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my city ISSN 1982-9922

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Problema na história recente dos museus, como não ter acervo e nem projeto de curadoria, faz a instituição procurar soluções para justificar à sua criação

how to quote

(ALMANDRADE), Antônio Luiz M. de Andrade. Um museu à deriva e uma cidade sem olhar. Museu Rodin de Salvador. Minha Cidade, São Paulo, ano 13, n. 147.05, Vitruvius, out. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/13.147/4520>.


Museu Rodin, Salvador
Foto Nelson Kon


A iniciativa do Secretário de Cultura e do Departamento de Museus em ouvir artistas e agentes do circuito de arte para encontrar uma saída para um museu é um modelo viável de compartilhar responsabilidades. Com a devolução das obras de Rodin, o Palacete das Artes – Museu Rodin, sem acervo, solicita uma solução para se justificar como instituição museológica. Inaugurado, sem projeto curatorial, para abrigar peças do escultor francês Auguste Rodin, sobreviveu alheio a qualquer perspectiva de curadoria, a depender sempre de onde sopra o vento. Com uma programação de exposições desarticuladas, sem desconhecer a qualidade de muitas delas, parece mais uma luxuosa casa de eventos culturais que mostra joias e bijuterias, numa cidade com bastante luminosidade e um olhar míope.

O Museu Rodin não é um caso isolado na história recente dos museus. Muitos foram criados no mundo inteiro nos últimos anos, sem nem ao menos saber o que se colocar dentro deles, verdadeiras casas de espetáculo. Vivemos no século dos museus, nunca eles foram tão referendados, celebrados e reproduzidos através de filiais em diferentes cidades e países. Não estamos mais nos tempos das vanguardas rebeldes, nos tempos de Maiakovsky, por exemplo: “Está na hora que os projéteis e as bombas batam nas paredes dos museus”. Atualmente, eles são sempre bem vindos, são eles que certificam a autenticidade da experiência artística.

Atravessamos um estágio de carência, revolta, desconfiança e descontentamento com a política cultural e as poucas iniciativas do Estado. Nesse cenário, qualquer reunião com os representantes oficiais, gestores da cultura e produtores de artes visuais é transformada numa arena de reclamações e reivindicações que vão além da pauta. É hora de aproveitar a oportunidade para emitir suas verdades. Perguntas e sugestões são muitas, às vezes marcadas pela emoção e pela ansiedade. Pensar sentado numa platéia não é tarefa fácil para o artista plástico acostumado na rotineira solidão do atelier, com a única companhia do trabalho que fala sem fazer ruído.

É nesse lugar de solidão e silêncio, depois do encontro público, que é possível pensar, avaliar e opinar a respeito do que veio à tona, até ao que escapa ao tema. Estamos às voltas com a aplicação de uma lei que garante a inclusão de uma obra de arte na edificação de um prédio. Mas sem desejo, sem vontade de ver, é uma imposição que resulta em fracasso. Quantos murais em edifícios deixaram de ser vistos? E se não são vistos, não existem. É um cego chamado Jorge Luis Borges quem diz: “Eu sou o único espectador desta rua: se eu deixar de ver, ela morrerá.” No hall de um cinema no centro da cidade, uma obra de arte existe atrás do cartaz do cinema. Ninguém percebe. Nem a arquitetura resistiu ao empreendimento imobiliário.

No interior de um Banco, na rua Chile, uma das mais importantes obras de arte do mais baiano dos artistas, o argentino Carybé, não está visível, a impressão é que ela é um incômodo para a instituição. Um mural localizado nos limites da antiga capital do país, fundada pelo governador geral Tomé de Souza, com uma iconografia que faz referência à história do Brasil e da Bahia, com um domínio técnico e tratamento conceitual que surpreende a arte contemporânea, termina numa parede perpendicular, transparente, com uma vista para a Baía de Todos os Santos, principal porta de entrada da velha capital. O mural é um rico objeto para uma tese acadêmica. Que privilégio e sabedoria desse artista e quanta ignorância de nossa geração que não sabe olhar.

Diante desses achados, não sei se a lei é o caminho… Voltando ao tema da ocupação do Museu Rodin, a ideia de uma galeria permanente da arte baiana deve ser descartada, esta é uma atribuição do Museu da Cidade, que conta com uma pinacoteca de artistas baianos, embora sem uma coleção representativa e em péssimas instalações. É uma outra questão que pertence a Prefeitura Municipal e à comunidade que se omite. Ocupar com esculturas de artistas baianos disponíveis nas coleções dos museus do Estado, no lugar das obras de Rodin, é uma opção possível, a meu ver, com um projeto expográfico e uma curadoria capaz de fazer o diálogo dessas esculturas com o espaço. Afinal, o museu não é também um lugar de confronto de histórias?

Por que também não se esboçar um projeto curatorial emergencial pra o anexo do Museu Rodin a partir das reivindicações e sugestões de artistas e agentes do circuito? As falas, depois de garimpadas e filtradas, apontam para a necessidade de iniciativas por parte da instituição, para que ela não seja o receptáculo de atendimento de demandas. As opções estão no ar, uma série de mostras coletivas que façam um panorama da arte na Bahia com a análise do contexto, pode ser uma alternativa. Compete ao Estado avaliar, principalmente, sua política de editais e investir nos museus para que eles cumpram sua função junto à sociedade.

nota

NE
Publicação original do artigo: ALMANDRADE. Um museu à deriva e uma cidade sem olhar. A Tarde, Salvador, Caderno 2+, 05 set. 2012, p. 3.

sobre o autor

Antônio Luiz M. de Andrade (Almandrade), artista plástico, poeta e arquiteto, é integrante do Conselho de Cultura da Bahia.

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