O enfoque
Acreditamos que a consciência a respeito do Global Warming e as conseqüentes medidas que disso resultam, configuram uma nova ordem Mundial.
Consequentemente entendemos que a questão proposta pelo concurso exige um pensamento abrangente capaz de verificar(especular) qual será o papel da arquitetura neste novo contexto e a quais parâmetros deve se referir. Pensamos desenvolver um modelo arquitetônico cuja essência consiste em responder de forma direta e econômica a estes parâmetros, ou seja, não apenas se adequar às questões de sustentabilidade ambiental e social, mas ter sua própria concepção originada e contida nestes parâmetros: uma “Arquitetura Essencial”.
Sua beleza consiste na capacidade de revelar estes conceitos: está de tal forma vinculada a seu contexto que não pode ser entendida fora dele: é exposta a estes parâmetros que esta arquitetura se revela.
Os (7) parametros
1. O uso do solo
Considerando que a qualidade do ambiente urbano na faixa tropical úmida depende em grande medida de uma boa ventilação (conforto térmico e higiênico) o modelo proposto prevê não apenas edificações “permeáveis”, mas também a implantação de blocos isolados, dispostos de maneira a permitir o permanente fluxo de ar entre as edificações.
O aumento da densidade (considerada a baixíssima densidade dos assentamentos predominantes) conduz a um modelo mais produtivo para ocupação do território, absorvendo o crescimento populacional e contendo o avanço da mancha urbana.
As edificações foram pensadas como um sistema que pode assumir diversas dimensões; o numero de pavimentos será reflexo da capacidade de carga do solo e da possibilidade de mecanização do edifício.
O Paisagismo deve ser pensado integralmente com espécimes nativas, dispensando cuidados ou doses extras de água.
2. Desempenho bioclimático
A Sombra e a ventilação são entendidas como recursos estratégicos essenciais, dispensando as soluções ativas ou mecanizadas como a climatização. Por esta razão os espaços são “explodidos”; vazados; fluidos. Como não há estação fria os fechamentos de vidro foram dispensados (Glass free).
A ventilação resfria o meio e as edificações; mantém a atmosfera livre de partículas em suspensão; previne a condensação da umidade nas superfícies e a conseqüente formação do mofo.
A cobertura, como um para-sol com grandes beirais e as varandas, além de sombrearem, garantem boa proteção contra as chuvas sem, no entanto, impedir a ventilação. A edificação é elevada do solo, sobre “estacas”, como palafitas.
A ventilação cruzada é garantida por amplos interiores; divisórias internas à meiaaltura e as venezianas, desenhadas para bloquear a intensa luz solar, mas para admitir o ar francamente. A movimentação das venezianas permite controlar a velocidade do ar no interior da unidade, bem como bloquear os raios solares do poente e nascente.
Foram adotados materiais com pequena massa ou inércia térmica (evita armazenar calor durante o dia uma vez que as noites são igualmente quentes). A adoção de cores claras também minimiza a absorção da radiação solar.
3. Construção e Operação
A construção é simples, composta de poucos elementos (componentes): “Essencial”.
A partir de uma seção transversal tipo o edifício é concebido como uma máquina (sistema) estrudável; reprodutível. Componentes pré-fabricados deverão ser simplesmente montados no local, garantindo um processo limpo e racional; uma obra seca.
Composta por perfis de mercado a superestrutura de aço será toda aparafusada dispensando a atividade de solda in loco. O uso de painéis de laje dispensa o uso de escoramentos ou estruturas temporárias.
A utilização de componentes industrializados acabados dispensa o uso de pintura ou outros cuidados superficiais, minimizando as atividades de manutenção. Quando necessário, alguns componentes podem ser substituídos e o descarte encaminhado para a reciclagem.
A utilização de recursos passivos como responsáveis pelo funcionamento minimiza os custos e a complexidade da operação do edifício.
4. Materiais e recursos (Desempenho ambiental)
O projeto busca responder à crise global principalmente através da redução. A idéia de arquitetura “essencial” prevê uma construção simples; mínima, com uso econômico de materiais (Lightness).
Da mesma forma, tendo seu funcionamento embasado nas soluções passivas o edifício demanda um mínimo consumo de energia para funcionar e se manter.
A geração de energia limpa in loco, porém não está descartada, de acordo com a disponibilidade financeira e o regime de fornecimento energético da região pode-se lançar mão da geração de energia Solar (fotovoltaica) na cobertura.
Os princípios para especificação dos materiais empregados são: certificação ecológica com custo acessível (compatibilidade com empreendimento para habitação de interesse social) buscando manter um equilíbrio entre componentes da indústria de âmbito global e materiais locais.
Alguns sistemas prediais de simples funcionamento e manutenção deverão ser implementados, tais como sistema solar para aquecimento de água e reuso de águas pluviais (devido ao alto índice pluviométrico o reuso das águas cinzas pode ser descartado).
5. Flexibilidade e Reprodutibilidade
A idéia de arquitetura essencial como infraestrutura nos levou a conceber um sistema flexível baseado na disponibilização de pisos abertos e sombreados, que como plataformas (lembrar os decks das embarcações fluviais da região) oferecem um suporte, um espaço aberto para ser apropriado.
O Edifício, montado a partir de componentes pré-fabricados e elementos industrializados, é naturalmente apto à reprodutibilidade.
Pensado como um sistema adequado para toda a faixa tropical úmida, o edifício tem grande capacidade para absorver a heterogeneidade e mutabilidade do uso e permitindo que possa ser reproduzido em contextos diferentes com dimensões diferentes.
6. Fatores Sócio-culturais
A imponderabilidade e a velocidade com que se modificam a organização familiar, tendo como condicionantes sua religião, divisão do trabalho, valores simbólicos, dentre outros, nos levou a pensar as unidades como salões abertos, flexíveis.
A intervenção no espaço por parte de seus usuários não é apenas permitida, mas é também encorajada: a participação na definição do espaço estimula o sentimento de pertencimento que além de promover o bem estar da comunidade propicia o envolvimento e compromisso com a preservação do lugar: fator fundamental na balança da sustentabilidade do conjunto (empreendimento).
Varandas e circulação horizontal ao mesmo tempo em que são o lugar da sombra, da proteção das radiações solares é também espaço de vivência e encontro, estes espaços comuns são estruturadores da dinâmica do edifício e podem também tornar-se estruturadores da comunidade.
O uso de materiais industrializados certificados, remete ao envolvimento de uma sociedade produtiva organizada, assim como a incorporação de técnicas/tradições locais traz identidade cultural ao conjunto.
7. Custo
A arquitetura essencial é por sua própria natureza econômica: seja pela industrialização de sua produção, seja pelo uso parcimonioso de materiais. A predominância do uso de recursos naturais, como o vento ou a iluminação natural, reduz consideravelmente a necessidade de equipamentos e, portanto a quantidade de energia e de capital para a construção e operação de edifícios. A industrialização da construção promove a economia de escala além da redução no tempo de execução e do desperdício de material na obra.
A noção (definição) de lugar
Acreditamos que a arquitetura deve ser concebida para o lugar, adequada a seu contexto específico. Cabe, portanto, determinar qual será a noção de lugar adotada para o projeto.
Pareceu-nos que se trata de projetar, não apenas para um lote específico em Recife, mas também apontar caminhos para o importante problema habitacional de uma realidade específica do planeta; uma faixa que é identificável, não por sua delimitação geopolítica e sim por suas características bioclimáticas.
Trata-se da Zona tropical úmida, que ocupa quase 50% de toda região intertropical do planeta. Caracterizada pela intensa insolação; pelo alto índice pluviométrico, altas temperaturas com pouca flutuação e grande umidade.
Além das afinidades climáticas alguns fatores sócio-culturais em comum despontam. Estão entre eles: a condição econômica no cenário mundial (muitos países “em desenvolvimento” estão estabelecidos nesta faixa) a crescente urbanização de suas sociedades, a carência habitacional em meio a grande pressão do crescimento populacional.
Dentro desta faixa é possível identificar tipologias arquitetônicas locais com características que se repetem e que nos dão alguns elementos essenciais para a aclimatação das edificações.
O meio urbano de Recife - Pernambuco
Com uma notável rede hidrográfica a sub-região costeira apresenta uma relação instável entre o solo e a água e é comum a ocupação de terras baixas, periodicamente inundáveis.
Para adequar-se a este contexto pensamos edificações sobre pilotis (palafitas) com estruturas leves que não extrapolem a capacidade de carga do solo.
No caso específico do loteamento proposto com quatro pavimentos podemos garantir o adensamento desejado de forma saudável evitando ainda a necessidade de mecanização da circulação vertical, respeitando as severas restrições orçamentárias.
A ampla ventilação cruzada dos edifícios, além de atender às exigências de conforto próprias maximiza o fluxo de ar que atinge os edifícios situados a sotavento.
ficha técnica
Local
Recife - Pernambuco, Brasil
Arquitetura
Andrade Morettin Arquitetos
Vinicius Andrade, Marcelo Morettin
Colaboradores
Marcelo Maia Rosa, Marcio Tanaka, Marina Mermelstein, Merten Nefs, Renata Andrulis, Thiago Natal
Estrutura
Stec do Brasil
Conforto Ambiental
Ambiental Consultoria
Tecnologias Ambientais
Ecocasa – Tecnologias Ambientais
Orçamento
Tríade – Serviços Técnicos