O projeto desenvolvido é sobre relações de afeto e arquitetura, como prática emancipadora. O projeto é um estudo e prática sobre moradias autoconstruídas por mulheres rurais. Através do projeto de graduação é proposto a relação com uma demanda e uma cliente real, possibilitando a ponte entre academia e realidade, projetando com responsabilidade de acerto para viabilização. As mulheres em zonas rurais fazem parte da sustentabilidade do nosso sistema como um todo, no entanto são vozes que são pouco escutadas. O desenho da casa foi feito após uma imersão no vilarejo de Kikajjo em Uganda, leste africano, depois de conversas e desenhos conjuntos com Jajja, a cliente. A arquitetura da casa não será apenas uma moradia para Jajja, mas uma prática emancipadora questionando os papeis de gênero através de oficinas de capacitação em construção para mulheres. O projeto da Casa de Jajja, inicia-se com o protótipo em Kikajjo, mas continua com a autogestão comunitário e possibilidade e intenção de se replicar para mulheres e seus lares pelo mundo.






Cenas do vilarejo de Kikajjo, Kampala, Uganda
Foto Mariana Montag
A pesquisa e pratica foi desenvolvida como trabalho de graduação. O afeto nasce através do envolvimento no Projeto Escola em Uganda, em kikajjo, vilarejo rural em Uganda, leste Africano. Lá conhecemos a Jajja Imaculate, uma senhora de 75 anos de muita força e fé, avó de Rose (14) e Gift (6). Desenhamos e discutimos uma casa juntas. A arquitetura da casa não será apenas uma moradia para Jajja, mas uma prática emancipadora questionando os papeis de gênero, onde o processo de construção será feito através de oficinas de capacitação para mulheres. Assim como Jajja, as mulheres do vilarejo de Kikajjo, cuidam de todos e todas, mas mulheres fortes também precisam ser cuidadas e voltarem a seus lares interiores.
O projeto da Casa de Jajja se baseia em quatro valores/diretrizes:
Academia x realidade
E se estudantes de arquitetura, em colaboração com profissionais, pudessem pensar soluções para problemas e demandas reais e ainda viabilizar? O projeto propõe que a academia ultrapasse os limites teóricos e especulativos para a prática. O projeto de graduação desenvolvido aqui é uma resposta a uma demanda e uma cliente real, possibilitando a ponte entre academia e realidade, um estúdio de projeto com a responsabilidade do acerto para viabilização.

Juliards, morador local, ensinando Mariana a enformar a terra saturada
Foto Henry

Juliards, morador local, ensinando Mariana a enformar a terra saturada
Foto Henry

Moradores locais trabalhando em obra autoconstruída
Foto Mariana Montag

Moradores locais trabalhando em obra autoconstruída
Foto Mariana Montag
Moradia e gênero
O lar sempre foi visto e delegado sob os cuidados das mulheres, principalmente nas zonas rurais. No entanto, o planejamento e construção foram delegados aos homens. E se as mulheres, as usuárias das casas desenvolvessem suas próprias casas? A criação da casa foi desenvolvida em colaboração com a usuária, a Jajja, e a pesquisa feita através da perspectiva de gênero. A viabilização do projeto – o processo construtivo – questionam os papéis de gênero através construção.

A arquiteta Mariana Montag discutindo as decisões projetuais com Nannono Imaculte e Janet
Foto divulgação [Acervo Mariana Montag]
Arquitetura produto x arquitetura processo
A Casa vista como um produto pode beneficiar uma família, mas e se a casa e todo o processo de concepção fosse abordada como um processo? O desenho e as tecnologias foram eleitos após uma imersão no local, compreendendo as possibilidades de recursos naturais e humanos de forma a respeitar a cultura e o meio, além de compartilhar inovação. A casa será uma escola de capacitação em construção para mulheres, beneficiando outras pessoas durante o processo.

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag

Processo de construção do protótipo da casa
Foto Mariana Montag
Replicabilidade e escalabilidade
O primeiro protótipo é a Casa de Jajja, no entanto o sistema construtivo permite flexibilidade e que possa ser replicado em outras zonas rurais do mundo de zonas climáticas semelhantes. O projeto ainda visa a escalabilidade, de modo que as mulheres envolvidas possam dar continuidade gerando uma cooperativa e rentabilizando o processo.

Estudo sobre as técnicas locais e visita as escolas primárias em Karamoja, do Studio FH
Foto Mariana Montag
Processo
O processo se iniciou com conversas sinceras e um caleidoscópio para observar os hábitos e a forma de viver. A observação e a escuta são as ferramentas de todos os dias, anteriores à ação. O contato com a psicologia social comunitária transformou completamente a forma de se propor arquitetura, compreendendo que a arquitetura poderia ser uma forma que se muito discutida com os usuários pudesse vir a ser uma ferramenta para tornar as pessoas agentes de transformações de sua realidade.

Estudo sobre as técnicas locais e visita as escolas primárias em Karamoja, do Studio FH
Foto Mariana Montag
Os recursos e a herança construtiva local foram a outra base da criação do projeto. Entender a possibilidades dos recursos locais e como as comunidades tradicionais produzem a arquitetura vernacular. Junto da apreciação do conhecimento local foi importante também considerar projetos que agregam inovação às técnicas locais. O projeto visitado faz parte das escolas sendo construídas na região de Karamoja pelo estúdio FH (studiofh.com). O estúdio faz uma intensa pesquisa de materiais inovando no tema.
A casa foi pensada em conjunto. Depois de muitas conversas, oficinas de desenho coletivo, pesquisa e troca o primeiro protótipo da Casa de Jajja nasceu.
Partido arquitetônico
O partido do projeto foi compreender a relação dos hábitos locais com os elementos essenciais do morar: o fogo, a água e o descansar. Todos os ambientes são organizados de baixo de uma cobertura independente: pilares que conectam treliças invertidas com a função de captar água para a casa. A Casa possui dois dormitórios rodeados por alpendres, em um núcleo mais privado construído com tijolos de adobe; uma cozinha horizontal central separada por painéis móveis do espaço compartilhado, a sala. Os painéis pivotantes separam a sala do espaço externo. As tarefas diárias do lar em sua maioria são feitas do lado de fora casa buscando uma sombra de árvore da forte incidência solar. Sendo assim, a Casa busca ter a flexibilidade de estar aberta, entre-aberta ou totalmente fechada. O módulo da casa e seus elementos foram todos pensados e dimensionados tendo a mulher como força humana construtiva e pensa na possibilidade da replicação, para uma ou mais formações familiares. Os módulos podem se unir.

Ícones explicativos do partido; a replicabilidade e formação familiar
Elaboração Mariana Montag
A cobertura desenvolvida tem a função de captar água e organizar um espaço flexível. Além disso, a estrutura apoia-se em apenas uma linha de pilares para que também possa pousar em diversos terrenos. Era preciso prototipar e testar essa estrutura. Seguindo a premissa da arquitetura como processo nos juntamos com alguém que tinha uma necessidade que o nosso protótipo pudesse suprimir: a professora Frida tinha acabado de iniciar uma escolinha de crianças de 2 a 4 anos, porém com apenas uma sala de aula. Ela havia começado a construir a segunda sala, mas o recurso acabou. Fizemos os devidos ajustes de projeto para fazer a cobertura da sala de aula e ainda testar a estrutura. Após 1 semana de muita produção e construção, o protótipo foi um sucesso principalmente para aprendermos todos os ajustes a serem futuramente feitos. O processo é sobre fazer para aprender.
Memória de um dia especial no vilarejo rural de Kikajjo em Uganda, África, onde Jajja Nannono Imaculate e nós tivemos um encontro muito esperado sobre o projeto de sua casa.
Depois de muitas conversas desde julho a outubro de 2018, tínhamos voltado em janeiro de 2019, mas agora com uma proposta com todos os pontos levantados materializados em uma maquete. A forma de diálogo através da maquete simboliza a importância do dialogo e a não utilização do projeto arquitetônica como ferramenta de poder. Optamos por conversar através de uma maquete e não desenhos técnicos ou imagens computadorizadas.
Foi um dia bastante importante, onde pudemos apresentar o modelo e escutar Nannono sobre todas as suas opiniões. Agora, continuaremos rumo a materialização da Casa de Jajja, desenvolvendo protótipos em loco, articulando o grupo de mulheres e o financiamento.
ficha técnica
projeto
A Casa de Jajja
local
Kikajjo, Kampala, Uganda
ano
2019
área
80m²
cliente
Jajja Nannono Imaculate
arquitetura
Mariana Montag (autora), Lucas Fehr e Ricardo Ramos (orientadores) / Trabalho Final de Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiterana Mackenzie
premiação
Beyond Bauhaus 2019 – Prototyiping the future