. Esse elemento arquitetônico também se relaciona com a ideia de higiene e bem-estar: as treliças filtram a luz e recebem a ventilação da rua, produzindo sombra fresca e arejamento natural. Além disso, o muxarabi desperta a ideia de zelo ou ciúme, pois o quadriculado apertado permitia que a dona da casa pudesse ver a rua e não ser vista por ninguém, sendo artefato de uma cultura em que a mulher não aparecia aos estranhos. Nas cidades coloniais brasileiras, o uso generalizado de adufas e muxarabis teria também conexão com o costume de influência ameríndia, destacado por Gilberto Freyre, de não aparecerem as mulheres e as crianças aos estranhos? Há, no final da rua Bartolomeu Bueno, numa casa onde se supõe ter vivido Bartolomeu Bueno da Silva, em Goiás Velho, um muxarabi inteiro pintado de azul e amarelo. Trata-se, entretanto, de um objeto do século 20.

Foto 10 – Painel de treliças

O painel de treliças do sobrado de Chica da Silva, composto de balaústres, na parte superior, painéis almofadados e de treliças, na parte inferior, e rótulas que se abrem para fora, acima do parapeito, também documenta a influência islâmica na arquitetura luso-brasileira. Esse painel de treliças é, porém, diferente do muxarabi da Biblioteca Antônio Torres, mostrando a existência simultânea da varanda e do muxarabi, numa época em que este já perdia a função de esconder de estranhos as mulheres. Com efeito, o quadriculado afrouxado permite a visão da varanda e, consequentemente, dos moradores da casa, sendo, talvez, expressão arquitetônica de uma mudança nos costumes: em 1817, o viajante naturalista Auguste de Saint-Hilaire visitou o Arraial do Tejuco, relatando que a esposa e as filhas de seu anfitrião não se escondiam nunca e, adotando hábitos europeus, admitiam o convívio dos homens.

Foto 11 – Friso ornamentado

O faiscado da arquitrave e as cornucópias de flores do friso documentam uma singularidade da arquitetura de Diamantina: a ornamentação exterior das casas em pinturas de cores vivas e motivos variados, favorecida pelo emprego da madeira em elementos estruturais e decorativos, que permite aplicação de pintura. O pintor, desenhista e historiador José Wasth Rodrigues registrou, em seu documentário arquitetônico, diversos beirais pintados em Diamantina, observando, contudo, o desaparecimento dessa ornamentação outrora de uso generalizado na cidade.

Foto 12 – Parede de telhas canal

Detalhe de parede revestida de telhas canal para a proteção da fachada da água da chuva. Essa solução pode ser encontrada em outros Estados do país, como na fachada lateral da sede do Museu Republicano Convenção de Itu, no centro histórico de Itu SP. O professor e arquiteto Günter Weimer, que considera essa técnica criação nacional, observou a mesma solução, na fachada lateral exposta de um sobrado revestido de telhas canal, construído ao lado de uma casa térrea, na rua Direita de Santo Antônio, em Salvador, Bahia. Essa solução técnica custava mais barato do que o revestimento de azulejos, atingindo o objetivo de proteger da umidade paredes de adobe, taipa de pilão e pau a pique, em edificações em declive ou sobrados adjacentes às casas térreas, a exemplo do sobrado do Museu Republicano de Itu, construído em taipa de pilão ao lado de uma casa térrea.

Foto 13 – Telhado oriental

Em 1796, Francisca da Silva de Oliveira (Chica da Silva) foi sepultada na Igreja de São Francisco de Assis (1762). O telhado em forma de pagode — um chinesismo da arquitetura colonial brasileira — é herança da presença de Portugal no Extremo Oriente, sendo comum na arquitetura religiosa setecentista mineira, principalmente, nas igrejas da primeira metade do século 18, como a Catedral Basílica de Nossa Senhora da Assunção (Mariana, 1714), a Capela de Nossa Senhora do Ó (Sabará, 1717) e a Igreja Matriz de Santo Amaro (Distrito de Brumal, Santa Bárbara, 1727). No século 19, o pintor Jean Baptiste Debret registrou edifícios residenciais com telhados em forma de pagode, no Rio de Janeiro. O autor deste ensaio observou a sobrevivência desse chinesismo na arquitetura popular de Montes Claros, na mesorregião do Norte de Minas, em telhados com beiradas arrebitadas de casas construídas no século 20.

Foto 14 – Arquitetura manuelina

A Igreja do Senhor do Bonfim (ca. 1771) apresenta características do partido de composição das igrejas mineiras mais antigas: fachada sem profundidade, com linhas retas, porta única, poucas aberturas superiores e desequilíbrio entre cheios e vãos. A planta de nave única e capela-mor retangular deriva das capelas do Norte de Portugal, assim como a sacristia, que toma seu lugar ao lado da capela-mor, projetando-se do bloco principal do edifício, à direita ou à esquerda. A fachada principal dessas capelas compõe-se de três pequenas janelas colocadas acima da porta estreita única, sistema derivado da arquitetura manuelina, mas desenvolvido e usado extensivamente nas capitanias do Norte do Brasil, tendo sido levado para as Minas por construtores baianos.

Foto 15 – Torre única lateral

Integrada à paisagem rochosa da Serra dos Cristais, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário (1731) possui torre única lateral, diferenciando as igrejas do Arraial do Tejuco das igrejas de outras cidades coloniais mineiras, como a Igreja de Nossa Senhora do Rosário (Distrito de Santa Rita Durão, Mariana, século 18), a Igreja de Nossa Senhora das Mercês (Sabará, século 18) e a Igreja de Santa Efigênia do Alto da Cruz (Ouro Preto, 1773), que possuem duas torres laterais. Em Diamantina, nenhuma igreja setecentista possui duas torres, à exceção da Basílica do Sagrado Coração de Jesus, construída no final do século 19, e da atual Catedral de Santo Antônio, que é um edifício da primeira metade do século 20.

Foto 16 – Frontão em madeira

Frontão em madeira da Igreja de Nossa Senhora do Rosário, “endemismo” que distingue as igrejas de Diamantina das igrejas de outras cidades coloniais mineiras, que utilizam cantaria nos frontispícios. Tome-se, como exemplo, a frontaria cilíndrica da Igreja de Nossa Senhora do Rosário (Ouro Preto, século 18), que emprega a pedra nos três arcos do primeiro pavimento e nas três portas sacadas do segundo pavimento, assim como nas pilastras, no entablamento, no frontão trilobado e nos pináculos que ornamentam o frontispício.

Foto 17 – Capela doméstica

A capela doméstica de Chica da Silva, sob invocação de Santa Quitéria — devoção da família do contratador João Fernandes de Oliveira –, é vestígio da casa-grande colonial brasileira. A capela foi demolida, em data desconhecida. Em 1951, a porta de acesso e o frontão triangular recoberto de telhas e arrematado por cruz latina foram reconstruídos, no pátio do sobrado. Pouco se sabe do partido de composição da Capela de Santa Quitéria. Adentrando o terreno das hipóteses, a fachada sugere um edifício de gabarito menor do que o do sobrado, semelhante às capelas do Senhor Bom Jesus dos Passos, como as que existem em Mariana e Tiradentes, de volume único e planta retangular que abriga um altar. A porta, que se abre para a rua, denota uma capela independente, que podia ser frequentada pelos habitantes do arraial, em eventos religiosos de dimensão social, como os casamentos de duas filhas de Chica da Silva, que foram realizados na Capela de Santa Quitéria, conforme a historiadora Júnia Ferreira Furtado. O exercício individual e intimista da fé era garantido pela presença de uma porta lateral de acesso ao pátio da residência.

Foto 18 – Amplitude dos espaços públicos

Ruas estreitas se abrem para espaços públicos amplos, como a praça Barão de Guaicuí e o Mercado Velho, construído em 1889, que substituiu antigo rancho de tropeiros destinado ao armazenamento e comercialização de mercadorias. As montarias dos tropeiros eram amarradas nos esteios de madeira espalhados na praça. No núcleo histórico, a praça Barão de Guaicuí, a praça Dom Joaquim, onde se localiza a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, a praça Conselheiro Matta (casa da Intendência dos Diamantes), a praça Lobo de Mesquita (casa de Chica da Silva) e a praça Juscelino Kubitschek (fórum de Diamantina) eram vazios, alargamentos e pontos de confluência das ruas do Arraial do Tejuco, a exemplo da praça Juscelino Kubitschek, localizada no ponto de convergência de sete ruas originadas no século 18. Esses espaços acidentais, que Saint-Hilaire chamou de encruzilhadas, foram apropriados pela população e pela municipalidade, tendo recebido, no decorrer de sua existência, pavimentação, mobiliário e vegetação. No entanto, eles não podem ser assimilados ao conceito de praça, pois não nasceram como espaços públicos — formas arquitetônicas abertas — intencionalmente criados para o encontro e as manifestações da vida urbana.

Foto 19 – Um chafariz e duas carrancas

A pedra cinzenta da serra foi utilizada na construção desse chafariz público, que se distingue pelas duas carrancas de traços negroides. Desprovido de sua função primitiva, o chafariz da praça Dom Joaquim é uma recordação do antigo sistema de abastecimento de água do Arraial do Tejuco. Parece que sua condição de monumento — elemento morfológico que persiste no tecido urbano e resiste a transformações — foi percebida pelo então governador da Capitania de Minas Gerais, Luís da Cunha Menezes (1783-1788), que mandou inscrever seu nome no chafariz, transmitindo à posteridade que o chafariz do Largo do Rosário foi construído, em 1787, “governando o ill.moe ex.mos.rLuís da Cunha Menezes”. Uma inscrição ulterior informa que o chafariz “foi concertado em 1900”. Em 1817, Auguste de Saint-Hilaire visitou o Arraial do Tejuco, mencionando a existência de três chafarizes públicos. Não se conseguiu, porém, localizar os outros dois chafarizes citados pelo botânico francês, supondo-se que o chafariz da praça Dom Joaquim seja o último do período colonial, em Diamantina.

Foto 20 – Pomares, jardins e hortas

Em Diamantina, a vegetação não se encontra nas ruas, mas está ao redor da cidade, na Serra dos Cristais. Dentro da cidade, a vegetação está contida nos logradouros privados, atrás dos muros que cercam pomares, jardins e hortas nos fundos das casas. Com efeito, a imagem mostra a rua Juscelino Barbosa completamente desprovida de árvores, canteiros e vasos. À direita, as árvores pertencem ao pomar da residência do Arcebispo Metropolitano de Diamantina. A vegetação rala da Serra dos Cristais pode ser vista, ao fundo. Conformação similar da vegetação no tecido da cidade aparece nos registros de Erich Joachim Hess, que fotografou Diamantina, em 1938. Embora as estruturas verdes não tenham a mesma permanência das partes edificadas da cidade, o naturalista George Gardner, que visitou Diamantina, em 1840, descreveu a existência de hortas nos fundos das casas, onde eram plantados vegetais comuns europeus, como batata, couve e alface, tendo visto também algumas frutas da Europa, como maçã, pêssego, marmelo e figo. Vinte anos antes de Gardner, Auguste de Saint-Hilaire relatou disposição análoga da vegetação no desenho do Arraial do Tejuco, em 1817: cada casa tinha o seu jardim, onde se plantavam laranjeiras, bananeiras, pessegueiros, jabuticabeiras, figueiras, pinheiros e marmeleiros, além de couve, alface, chicória, batata, ervas medicinais e flores, entre as quais o cravo era a espécie favorita.

Foto 21 – Mobiliário urbano

O mobiliário urbano é constituído de objetos instalados em espaços públicos. Esses objetos estão a serviço dos cidadãos, sendo necessários para o bom funcionamento da cidade, mas também para a qualidade do espaço e comodidade de seus habitantes. São exemplos de mobiliário urbano: pontos de ônibus, hidrantes, lixeiras, postes de iluminação, relógios, bancos, placas de sinalização, bancas de jornal e parquímetros. Em Diamantina, os postes de iluminação e lampiões de estilo colonial — como o lampião documentado na imagem — parecem seguir o modelo dos de Ouro Preto, onde foi implantada, em 1967, a primeira rede de distribuição subterrânea de energia elétrica, em Minas Gerais, incluindo o desenvolvimento de uma luminária com design colonial, a partir das pranchas dos pintores viajantes Jean Baptiste Debret, da Missão Francesa, e Johann Moritz Rugendas, da Expedição Langsdorff. Os letreiros do comércio e dos serviços seguem o padrão dos de Ouro Preto, Mariana e Tiradentes, compatíveis com as orientações do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional — Iphan, exemplificadas na imagem: placas paralelas ou perpendiculares às fachadas, utilizando três cores, no máximo; instalação somente no pavimento térreo, mantendo a visibilidade dos elementos da fachada, como gradis, portas e vergas.

notas

NE — Parte das imagens apresentadas neste ensaio integra, desde setembro de 2021, a exposição virtual permanente Relíquias da Serra dos Cristais, hospedada no site do Museu do Cerrado <https://bit.ly/38GHryl>.

1
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sobre o autor

Elio Moroni Filho é sociólogo com pós-doutorado em História da Arte e integrante do grupo de pesquisa Literatura arquitetônica: narrativas e representações da arquitetura e da cidade como patrimônio cultural, do Programa de Pós-Graduação em História da Arte, da Universidade Federal de São Paulo.

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