“Chandigarh era e é quem eu sou”, escreve Vikramaditya Prakash, o autor de Chandigarh’s Le Corbusier: The Struggle for Modernity in Postcolonial India. “O livro, claramente e em primeiro lugar sobre a criação de Chandigarh, também fala da minha própria criação” (1).
Chandigarh’s Le Corbusier é tanto um relato histórico quanto pessoal: histórico pois tenta explorar a questão da identidade, tanto da cidade quanto dos habitantes, a partir de documentos da História da Arquitetura. A incorporação de uma história pessoal torna Chandigarh’s Le Corbusier diferente das publicações anteriores, que se baseavam apenas em documentos históricos, estatísticas de populações regionais ou teorias gerais da estética.
Criado e educado em Chandigarh, o autor atualmente ocupa uma cadeira no Departamento de Arquitetura da Universidade de Washington. Aditya Prakash, seu pai, formou-se em arquitetura na Inglaterra e trabalhou em Chandigarh, nos anos 1950, como arquiteto assistente de Le Corbusier, Pierre Jeanneret, Jane Drew e Maxwell Fry. Prakash pai tornou-se então um dos primeiros habitantes na nova capital que ele ajudara a construir.
O livro, no entanto, não é uma mera narrativa pessoal. As biografias de pai e filho estão atreladas à história do novo começo da nação indiana, em 1947. Após traçar as pegadas da carreira de seu pai, o autor cita o discurso histórico de Jawaharlal Nehru clamando o despertar da Índia para “a vida e a liberdade”, proferido à meia-noite do dia 14 para o 15 de agosto, quando o domínio colonial britânico chegou ao fim, após décadas da resistência política liderada por Mahatma Gandhi. O novo ministro Nehru deu início à modernização da Nação indiana, agora independente, e ainda separada do Paquistão. Isso tornava necessária a construção de uma nova capital regional, já que Lahore havia se tornado parte da posteridade. Chandigarh deveria ser a cidade onde a Índia independente pudesse promover os símbolos da sua identidade pós-colonial; apesar da natureza e dos significados precisos desses símbolos ainda estarem por ser descobertos, inventados e reinventados.
A literatura sobre e entorno de Chandigarh é extensa. A bibliografia de Prakash lista 109 textos (2). Vários livros continuam indispensáveis para os seus relatos históricos detalhados. O livro de Ravi Kali de 1987 Chandigarh: In Search of an Identity (3), apresenta a descrição mais abrangente dos eventos históricos, desde a escolha do lugar e o processo de estabelecer o plano diretor, até as estratégias subseqüentes para organizar a cidade. Em seu livro de 1982, Urban Planning in the Third World: The Experience of Chandigarh (4), Madhu Sarin nos oferece um olhar cuidadoso sobre a história social e a evolução das partes da cidade que não foram planejadas. Outros relatos focam-se na intenção do desenho do arquiteto: Mogens Krustrup abre o horizonte das imagens inventivas de Le Corbusier para os leitores, meditando, em particular, sobre os aspectos simbólicos das portas esmaltadas do Capitólio (5). Outros abordam a evolução do vocabulário formal de Le Corbusier, com poucas referências aos contextos políticos e culturais; por exemplo, Paris – Chandigarh (6), de Klaus-Peter Gast, limita-se largamente à análise proporcional.
O livro de Prakash difere de todos os trabalhos mencionados acima. Apesar de seu interesse por questões de estética e forma, o autor está mais preocupado com o seu uso como instrumento para a busca de uma nova identidade nacional do que como uma expressão da geometria universal. Ele centra a sua pesquisa em como as formas e símbolos do Capitólio refletem a comunicação entre os funcionários de planejamento e os arquitetos responsáveis, e o que ambos transmitem para os habitantes de Chandigarh. Alguém poderia se perguntar por que os acadêmicos debateram por décadas sobre as origens das proporções e figurações de Le Corbusier, mas qual seria a razão deles se questionarem tão pouco sobre aqueles para quem os edifícios foram claramente destinados? Para quem são esses símbolos, encomendados por um Estado em busca de uma nova identidade e desenhados por um modernista francês?
Chandigarh’s Le Corbusier é dividido em cinco capítulos que giram em torno do estético e do político no plano diretor de Chandigarh e no complexo do Capitólio. Prakash começa o livro descrevendo os paradoxos que circundam o modernismo de Chandigarh. Ele liga a biografia pessoal daqueles envolvidos no planejamento de Chandigarh com a realidade política do novo Estado Nação da Índia, indicando que o jovem país confiou em consultores ocidentais e no conceito ocidentalizado de Modernismo para criar a sua imagem pós-colonial. A oposição “ocidente/oriente” conduz muito da narrativa do livro. No entanto, essa oposição não se dá sem complicações. Pois, como afirma Prakash, o modernismo do estado pós-colonial corporifica um paradoxo, uma “resposta recíproca dos colonizados, o ato fortalecedor de dissolver a contradição, ao mesmo tempo rejeitando e se apropriando de um presente que não se pediu da colonização” (7). Mais adiante, Prakash afirma que tanto Nehru quanto Le Corbusier “consideram obsoleto e sem sentido o questionamento sobre ter de fazer uma arquitetura indiana ou européia.” “Ser moderno era ser novo, e ‘novo’ e ‘bom’, na semântica nehruviana, eram sinônimos,” escreve Prakash (8).
Contudo, o autor prossegue questionando a “fé na modernidade” da época com duas considerações (9). Primeiro ele argumenta que “o modernismo importado por Nehru não era o mesmo modernismo exportado por Le Corbusier” (10), e, adiante, que o conceito de abstração, como William Curtis o empregou para explicar o estabelecimento histórico de Chandigarh, é eurocêntrico desde que a abstração não seja historicizada (11). Ao explicar o papel do Modernismo na construção da identidade pós-colonial da Índia, Prakash percebe que seu livro é a “desconstrução do modernismo” (12).
A quem pertence a história incorporada à Chandigarh? A cidade é o maior projeto do arquiteto mais conhecido da Europa, mas, em primeiro lugar - e mais importante -, é uma capital regional indiana. Em 1953, foi inaugurada como a capital da parte indiana de Punjab, e desde 1966 é a capital conjunta dos estados de Punjab e Haryana.
Quem está escrevendo a história? Na maioria das histórias disponíveis o “oriente” é descrito direta ou indiretamente como o “outro”. Prakash avalia que este outro “não é o outro do Ocidente, mas o outro em si – um discurso do Outro, feito por, para e do Ocidente” (13). O texto estabelece duas perspectivas distintas no centro da análise: a perspectiva oriental, da criação do autor, e a ocidental, da sua formação acadêmica. Qual tipo de diálogo as duas culturas podem produzir? Este não é um livro de fatos recém divulgados, mas de novas questões; uma tentativa de historiografia crítica.
Seguindo o tom pessoal da introdução, o autor abre cada capítulo com uma lembrança do tempo em que morou em Chandigarh, da infância aos anos da faculdade, até o simpósio internacional de arquitetura em 1999. Os capítulos seguintes traçam cronologicamente a evolução do plano diretor, o desenho do complexo do Capitólio, incluindo a Suprema Corte do Estado, Assembléia Legislativa e Secretariado, e a Mão Aberta (Open Hand); a última só foi concluída após a morte de Le Corbusier e Nehru.
O segundo capítulo descreve o desenvolvimento do plano diretor, desde o conceito de cidade-jardim - desenvolvido durante o período de A. L. Fletcher como chefe de planejamento, a sua revisão feita pelo sucessor P. L. Verma, o primeiro projeto de Albert Mayer e Matthew Nowicki -, até a nova versão do projeto feito por Le Corbusier. Enquanto o livro de Ravi Kalia é mais útil para aqueles que desejam conhecer todos os detalhes históricos, o relato de Prakash sobre a evolução da cidade é mais conciso e explora bem a especulação sobre as diferentes noções de “moderno” em termos de estética e atitude. Contudo, o segundo capítulo já termina com um tom desiludido: o modernismo de Chandigarh, segundo Vikram Prakash, não é voltado para frente, em direção ao novo, mas aprisionado entre colinas artificiais; o Complexo do Capitólio é um “breve espaço de idealização” onde a “cidade pode superar seus pesares” (14).
O subtexto simbólico dos prédios do Capitólio já foi tema de especulação de inúmeros críticos. O capítulo três decifra as referências na porta esmaltada e as formas expressivas do prédio da Assembléia. Seguindo a tradição das reflexões poéticas de Mogens Krustrup sobre as conotações de símbolos cósmicos, paisagens, figuras humanas e animais, Prakash procura pelas fontes míticas e bíblicas da figuração de Le Corbusier. Ele revela que as fotografias em preto e branco publicadas nas Oeuvre Complete (15) representam trabalhadores migrantes e rurais no centro dos prédios, mas não os moradores urbanos e os administradores. Esta representação de um paraíso rural também é encontrada por Prakash nos primeiros esboços; a escolha subseqüente de tais fotografias levou, em última instância, o autor a levantar a hipótese de que Le Corbusier tentara reconstruir o lugar bíblico do Jardim do Éden. Adolf Max Vogt, em seu livro Le Corbusier, the Noble Savage (16), interpretou a arquitetura piloti de Le Corbusier como uma derivação de seu fascínio pelas construções pré-históricas de palafitas nas regiões dos lagos Suíços; Jacques Gluber sugeriu um ponto de vista semelhante ao de Vogt. Vikram Prakash transfere estas leituras pastoris para a paisagem Indiana, retratando Le Corbusier como um rousseauniano romântico que queria ver-se como “alguém entre os selvagens, em perfeito entendimento” (17).
No capítulo quatro, Prakash embarca numa “leitura psicanalítica do Capitólio”. Ao contrário de outras interpretações, ele argumenta que o desenho horizontal dos prédios não os integra à paisagem, mas torna o complexo independente e distante do resto da cidade, com a paisagem servindo apenas como pano de fundo. Le Corbusier, que aparentemente havia perdido sua percepção de profundidade espacial, ficou restrito ao estudo de relações espaciais numa superfície bidimensional (18). Tanto a Suprema Corte, com sua simetria horizontal e o reflexo na superfície da água (o que dá leveza ao volume), quanto a Assembléia, com sua composição vertical que invoca a massa animalesca dos desenhos de touros de Le Corbusier, são retratadas como estranhas (unheimlich) no sentido freudiano. Nesta leitura (evidentemente fundamentada na teoria do discurso aplicada à arquitetura, popular nos Estados Unidos nos anos 1990) Prakash encontra as origens da lógica estética dos edifícios.
O último capítulo enfoca o elemento simbólico da “Mão Aberta”, onde a estética e a política finalmente se unem, como afirma Prakash. A Mão Aberta agora está “em todo lugar de Chandigarh”: na entrada da cidade, em gráficos comerciais e nas carteiras de motorista. É difícil localizar a origem da Mão no processo de elaboração do projeto de Chandigarh. A biografia recém publicada de Jawaharlal Nehru, escrita por Shashi Tharoor, revela que Nehru tinha dois objetos em sua escrivaninha: uma estátua dourada de Gandhi e um modelo de bronze da mão de Lincoln (19). O escritor francês André Malraux, numa carta citada no livro de Prakash, descreve sua lembrança de um modelo de bronze da “mão da paz”, com cerca de 18 polegadas de comprimento (20). Prakash, numa conversa por e-mail, escreve: “Eu não acho que exista uma relação entre as duas mãos... O modelo de bronze de Lincoln tem o punho fechado, enquanto a Mão Aberta de Le Corbusier é obviamente aberta. No entanto, ambas simbolizam ação, a determinação da pessoa ativa de fazer coisas, de ter as coisas feitas”.
O livro de Prakash inclui parte da correspondência entre Le Corbusier e Nehru, onde o arquiteto expressava seu desejo de construir a Mão Aberta. Devido às diversas obrigações políticas de Nehru, realmente parece uma gentileza que ele tivesse tempo de respondê-las pessoalmente. No caso da Mão, o Primeiro Ministro, uma única vez, recusou o desejo do arquiteto francês, alegando “dificuldades financeiras” (21).
A Mão Aberta foi finalmente construída em 1984, quase trinta anos após o projeto. Para a segunda geração de habitantes de Chandigarh, entre os quais está o autor, a realização do projeto de Le Corbusier foi considerada um passo adiante na construção de sua própria “identidade pós-colonial”. Ao mesmo tempo, a era da presidência de Indira Gandhi também foi marcada pela repressão política e movimentos nacionalistas que obscureceram o otimismo da era de Nehru.
A razão pela qual Nehru se opôs à Mão Aberta continua uma questão para futuras especulações. Olhando para a historiografia recente, Sunil Khilnani lança um olhar crítico sobre as motivações do projeto da capital regional (22), enquanto a biografia de Nehru escrita por Tharoor omite por completo a construção de Chandigarh. Provavelmente Nehru não precisava de outra mão simbólica, pois já havia colocado o modelo do punho de Lincoln em sua escrivaninha? Ou, uma segunda especulação no campo do diálogo Oriente-Ocidente que Chandigarh deveria ser, leva aos esboços da Mão Aberta feitos pelo arquiteto, vários dos quais são reproduzidos por Prakash (assim como fizeram muitos acadêmicos antes dele). Apesar de muitos terem pesquisado o significado mais profundo contido nas linhas dos desenhos do arquiteto, por que ninguém questionou até agora o que os parceiros indianos pensaram de Le Corbusier ter ligado os dedos da Mão Aberta a corpos de mulheres nuas? A junção que Prakash faz do esboço do arquiteto com o desenho de duas figuras femininas nuas, permanece uma reposta incerta para quem ainda se questiona.
Nehru atribuiu importância à construção de Chandigarh num contexto de promover a modernização na Índia recém independente: Ravi Kalia, em seu livro, cita o discurso de Nehru proferido em 17 de março de 1959, em Nova Deli (seis anos após a inauguração de Chandigarh), onde ele declarou que “Nós não devemos, mesmo se tivéssemos a capacidade, construir um Taj Mahal. Isso não cabe na sociedade de hoje” (23).
Muitos se perguntaram por que os arquitetos para essa “sociedade de hoje” não eram da Índia. Os planejadores encarregados escolheram Le Corbusier com seu primo Pierre Jeanneret e os arquitetos ingleses Jane Drew e Maxwell Fry, após uma aproximação inicial com o americano Albert Mayer, que havia trabalhado anteriormente como planejador para o Estado Colonial.
Prakash descreve a seleção como uma “escolha circunstancial, uma oportunidade inesperada agarrada pelo time de burocratas”. A partir daí ele desenvolve seus argumentos acerca da fascinação pelo “novo”. “Nehru queria simplesmente uma cidade caracterizada pelo pensamento livre e pela novidade” (24). O novo vindo do Ocidente ou para o Oriente? Uma provocação do livro é dizer que o modernismo de Chandigarh não é o mesmo modernismo dos anos europeus de Le Corbusier, mas, ao invés disso, é o “moderno” próprio da Índia.
Em 1995, o governo suíço emitiu uma nova cédula de 10 Francos apresentando o Capitólio de Chandigarh: a frente da nota traz o retrato de Le Corbusier e o verso mostra o Modulor, duas vistas da fachada da Secretaria e uma entrada em perspectiva da Suprema Corte. É uma irônica mudança nos fatos, já que, de acordo com Jane Drew (25), Le Corbusier fez grandes esforços para provar que era francês e não suíço, desde que se tornou um cidadão francês em 1930. Reivindicar o Capitólio de Chandigarh como parte do patrimônio suíço acentua o conflito inerente à importação pós-colonial da autoria estrangeira para a identidade do novo Estado Nação da Índia. Deveria se atribuir ao governo suíço uma tentativa de imperialismo tardio ao transformar um edifício de governo indiano em algo cotidiano do centro da Europa? Vikramaditya Prakash está “ao mesmo tempo satisfeito e indignado” (26), como ele escreve no posfácio. “Se eles (o governo suíço) podem reivindicar o Capitólio de Chandigarh como algo deles, eu certamente posso reivindicar Le Corbusier para a Índia” (27). Outros, como Charles Correa, meditaram ironicamente sobre se Le Corbusier deveria ser considerado o “maior arquiteto indiano” (28). Prakash é provavelmente o primeiro a tratar está questão com rigor e sinceridade.
O projeto para a cédula de 10 Francos Suíços levanta problemas de autoria e propriedade que complementam a questão do livro sobre identidade nacional. Contudo, parece uma escolha infeliz para a capa empoeirada de um livro de história e teoria da arquitetura, dando ao estudo arquitetônico uma aparência de relatório executivo, e subvertendo a sugestão do título de que o livro é escrito do ponto de vista de um indiano. O desenho da Mão Aberta, inserido entre o título e a representação da cédula, pode ser uma tentativa desanimada de melhorar isso. As fotografias incluídas no livro - como a de uma mulher carregando plantas do Complexo do Capitólio para a sua aldeia, em um caminho delineado por uma vegetação abundante, ou de jogadores de críquete ao lado da Mão Aberta - podem invocar um escopo maior das questões em jogo, ao discutir autoria, contexto e o significado dos símbolos nacionais da Índia.
O livro de Prakash, com sua ambição por encontrar uma lógica subliminar na intenção do projeto de Chandigarh, é ilustrado com uma série de fotografias em preto e branco e coloridas. O óbvio cuidado com que essas imagens foram coletadas e reproduzidas, incluindo a alta qualidade do papel no qual foram impressas, marca a importância das ilustrações nesta investigação sobre símbolos, significados e leituras. Os materiais visuais incluem não apenas o material obrigatório, como os projetos de Le Corbusier e Mayer de 1951, dispostos lado a lado, como também vistas do edifício do Capitólio e das moradias. Mais específicas em relação à investigação do livro, são as imagens que justapõem o Forte Vermelho em Deli com a Suprema Corte de Chandigarh – tiradas por Curtis (29) – ou o ligam o esboço de 1952 para o eixo entrelaçado do Capitólio com a foto do desenho de Lutyen para o eixo monumental de Nova Deli – feita por Von Moos (30). Em seguida, a série de fotografias, esboços e pinturas traçam a evolução do projeto da Mão Aberta.
Essas imagens não são apenas documentos materiais, elas são parte da busca do autor para compreender a cidade assim como ela foi interpretada através de olhos alheios, e portanto são úteis à historiografia crítica do próprio Prakash sobre Chandigarh. Os desenhos de Le Corbusier absorveram as linhas da paisagem e as figuras dos animais. Mais tarde, imagens comparadas por críticos ocidentais estabeleceram similaridades entre a tradição indiana e os volumes de Le Corbusier. Leituras estéticas descontextualizaram o Capitólio de Chandigarh: muitas das fotografias tiradas por visitantes não mostram qualquer habitante indiano da cidade. O entusiasmo para incluir pessoas àqueles prédios que deveriam simbolizar a democracia, desapareceu aos poucos, junto com os ideais políticos dos primeiros anos de Nehru. De modo similar, os setores habitacionais foram omitidos da pesquisa de Prakash, assim como ocorreu em muitos estudos: se por um lado elas não têm o óbvio poder monumental do Complexo do Capitólio, as áreas residenciais, planejadas com ruas amplas, parques e jardins, são onde Chandigarh mais difere das outras cidades indianas.
Vikramaditya Prakash utiliza ilustrações para reforçar os efeitos do texto; juntos, ambos levam a uma leitura diferenciada do Modernismo na construção de sua própria identidade e de uma identidade pós-colonial. É raro ler um livro ao mesmo tempo sincero, teórico e original, que nunca abandona seu tom lírico. Tanto o texto como as imagens procuram por similaridades naquele espaço ambíguo onde o Oriente e o Ocidente se oferecem um ao outro. Se as descrições do autor e suas próprias fotografias sugerem uma nova leitura da cidade, permanece incerto. No final das contas, talvez seja apenas possível nos reconhecermos no espelho, ou pelos olhos dos outros.
notas
1
PRAKASH, Vikramaditya. Chandigarh’s Le Corbusier: The Struggle for Modernity in Postcolonial India. Washington, University of Washington, 2002.
2
Uma nota à parte sobre a bibliografia: ela inclui 19 publicações do próprio Le Corbusier, no entanto entre elas não estão os seis volumes de livros de esboços que documentam a “Viagem ao Oriente”, empreendida por Le Corbusier em 1911. Em 1965, algumas semanas antes de sua morte, ele finalmente editou Voyage d’Orient para ser publicado. Não parece haver ligação entre sua experiência como um jovem viajando ao Oriente Próximo e a sua grande obra em Chandigarh. Uma explicação possível seria que a grande fascinação do arquiteto durante a Voyage d’Orient eram as mesquitas, enquanto a Índia de 1947 foi fundada como um Estado secular. Prakash, que excluiu Voyage d’Orient da bibliografia, o menciona quando discute as viagens de Le Corbusier como uma empreitada para “questionar o homem nu” em busca do paraíso rousseauniano (p. 93 do livro de Prakash). O “Oriente” de Le Corbusier de 1911 é diverso não apenas geograficamente do “Oriente” da Índia independente, mas também cultural e historicamente.
3
KALIA, Ravi. Chandigarh, in search of a new identity. Carbondale, Southern Illinois University, 1987.
4
SARIN, Madhu. Urban Planning in the Third World: the Chandigarh experience. London, 1982.
5
KRUSTRUP, Mogens. Porte email / The enamel door: Le Corbusier, Palais de l’Assemblée de Chandigarh. Kobenhaven, 1991.
6
GAST, Klaus-Peter. Le Corbusier: Paris-Chandigarh. Boston, Birkhäuser, 2000 (resenhado em Neue Züricher Zeitung, 21.03.2001, p. 68, por Sabine von Fischer).
7
PRAKASH, Vikramaditya. Op. cit., p. 11.
8
Idem, ibidem, p. 10.
9
Idem, ibidem, p. 18.
10
Idem, ibidem, p. 21.
11
Idem, ibidem, p. 24.
12
Idem, ibidem, p. 26.
13
Idem, ibidem, p. 25.
14
Idem, ibidem, p. 70.
15
LE CORBUSIER. Oeuvre complete, 1952-57. Boston, Birkhäuser, 1957.
16
VOGT, Adolf Max. Le Corbusier, the Noble Savage: Toward an Archeology of Modernism. Cambridge, MIT Press, 1992.
17
PRAKASH, Vikramaditya. Op. cit., p. 93.
18
Idem, ibidem, p. 105.
19
THAROOR, Shashi. Nehru: The Invention of India. New York, Arcade Publishing, 2003, p. 93 ff (o subtítulo do livro parece ser uma interpretação do livro de Nehru The Discovery of India, de 1964).
20
PRAKASH, Vikramaditya. Op. cit., p. 150.
21
Idem, ibidem, p. 125
22
KHILNANI, Sunil. The Idea of India. New York, 1997. Khilnani crítica o envolvimento de Le Corbusier na criação dos símbolos de Chandigarh com o argumento de que a posteridade criou uma obra de museu destacada da situação real para representar o Estado Nação moderno. O autor prepara uma biografia de Nehru.
23
KALIA, Ravi. Op. cit., p. 28-29.
24
PRAKASH, Vikramaditya. Op. cit., p. 148.
25
DREW, Jane. “Le Corbusier as I knew him”. In WALDEN, Russell (ed). The Open Hand: Essays of Le Corbusier. Cambridge, MA: MIT Press, 1977, p. 365.
26
A nova nota de 10 Francos foi veiculada em 1995, como parte da série que representa figuras culturais de destaque na história da Suíça. As outras personalidades representadas incluem Sophie Täuber-Arp e Alberto Giacometti. Assim como Le Corbusier, os dois também passaram parte de suas vidas em Paris. A série foi desenhada pelo designer gráfico suíço Jörg Zintzmeyer. A série anterior de notas apresentava cientistas.
27
PRAKASH, Vikramaditya. Op. cit., p. 146-147.
28
CORREA, Charles. “Chandigarh: View from the Benares. “ In BROOKS, Allen H (ed). Le Corbusier. Princeton University Press, 1987, p. 197-202.
29
CURTIS, William. Le Corbusier: Ideas and Forms. New York, Rizzoli, 1986.
30
VON MOOS, Stanislaus. “The Politics of the Open Hand: Notes on Le Corbusier and Nehru at Chandigarh.“ In WALDEN, Russell (ed). The Open Hand: Essays of Le Corbusier. Cambridge, MA: MIT Press, 1977, p. 412-57.
[tradução de Julia Bussius. A autora agradece Mary McLeod, da Universidade de Columbia, pelo seu apoio, bolsa de estudos e críticas]