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Indicado como novo diretor do MAC USP, o arquiteto e professor da FAU USP Hugo Segawa apresenta sua proposta de ação para seu mandato.
SEGAWA, Hugo. MAC USP. Uma nova visibilidade. Minha Cidade, São Paulo, ano 14, n. 167.01, Vitruvius, maio 2014 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/14.167/5187>.
No ano do seu cinquentenário, o MAC USP ganhou um novo espaço. Da modesta sede de cerca de três mil metros quadrados no campus da Cidade Universitária do Butantã (além da reserva técnica na extremidade do prédio da Bienal), saltou para um edifício da ordem de trinta mil metros quadrados, em pleno Parque Ibirapuera, antes utilizado pelo Detran.
Todavia, sua visibilidade multiplicou-se muito mais que sua área física: o MAC USP ganha uma dimensão urbanística inédita: situa-se agora no principal parque metropolitano da cidade; situa-se no espaço que foi criado há 60 anos para comemorar o quarto centenário da cidade de São Paulo; situa-se num espaço projetado pela equipe liderada por Oscar Niemeyer, reconhecido pelo Condephaat e Compresp como patrimônio cultural.
Seus visitantes deixam de ser o público predominantemente universitário do campus, de especialistas, diletantes e amantes das artes, para potencialmente receber as “tribos” do Ibirapuera: esportistas, skatistas, skinheads, darks, harry potters, bykers, patinadores, birdwatchers, evangélicos e outros frequentadores impensáveis. Ônibus que servem as paradas defronte ao edifício, nos extremos da passarela Ciccillo Matarazzo, ostentam em suas plaquetas de itinerário a abreviação “MAC USP”, substituindo o outrora “Detran”. Estes coletivos levam e trazem passageiros do centro de São Paulo – Praça da Sé, Largo São Francisco, Parque D. Pedro II, estações do Metrô – para o Terminal Capelinha, Terminal Jardim Ângela, Terminal Grajaú, Terminal Santo Amaro, Terminal Guarapiranga, Jardim Miriam, Jardim Luso e outros destinos periféricos. Alguns dos quais classificados entre os distritos de mais baixo IDH da cidade de São Paulo. De outro modo, o Parque Ibirapuera está cercado dos distritos com os mais altos IDH: Jardim Paulista, Moema, Itaim Bibi. Entre os 1,5 milhões de usuários/mês do Ibirapuera, há gente de todas as classificações sociais e culturais, além dos inclassificáveis. Com um universo bem mais amplo de potenciais frequentadores, o MAC USP pode ser um espaço de inclusão cultural, artística, educacional, social e etária. Evidencia-se o caráter metropolitano e heterogêneo do novo espaço do museu.
O MAC USP pode ser uma atração cultural e turística em diálogo com seus congêneres no Parque: o Pavilhão da Bienal, o Museu de Arte Moderna, a chamada OCA, o Museu Afro Brasil, o Auditório Ibirapuera, o Obelisco da Revolução de 1932. Por si só, é uma atração arquitetônica, como parte do conjunto desenhado por Oscar Niemeyer e equipe. Mas de uma presença visual mais impactante, porquanto imponente à margem da Avenida 23 de Maio. Todos rodantes do corredor norte-sul, o mais estressante eixo viário da cidade (que é também o caminho para o aeroporto), enxergam o grande prisma de fachada prateada (também visível de dentro dos aviões). No conjunto das obras de Niemeyer, está entre as criações do período áureo de sua produção (décadas de 1940-1960). E dos poucos museus dentro de um espaço da fase clássica do arquiteto, ao lado do Museu de Arte da Pampulha, o Pavilhão da Bienal e o Museu Afro Brasil. Poderia rivalizar, em termos de repercussão arquitetônica, ao MAC-Niterói.
Mas qual a repercussão desejada? O alcance do MAC USP se deve regular por sua condição de museu universitário. Lugar de reflexão e extroversão da produção cultural e científica da Universidade de São Paulo. É uma das três unidades fora do campus do Butantã – junto com o Museu Paulista e o Centro Universitário Maria Antônia – a estabelecer contato e diálogo diretos com o grande público. Com o fechamento temporário do Museu Paulista e do Museu de Zoologia, e a limitação de área do CEUMA, o MAC USP é no momento o maior e mais acessível espaço disponível para a USP mostrar sua produção. É uma enorme responsabilidade.
A missão, objetivos institucionais e estratégias de gestão acadêmicas estão prescritos no Regimento do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (Resolução nº 6439, de 17 de outubro de 2012). Para além da fria norma, é preciso examinar os caminhos possíveis do MAC USP como instituição de produção criativa, cultural, científica, de circulação de ideias e de extensão universitária.
O resgate dos textos do primeiro diretor do MAC USP, Walter Zanini, é oportuno como leituras para meditação das origens, rumos e descaminhos. Bem como uma proposta de Mário Pedrosa de 1962 para o core da Cidade Universitária da USP revela antecedentes importantes para a compreensão da gênese do MAC USP. Nesses escritos, evidenciava-se que se esboçava na sua origem a interdisciplinaridade, a multidisciplinaridade e a experimentação como pautas de ação. Arquitetura, design, artes gráficas, publicidade, música, cinema, foram frentes de pesquisa que não lograram persistir ou foram contingenciadas ao longo de sua existência. Permanece como desafio pensar como incorporar essa diversidade, fortemente ampliada com novas linguagens, técnicas, abordagens, conceitos, saberes e fazeres, decorridos meio século desde a criação do Museu. Ou tentar apreciar o quanto as “unidades e museus afins da Universidade de São Paulo” previstas no regimento – EACH, ECA, FAU, FE, FFLCH, MP e MAE – podem partilhar afinidades com o MAC USP. Decerto outros campos disciplinares teriam a colaborar, diluindo definições ortodoxas de “arte contemporânea”: A Escola Politécnica, o IME, o Instituto de Física, o Departamento de Ecologia seriam casos de unidades que operam pesquisas que não se enquadrariam nas normas convencionais de “produção artística”, mas cujos experimentos – como na informática, o ambientalismo – são indissociáveis das novas narrativas artísticas. Ou a Física, a Química ou a Biologia contribuindo para a preservação do patrimônio artístico. São ainda elucubrações derivadas da regulação básica do MAC USP: um museu universitário.
A Universidade de São Paulo comemora este ano seus 80 anos de criação. Estará o MAC USP ciente da amplitude etimológica da palavra Universidade? Conseguiria converter em substância própria os saberes humanísticos, tecnológicos e artísticos produzidos pela universidade e traduzir esses conhecimentos para o grande público do Ibirapuera, da metrópole paulistana? Há de se pensar que não estamos em uma universidade qualquer. A Universidade de São Paulo é a principal referência latino-americana, a primeira do subcontinente em todos os rankings internacionais. O MAC USP deve lidar com muitas escalas: a vizinhança, a cidade, o estado, o país, o mundo. A latitude de atuação é enorme, tanto quanto a responsabilidade de responder como um museu universitário entre os mais importantes no mundo latino-americano e internacional.
Estas considerações são anotações para um programa de trabalho. Programa que não se esgota em uma diretoria de quatro anos de mandato, tampouco do empenho solitário de um diretor de unidade. Trata-se de uma especulação que só faz sentido quando um programa é objetivo de equipe, um pacto entre pesquisadores, técnicos e funcionários envolvendo o coletivo do MAC USP, tendo como propósito um fim comum. Recebo do meu antecessor, o Prof. Tadeu Chiarelli, que, com o apoio da equipe técnica da casa, que seguirá me assistindo, um museu que a cada dia recebe mais e mais visitantes, num crescendo que ressalta ainda mais a importância deste Museu como resposta que a Universidade de São Paulo pode oferecer diante das responsabilidades a nós atribuídas pela sociedade.
O MAC USP vive um momento de transição – paradoxalmente, uma condição permanente. Mas neste instante, esta transitoriedade deve ser vista tanto como continuidade como mudança. Continuidade de premissas e realizações construídas pelo esforço de várias gestões; mudança pela inflexão de uma nova visibilidade pública com a sede no Parque Ibirapuera. Uma instituição que completou 50 anos de atividades, e agora em condições de dialogar e servir à sociedade de modo inédito e inovador, caso seja este o ensejo.
sobre o autor
Hugo Segawa é arquiteto, professor da FAU USP e novo diretor do MAC USP.