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português
Um novo uso se prolifera nos aglomerados urbanos, resultado da revolução tecnológica, favoráveis condições econômicas globais e políticas ultra liberais. Como consequência: o desfavorecendo a troca social e a baixa densidade nessas áreas.
english
A new type of occupation that incrases in urban areas, a result of a technological revolution, favorable global economic conditions, ultra liberal policies. As a consequence: disadvantaging the stages of social exchange and at low density in these areas.
español
Un nuevo uso prolifera en las aglomeraciones urbanas, resultado de la revolución tecnológica, condiciones económicas globales favorables, y políticas ultra liberales. La consecuencia: desfavoreciendo la movilidad social y la baja densidad en esas áreas.
SERRA, Marcelo Galli. Cidades sem permanência. Enclaves urbanos dispersos: relação entre urbanidade e urbanização. Minha Cidade, São Paulo, ano 15, n. 177.05, Vitruvius, abr. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/15.177/5487>.
O “cinturão do sol” (Sun Belt), onde se encontra a cidade de Houston, compreende uma larga e extensa faixa da Califórnia até a Florida, nos Estados Unidos, é um exemplo peculiar do fenômeno de dispersão urbana territorial. A expansão territorial nesta região teve inicio após a Segunda Guerra Mundial, numa tentativa do governo americano em fomentar o desenvolvimento demográfico e econômico numa zona considerada pobre em relação às demais zonas daquele país, tida até então somente como uma fonte de produtos primários, uma vez que a produção industrial americana se concentrava no triângulo noroeste. A consequência da chegada do capital privado foi a diversificação da economia da região, com indústrias aeronáuticas e matrizes energéticas (petróleo e gás). Os fluxos migratórios para o Cinturão do Sol se intensificaram, resultando em uma explosão demográfica: regiões metropolitanas cresceram em média seis vezes, cidades como Phoenix, Arizona, tiveram aumento acima de 800% entre 1950 e 1990. O modelo de ocupação que os centros urbanos do Cinturão do Sol definiram para materializar esse crescimento e grande desenvolvimento foi descompactar a cidade, proliferando subúrbios, espraiando o perímetro urbano. Los Angeles, Califórnia, por exemplo, para abrigar o mesmo número de habitantes do Brooklyn, Nova York, precisaria de sete vezes mais área, essa expansão territorial que sustentava o “boom” demográfico, instalado no território de forma dispersa e pouco densa, traz a tona situações e relações habitante x território, incompatíveis, por exemplo, no período de 1970 a 1990, a cidade de Los Angeles, Califórnia, cresceu demograficamente 45%, enquanto sua superfície territorial teve um aumento de 300%, descompactando a cidade (1). Com o espraiamento de seus fixos e fluxos; a cidade contemporânea vive esse fenômeno que dispersas suas ocupações pelo território, baixando a densidade.
O caso de Houston no Texas, considerada um produto do Laissez-faire, termo emblemático do liberalismo econômico, baseado no mercado livre, sem interferência do Estado, a cidade sofreu com as intervenções imobiliárias dispersas pelo território. Robert Fisher considera Houston uma cidade sem planejamento, nas palavras dele uma “anarquia urbana”, a falta se diretrizes concretas de ocupação do solo promovidas pelo estado transforma a cidade uma grande plataforma urbana explosiva desmantelando as tradições da urbanidade, uma vez que se expande para fora e para cima, com uma energia que surpreende até mesmo para seus residentes (2).
Segundo dados, Houston investiu vinte vezes menos em planejamento urbano, do que Kansas City, quase dez vezes menos do que Baltimore e comparado a Dallas, outra cidade do mesmo estado, Houston investiu por volta de cinco vezes menos. O planejamento urbano em Houston é definido por investidores, construtores, planejadores do setor privado e por organizações como a Camara de Comercio (3). Contudo Houston é um símbolo apropriado do crescimento urbano no final do século 20 nos Estados Unidos, assim como em outras cidades o desenvolvimento econômico foi o propulsor urbano e territorial, porem não desmantelou a política urbana, já em Houston o crescimento foi intimamente ligado ao desenvolvimento da indústria do petróleo que trouxe liderança de um negócio oligárquico que tem guiado o crescimento urbano com o apoio tácito da maioria dos cidadãos (4).
Uma pequena concentração de arranha-céus no centro e o entorno espraiado, assim acontece a paisagem da cidade de Houston. Como qualificou Lewis Mumford, o subúrbio que inundava as metrópoles norte americanas negando a cidade tradicional, bem como a forma urbana planejada (5). Cravejada por centros comerciais e outlets, em sua totalidade enclausurados, e localizados distante do centro da cidade, nota-se um meio urbano onde as trocas sociais são confortadas dentro de enclaves. Um exemplo clássico deste fenômeno é o The Galleria, o maior shopping do Texas e o quarto maior do país, recebe anualmente mais de 26 milhões de visitantes. Ocupa uma área de aproximadamente 390.000 m2, maior que o centro da Cidade de Amsterdã na Holanda, com 400 lojas e restaurantes finos, dois edifícios de hotéis, e três torres de escritório, uma grande pista de patinação no gelo, duas piscinas, salão de jogos eletrônicos, três bancos nacionais e internacionais fornecendo serviços completos, 12 salões de beleza, uma agência de correios e 11.263 vagas para veículos. The Galleria tem o desenho arquitetônico baseado na Galleria Vittorio Emanuele em Milão, construída em 1867. Os melhores estabelecimentos e restaurantes da cidade se encontram neste ambiente e não no centro da cidade. Lojas-âncoras como Neiman Marcus, Macy’s, Saks Fifth Avenue, Nordstrom, Tiffany & Co., Yves Saint Laurent, Ralph Lauren, Fendi, Gucci, Louis Vuitton, Valentino, Chanel, Prada, Miu Miu e Cartier, Juicy Couture e Abercrombie & Fitch, J. Crew, Gap e Banana Republic, Sony, Sephora, e lululemon athletica, Apple, Zara estão baseadas neste complexo.
O impacto destes enclaves comerciais são tão forte nos espaços públicos que nos horários de 12:00 as 13:00, horário de pico em grandes metrópoles como Boston e NY, as avenidas de Houston estão desertas, quase não há indivíduos caminhando pelas calçadas ou atravessando ruas, bem como o fluxo de carros é considerado baixo, ocorrendo a mesma situação no decorrer do dia, isso acontece pelo uso frenético desses enclaves, que somam 2,6 milhões de metros quadrados de espaços comerciais, onde oferecem todas as funções da cidade tradicional e geram uma urbanidade trancafiada distribuída pelo território (6)
O uso de veículos se torna imprescindível, uma vez que o deslocamento para os pontos de atração necessita este tipo de locomoção, alem do incentivo e facilidade ocasionado pela infraestrutura logísticas através de vastas autoestradas e avenidas, ou seja, uma dependência de veículos particulares. Este evento somado ao espraiamento dos volumes urbanos e a legislação vigente que prevê uma vaga para veiculo para casa posto de trabalho de um escritório e nos complexos maiores são exigidos 1,4m2 para cada 1m2 de laje para escritório construído, traz à tona a equação simples: alto numero de veiculo por habitante + baixo valor do solo = estacionamentos, nas áreas próximas ao centro se torna mais rentável manter áreas com estacionamentos, do que construir um edifício, já que a cidade esta descentralizada. Houston possui a media de 30 vagas para veículos por habitante, isso evidencia outro numero, a cidade dedica 50% do solo para os carros, considerando asfalto para o leito carroçável e estacionamentos. Carlos Garcia Vazquez nomeia este fenômeno como “anorexia urbana” onde a baixa densidade se torna uma epidemia das cidades nortes americanas, com ênfase nas cidades no cinturão do sol (7).
Considerações finais
Entende-se que sem prévios estudos de impactos, sem diretrizes suficientes de planejamento em nível municipal e metropolitano, e sem uma adequada coordenação do processo de implementação de grandes empreendimentos, podemos identificar o protagonismo do setor privado; determinando na maior parte dos casos os padrões dessa nova ocupação, suas configurações espaciais e seus fluxos, sem uma atuação firme do Estado no que se refere à ordenação e regulação deste meio. Esse tipo de ocupação, no qual nega a condição de cidade propriamente dita, dificultando a presença do transeunte, formando cenários socialmente segregados, gentrificando, com restrições de acessos, vão na contramão do pensamento de autores como Aldo Rossi (8), Jane Jacobs (9) e Kevin Lynch (10), os quais, embora tragam diferentes conceitos e análises, defendem todos em seus livros definições de cidade como ambientes de trocas sociais e de convivência coletiva, intensidade de experiências e identificação dos habitantes e usuários com o meio onde vivem.
Na afirmação de Harvey, a “mercadificação” do espaço, desencadeada pelo poder aquisitivo, onde se vende o espaço conforme a hierarquia social, de forma tangível, e onde o acesso é livre, desde que haja condições sociais do indivíduo para frequentar o espaço; ocorre na contramão de séculos de lutas sociais – que buscaram o desmantelamento da concentração de riquezas e a construção de maior igualdade social (11). É preciso dizer que esse processo ocorre por conta de demandas legitimadas pelas ideologias prevalentes na sociedade contemporânea, intimada a buscar segurança, comodidade e conforto, e acreditando encontrar esse refúgio no seio desta cidade-cenário, que gentrifica e silenciosamente escolhe seus frequentadores.
Considerando novas versões de usos que necessitam a cidade do século XXI, leva-se ao raciocínio que dependemos de uma nova política de ocupação das áreas residuais, ou rurais urbanas, bem como planos bem sucedidos de implementação do que se entende de uma nova forma urbana. levando em conta os espaços públicos de confrontação social.
notas
1
VÁZQUEZ, Carlos García. Antípolis: el desvanecimiento de lo urbano en el Cinturón de Sol.Barcelona, Gustavo Gili, 2011, p. 13.
2
FISHER, Robert. Urban Policy in Houston. Urban Studies, Vol. 26,Texas, 1989.
3
Idem, ibidem.
4
Idem, ibidem.
5
MUMFORD, Lewis. The case against modern architeture. The future of the cities.Washington, Architectural Record, 1962.
6
VÁZQUEZ, Carlos García. Op. cit., p. 130-131.
7
Idem, ibidem, p. 94.
8
ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. Tradução Eduardo Brandão. 2º edição. São Paulo, Martins Fontes. 2001.
9
JACOBS, Jane. Morte e vida das grandes cidades. São Paulo. Martins fontes. 2003.
10
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Tradução Jefferson Luiz Camargo. São Paulo, Martins Fontes, 1997.
11
HARVEY, David. Condição Pós-moderna. 22º edição. São Paulo, Editora Loyola, 2012, p. 218.
sobre o autor
Marcelo Galli Serra é Arquiteto e Urbanista formado pela Universidade Anhembi Morumbi; mestrando em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Sócio da aedifex projetos, escritório que atua com projetos e obras públicas, particulares e institucionais.