O recém-lançado “Arquitetura Brasileira Contemporânea”, ilustra através de diversos matizes e tons o percurso de nossa arquitetura pela tropicalidade. São 48 obras escolhidas com acuidade e rigor: espaços de memória, cultura, lazer e cidadania, edifícios administrativos e comerciais, residenciais, intervenções urbanas pós-anos 90 feitas ao longo desse país-continente.
Produto de uma edição bem cuidada, o trabalho do professor Roberto Segre se revela um resumo-guia de boa qualidade sobre os últimos 70 anos de investigação e renovação arquitetônica, seja para estudantes, curiosos, seja para apreciadores e apaixonados dessa arte-ofício que se constrói, marcada pela diversidade e intensidade de cores, nos espaços urbanos brasileiros. Demonstra, além disso, que nos últimos trinta anos houve uma grande abertura na arquitetura brasileira, para além dos preceitos rígidos pregados pelo modernismo de primeira hora, dirigindo-se assim a uma multiplicidade de questões de linguagem pertinentes à arquitetura contemporânea tanto em nível local quanto internacional.
Parece que o milanês-cubano-argentino, como se autodefine Roberto Segre, ao concluir o seu “Arquitetura Brasileira Contemporânea” incorpora e assume, definitivamente sua brasilidade, que se faz presente no tratamento gráfico do livro, na escolha e colorido das obras, no texto enxuto e objetivo que possibilita, mesmo aos leitores dos mais distantes lugares, uma compreensão do atual estágio da produção brasileira. Portanto, reforçam a abertura de tal possibilidade a edição bilíngüe, a atualidade bibliográfica e os recentes acontecimentos desse país-continente que se refletem em sua produção arquitetônico-urbanística.
Se se desejar ir um pouco mais além no que diz respeito à qualidade e crítica, a obra recém-lançada se apresenta, inclusive, como um destacado leque de possibilidades para a abertura de buscas mais acuradas, seja sobre as 48 intervenções apresentadas seja sobre quaisquer obras de seus autores, de arquitetura ou de urbanismo brasileiros.
Deve-se ainda mencionar a justa homenagem prestada a Cláudio Bernardes e Éolo Maia, não somente pelo sentido que representam à Arquitetura Brasileira Contemporânea suas prematuras perdas, como também pelos caracteres de irreverência e de inusitado presentes nas obras dos dois arquitetos escolhidas para fazerem parte da publicação.
Em alguma medida, a classificação por Segre adotada para dispor as obras escolhidas nessa edição ecoa sintonia com palavras de Flávio de Carvalho, no final dos anos 30 quando este falava sobre a mudança na dimensão da casa do homem. A sucessiva incorporação de novos discursos, de tecnologia, de acontecimentos político-sociais, fazia com que ‘a cidade fosse toda ela a casa do homem’. Essa casa-cidade brasileira, com seus espaços mais distintos, produto de manifestações coletivas locais foram muito bem sintetizados na recente publicação.
Algumas ressalvas apenas: como guia que pretende ser, o “Arquitetura Brasileira Contemporânea” seria ainda mais didático se ao apresentar cada obra, identificasse também sua localização e data de execução a fim de que se abrisse a possibilidade de acesso a cada uma, indistintamente. Além disso, a ausência de exemplos significativos acerca da produção recente de habitação popular, mostrando inovações de partido, de implantação ou sustentáveis e uma pequena mostra da produção dos arquitetos mais jovens, revelando possibilidades especulativas por estes traçados se faz sentir.
Por último, há que se fazer justiça ao se mencionar a importante contribuição que o Prof. Segre vem dando à Arquitetura e Urbanismo do Brasil, seja através de sua atividade de pesquisador e docente junto ao PROURB e FAU/UFRJ, seja através das publicações acerca da Arquitetura Brasileira recente, seja através dos muitos artigos que escreve para revistas especializadas, impressas ou virtuais, bancas de defesas de Mestrados e Doutorados, orientação de pesquisas acadêmicas, contribuições concernentes ao campo da História e Teoria da Arquitetura Latino-Americana e desde o final da década de 80 do século XX, em especial, ao Brasil, quando Segre parece ter sido contagiado pela tropicalidade- arquitetônico-urbanística brasileira. Junto de teóricos e críticos respeitados como Hugo Segawa, Carlos Comas, Ruth Verde Zein, entre outros, o Prof. Roberto Segre é hoje uma das importantes referências para a Teoria e Crítica da Arquitetura Brasileira dos séculos XX e XXI.
Para os apreciadores dessa tropicalidade, para os jovens acadêmicos, para os curiosos, para quaisquer interessados de países vizinhos ou de lugares mais distantes será certamente possível, através desta obra, uma avaliação da produção nacional pós- anos 90, discutindo, contextualizando, contestando, descobrindo significações outras para as obras, espaços e intervenções apresentados, buscando os novos contornos da produção brasileira contemporânea.
sobre o autor
Rosana S. B. Parisi é Arquiteta e Urbanista, Professora da PUC-Poços de Caldas, Mestre em Urbanismo pela FAUPUCCAMP e Doutoranda em Ciências da Engenharia Ambiental pela EESC-USP