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my city ISSN 1982-9922

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LEMOS, Carlos Alberto Cerqueira. A reforma do Museu do Ipiranga. Prevendo incêndios. Minha Cidade, São Paulo, ano 09, n. 101.02, Vitruvius, dez. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/09.101/1867>.


Museu do Ipiranga - vista externa
Foto Victor Hugo Mori


Monumento do Ipiranga
Foto Victor Hugo Mori

Monumento do Ipiranga
Foto Victor Hugo Mori

Projeto de ampliação do Museu Paulista, arquitetos Eduardo Colonelli e Silvio Oksman / Escritório Paulistano de Arquitetura

 

No último dia 12 de agosto, o Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo, mais conhecido como Conpresp, em reunião ordinária, aprovou o projeto de ampliação da área construída do edifício do Museu Paulista/ USP, no Ipiranga, bem tombado pelas repartições preservacionistas Iphan, Condephaat e Conpresp.

Não queremos discutir agora as condições em que houve o deferimento da aprovação solicitada, mas nada nos impede de dar aqui na Folha de S.Paulo palpites sem sermos chamados a falar quanto ao mérito daqueles desenhos.

Em maio de 1964, em Veneza (Itália), aconteceu o Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos em Monumentos Históricos, cuja carta, apoiada e divulgada pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), é, ainda hoje, seguida "oficialmente" pelos especialistas em preservação, inclusive brasileiros, já que nosso país lá esteve representado.

Tal documento orientador de todos permite que monumentos tombados sofram intervenções necessárias a satisfazer demandas de novos programas de necessidades, contanto que elas sejam expressas, ostentando as marcas da contemporaneidade, isto é, que fiquem aparentes os vestígios da tecnologia de nossos dias, sendo terminantemente proibidos os fingimentos tendentes a satisfazer o desejo de "unidade estilística".

Porém, ao mesmo tempo, a Carta de Veneza insiste no respeito às características básicas originais do monumento quanto à sua volumetria, à sua espacialidade, à sua inserção no meio ambiente, principalmente na paisagem envoltória.

Naquele citado projeto – aliás, de boa qualidade –, há, no entanto, dois entraves: duas torres de escada acopladas no venerando edifício. A mais importante construção eclética de São Paulo merece de todos o maior respeito, antes de tudo, porque sua imponência majestática, ao nosso olhar e sobretudo na imaginação do povo, simboliza a perpetuação de nossa liberdade, tornando-se, assim, um ícone daquilo que podemos chamar de pátria, ainda mais que está a guardar em seu ventre o imenso quadro do grito perpetrado por Pedro Américo, em Florença (Itália).

Além do mais, o prédio também deve ser acatado pelos incontáveis reflexos nas demais construções paulistanas a partir dos últimos anos do século 19 até o armistício de 1918. As loggias de Teatro Municipal, por exemplo, foram nele inspiradas, assim como as do Palácio dos Campos Elíseos. Foi verdadeiramente uma escola de técnicas construtivas.

Ali, os autores do projeto, aparentemente seguindo os ditames da citada Carta de Veneza, imaginaram duas escadas modernas fazendo contraponto à vetustez do prédio do arquiteto Tommaso Gaudenzio Bezzi, qual duas muletas a segurar de pé o monumento combalido, qual dois contrafortes modernos dizendo: "Olhem, estamos aqui".

A nosso ver, não adianta a argumentação de que existem precedentes, como as escadas de aço projetadas pelo ilustre arquiteto francês Jean Nouvel no Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, em Madri (Espanha). Lá, o contexto é bem outro.

O nosso museu é diminuto se comparado à grande massa arquitetônica do complexo museológico espanhol inserido na malha urbana. O museu paulistano está ambientado isolado, entre árvores e jardins, com quem mantém um diálogo harmonioso. Cada caso é um caso, como diria o conselheiro Acácio.

Dizem os arquitetos que há imposições municipais exigindo mais escadas bem localizadas destinadas a facilitar a saída de pessoas em momentos de pânico. Esse é um típico exemplo de alteração de programa, pois, no tempo do arquiteto italiano, não havia ainda o risco de curtos-circuitos e de incêndios porque a Light até então não chegara à cidade.

A solução, diz o bom senso à luz da carta, é fazer essa nova circulação vertical dentro do edifício, vazando os pisos elevados, e as áreas expositivas ali prejudicadas poderiam ser repostas no aumento previsto na ampliação semi-enterrada, agora aprovada pelo Conpresp.

Seja como for, se mantidas as escadas, a nosso ver, elas somente deveriam ser construídas quando fossem levantadas aquelas que estão faltando ao prédio do Masp, na avenida Paulista. A escadaria nobre do museu dito do Ipiranga é tão larga e segura quanto a de Lina Bo Bardi. A Prefeitura de São Paulo não pode ter dois pesos e duas medidas.

(artigo originalmente publicado no jornal Folha de S. Paulo, na coluna Tendências/Debates, quarta-feira, 22 de outubro de 2008)

sobre o autor

Carlos Alberto Cerqueira Lemos, arquiteto, é professor de pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP

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