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my city ISSN 1982-9922

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O projeto de renovação urbana elaborado durante a X Bienal de Arquitetura e inspirado no projeto do Anhangabaú da Feliz Cidade de Lina Bo Bardi e Edson Elito propõe a criação de um novo espaço público para o bairro do Bixiga, em São Paulo.

how to quote

GALLMEISTER, Marília; MATZENBACHER, Carila. O talento cultural do Bixiga & o Anhangabaú da Feliz Cidade. Minha Cidade, São Paulo, ano 15, n. 180.05, Vitruvius, jul. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/15.180/5617>.


Vista do bairro a partir da escadaria do Bixiga
Foto Abilio Guerra


Um Bixiga de urgências

O bairro do Bixiga, antes possessão da escrava alforriada Libertas, aglutinou toda espécie de ocupação de insurgências: escravos fugidos criando quilombos – como o Saracura – e depois expulsos de suas terras para as cabeças de porcos dos porões das casas; imigrantes italianos calabreses trazendo suas artes e ofícios e seus saberes impregnados nos sobradinhos, hoje tombados (mais de 900 tombamentos de naturezas diferentes); nordestinos de todas as partes, gestando o que hoje é a vocação do bairro, a de Território de todas as Artes e da manifestação de todo poder humano.

Toda a singularidade e complexidade da formação/configuração do bairro do Bixiga não é levada em consideração no avanço predatório que a especulação imobiliária vem impondo ao bairro há algumas décadas – e mais violentamente nos dias de hoje. Os modelos de ocupações anárquicas, irregulares, e as atividades híbridas desenharam um bairro desconcertante e por isso muitas vezes de difícil leitura para os poderes públicos que hoje legislam para preservar sua configuração e a dinâmica da vida vivida ali.

O tecido urbano do Bixiga é cheio de “falhas”, porosidades, por conta do caráter provisório da urbanização italiana e do loteamento em “linguiça” (de 40m x 5m) que geravam sobras no interior das quadras. Estas sobras permitiam uma ocupação heterogênea de espaços compartilhados entre as casas, quase como uma copropriedade, e dos lotes compridos nasceram os cortiços labirínticos, alojando diversas famílias num mesmo lote, numa metástase de ocupações irregulares e ilegais, agregando todo tipo de gente à margem da centralidade de Sampã.

Vazios e equipamentos do Bixiga: 1) vazio próximo à rua Major Diogo; 2) terreno vizinho ao Teatro Oficina; 3) rua Santo Antônio; 4) praça Ítalo Bagnon; 5) rua Jaceguai; 6) praça Pérola Byington; 7) Casa de Dona Yayá; 8) Teatro Brasileiro de Comédia; 9) ga

Também os imigrantes artesãos passaram a trabalhar seus ofícios nas suas residências e esta combinação de residência-oficina gerou uma tipologia muito particular, e consolidou o Bixiga como bairro de pedestres, já que seus moradores não precisavam de transporte pra chegar ao trabalho.

Vias de pedestres

Seus sobrados e suas casas de baixo gabarito ainda permitindo que a visão alce voo para além dos lotes, e ainda seja permeável ao céu, suas ruas estreitas e sinuosas por causa do seu tecido urbano de diferentes qualidades topográficas não podem suportar o tráfego intenso demandado pelo processo de verticalização urbanisticamente irresponsável que se implanta hoje no Bixiga.

Construção do Elevado Costa e Silva, Minhocão, e impacto no Bixiga

Todo este DNA do Bixiga deve ser considerado para se estudar com rigor artístico os impactos das construções e intervenções que se pretende hoje ali. Toda a lógica ilógica de sua configuração histórica deve ser evocada para proteger o bairro da violenta descaracterização que o Bixiga sofre desde a implantação do Minhocão.

Anhangabaú da Feliz Cidade

O Anhangabaú da Feliz Cidade nasceu quando Lina Bo Bardi e Edson Elito criaram, no único terreno vago no entorno do Teat(r)o Oficina, a construção de um Teatro de Estádio, que fazia a conexão do Oficina com o Vale do Anhangabaú (durante a década de 1980). Aliás, o nome Anhangabaú da Feliz Cidade foi criado pela própria Lina numa referência direta ao baú da felicidade de Silvio Santos. Em 1996 Paulo Mendes da Rocha faz um novo estudo, extrapolando os limites do terreno e alcançando com seu projeto os baixios fronteiriços ao teatro e ao terreno, sendo o primeiro a apontar uma aproximação do projeto com o Bixiga. Desde então muitos estudantes de graduação e pós, nacionais e internacionais, tem feito do projeto matéria de suas teses. E em 2013, durante a X Bienal de Arquitetura, o projeto do Anhangabaú da Feliz Cidade foi re-significado, num núcleo chamado Módulos de Colaborar, em que o super objetivo foi a continuação da elaboração deste projeto.

Explosão do programa

O núcleo formou-se por um coro de arquitetos que trabalharam o dia a dia da residência (Carila Matzenbacher e Marília Gallmeister, arquitetos e urbanistas da Associação Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona; Jonas Knapen e Jeroen Stevens, urbanistas pesquisadores da Universidade KULeuven, Bélgica; Carlos Teixeira e Daila Araujo, arquitetos e urbanistas do estúdio Vazio S/A, de Belo Horizonte, MG; o coletivo de arquitetura e urbanismo Supersudaca, América Latina) e um coro de técnicos antropófagos (a Associação Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona e atuadores do bairro do Bixiga, como Casa de Dona Yayá, Associação Rede Bela Vista, Bexiga 70, Mundo Pensante, Grupo de Teatro Narradores e moradores das imediações). Além desses, a participação de arquitetos convidados: Guilherme Wisnik, Edson Elito, Pedro Arantes, José Lira, ex-diretor da Casa de Dona Yayá, e Dulcilei de Souza Cipriano, representante do Departamento de Patrimônio Histórico da Prefeitura de São Paulo.

Vale do Anhangabaú: mapa do projeto geral de ocupação

A elaboração do novo projeto caminhou na direção dos “diálogos” já iniciados entre Lina Bo Bardi, Edson Elito e Paulo Mendes da Rocha, os estudantes e o bairro do Bixiga. Sobretudo Lina, cuja abertura concreta de trocas de substâncias entre o teatro e o bairro começou durante a criação da peça Na Selva das Cidades, em 1968, e influiu na permeabilidade radical do espaço cênico atual do Teat(r)o Oficina com o bairro do Bixiga, quando usou as substâncias resultantes das demolições do bairro para a construção do minhocão (ligação Leste-Oeste) para compor a cena. Esta relação entre o Teat(r)o Oficina e o bairro do Bixiga existiu desde 1958, quando a companhia começou a ocupar o endereço 520 da Rua Jaceguai, há 57 anos.

Vale do Anhangabaú: perspectiva e esquemas do projeto geral de ocupação

Numa incorporação múltipla das propostas arquitetônicas e urbanísticas anteriores, do anárquico processo de consolidação do bairro e do Bixiga contemporâneo, o novo projeto, desenvolvido durante a X Bienal, explode os limites físicos do terreno do entorno ao Teatro, agregando a este terreno os baixios do Minhocão (ligação Leste-Oeste), vazios urbanos e imóveis desocupados ao longo do viaduto, e gerando uma re-conexão do bairro através de um Corredor Cultural: o Anhangabaú da Feliz Cidade, seu Teatro de Estádio e sua Universidade Antropófaga, além do verde da Oficina de Floresta.

A explosão deste programa junto a equipamentos existentes como o TBC – Teatro Brasileiro de Comédia e a Casa de Dona Yayá inventa o novo Bixiga na escala de seus moradores, passando também, o terreno do entorno do Oficina, a integrar livremente o bairro, permeável, por meio de novos acessos que farão dele um espaço aberto, público.

Estrutura verde

Para além da re-conexão do bairro, o Corredor Cultural se liga ao centro da cidade, à Praça Roosevelt e ao Parque Augusta, através de caminhos de pedestres, ciclovias e do verde, devolvendo esta conexão existente para os pedestres – já que o Minhocão foi criado durante a ditadura, para os carros.

O projeto elaborado durante a X Bienal de Arquitetura e inspirado no projeto do Anhangabaú da Feliz Cidade de Lina Bo Bardi e Edson Elito propõe a criação de um novo espaço público onde as pessoas contracenam suas diferenças, um território de manifestação da diversidade de comportamento, pensamento e estética. Um espaço pra ser experimentado e apropriado considerando esta complexidade, sem cair num modelo homogêneo de ocupação dos espaços públicos, como os que se multiplicam em São Paulo e que acabam sendo apropriados da mesma forma: uma somatória de atividades diferentes e comportamentos iguais.

Este projeto de criação e transformação permanente é um novo tempo de uma bola lançada por Lina e Edson, e o embrião de um Urbanismo Antropófago, uma proposta pra além dos lotes e quadras e dos abstratos limites riscados um dia na cidade de Sampã.

Anhangabaú da Feliz Cidade: mapa geral da ocupação

sobre as autoras

Marília Gallmeister e Carila Matzenbacher são arquitetas cênicas.

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