Na sua Poética, Aristóteles reflete sobre "as coisas da criação", estabelecendo a teoria dos gêneros literários baseada em dois pontos: como se imita e o quê se imita. Ou seja, como se mimetiza e o quê se mimetiza. Conclui que há três modos de mimesis: os meios de imitação, os objetos imitados e como se imita. Estas reflexões fundamentais de Aristóteles para a cultura ocidental foram a base do que logo foi chamado "a ficção". E da ficção (nosso teatro) passou à metáfora.
Estas foram as primeiras idéias que me vieram à mente quando comecei a ler o texto de Conan. Por quê relacionei quase instantaneamente uma poética com outra?
Estes ensaios da poética dos jardins compilam 17 artigos (originais e inéditos) escritos nos últimos 30 anos por este pesquisador cultural. Então, o quê é a historia dos jardins senão um componente fundamental da cultura e das sociedades?
Reunidos no entorno de quatro temas, estes capítulos se referem aos seguintes tópicos: a textura poética dos jardins, a criação dos jardins, a vida nos jardins e os jardins como crisóis de culturas. São 426 páginas que nos levam da metafísica da água ao labirinto de Versailles; dos jardins à francesa do século XVII às paisagens contemporâneas criadas em bairros operários; dos "clássicos" Le Nôtre e André Mollet ao utopista Thouin e ao renovador Bernard Lassus; das criações individuais às criações coletivas; da vida galante à metáfora paisagística; da literatura de A Fontaine à relação entre natureza e política. Ou seja, um amplo leque de particularidades para explicar, ou melhor dito, para tratar de explicar "a confissão das eleições pessoais e de um pequeno número de perguntas às que sempre se tem dirigido meus escritos", como nos diz Conan no início.
Isto é o bom: poder percorrer o livro (lendo cada texto em si mesmo, como um elo de uma cadeia de ensaios) tratando de encontrar coincidências ou contrastes com nossas próprias convicções culturais. Fácil será então coincidir ou não com minha relação aristotélica inicial.
As reflexões de Conan estão encaminhadas a desvelar – mais além de suas formas e de suas matérias – os significados, as metáforas e as ficções dos jardins de todos os tempos e latitudes. Sem determinismos, propõe utilizar um conceito antropológico das condutas humanas nos jardins, sejam estas de seus criadores ou de seus visitantes, como ponto de partida para uma comparação com nosso tempo, com nossa cotidianeidade.
"Os jardins são sempre ecossistemas frágeis cuja vida depende dos cuidados incessantes dos homens para controlar a natureza com o sentido de um ideal cultural. A cultura humana não se opõe à natureza, mas a transforma ao apropriá-la e adaptá-la, resultando que o jardim constitui uma fonte infinita de metáforas para evocar os maiores refinamentos da cultura e dos tempos da vida".
Todas estas reflexões estão expressas em um cuidadoso francês, somado a um importante número de ilustrações em preto e branco e em cores que ampliam iconograficamente o texto, ampliando as possibilidades cognitivas.
Em uma frase: um texto essencial para o acadêmico da história urbana, da história social, da história da arte, da história da cultura… e porquê não, da história dos jardins !
sobre o autorSonia Berjman é doutora em Filosofia e Letras pela Universidade de Buenos Aires, doutora em História da Arte pela Universidade Sorbonne, Fellow postdoctoral de Dumbarton Oaks Library (Harvard University), ex-pesquisadora do CONICET e da Universidade de Buenos Aires, Vice-presidente do Comitê Científico Internacional "Jardins Históricos – Paisagens Culturais" do ICOMOS