Um dos temas recorrentes da última eleição municipal dizia respeito à identidade política de Eduardo Paes. Como se sabe, Paes iniciou sua carreira política como “prefeitinho” da Barra, ainda no primeiro mandato de César Maia. Com a popularidade do atual prefeito em baixa, o candidato do PMDB esforçou-se para se desvencilhar da imagem de cria de Maia, preferindo dar destaque à de dissidente político.
Findo o período eleitoral, eis que Paes se vê novamente enredado no debate sobre sua identidade política. O motivo, agora, foi sua declaração de que pretende fazer do combate à desordem urbana a marca de sua gestão. “Quem sai aos seus não degenera”, escreveu um articulista político, lembrando que a restauração da ordem pública foi a palavra de ordem da primeira campanha de César Maia à prefeitura do Rio.
Afirmar que Paes dará continuidade à chamada era César Maia pode contudo ser enganoso. E isso pela simples razão de que, do ponto de vista da gestão urbana, tal era se divide em duas. A separar uma e outra está a presença – primeiro como Secretário de Urbanismo, depois como prefeito – de Luiz Paulo Conde.
Mais do que enumerar os projetos que pôs em prática, cumpre destacar que, graças à presença de um arquiteto-urbanista com o currículo de Conde, a política urbana carioca foi, por oito anos, decorrência de uma verdadeira idéia de cidade – uma visão clara de como o Rio de Janeiro deve ou pode ser planejado, gerido e, sobretudo, compreendido.
Esquematicamente, pode-se afirmar que o traço característico dessa idéia era a desconfiança do conceito tradicional de planejamento urbano. Descentralizar a gestão, estimular a parceira entre os órgãos municipais de planejamento e escritórios locais de arquitetura, dar prioridade aos bairros – essas e outras propostas eram a expressão de uma abordagem que, por isso mesmo, quis trazer “o urbanismo de volta às ruas”.
Pode-se questionar, é claro, se essa visão é ainda (e mesmo se foi algum dia) pertinente. Mas o fato relevante é que, durante duas administrações consecutivas, e graças ao papel crucial desempenhado por um arquiteto-urbanista da estatura de Conde, a política urbana carioca foi guiada por uma verdadeira visão de cidade. Parece pouco? Não é. A comparação entre a primeira e a segunda era Maia (ou entre a era Conde e a era Maia) diz tudo.
Aparentemente, Eduardo Paes não tem, a rigor, uma visão de cidade. Mas, assim como fez o primeiro Cesar Maia, ele pode dar início a sua política urbana admitindo ser essa uma área de competência técnica, não político-partidária. A escolha de seu Secretário de Urbanismo será reveladora. Explicitará de qual dos dois César Maia ele de fato descende.
PS – Alguns dias depois da conclusão deste artigo, o Prefeito-eleito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, anunciou seu futuro Secretário de Urbanismo. Chama-se Sérgio Dias, e é engenheiro. Comentários?
sobre o autor
Otavio Leonídio, arquiteto, professor da PUC-Rio, é co-autor do projeto Rio-Cidade Realengo