Ipameri e seus moradores estão inseridos no contexto histórico nacional, desde o surgimento da cidade. Por volta de 1816, povoados de Minas Gerais e Catalão, deslocaram-se para entre os rios às margens do Veríssimo, do Braço e do Corumbá em busca de terras férteis para a criação de gado e cultivo da terra. Inseriram-se no contexto nacional por meio da exportação do gado de corte, para as regiões Centro-Sul e Norte-Nordeste. Em 1913, com a chegada da Estação da Estrada de Ferro de Goiás a Ipameri, abre-se a comunicação com os grandes centros, gerando avanços nos aspectos da modernização da cidade, no comércio e no crescimento da população. Isso irá refletir principalmente na cidade, por ser a primeira do Estado a contar com o sistema de energia elétrica, iluminação pública, telefone, telégrafo e cinema.
Surge então o termo ‘sala de visitas’ para designar, frente os viajantes, europeus fugidos da I Guerra Mundial e pessoas de outros estados, o ambiente da cidade, refletindo um modelo para se projetar o futuro. Ipameri se consagrava como um ambiente rico em informações e vivencial dos acontecimentos políticos que nortearam a Revolução de 30, dentre eles, a formação da Aliança Liberal em Goiás, e a divulgação de informações pelo jornal O Ipameri, através principalmente do cronista Joaquim Rosa.
Por volta de 1922, próximo as comemorações do 1º centenário da independência, durante o governo de Joaquim Rosa, na prefeitura, deslocava-se da cidade de Vila Boa de Goiás, a velha capital do Estado, o 6º Batalhão de Caçadores do Exército Brasileiro, por ato do então Intendente Vicente Marot e vai se instalar na cidade e sediar o único Batalhão de Caçadores existente no Estado de Goiás, Além da garantia de ordem, impressa na atuação do Exército, este trazia também a banda musical do 6º Batalhão, uma forma de lazer para a cidade.
Este evento, juntamente com a chegada da estrada de ferro, marca as transformações urbanas com novas construções, como exemplos podemos citar o cinema, a Loja Maçônica, a centralização das repartições públicas, o jardim e o Coreto da Praça da Liberdade, a Avenida Cel. Eugênio Jardim.
Com a dinamização de sua economia, a presença da estrada de ferro e do 6º Batalhão de Caçadores, que trouxe mais de 800 famílias para a cidade, todo o sul do Estado ficou submetido a Ipameri. No começo do século a 1920 a cidade dobrou a população sendo a região mais povoada a sudeste.
Nas eleições de 1º de março de 1930 para presidente da república a oposição goiana levou cerca de mil votos às urnas, destacando-se Ipameri como a região com maior número de votos, segundo Joaquim Rosa.
A partir daí Ipameri entra no contexto da política nacional e se torna um dos principais locais de fortalecimento de bases políticas, como exemplo, a cidade é sede do Congresso de Ipameri, que busca uma oposição forte contra a efetiva posição política de Pedro Ludovico no governo do Estado de Goiás.
"... Assim, falar da cidade de Ipameri para Joaquim Rosa é compreendê-la como um espaço propício às discussões acaloradas, que fizeram da pacata cidade o centro de articulações políticas do Estado, mas esse centro tem um alcance: os olhos do nosso cronista por esse Goiás afora..."
[In: Mariana de Simone Kaadi. Joaquim Rosa: Memória e Política em Goiás(1928-1934). Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia, 2007]
Neste sentido o Projeto da Praça da Liberdade de Ipameri-GO busca reascender as vocações latentes do espírito do povo da cidade, através de uma intervenção num local que já foi palco de diversas bandas locais e atração cultural pública principal de outras épocas, além de sediar discursos políticos dos ex-presidentes da República Jânio Quadros, Juscelino, e de autoridades estaduais como Pedro Ludovico. A intervenção ressalta o único edifico da Praça, um exemplar de arquitetura Neo-Clássica, o Coreto, elemento central do projeto, considera a configuração do sitio frente à trama da cidade, a vegetação existente e as características do Cerrado, fazendo com que este espaço público por excelência juntamente com sua arquitetura ‘Art Deco’, composta pelos edifícios tombados que compõem o entorno, no torne-se palco da Cultura e da Política atuais.
Portanto o Projeto pretende inaugurar um novo momento da cidade no contexto histório do país, através de um projeto que respeita acima de tudo as questões ambientais e culturais locais.
[Texto escrito com base na dissertação de mestrado de Mariana de Simone Kaadi - Joaquim Rosa: Memória e Política em Goiás (1928-1934)– Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia, 2007]
Projeto
O projeto parte de uma análise do sitio, em primeira instância da cidade, seus eixos e conexões e em segunda da praça propriamente dita, a saber:
A quadra de projeto está inserida numa intersecção de duas tramas ortogonais distintas e que irão gerar um desenho de espaço publico que foge da ortogonalidade, mas que assume uma unidade com o triangulo oposto à praça. A bipartição da praça pelo eixo da Av. Dr. Gomes da Frota e continuação na Rua Cel. José Reginaldo faz com que entendamos esta área como sendo única e que assume uma relação particular em projeto.
A própria configuração da vegetação existente junto às arestas lindeiras ao eixo viário, que não ocupam totalmente o perímetro, assume, neste lado ‘norte’ uma configuração de largo (Vazio), possibilitando o reconhecimento, e leitura do todo. A relação do todo fica explicita em dois momentos do projeto: por parte do desenho, estabelecemos uma relação com a geometria do ‘triângulo’, inserindo nas áreas com massa arbórea, triângulos sobrepostos, evidenciando o descolamento do ‘triangulo’ existente, como parte integrante do conjunto. Estes ‘triângulos’ receberam tratamento paisagístico de espécies de herbáceas resistente ao clima, que se adaptam ao tanto a pleno sol, quanto à sombra; e por parte da vegetação inserimos no vazio apenas uma espécie de Ipê, de floração amarela, fazendo um contraponto ao existente ‘Rosa’ e uma homenagem à vegetação do cerrado.
Após um reconhecimento de maneira geral das áreas verdes da cidade, somado ao clima do Cerrado com seus períodos de estiagem, optamos por fazer a captação de água de aproximadamente 50% de sua área, portanto a praça tem sua pavimentação metade impermeável e metade permeável, sendo que, de toda a parte ‘seca’ coletamos a água para um reservatório que passa por um processo de filtragem, reuso de água para irrigação e uso das descargas dos banheiros.
Para chegarmos num desenho coerente de captação das águas pluviais, analisamos diversas fotografias do local e notamos um desnível de aproximadamente 3 metros no sentido nordeste.
Tendo o Coreto como elemento motivador de centralidade do projeto, descrito anteriormente, propusemos uma simulação das curvas de nível juntamente com o Coreto e a partir disso dispusemos os pisos num traçado em espiral, de modo a acomodar o desenho dos pisos em forma de ‘gotas’, nas curvas de nível, fazendo com que as águas provenientes das cotas superiores fossem direcionadas para a circunferência que circunscreve o Coreto, e a partir daí as águas passam pelo processo de filtragem. Este método possibilitará uma adaptação do desenho a partir de um levantamento planialtimétrico posterior.
No Coreto, é proposto rebaixar o piso ao redor do mesmo, trazendo maior destaque a sua arquitetura, gerar uma espécie de arquibancada ao redor, e possibilitar o acesso aos portadores de necessidades especiais por meio de rampas, incluindo o acesso aos banheiros públicos. Esta diferença de nível possibilitou separar em altura, a caixa de captação das águas pluviais da cisterna (etapa de armazenamento antes da filtragem), fazendo com que em eventual lavagem do piso, possamos fechar a tubulação que vai até a cisterna e desse modo as águas sairiam pelo “ladrão” ligado à caixa de captação das águas pluviais, direcionando o fluxo para os bueiros, além de concentrar todo o sistema de captação de águas ao seu redor, minimizando os custos.
Portanto a implantação da praça se define pelos ‘triangulos’ sobrepostos que fazem o desenho da vegetação, somado ao desenho do piso em espiral, convergindo para o Coreto, o rebaixo do piso ao redor do mesmo e a própria pavimentação da calçada que preenche as calhas de captação de águas pluviais entre as ‘gotas’ e os ‘triangulos’. Além disso, quatro áreas foram definidas entre os pisos, onde a vegetação receberá o tratamento paisagístico com duas espécies de gramado, por coincidirem com maiores locais de insolação e aumentar o contato do homem com o natural. Afim dos canteiros serem espaços de passagem ou permanência.
Quanto aos módulos de comércio, sua implantação foi definida pela melhor orientação solar, pela setorização na rua mais larga e com menor importância para o fluxo da cidade e pela localização mais próxima ao sistema de tratamento de água, pois os módulos fazem a captação das águas pluviais e geram energia por meio das placas solares, que irão fornecer energia tanto para as próprias unidades quanto para as bombas de sistema de irrigação. Tornando o sistema mais compacto e auto-suficiente. Localizamos oito unidades na implantação, sendo seis delas, as centrais, destinadas aos ‘pitdogs’, onde as das extremidades seriam uma para um ponto de taxi e na outra para um ponto de coleta de lixo reciclável. Ainda existe a possibilidade de rearranjo dos usos já que o módulo foi pensado com uma parte técnica central, que terá a caixa d’ água de abastecimento das unidades, descidas pluviais das coletas de águas, os controles da captação da energia solar e as paredes hidráulicas, mantendo o restante do módulo com planta livre, assim podendo adaptar seu uso, como por exemplo, pequenas lojas.
O mobiliário foi pensado no sentido de diminuir os impactos da obra. Por um plano de gerenciamento de resíduos, propomos que todo o antigo piso da praça seja triturado e torne-se o agregado que irá compor a nova pavimentação impermeável e também os bancos da praça. Quanto à iluminação, optamos pelos postes de luminárias solares com led.
De maneira geral o projeto todo foi pensado em dispositivos que contribuem para a gestão e redução no consumo de energia elétrica, água e conforto térmico do espaço público, com o objetivo de aproveitar recursos naturais disponíveis, proporcionar seu reuso, economizar energia e gerar esta mesma energia por uso de fontes renováveis. Quanto à especificação dos materiais propomos produtos obtidos com o mínimo de agressão ao meio ambiente, com matérias primas naturais renováveis ou reaproveitáveis, produtos reciclados, com matérias-primas não renováveis, tecnologias que permitem a resolução de problemas no próprio local da geração destes e sistemas que permitam gerar energia, com baixo impacto e não comprometam o meio ambiente com a emissão de poluentes. Desse modo será necessário uma busca mais aprofundada de fornecedores da região, numa segunda etapa, para que o transporte desse material seja equacionado de modo a não agredir demasiado o ambiente.
Especificação da Vegetação a ser plantada
A - Axonopus compressus - Grama São Carlos - Essa espécie de gramínea foi escolhida para bordear certos espaços, projetados propositalmente e funcionarem como área de estar. Será plantada uma área total de 452,34 m².
B - Axonopus compressus variegata - Grama São Carlos variegata - Mesma espécie citada anteriormente, irá evidenciar as áreas de estar. Essa espécie cobrirá uma área total de 263,17 m².
C - Eragrostis curvula - Capim Chorão - Este capim foi escolhido pela leveza de sua folhagem. A intenção é criar uma textura que remeta o cerrado. A área total é de 698,59 m².
D - Dietis iridioides - Moréia branca - Foi escolhida por ser uma espécie muito resistente, tanto a áreas ensolaradas, quanto sombreadas. Sua folhagem é leve, densa e alta, para dar o movimento vertical. Sua área total é de 453,14 m².
E - Ophiopogon jaburan - Liriopes verde - Foi escolhida pela semelhança com a MORÉIA, para compor os movimentos verticais e horizontais. Cobre uma área de 200,87 m².
F - Ophiopogon jaburan variegata - Barba de serpente - Espécie de folhagem leve e resistente, escolhida para dar claridade aos canteiros sombreados e compôr com as outras espécies de folhagem semelhante. Sua área total de canteiro é de 406,49 m².
G - Arachis repens - Grama amendoim - Foi escolhida para ser plantada ao pé do Ipê amarelo proposto, pois sendo uma forração rasteira, colaboraria para evidenciar a árvore, símbolo do cerrado. A área total dessa forração é de 82,63 m².
H - Tabebuia chrysitricha - Ipê amarelo - Esta espécie de árvore foi escolhida para ser plantada sozinha, como uma homenagem à vegetação do cerrado, por ser espécie símbolo. Ela será plantada num canteiro livre da sombra das outras árvores, para receber luz direta. Terá o DAP máximo permitido para o transplante e plantio.