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PORTAL VITRUVIUS. Congresso UIA 2005 Istambul – Concurso de estudantes. Projetos, São Paulo, ano 05, n. 058.03, Vitruvius, out. 2005 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/projetos/05.058/2553>.


Cidade contemporânea: São Paulo, a metrópole espalhada e precária
Gabriel Kogan e Paulo Miyada
[representação da FAUUSP]

Um projeto de cidade: São Paulo

A maior cidade da América do Sul, como uma alegoria de outras, é, hoje, avessa a arquitetura e urbanismo. Durante as últimas décadas, um planejamento urbano perverso tornou São Paulo ainda mais suscetível e desigual. Uma clara dicotomia pode ser colocada: uma periferia incompleta e uma dúzia de bairros ricos. Dentro e entre estes extremos, não há espaços públicos. A cidade velha e seus entornos próximos, apesar de uma completa rede de infra-estrutura e até mesmo de equipamentos, está extremante deteriorada e perde população rapidamente. Entretanto, ela preserva ainda a possibilidade de uma vida social ativa e atraente.

Tempo de deslocamento médio: 1 hora e 40 minutos
Salário médio: US$390
Densidade média: 83 habirantes/ha

Na periferia a auto-construção, sem marcos, infra-estrutura e equipamentos, novas casas são construídas todos os dias espalhando uma grande massa uniforme. Essas novas cidades-dormitório estão totalmente desconectadas de qualquer outra parte do território. O estado, quebrado, distante e burocrático, é incapaz de atingir esses habitantes espalhados e a tendência aponta para um agravamento do processo onde a periferia está crescendo continuamente. O tempo de deslocamento casa-trabalho pode atingir facilmente mais de 2 horas por viagem e isso é quase uma regra e não uma exceção.

Já no centro com paisagem de muros, existem museus, escolas, parques, hospitais, grande e pequenas lojas, estações de metrô, redes de esgoto, redes de fornecimento de água, serviços mas estão todos murados. A contradição é que, onde a cidade é quase estruturada, onde a cidade é viável, a possibilidade de habitá-la não existe. Os espaços públicos, as ruas, as praças, estão vazias: a individualização está em alta, somada as políticas públicas e o valor da terra forçam crescentemente a população para fora.

Um projeto de cidade: São Paulo, a utópica metrópole hiper-densa

Utopia. Substantivo. Do grego, não + topos lugar. 1. Um lugar imaginário e remoto; 2. Um lugar de perfeição ideal especialmente para leis, governo e condições sociais; 3, Um esquema teórico para melhoria social.

Nota Explicatória: A metrópole de São Paulo hiper-densa é utópica, é um manifesto. É a cidade para todos. O esporte, a arte, a dança das multidões e a vida, todos acontecendo juntos. As extremas condições sociais, políticas e espaciais da metrópole são todas repropostas.

Os reestruturadores urbanos são edifícios que tem o poder de rearticular seu entorno. Eles não apenas suprem demandas de equipamentos (a escola, o hospital) como reorganizam o espaço público. Os reestruturadores urbanos são também nós articuladores do transporte e da habitação. Pela grande mobilidade da metrópole hiper densa, eles podem funcionar como rede: seus programas não são sempre os mesmos, são complementares.

Para a realização da metrópole hiper-densa acessível a todos, uma construção massiva de habitação será necessária. A conexão dessa nova moradia com os reestruturadores urbanos é essencial para que a nova metrópole se realize como cidade pública e permeável.

São Paulo: percebamos a inviabilidade. A cidade expande-se indefinidamente. A periferia, novidade antiga, é transferida constantemente para fora, ainda mais e mais, e seus vínculos se desfiam. Renova-se sem mudança. Nessa expansão, há conurbação e dispersão: sem desenho ou proposta, a cidade cresce, esvazia e enche, especula e multiplica, diversa e igual.

A cidade espalhada, pouco densa, sem futuro prazeroso e sem passado manifesto, impossibilita-se no presente. Não há gestão possível. A infra-estrutura se espalha tal qual a cidade. Os equipamentos, numerosos, centralizam antes extensões de terras do que pessoas. A metrópole dos encontros e das complexidades está pelo avesso: sua configuração espacial é determinante para a exclusão e o impedimento. A cidade é a rua e a praça, espaço público das trocas e das identidades, mas as ruas e as praças de São Paulo viraram espaços de esvaziamento e insegurança, viraram muros, viraram leito carroçável.

São Paulo: percebamos as potencialidades. Cidade-metrópole de todas as misturas, espaço do encontro para ser agendado. Componhamos a rua da aglomeração para grandes manifestações, a cada segundo, do parangolé coletivo. Esta é a dança da multidão ao som do sinal fechado e aberto num instante, da porta do metrô que se abre. É a menina que parte no sentido oposto, perdendo-se na multidão de todas as cores.
No transporte hiper-rápido ou no caminhar do pedestre, o tempo se transforma. O espaço se deforma e se rende diante das possibilidades de mobilidade, reconstrói-se na paisagem da memória. Na cidade, esse imaginário ganha cheiro, cor, forma e peso: o espaço deformado pela velocidade se materializa novamente; agora, as memórias individuais podem se realizar como espaço coletivo.

Desenhemos São Paulo em perspectiva e escrevamos não como Koolhaas, retroativamente. Nossa cidade tem potencialidades e não é como Nova York, cheia de evidências. Há de se construir assim uma história a partir do presente, a cidade do desejo.

A cidade nos últimos 100 anos se reconstruiu três vezes. Inevitável talvez seja não pensar a história de São Paulo como uma história volátil, insípida. Uma contemporaneidade sem vínculos com a história. Uma história que vai deixar de existir em breve para dar lugar a outra. Projetemos enfim uma metrópole-cidade possível onde todas as pessoas estão inseridas. Deixemo-as sentir o impacto de atravessar a rua com mais duzentas pessoas, serem vizinhas da faculdade, do trabalho, da escola e do parque, habitemos o imenso circo picadeiro!

Propomos a densidade como partido, mas ela numa rede-sistema de infra-estrutura, de equipamento e de transporte. Nossa densidade é possível, concreta, vem de Manhattan, cerca de vinte vezes a concentração atual, o que faria de São Paulo compreensível em uma área de 300 km².

A cidade hiper-densa é o lugar da infra-estrutura racionalizada em que os encanamentos percorrem poucos quilômetros, mas atendem todos, onde o metrô cresce metros para atingir milhares. A cidade hiper-densa é o equipamento ao alcance, a escola a poucos minutos, o hospital acessível; mas não apenas, é também o lugar onde as manifestações são possíveis e grandiosas, é o lugar dos encontros. Em São Paulo, como em seu museu, o cidadão se constrói agora do confronto e da simultaneidade de culturas: Rembrandt e Léger estão lado a lado para mudarem e serem mudados. No contínuo e livre do espaço, o referencial entre as obras é o público, para sempre circulando.

O centro que queremos ver adensado não é o centro que já temos, nem o centro de Manhattan, para além disso: para uma proposta de cidade futura, cidade com qualidade, acessibilidade e densidade necessárias para sugar o crescimento da cidade para si, como um grande imã.

Falamos então do crescimento vertiginoso da moradia francamente acessível, da concentração dos transportes e de seus nós organizadores. Falamos do déficit habitacional da cidade, do país e de toda América Latina. Falamos da tendência natural da cidade em expandir-se. Habitação, transporte e equipamentos: nenhum antes, nenhum depois mas num tripé funcionando em sistema. Este não é o lugar dos apaziguamentos, não é o lugar do imaginário sub-urbano que freqüentemente nos ronda. Possamos assim, enfim, falar numa metrópole possível para toda a sua população. Uma metrópole cidade que é, antes de tudo, uma cidade.

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Gabriel Kogan e Paulo Miyada
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