César Sartorelli: Como surgiu essa idéia de mudar da profissão de Analista de Negócios para arquiteto?
Luca Panhota: Sempre tive grande admiração por arquitetura. Conversando com meu sobrinho que está prestes a entrar na faculdade, lembrei-me de quando era pequeno e adorava brincar com legos e blocos de madeira, construindo casas, carros e garagens com os blocos miniaturas. Sempre tive uma grande preocupação para que as peças se conectassem precisamente e estivessem com a mesma cor e forma. De família pobre e sem muita informação sobre profissões e disponibilidades, sabia que queria vencer de alguma forma e poder prover para mim e minha família. Isto foi no final dos anos 70 e início dos 80. Por causa do surgimento dos computadores pessoais e da tecnologia, optei pelo campo de informática, o qual acreditava me daria possibilidade de continuar criando coisas em menor escala e esteticamente agradáveis.
Comecei a trabalhar na Gessy Lever em 1991, um ano antes de me formar na universidade em Administração de Empresas com ênfase em Análise de Sistemas. Paralelamente, como sempre gostei de línguas e do estrangeiro, estudava Inglês, Francês, Italiano e Espanhol. A Gessy Lever proporcionou-me oportunidades de viajar e ampliar meus horizontes e, aliado à facilidade de poder comunicar-me em vários deles, resolvi cursar pós-graduação em Comércio Internacional. Chegamos ao final dos anos 90: o país em crise e intenso êxodo de profissionais para o exterior. Como sempre quis tentar a vida fora, resolvi mudar para Nova Iorque. Aqui cheguei como Gerente de Projetos de uma empresa de consultoria e comecei a visitar empresas e a conhecer mais o mundo das indústrias americanas. Descobrir que a “visão” que temos dos Estados Unidos não é nada parecida com a realidade. As indústrias são arcaicas e o método de trabalho é retrógrado. Resultado: desilusão. Fiquei perdido por um período e em dúvidas, e quando estamos em dúvida, geralmente procuramos soluções onde nos sentimos mais confortáveis. Comecei a estudar pintura a óleo e desenho, num modo de obter gratificação imediata. Lembrei-me com doçura do tempo em que era criança e me perdia nos desenhos e nas cores. Procurei ajuda com um Orientador Vocacional, professor da escola na qual estudava. Lembrei que sempre quis construir, e fazer algo mais tangível e palpável. Um amigo no Brasil me pôs em contato com Arthur Casas. Enquanto perguntava-lhe como era a vida de um arquiteto brasileiro em NYC, disse que me sentia frustrado por não ter perseguido uma vida de arquiteto. Ele então respondeu: “... então deixe de ser frustrado e faca arquitetura, nos só vivemos uma vez”. Isto tem sido meu mantra a partir de então. Procurei informações sobre cursos de arquitetura, montei um portfólio com meus trabalhos de fotografia, pintura e desenho, e fiz inscrição na Columbia University e Pratt Institute, ambos em NYC, onde acabei optando pela Pratt Institute.
CS: Como foi sua formação em Arquitetura nos EUA?
LP: Uma coisa muito legal da Pratt foi que o curso que fizemos era novo. Fomos a primeira turma e a reitora dos cursos de graduação, Catherine Ingrahan, estava muito empenhada em criar o melhor curso de graduação em arquitetura, para os que não tinham background em arquitetura. O curso foi ótimo. Durou 3 anos, de forma integral, com 84 créditos. Tínhamos sempre incentivos para estágios e conexões com o mundo da arte e arquitetura. Tínhamos palestras constantes com Zaha Hadid, Diller Scofidio, Bernard Tcshumi, Terence Riley entre outros.
CS: O curso é mais técnico ou teórico?
LP: O curso foi muito intensivo e desenhado para quem não tinha background em arquitetura. Minha turma era composta de coreógrafos, estudantes de ciência política, administradores, contadores, pintores e, acredite, um geógrafo.
O curso foi ambos, muito teórico e técnico ao mesmo tempo. Como já éramos formados em alguma profissão, não tivemos cursos básicos relacionados com primeira formação, consequentemente não tivemos aulas de história e fomos direto para aulas de teoria da arquitetura. Nos estúdios, os trabalhos tinham uma base de investigação teórica e assumia-se que já sabíamos desenhar e nos expressarmos em forma gráfica; porém muitos de nós já usávamos o computador como gerador de imagens e formas, facilitando assim a compreensão do espaço tridimensional. Claro que tivemos cursos técnicos como cálculo de estruturas, sistemas mecânicos e elétricos, porém os meus preferidos foram os cursos teóricos mais abrangentes. Não só estudamos os clássicos de arquitetura, como tivemos uma vasta abordagem da arquitetura mundial incluindo regiões pouco estudadas como a Índia, o Oriente Médio e a o resto da Ásia, assim como exemplos de questões atuais como problemas em Israel, êxodos urbanos e rurais e até estudos sobre a periferia brasileira.
CS: Depois de formado o arquiteto já assina os projetos como no Brasil?
LP: Depois de formado, o arquiteto nos Estados Unidos deve passar por um doloroso processo de estágios, mal remunerados, onde se espera que aprenda e passe por várias fases do processo em um escritório de arquitetura. Esses estágios chamam-se IDP – Internship Development Program e é composto de 700 unidades, sendo 350 para design e documentos, 70 para administração de construção, 35 para atividades de gerenciamento, 10 em serviços para a comunidade e 235 em uma área de especialização. ;Esse programa tem a duração de 3 anos, e são poucos os que conseguem cumpri-lo nesse período, pois cada unidade equivale a 8 horas de trabalho nas respectivas áreas. Após terminar o IDP, o candidato à profissão tem que submeter-se à análise do Conselho de Arquitetura dos Estados Unidos, que avalia se o candidato está apto ou não a prestar os recentes e atuais 7 exames (até o ano passado eram 9 exames) para poder tirar a licença de arquiteto e finalmente obter o título e assinar projetos.
Aliados a estes exames, as empresas estão hoje exigindo do candidato a certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), para que os profissionais possam ter uma melhor compreensão dos problemas e soluções do mundo atual e que possam também propor projetos com um design sustentável.