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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
Praia de Iacanga, referência de lazer e diversão por muitos anos, hoje em dia é referência apenas de abandono e sujeira. Para tentar entender a situação foram feitas entrevistas com diversos moradores da cidade, inclusive um vereador.

english
Iacanga's beach used to be a reference of recreation and fun for many years, nowadays it is reference only of abandonment and dirt. To try to understand the situation, interviews were made with several residents of the city, including an councilman.

español
La playa de Iacanga, referencia de ocio y diversión por muchos años, hoy día es recordada solamente por su abandono y suciedad. Para intentar entender la situación fueron hechas entrevistas con diversos habitantes de la ciudad.

how to quote

PREVIERO, Eduarda de Mattos. O declínio da Praia de Iacanga. Minha Cidade, São Paulo, ano 18, n. 207.02, Vitruvius, out. 2017 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/18.207/6737>.


Praia de Iacanga, 1977
Foto de Dorival Ferreira de Campos


Crescemos ouvindo histórias das mais diversas, sejam elas de livros infantis lidos por nossos pais antes de irmos dormir, contos de terror contados pelos amiguinhos de escola, memórias da infância de nossos avós, como nossos pais se conheceram e suas aventuras na juventude. Algumas delas esquecemos com o tempo, outras guardamos para a vida. Seja para contarmos também para nossos filhos, para nunca esquecermos a lição daquela história ou porque simplesmente ficamos intrigados com o que nos foi contado. Comigo não foi diferente: cresci ouvindo sobre as aventuras de meus pais e tios no pequeno município de Iacanga, a 385 km de São Paulo, onde eles cresceram, como aos finais de semana eles iam acampar com os amigos, faziam piqueniques ou iam para a prainha da cidade andar de caiaque, windsurf e brincar no toboágua. O que sempre me intrigou sobre essas histórias é que também passei a maior parte de meus finais de semana na cidade de Iacanga onde até hoje moram meus avós e tios, mas nunca cheguei a fazer o que eles faziam. As memórias que tenho são de um lugar sem muitas pessoas, sem muitos atrativos e sem infraestrutura. Nunca entendi porque o local que antes era o destino de fim de semana para meus pais, tios e avós, se tornou para mim apenas um lugar de histórias.

A curiosidade e vontade de entender o que aconteceu e quando a característica da cidade e da prainha mudou tão drasticamente me levou a entrevistar vários moradores, ouvir suas histórias, suas opiniões e tentar montar uma linha do tempo para esclarecer o declínio do local.

A história começa em 1970, na gestão do prefeito Anselmo Abdalla (gestão de 1969-1972) que incentivou e apoiou a criação da prainha. Até então a área era apenas um terreno íngreme limitado em duas laterais pela junção do Córrego do Areião e o Rio Ribeirão Claro. Nessa época estava sendo feito o represamento da Usina de Ibitinga, e o prefeito Anselmo resolveu ajudar fazendo doação da terra daquele terreno onde o Córrego e o Rio se encontram. A doação acabou gerando um vão no local e o represamento fez com o que leito do rio aumentasse. Então o prefeito pediu para que caminhoneiros trouxessem areia para a área e assim começou a se formar a prainha de Iacanga.

Vista aérea de Iacanga no começo dos anos 2000 (marcações realizadas pela autora)
Foto divulgação [Acervo de Paulo Roberto Paleari]

Para evitar problemas de desmoronamento e facilitar o acesso à área, o prefeito mandou fazer um muro de gabião de um lado para segurar a terra e uma grande escadaria do outro lado para passagem dos banhistas. Com a estrutura já pronta, a área foi arborizada, foram feitos quiosques de sapé para lazer e começaram a acontecer competições de pesca e pedalinho.

Praia de Iacanga, 1977
Foto de Dorival Ferreira de Campos

Quem conta essa história é Célio Abdalla, filho do ex-prefeito Anselmo Abdalla, que diz que a praia recebia inclusive visitas de cidades vizinhas. Essa popularidade, no entanto, não se manteve com os demais prefeitos devido a falta de incentivo e manutenção.

Foi na administração do prefeito Orlando Castro (1983-1989) que a Praia voltou a receber atenção, passou por muitas melhorias, se desenvolveu e teve seus anos de glória. A instalação do Camping para 150 barracas, com estrutura completa de água, luz e banheiros, fez muita diferença para a popularidade da praia e acabou trazendo locais e pessoas de fora para passar seus finais de semana acampando na área. As melhorias feitas por Orlando Castro também contavam com um toboágua de 6 metros de altura e um bar na divisa entre a área de camping e da praia e atendia aos dois lados. Junto às melhorias físicas no lugar foram implementados campeonatos de windsurf, caiaque e barco a vela que se tornaram muito populares e atraiam muita gente. A Federação Náutica chegou a comparecer para uma das competições e fazer seus shows.

Praia de Iacanga durante a gestão de Orlando Castro
Foto Dorival Ferreira de Campos


A presença de bandas da região fazendo shows de graça no palco que havia na praia se tornou constante com o grande movimento que o local atraia. De acordo com os moradores, quando não havia competições os grupos de amigos arranjavam um jeito de brincar fazendo disputas de natação entre eles.

A escola municipal também fez muitos eventos na praia a incentivo e direção da professora de história Lídia Possas (1). No período em que deu aula no município de Iacanga à professora Lídia promoveu as festas das nações e do folclore engajando toda a população e deixando lembranças até hoje naqueles que participaram.

Foi nessa época que as histórias foram feitas, as fotos foram tiradas e é para lá que a memória vai quando habitantes querem relembrar seus bons momentos de juventude. Mas o que aconteceu? Como que a prainha foi de toda sua glória para a situação atual, abandonada e sem a vida de outrora?

Praia de Iacanga durante a gestão de Orlando Castro
Foto João Natal Previero Filho

Após o mandato de Orlado Castro a prainha deixou de ser prioridade e foi sendo cada vez mais abandonada; os prefeitos davam uma manutenção básica, mas nunca mais houve o mesmo incentivo no local. Isso fez com que o movimento fosse caindo cada vez mais. Então na primeira gestão de Durvalino Afonso Ribeiro (1997-2000 e 2001-04) foi decidido retirar toda a estrutura existente, desmontando o camping e retirando o tobogã. Com essa atitude o destino da prainha, que era chamada de Praia das Palmeiras, foi traçado. A preservação do local deixou de ser uma preocupação por parte dos políticos da cidade e hoje em dia nem palmeiras existem mais no lugar.

Durante os dois mandatos de Durvalino a cidade realmente não teve investimentos em um lugar de convivência dos cidadãos. O prefeito investiu em playground para crianças, mas a infraestrutura não atendia às demais idades. A alternativa de recreação era se locomover a cidades vizinhas. O prefeito Ismael Boiani (2005-08 e 2009-12), sucessor de Durvalino, investiu na construção de um lago próximo à prainha, com playground, academia ao ar livre, caminhos para passear e com o Aquário Escola de Iacanga que tem peixes nativos do Córrego do Areião e do Rio Tietê. Apesar de a população ter desfrutado desta infraestrutura, a praia, o antigo símbolo da cidade foi mantida no esquecimento.

Praia de Iacanga, situação atual, abril de 2017
Foto Eduarda de Mattos Previero

Na tentativa de entender o posicionamento dos políticos da cidade em relação a Praia das Palmeiras entrevistei o vereador Dorival Ferreira de Campos Filho e o questionei quanto a existência de um projeto de revitalização para a área. O vereador foi muito honesto e aberto ao se tratar do assunto, falou que já existe um projeto de revitalização, que já foi feitou um pedido para o Ministério do Turismo em Brasília para a liberação da verba para a implantação do projeto, mas ainda não houve resposta. De acordo com Dorival essa solicitação foi reativada pelo atual prefeito Boiani (gestão 2017-20), pois o primeiro pedido já havia expirado.

O município de Iacanga também está inscrito no projeto estadual Município de Interesse Turístico – MIT, apoiado pela lei complementar no1.261 de 29 de abril de 2015. A nova lei estadual cria 140 vagas para cidades de interesse turístico que poderão se tornar Estâncias Turísticas e receber verba do Fundo de Melhoria dos Municípios Turísticos, administrado pelo Departamento de Apoio as Estâncias – DADE. De acordo com o vereador Dorival, a cidade de Iacanga atende a todos os requisitos necessários para concorrer aos recursos e se tornar uma Estância Turística do estado, ele menciona ainda que Iacanga está entre os 20 primeiros municípios que devem ser beneficiados pela lei.

Após entrevistas e a análise do contexto, pudemos perceber que os maiores influentes para a valorização ou desvalorização dos espaços, para o uso e incentivo ou desuso e abandono da prainha são as pessoas, especificamente as que tem poder e capacidade de fazer algo a respeito, como os políticos da cidade. Fica na mão das pessoas proativas da sociedade e com influência politica tomar uma atitude e mudar a situação da Praia das Palmeiras. Para aqueles de nós que querem ver a prainha revitalizada e movimentada novamente, mas não tem o que fazer quanto a isso, nos resta torcer para que os projetos existentes sejam executados.

Lago Municipal José Seghmatz, abril de 2017
Foto de Eduarda de Mattos Previero

notas

1
A professora Lídia Maria Vianna Possas é livre docente em História, Relações de Gênero e Feminismos na América Latina. Atualmente é professora assistente doutora da Unesp.

sobre a autora

Eduarda de Mattos Previero é arquiteta (Universidade do Sagrado Coração, 2015) e cursa MBA em Gestão de Projetos pelo Centro Universitário Internacional (UNINTER).

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