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my city ISSN 1982-9922

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MASSAD, Fredy; GUERRERO YESTE, Alicia. Artefatos naturais. Minha Cidade, São Paulo, ano 05, n. 055.01, Vitruvius, fev. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/05.055/1986/pt>.


Exterior da Casa Lucas, em Almacelles
Foto Jordi Bernadó


Pronto Socorro Médico no bairro leridano de Cap-Pont
Foto Jordi Bernadó

Pronto Socorro Médico no bairro leridano de Cap-Pont
Foto Jordi Bernadó

Exterior da Casa Lucas, em Almacelles
Foto Jordi Bernadó

Exterior da Casa Montull, em Lleida
Foto Jordi Bernadó

Exterior da Casa Montull, em Lleida
Foto Jordi Bernadó

 

Edifícios que aparecem como peças precisas dentro de um vazio urbano rodeado de casas geminadas, no enfrentamento com a aridez austera da paisagem da comarca de Segrià, resultado da experimentação com novas técnicas de construção e de novas formas de emprego e tratamento de materiais: a arquitetura de Ramón Fité e Julio Mejón, em sua materialidade, é expressão de uma busca sensível. É arquitetura que surge da concentração intensa, racional e emocional, em cada elemento e fator de sua essência e matéria.

Fité e Mejón são desses arquitetos que fazem com que um edifício surja como um elemento que se faz vivo tanto por sua função como por ser uma entidade de individualidade plena integrada e incorporada em uma paisagem, na intempérie, enriquecendo-a ao transformá-la com sua presença. Dentre as lições silenciosas enunciadas por suas obras, se destaca como a arquitetura se revela como um produto da psique, reflexo da percepção de nossa parcela específica de realidade. Uma arquitetura que afirma que o solo é a matéria-prima de toda construção, criando espaços compostos de sensações de temperatura, luz, relações entre exterior-interior, contrastes entre gravidade e leveza... Estes arquitetos operam manejando técnica para controlar e fazer bela a matéria: fazendo-a especificamente bela desde a elaboração da complexa aprendizagem sensorial que se adquire através do vínculo que arquitetura e arquiteto estabelecem com o entorno. ”O clima e a orientação condicionam a maneira de se posicionar. Vivemos em Lleida, em um lugar aonde as quatro estações do ano se marcam com intensidade: primaveras chuvosas, verões quentes e outonos ricos em cores, prelúdios do frio e a neve do inverno. Entendemos a arquitetura nestas circunstâncias”, explicam.

Do ponto de vista técnico, os arquitetos propõem a aprendizagem nos diferentes ateliês envolvidos nos processos de construção para entender suas racionalidades e, ao aprofundar neste conhecimento, aprender a subvertê-los para assim manejá-los, controlá-los e dominá-los para poder refletir de uma maneira mais exata suas próprias idéias.

As colocações dos arquitetos sobre a realização de uma arquitetura seca – aonde os elementos são montados a seco, sem uso de cimento – revelam como a apreciação poética do lugar produz uma curiosidade que conduz ao estudo e desenvolvimento de procedimentos construtivos e do tratamento dos materiais que fazem dos edifícios de Fité e Mejón artefatos naturais de identidade técnica e estética absolutamente autóctone. Seus recentes projetos para duas habitações unifamiliares – uma em Lleida, outra no povoado de Almacelles – e o de um Pronto Socorro Médico no bairro leridano de Cap-Pont, evidenciam a certeza de ambos que ocupar um lugar com arquitetura significa transformá-lo. A concepção de uma arquitetura seca é uma transposição afirmativa dos traços fundamentais do perturbador clima extremo e da paisagem natural e urbana de Lleida e seus contornos. “A arquitetura deve reconhecer os atributos negativos e positivos de um lugar: entender o que tem que se ignorar, ampliar, eliminar, modificar”, afirmam ambos.

O Pronto Socorro Médico e a casa unifamiliar construídos em distintas zonas limites do perímetro de Lleida se erguem como volumes firmes e sólidos. No caso do Pronto Socorro, chama a atenção o tratamento da fachada e sua relação com o entorno: uma área urbana de agressivos blocos de habitação construídos pela iniciativa privada, em relação aos quais os arquitetos buscam que seu edifício se integre como uma entidade abstrata e precisa, unitária e complexa, subjetiva em seu exterior e pragmática em seu interior. E o conseguem mediante uma estrutura horizontal – que se opõe à verticalidade dos feios blocos adjacentes – composta de alumínio, vidro e madeira laminada que gera uma pele conformada por sucessivos módulos, de diferente tamanho e material, compondo uma espécie de alfabeto.

O projeto desenvolvido para uma habitação situada em uma urbanização próxima à Lleida demonstra o interesse destes arquitetos tanto pela pesquisa como pela proposição de novas soluções construtivas. “Construir supõe combinar materiais, técnicas e métodos para materializar uma idéia. Isto é algo que não se consegue unicamente com a utilização direta dos sistemas e produtos que oferece a indústria. Para este projeto, criamos nossas regras particulares e nossa metodologia, entendendo a construção como um instrumento para conceber a arquitetura, de maneira que, propiciando decisões e aprofundando em seu conhecimento, pudéssemos chegar a alterá-la”, comentam Fité e Mejón. Baseando o programa doméstico desta habitação no costumeiro para qualquer família numerosa, os arquitetos levam a cabo uma construção concebida e materializada com técnicas e máquinas usadas na construção de estruturas dinâmicas para o suporte de caminhões e carrocerias frigoríficas. O edifício é um volume metálico leve, sobreposto a uma base de concreto disposta no entorno de um pátio. Os revestimentos da estrutura ocultam esse caráter industrial original e a faz aparecer como uma casa confortável e elegante, sem afetação.

A sensualidade e o domínio do vocabulário arquitetônico que sustentam o exercício de construção de uma casa em Almacelles, uma pequena localidade a poucos quilômetros de Lleida, podem ser tomados como um reflexo máximo da sensível capacidade, audácia, inteligência e energia destes arquitetos. Seu elemento principal é a pesada massa de aço que conforma o segundo pavimento e que se oxida aos poucos pela ação da brisa marítima. Esta bonita estrutura estabelece um desconcertante diálogo de firme equilíbrio com leve e tênue piso térreo, estabelecendo uma estranha fraternidade com as melancólicas habitações vizinhas e a árida paisagem rural da proximidade. Sua exuberância reside em seu apego à própria essência, à própria identidade, que são as mesmas do agora transformado lugar aonde se assenta, mediante o trabalho e o pensamento de arquitetos com vocação manual e artística.

Aproximar-se da tecnologia e seu desenvolvimento para fazer com ela um trabalho artesanal e cuidadoso. A montagem ajustada e harmônica de peças que jogam o papel da construção de um todo para o desenvolvimento de uma linguagem arquitetônica que chega a ser plenamente poética quando se faz evidente que não existe temor a construir experimentando: para estes arquitetos, a construção é um instrumento para conceber e fazer uma arquitetura sensível e profunda, que transpira beleza. Que transforma seus lugares em outros espaços.

nota

[Publicação original em suplemento “Cultura/s”, jornal La Vanguardia, Madri, 26 de janeiro de 2005.]

sobre o autor

Fredy Massad e Alicia Guerrero Yeste são autores do livro Enric Miralles Arquitetura do sentimento, que será publicado em breve pela editora Testo & Immagine.

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