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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
O texto em questão pretende discutir o esquecimento e a desvalorização da produção arquitetônica da virada do século 19 para o 20. O intuito é pensar sobre os escassos fragmentos Art Nouveau na cidade de São Paulo.

english
This article intends to discuss the forgetfulness and devaluing of architectural production from the end of the 19th to the rising of the 20th century. The goal is to discuss the few Art Nouveau fragments in the city of São Paulo.

español
El texto en cuestión pretende discutir el olvido y la desvalorización de la producción arquitectónica de finales del siglo XIX al XX. El objetivo es pensar en los pocos fragmentos Art Nouveau de la ciudad de São Paulo.

how to quote

SALDANHA, Daniela Costa Dornfeld. Memórias da Belle Époque paulistana. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 255.01, Vitruvius, out. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/22.255/8283>.


Palacete na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, o “Castelinho da Brigadeiro”, Bela Vista, São Paulo
Foto Dornicke [Wikimedia Commons]


Se atualmente muitos paulistanos não reconhecem a produção arquitetônica da passagem do século 19 para o 20, não é mero desinteresse. São mesmo raros os exemplares em estilo Art Nouveau na cidade, porque até a década de 1960 foram classificados como cópia de uma determinada produção europeia e longe de integrarem a identidade nacional.

A historiografia desprezou o assunto por décadas. Foi o arquiteto Flávio Motta, que em 1957, contrariando a todos, escreveu sua tese na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, Contribuição ao estudo do Art Nouveau no Brasil (1). Muitos não entenderam para que falar dessas “bobagens”. Já nos manuais de arquitetura do século 20, encontramos sempre um pequeno trecho sobre o assunto, um resumo de todo o contexto mundial, citado como um período de transição, um destacando sua efemeridade e sua ênfase na criatividade individual, em detrimento a um pretenso movimento coletivo. Poucos autores não reclamam sobre a dificuldade de dar uma ordem satisfatória ao tema, como Leonardo Benevolo, em História da arquitetura moderna, em 1976 (2). Sabemos que a maioria das publicações qualificaram o neocolonial e o modernismo como protagonistas na construção da identidade nacional, principalmente após a criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Sphan, atual Iphan, em 1937.

No esforço ativo de resgatar a memória dessa produção, criar um roteiro Art Nouveau pela cidade de São Paulo pode ser uma tarefa difícil. Lembraremos logo da Vila Penteado (1902-1903), mesmo que hoje sua disposição não nos permita conhecer a verdadeira “villa” italiana, do palacete no centro do lote e as novas concepções dos jardins da “Bela Época” (3). O que restou foi um lote retalhado em meio ao caos do crescimento da cidade.

Vila Penteado, atual FAU Maranhão
Foto Ana Fidelis [Wikimedia Commons]

Podemos somar a ela alguns “sobreviventes” da especulação imobiliária: o Castelinho da Brigadeiro (1907-1912), o Colégio Santa Inês (1907), o Edifício Guinle (1913), uma residência na Martinico Prado ou o Viaduto Santa Ifigênia (1913), algumas casas na Maestro Cardim, a Escola de Comércio Álvares Penteado... pouco.

Se nos esforçarmos muito, incluiremos apenas fragmentos de construções e outras artes, já que o movimento era a comuna de todos os ofícios e, por esse motivo, não deveríamos pensar só na arquitetura propriamente dita. Então o portão na Rua Vitória, porque o resto mesmo tombado pelo patrimônio desapareceu criminosamente em um feriado. Ou então os detalhes ornamentais do Theatro São Pedro (1917), as pinturas decorativas da Casa da Dona Yayá (CPC-USP), o vitral do CCBB, a Selvagem de Nicolina Vaz de Assis Pinto do Couto de 1905, no Cemitério da Consolação, o quadro O Vestido Estampado de Edouard Vuillard no Masp, trechos das revistas Kosmos, Fonfon e O Piralho no IEB. Mas ainda é pouco.

Viaduto Santa Ifigênia, Vale do Anhangabau, São Paulo
Foto Wilfredor [Wikimedia Commons]

Parece-nos a priori que o período entre 1890 e 1914 deveria então ser ativamente esquecido, quando nada do que se produziu foi brasileiro. Mas foi nesse momento em que se buscava novos meios de expressão pela arquitetura, adequados aos novos tempos, em consonância com as potencialidades das inovações tecnológicas, como as estruturas metálicas ou o concreto armado. A taipa foi pouco a pouco substituída por tijolos. Novos elementos decorativos foram empregados, graças ao conhecimento técnico da nova mão-de-obra, que vinha também do continente europeu para substituir a mão-de-obra escrava recém abolida, transformando as residências da elite cafeicultora da época.

Entretanto, o cansaço do Ecletismo, a vontade de criar algo novo, totalmente desvinculado do modelo europeu fez com que toda a produção da virada do século fosse colocada em uma mesma categoria: réplica dos modelos e alheia à construção de uma identidade nacional. Igualmente, o Movimento Moderno defendeu a substituição dessas edificações por modelos pouco ornamentados, em busca da tão sonhada racionalidade, tratou de classificar essa produção como excessiva em ornamentos e importada, sem a nossa personalidade.

“O Selvagem”, de Nicolina Vaz de Assis Pinto do Couto, quadra 36 do Cemitério da Consolação, São Paulo
Foto João Pedro Romani [Wikimedia Commons]

Mas os resquícios desse modus operandi construtivo perdurou. As novas técnicas construtivas propagaram-se, pela nova mão-de-obra, pelos mestres que estudavam na Europa e pelo Liceu de Artes e Ofícios. Mesmo hoje, encontramos em passeios pelo centro, gradis de sobrados com motivos do Art Nouveau, estuques em gesso das novas interpretações para os motivos decorativos. Os motivos vegetais que eram tema frequente, na Europa, a folha de carvalho, por exemplo, aqui foi substituída pela folha de café, nosso produto agrícola que era exportado. Era a personalidade dos nossos artesãos, sua criatividade, nossa identidade. Sabemos que a própria produção mundial por trás da busca de um “estilo” novo, na verdade, tentava de afirmação de hegemonia de alguns países. Com essas folhas de café mostrávamos nosso poder econômico.

Passamos a estudar esse período com ressalvas, entendê-lo como uma transição para o Modernismo, somente quando surgiria uma Arquitetura verdadeiramente brasileira, fora a neocolonial. Sejam quais foram os ensinamentos técnicos, construtivos, ornamentais, estéticos, de uma história que conta também a imigração, muitos deles foram apagados e ativamente esquecidos. Talvez porque essa produção arquitetônica não poderia ser classificada por um rótulo único, por abrigar produções tão variadas (4).

Casa de Dona Yayá, Bela Vista, São Paulo
Foto Ana Sieds [Wikimedia Commons]

notas

1
MOTTA, Flavio. Contribuição ao estudo do Art Nouveau no Brasil. Tese de cátedra. São Paulo, FAU USP, 1957.

2
BENEVOLO, Leonardo. História da arquitetura moderna. São Paulo, Perspectiva, 2001.

3
Ver: TOLEDO, Benedito Lima de. Vila Penteado: registros. São Paulo, FAU USP, 2002.

4
Outros títulos consultados: BRUAND, Yves. Arquitetura Contemporânea no Brasil. Tradução Ana M. Goldberger. 5a edição. São Paulo, Perspectiva, 2010, p. 44-52; GIEDION, Sigfried. Espaço, tempo e arquitetura: o desenvolvimento de uma nova tradição. Tradução Alvamar Lamparelli. São Paulo, Martins Fontes, 2004; RICOUER, Paul. A memória, a história e o esquecimento. Tradução Alain François. Campinas, Editora Unicamp, 2007; SALDANHA, Daniela Costa Dornfeld. Vila Penteado: estudo e análise iconográfica dos seus desenhos ornamentais. Orientador Luiz Munari. Dissertação de mestrado. São Paulo, FAU USP, 2017.

sobre a autora

Daniela Costa Dornfeld Saldanha é arquiteta (Faap, 2000), mestre e doutoranda (FAU USP) e docente em História da Arquitetura e Urbanismo. Fez o curso de Civilização Francesa na Universidade Paris Sorbonne (2010), foi estagiária em conservação no Museu D'Orsay no setor de curadoria em Arquitetura e Paisagem, no Gabinete de Artes Gráficas e Fotográficas, e foi selecionada a participar do programa Seminário Internacional em Museologia e Estágio em Museus Franceses, parceria da École du Louvre e do Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), com bolsa de intercâmbio da Capes (ago./dez. 2016).

05. Casa de Dona Yayá, Bela Vista, São Paulo
Foto Ana Sieds
Wikimedia Commons

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