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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
Este trabalho tem por objetivo apresentar a história da Capela São Judas Tadeu. Unir informações, antes perdidas e permitir a reflexão de como diversos espaços podem ser compreendidos e reinseridos no cotidiano.

english
This present study aims to analyze the new meaning of the Chapel São Judas Tadeu. Garther information, previously lost and allowing a reflection on how these spaces in the city can be recognize and reinsert in its daily life.

español
Este trabajo tiene como objetivo el nuevo significado de la Capilla San Judas Tadeo. Unir informaciones, antes perdidas, y permitir la reflexión sobre como espacios olvidados de la ciudad pueden ser reinsertados y reconocidos en su cotidiano.

how to quote

ZEMANTAUSKAS, Ana Paula de Moraes; SILVA, Leandro Alexandre dos Santos; SOUSA, Mariana Cerqueira de; MUNERATO, Victória Mantas. Capela São Judas Tadeu. Um registro de sua história. Minha Cidade, São Paulo, ano 22, n. 255.02, Vitruvius, out. 2021 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/22.255/8284>.


Capela São Judas Tadeu e pátio
Foto Mariana Cerqueira, 2019


A Vila Olímpia é um dos bairros que mais passou por transformação nas últimas décadas em São Paulo, resultado dos planos urbanísticos, como a Operação Urbana Consorciada Águas Espraiadas que atraiu grande desenvolvimento econômico na região, que hoje sedia importantes empresas multinacionais.

Antes, como área residual resultante da retificação do Rio Pinheiros, atraiu favelas nas porções alagadiças, chácaras e vilas nas regiões mais altas.

Na década de 1930, a cidade de São Paulo passava por intensas transformações. Sob o governo de Getúlio Vargas, movimentos artísticos e ações sindicalistas ganham força, possibilitando a conquista de direitos trabalhistas, dentre os quais a aposentadoria para os artistas. Nesse contexto que, durante o século 20 foi construída a Vila dos Artistas (1), equipamento que deu nome a Rua Casa do Ator (2), um lugar dedicado a receber artistas idosos na região da Vila Olímpia, popularmente nomeada pelos antigos moradores por conta do poder de transformação que o bairro ganhou através da presença da vila, a qual incluía as pequenas edificações, uma das quais a Capela São Judas Tadeu, construída em 1943 como a única edificação de cunho religioso que compunha a Vila e hoje único remanescente das antigas edificações, um verdadeiro tesouro perdido ao longo tempo na memória do antigo bairro e do equipamento que ali existia.

Observando mapas históricos da Cidade de São Paulo, como o Vasp Cruzeiro, de 1954 (3), é possível observar a peculiaridade da região, com edificações dispersas, vilas e alguns equipamentos de maior porte. A Rua Casa do Ator liga a Avenida Santo Amaro à Rua Olimpíadas, sendo paralela às Ruas Gomes Carvalho e Quatá. Dentre os terrenos localizados, vemos o da Vila dos Artistas, cercado de alguns equipamentos de maior porte e outras pequenas residências. No terreno vemos duas edificações ao fundo uma das quais, a Capela.

Mapa da Vila Olímpia
Vasp Cruzeiro, 1954 [Geosampa, 2020]

Com a transformação do bairro a partir do início do século 21, as edificações e chácaras cederam lugar a grandes empreendimentos, dentre edifícios corporativos até residenciais de médio e alto padrão, dando-se de forma mais intensa nas porções mais baixas do bairro e refletindo-se também ao longo de todo o eixo da Avenida Santo Amaro, como limite do bairro. Nessa ocasião, em 1999, o terreno da Vila dos Artistas foi comprado e, por projeto de Francisco Petracco (4), construíram-se os edifícios institucionais que viriam a acolher o programa da Universidade Anhembi Morumbi.

Com capacidade para 24 pessoas sentadas, a Capela foi quase destruída durante as escavações do subsolo. Durante essa etapa, o desejo de permanência da Capela foi expressado por Gláucia Rodrigues, filha de Gabriel Rodrigues, reitor da Universidade Anhembi Morumbi à época, na qual optou por contratar Dorothy Lenner para reformar a capela durante esse período, como uma forma de “preservação” da memória do bairro e do equipamento que ali existia. De acordo com o então reitor, o espaço simbolizaria paz e boas vibrações na concepção do novo espaço universitário.

A Capela, doação da atriz e cantora carioca Otília Amorim, que dedicou uma parte de sua trajetória profissional ao circo, representa então a consciência sobre esse valor da edificação entendido por esses personagens, no contexto de um bairro que protagoniza grandes transformações na história recente da cidade de São Paulo. A atriz também ofereceu ao Retiro dos Atores a escultura de São Judas Tadeu, patrono das causas desesperadas, que tornou-se padroeiro da Capela.


Vídeo “Visita on-line: Capela de São Judas”, pesquisa, desenvolvimento e gravação de Ana Paula de Moraes Zemantauskas, Leandro Alexandre dos Santos Silva, Mariana Cerqueira de Sousa, Priscila Marinho e Victória Mantas Munerato, Jornada do Patrimônio 2021

Atualmente, a edificação localiza-se ao fundo do Campus da Universidade Anhembi Morumbi na Vila Olímpia, embora presente apenas após as escavações, os acessos definidos em fase projetual, em que determinaram a circulação de alunos e funcionários, os fluxos e trajetos não potencializam a figura da Capela no contexto em que está inserida, por isso sua imagem e memória passa despercebida pela maioria dos usuários do Campus.

Os edifícios da Universidade, separados pela Rua Casa do Ator, complementam-se pelo térreo livre em comum, dessa forma, o tráfego calmo da via é intercalado por períodos de intensa circulação de alunos entre os edifícios que ficam frente a frente. Da calçada, os níveis do térreo são acessados por pedestres através de escadarias e rampas. A calçada larga de pedra portuguesa adentra o térreo livre de um dos edifícios da Universidade e, continuado através do piso de granilite, leva o transeunte desde às catracas diretamente à Capela.

Capela São Judas Tadeu e Edifício da Unidade 6
Foto Mariana Cerqueira, 2019

O Edifício da Unidade 6 construído no mesmo terreno da Capela, é um prédio imponente de 4 andares. A estrutura metálica junto às vedações de vidro cria a primeira fonte de atenção de quem ali usufrui ou passa pelo espaço. Diferente da Capela que, apesar da localização, não é destaque na paisagem sendo, por muitas vezes, desconhecida dos frequentadores do edifício principal. A fachada simples é composta por um arco e alguns relevos em volta da entrada, ligados a parte superior, onde encontra-se uma espécie de frontão ornamentado com formas côncavas, encabeçado por uma cruz no topo. A edificação, de cor alaranjada, possui acesso através da porta em madeira com um portão externo de ferro. O lado direito da Capela é composto por um vitral e uma janela em arco. A lateral esquerda segue a mesma linguagem de modo espelhado. Anexa a construção original, existe uma estrutura de madeira que abriga a imagem de São Judas Tadeu sob o telhado cerâmico.

A parte interna compõe um espaço para 24 lugares, cheio de elementos decorativos, podendo-se observar acima do altar a presença a tesoura e toda a estrutura em madeira que apoia o telhado de telhas portuguesas. Parte das paredes possui acabamento, na parte os tijolos de barro ficam aparentes. Há detalhes e imagens pintadas nos níveis acima das entradas como uma moldura que envolve todo o contorno interno da Capela. Algumas desses elementos incluídos ao longo dos anos, principalmente a partir de 1999, na reforma em que Dorothy Lenner foi responsável (5).

Uma ação de educação patrimonial torna-se essencial a partir do momento em que há uma barreira para quem frequenta o local quanto a compreensão da memória que Capela é testemunha. Essa falta de compreensão é potencializada pelo desenho do espaço, de forma que, por mais que muitos convivem diariamente próxima a Capela, poucos a veem efetivamente. Ao serem questionados sobre sua existência, tanto professores, alunos, funcionários como ex-alunos, poucos sabem da sua localização no terreno, apesar de ser próxima ao acesso principal. Tal desconhecimento pode coloca em vulnerabilidade a preservação e permanência da pequena edificação no terreno, mas pode ser minimizado pela educação patrimonial, o qual significaria o local a fim de resgatando sua memória.

A falta de informações e registros da Capela São Judas Tadeu de forma documentada, tornou uma barreira a realização da pesquisa em campo. Sendo assim, se fez necessária a busca por pessoas que fizeram parte da história do local e que pudessem fornecer informações sobre como o espaço se modificou ao longo do tempo e como se adequou às novas necessidades do território. Dessa forma, tornou-se crucial realizar entrevistas e buscar por relatos que envolvessem a história da edificação, da Vila dos Artistas e do bairro. Graças a esse processo, diversas peças do “quebra-cabeça” foram encontradas a fim de preencher as lacunas da história desta Capela, a qual trata-se de uma das muitas que existiram em São Paulo, mas uma das poucas que sobreviveram para e revelar, por meio de detalhes, a formação da cidade.

Em um dos relatos, Gilberto Nascimento, ex-eleitor da Universidade Anhembi Morumbi, diz que a Capela, assim como todo o conjunto de casas da Vila dos Atores, não podia ser avistada da rua por haver um muro alto na frente na época essa em que o prédio da Universidade ainda não existia.

E em entrevista com Dorothy Lenner (6), responsável pela reforma realizada em 1999, foi possível compreender como o processo de reforma da Capela se deu. Antes da reforma, Dorothy, apesar de ter uma carreira no Teatro e como professora, também já havia trabalhado em Serra Negra com decoração de sítios, chácaras e casas de campo. Ela conhecia a Capela São Judas Tadeu apenas de quando visitava a rua Casa do Ator, onde a Capela seria o único remanescente da Vila de Artistas.

Aos 88 anos, Dorothy relatou que sua experiência com a reforma durou cerca de sete a oito meses. Ela conta que apenas os bancos e a estrutura da Capela São Judas Tadeu são originais, uma vez que a própria Capela era anexa às casas adjacentes. A princípio os bancos eram muito escuros, e ela optou por deixá-los no tom natural da madeira. Segundo ela, não usou nenhuma referência projetual, apenas pedia “conselhos à Deus”: “Eu me sentava lá na frente da Capela, com as portas abertas e olhava pra lá, me sentava e rezava e pedia: Deus, me inspira, que que eu faço? E assim, parecia uma voz que me dizia: Você tem que trocar isso…

A cobertura da Capela precisou ser trocada e refeita, porque estava com cupim e chovia no interior da edificação. Ao ser refeita, foram colocados uma pátina e um produto para prevenir de futuras patologias no telhado. Próximo à área do altar, que era muito escuro, foram colocadas telhas de vidro para entrada de sol e luz. Como também não haviam janelas, foram colocados dois vitrais de cada lado da Capela, dois deles foram comprados pela Dorothy anos antes após terem sido retirados de uma casa que fora demolida.

A porta de entrada original sólida e ficava fechada a maior parte do tempo (por motivos de segurança), não permitindo que se olhasse para o interior, por isso foi retirada e guardada para ser substituída por uma porta com grades de ferro, assim permitindo a visão para o interior da Capela, mesmo quando fechada.

Na parte do altar, dentro da Capela, onde estavam localizados os santos, havia apenas uma mesa de cimento com uma tábua comprida de pedra que foi substituído na reforma por um novo altar, com espaço para deixar as hóstias e os santos, os quais foram comprados por Dorothy em um antiquário. O piso foi refeito, não foi possível se conservar os ladrilhos, e como as paredes eram escuras, em tons preto e verde escuro, foi necessário pintá-las com cores mais claras, branco e azul claro. Os desenhos superiores no interior da Capela, foram feitos a convite de Dorothy pela artista Paola Caires, a qual deu continuidade para as pinturas que já existiam e foram limpas durante a reforma.

A Capela São Judas Tadeu, trata-se então de um dos mais antigos registros de uma Vila Olímpia e de um equipamento que já não existem mais, por isso constitui uma memória essencial de ser lembrada e preservada no contexto da Universidade, do bairro e da cidade.

Todos estes detalhes, são derivados de uma proposta de ação patrimonial (7), a fim de mostrar a importância de preservar, restaurar, e também manter a história ativa nas constantes transformações que movem não só a cidade, mas as pessoas que a compõem, essas essenciais para o resgate da importância desses pequenos ícones arquitetônicos que caem em esquecimento, embora tenham feito parte de formações em diversas escalas. A Capela São Judas Tadeu, mantida durante a construção da universidade, foi inserida novamente no contexto ao optar pela preservação de um item do bairro, mas que ao mesmo tempo, presente na rotina de milhares de pessoas, passa despercebida por elas, mesmo sendo um dos mais antigos registros da Vila Olímpia, constitui uma memória essencial de ser lembrada e preservada no contexto da Universidade, do bairro e da cidade.

notas

1
MARQUES, Fabíola Marialva. Design em diálogo no espaço universitário: a memória do Edifício Theatro Casa do Ator, o Prédio de Vidro. São Paulo, Universidade Anhembi Morumbi, 2011 <https://bit.ly/3BwOToP>.

2
CLT – COORDENAÇÃO DE DENOMINAÇÃO DE LOGRADOUROS E PRÓPRIOS MUNICIPAIS. Verberte Rua Casa do Ator. In Dicionário de Ruas. São Paulo, Prefeitura do Município de São Paulo, 2003 <https://bit.ly/3mHL3TJ>.

3
GEOSAMPA, 2020

4
Francisco Lucio Mario Petracco é um arquiteto brasileiro formado pela FAU-Mackenzie em 1959, com Doutorado pela FAU-USP em 2004. Criou e coordenou o Curso de Arquitetura da Universidade Anhembi Morumbi e participou de importantes projetos, como os edifícios das unidades 5, 6 e 7 da Universidade Anhembi Morumbi e o Clube XV, em Santos, projetado com Pedro Paulo de Melo Saraiva.

5
Dorothy nasceu em 2 de abril de 1932 em Bucareste, capital da Romênia. Porém, por conta da invasão de Hitler à Polônia em 1939, ela, na época com sete anos, e sua mãe, decidiram ir para a Buenos Aires, onde viveu 14 anos, lá sempre teve muito contato com dança e teatro. Ao fixar-se em São Paulo, trabalhou com Alfredo Mesquita, Eugênio Kusnet, Sábato Magaldi e Antunes Filho, além de ter sido discípula de Takao Kusuno, um dos precursores do Butô no Brasil. Se formou em artes cênicas em 1958 na Universidade de São Paulo. Em 1966 ela representou o Brasil como bolsista do Conselho Britânico no curso Stage Craft and Acting  no British Drama League  . Quando voltou foi convidada para lecionar onde havia estudado, na EAD-USP, Escola de Arte Dramática da Universidade de São Paulo. Lá lecionou até 2004.

6
Entrevista conduzida pelos autores com Dorothy Lenner. São Paulo, 19 de maio de 2020.

7
Documentos utilizados: ALMEIDA, Gabriel Bueno de, et. al. Levantamento de Danos. Patrimônio e Restauro. São Paulo, Universidade Anhembi Morumbi, 2019. Disponibilizado via Blackboard com acesso restrito <https://bit.ly/3iOCAwN>; TEIXEIRA, Bruna; REIS, Gabriel; AQUILES, Istéffane. Relatório de Levantamento Métrico Arquitetônico. Patrimônio e Restauro. São Paulo, Universidade Anhembi Morumbi, 2019. Disponibilizado via Blackboard com acesso restrito <https://bit.ly/3al5zUk>.

sobre os autores

Ana Paula de Moraes Zemantauskas, graduanda do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi, é estágiaria do Studio Cris Paola Arquitetura e Design.

Leandro Alexandre dos Santos Silva, graduando do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi, é estagiário na Secretaria do Verde e Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo.

Mariana Cerqueira de Sousa é graduanda do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi.

Victória Mantas Munerato é graduanda do curso de arquitetura e urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi.

legendas

01. Vasp Cruzeiro 1954
Fonte: Geosampa, 2020

02. Capela São Judas Tadeu e pátio
Foto Mariana Cerqueira, 2019

03. Capela São Judas Tadeu e Edifício da Unidade 6
Foto Mariana Cerqueira, 2019

 

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