O Casarão da Inovação Cassina é o mais novo centro de tecnologia digital do Brasil e o marco inaugural do Polo Digital de Manaus agora em fase de desenvolvimento no Centro Histórico de Manaus. Com 1.586 m2distribuídos em quatro pavimentos, o Cassina é composto de vários tipos de ambientes para suscitar a criatividade e encontros formais ou informais para o desenvolvimento desta nova economia: áreas multifuncionais, lounges, salas de reuniões, laboratórios, salas de formação, assim como um espaço café/restaurante no ultimo pavimento com vistas privilegiadas do Centro Histórico e do Rio Negro.
A intervenção executada na edificação para implantar o Casarão da Inovação Cassina combina uma forma inovadora e respeitosa de se relacionar com o patrimônio.
Uma análise da História da edificação revela que após aproximadamente trinta anos de funcionamento como Hotel Cassina, ela funcionou como Cabaré Chinelo por também aproximadamente trinta anos e, posteriormente, entrou em processo de degradação por sessenta anos. Em outras palavras, o estado de ruína teve um peso histórico igual ao peso do estado de funcionamento. Por esta razão, as ruínas das três fachadas, se degradando por décadas e tomadas pela vegetação, geraram uma imagem potente que se tornou parte do imaginário do manauara. O apogeu do Hotel como símbolo da riqueza da cidade na época da borracha tem seu encanto, mas, sem dúvida, o seu declínio é igualmente fascinante e marcou a mente dos manauaras.
A beleza da imperfeição da ruína suscita interesse, questionamentos e convida à reflexão sobre o passado e a ação do tempo e do homem na cidade e sobre o patrimônio construído de uma forma geral. Não é atoa que a imagética da ruína, com suas potencialidades poéticas e plásticas, foi explorada por inúmeros artistas e arquitetos: Piranesi, Gordon Matta-Clark, Robert Smithson, Lúcio Costa (Museu das Missões), Paulo Mendes da Rocha (Pinacoteca de São Paulo e Capela Brennand) e Ernani Freire (Parque das Ruínas), para citar apenas alguns.
No caso do Cassina, além da perpetuação no imaginário manauara e da exploração das potencialidades plásticas e poéticas, a preservação da condição de ruína das fachadas torna a intervenção um verdadeiro manifesto didático: o edifício é o último representante em Manaus de fachada com argamassa pigmentada com pó de pedra jacaré.
Para poder deixar visível e tangível esta técnica construtiva única para as próximas gerações de forma verdadeira, e paralisar a sua degradação, foi executado um trabalho meticuloso de restauração nas fachadas (limpeza, estabilização, consolidação, proteção etc.), sem recomposição de elementos ou fragmentos faltantes, para evidenciar as marcas da passagem do tempo que contam a História. Assim, ficaram visíveis e consolidadas as marcas do tempo da época do Hotel Cassina, como o seu porta-bandeira e outros elementos adicionados ao longo do tempo mostrando o quanto o prédio teve várias funções até chegar ao estado de ruina. Como exemplo dessas intervenções temos os ganchos trava-portas, os engastes de escada na parede de tijolos, os desgastes da argamassa pelas trepadeiras nas últimas décadas, as consoles e vigas de reforço estrutural instaladas em 1992, algumas depredações etc.
Também no intuito de perpetuar o imaginário manauara, o Casarão da Inovação recebeu uma vegetação exuberante e tropical, no espaço criado por trás da fachada histórica que faz frente a Praça Dom Pedro II. Este espaço de contemplação e de circulação serve como área de transição entre a praça de tipo “jardim romântico” e a intervenção contemporânea no coração do Hotel Cassina. Além de criar um microclima favorecendo a ventilação natural, este pátio tropical é também a oportunidade para todos os usuários, acessando o edifício pela passarela cruzando o vazio sobre o jardim, de serem lembrados da razão intrínseca de ser da cidade de Manaus: a floresta amazônica. Esta área de acesso, com sua floresta tropical exuberante, associada ao vidro, com suas transparências e reflexões, mescla a História da ruína do Cassina com o Futuro do Casarão da Inovação numa espacialidade associada à tecnologia, virtualidade, contemporaneidade e inovação.
Em termos de sustentabilidade passiva, além da possível ventilação cruzada em todos os ambientes devido a diminuição da largura do edifício inserindo o jardim tropical arejado, o Cassina apresenta um vazio ventilado entre a laje de cobertura e o forro do café/restaurante além de beirais grandes em todas as direções, garantindo assim um ambiente termicamente confortável. Além destes itens, a fachada Leste, que recebe o sol nascente, recebeu esquadrias contemporâneas com aletas de vidro temperado na parte externa, de forma a criar uma pela dupla ventilada que mantém o calor na parte externa.
Em resumo, a intervenção para a criação do Casarão da Inovação Cassina, através da inserção de uma floresta tropical e de uma estrutura de aço industrial dentro das ruínas consolidadas de um casarão da época da borracha, pode ser considerada como a síntese dos ciclos econômicos da cidade de Manaus: a era da borracha, seu declínio, a era do Distrito Industrial e a nova economia digital.
ficha técnica
projeto
Casarão da Inovação Cassina
ano
Projeto: 2013|2020
Obra: 2020
local
Manaus AM Brasil
área construída
1.586 m²
cliente
Prefeitura de Manaus
arquitetura
Arquiteto Laurent Troost (autor), Rejane Gaston, Juliana Leal, Nayara Mello, Erick Saraiva, Eloisa Serrão, Victor Marques, Marcelo Costa, Ingrid Maranhão, Eduardo Corrêa, Amanda Perreira, Fernanda Martins, Kauã Mendes / Laurent Troost Architectures
restauro
Landa Bernardo
consultoria em História
Centro Cultural Reunidos, Fábio Augusto de Carvalho Pedrosa
interiores
Rejane Gaston, Juliana Leal
luminotécnico
Juliana Leal
comunicação visual
Elter Brito
paisagismo
Nayara Mello e Hana Eto Gall
arqueologia
Margaret Cerqueira e Vanessa Benedito
construtora
Biapó Constutora
foto
Joana França
premiação
Finalista do 8º Prêmio de Arquitetura Instituto Tomie Ohtake Akzonobel