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Chuva, Goeldi, 1955

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ANELLI, Renato. As propostas das vanguardas modernas. Resenhas Online, São Paulo, ano 06, n. 070.02, Vitruvius, out. 2007 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/06.070/3102>.


 

A recente publicação dos livros de Ozenfant e Jeanneret e de Gregori Warchavchik abre a série “Fontes da Arquitetura Moderna”, concebida e organizada pelo professor Carlos Ferreira Martins para a editora Cosac Naify, quem também assina os respectivos prefácios. Trata-se de textos fundamentais para o entendimento do processo de formação da arte e arquitetura moderna no entre-guerras europeu e brasileiro.

No primeiro, Le Corbusier e o pintor Amedée Onzenfant apresentam suas concepções estéticas para a superação da crise do Cubismo em 1918. No segundo, acompanhamos os embates de Warchavchik pela difusão das propostas das vanguardas européias no Brasil. Esta é a primeira publicação de “Depois do Cubismo” em português, enquanto a reunião dos textos de Warchavchik é inédita, pois estavam dispersos em jornais ou outras coletâneas parciais. A editora anuncia para breve o lançamento de títulos de Mondrian e Terragni na série.

Estas publicações procuram superar as dificuldades de acesso em língua portuguesa ou em edições contemporâneas destes textos de referência para a história da arte e da arquitetura moderna. Seu significado deve ser buscado em meio aos esforços do seu organizador em promover uma reflexão crítica sobre as propostas das vanguardas modernas iniciada em meados da década de 1980, no auge do impacto do pós-moderno no Brasil.

Na apresentação da série o coordenador editorial da série alerta para o fato do seu interesse se dar “menos pela permanência de suas respostas que pela atualidade das questões que apresentam”. Eis uma abordagem que ainda foge à compreensão de muitos que se dedicam à arte e arquitetura contemporânea. Se os pós-modernos tornavam a arquitetura moderna uma caricatura para facilitar a aceitação das suas posições, a cristalização dogmática dos modernos impedia-lhes uma defesa substantiva e a construção de novos caminhos. Naquele momento, a opção pelo aprofundamento dos estudos sobre a arquitetura moderna procurava construir uma história que fosse menos operativa, como defendia Tafuri (1), portanto menos cúmplice do seu objeto, mas que permitisse a identificação de sua complexidade, riqueza, limites e contradições.

A leitura de Le Corbusier em “Depois do Cubismo” desmonta o estereótipo do frio propositor da “máquina de morar” e revela um artista envolvido com os desafios da permanência da arte na história, empenhado em conceber uma arquitetura do seu tempo, mas que pudesse emocionar as gerações subseqüentes. Como ressalta Martins no prefácio, um Jeanneret que via na crítica ao cubismo “a possibilidade de conciliar o seu ingresso nos meios de vanguarda com o ‘retorno à natureza’, tema central de preocupação desde os tempos de sua formação em La Chaux-de-Fonds”. Neste manifesto fundador do Purismo, encontramos um Le Corbusier onde o principal do caráter clássico não está na recuperação retórica de certas estruturas compositivas, como queria Colin Rowe (2), mas no pensar a máquina como o instrumento capaz de produzir na matéria a perfeição da idéia transcendente. Trata-se do Le Corbusier que veio ao Brasil e concebeu uma arquitetura que enfrentasse, de forma quase sublime, o esplendor da sua paisagem natural.

Os textos de Warchavchik trazem outras questões. Para acompanharmos seus esforços de produção de uma arquitetura de raiz geométrico-abstrata no Brasil dos anos 20 e 30, Martins propõe que é necessário entendermos as particularidades da construção histórica da Arquitetura Moderna Brasileira. Iniciada em 1943 com a publicação do livro Brazil Builds, essa trama perdura ao longo de cerca de 50 anos, constituindo uma historiografia engajada na construção de uma linha hegemônica entre as variadas produções modernas do período. Uma historiografia que restringe o papel de Warchavchik, quando muito, ao de pioneiro, com suas casas paulistanas no final da década de 20.

A revisão dessa historiografia, em especial na procura daquilo que foi excluído ou teve seu valor diminuído, tem sido o mote de um grande número de pesquisas contemporâneas, em sua maioria sediadas nos programas de pós-graduação em arquitetura. Concebida para informar essa produção, a publicação desta coletânea se distingue desse conjunto por enfrentar o núcleo central da trama historiográfica. No seu prefácio Martins situa com rigor o debate entre Geraldo Ferraz e Lúcio Costa sobre o papel histórico de Warchavchik, acompanha a fortuna crítica da sua obra em Goodwin (3), Mindlin (4), Bruand (5) e Lemos (6), e contextualiza cada texto publicado. A afirmação das qualidades da contribuição de Warchavchik não depende da diminuição da importância da corrente hegemônica.

A coletânea de textos traz as palavras do autor aos nossos dias. Os textos originais vêm se somar a outros trabalhos recentes que têm se dedicado a analisar a obra projetada e construída de Warchavchik, demonstrando que seu engajamento pioneiro não se resume a uma epiderme decorativa de aparência moderna, como querem alguns autores. Warchavchik constata e enfrenta os limites de um parque produtivo brasileiro, que combina o uso de avançadas técnicas construtivas, como as estruturas de concreto armado, com a ausência completa de sistemas e sub-sistemas industrializados ou mesmo de organização racional do trabalho. No debate com Dacio de Moraes e Christiano das Neves, Warchavchik enfrenta a nascente estrutura profissional dos arquitetos, onde os acadêmicos ecléticos reagiam com veemência à nova arquitetura. Em 1930 relata para o III CIAM os limites e potencialidades da arquitetura moderna no Brasil e na América do Sul, levando Siegifried Giedion a comparar tal situação com a da Finlândia, dois países que se tornariam protagonistas importantes da arquitetura moderna do segundo pós-guerra.

São textos que expressam um momento no qual o debate sobre os rumos da arquitetura não se restringia à mídia especializada, tendo como objetivo a conquista de um público amplo e a construção de um campo de atuação profissional, o que hoje poderíamos chamar de mercado. Hoje são republicados para enriquecer a formação de graduação e de pós-graduação em arte e arquitetura.

Muito oportuna a publicação desta série neste momento em que novas gerações se destacam na retomada do moderno, em especial em São Paulo. Tais leituras apontam que se algum sentido há em pensarmos a permanência do moderno hoje, ele estaria no vigor de uma atitude frente ao mundo e não na reprodução de um repertório formal.

notas

1
TAFURI, Manfredo.Teorias e História da Arquitetura. Lisboa, Presença, 1979.

2
ROWE, Colin. Mathematics of the ideal villa and other essays. Cambridge, Mit, 1989.

3
GOODWIN, Phillip L. & SMITH, G. E. Kidder. Brazil Builds, architetcture new and old 1652 - 1942. New York, The Museum of Moderns Arts, 1943.

4
MINDLIN, Henrique E. Modern Architecture in Brazil. Rio de Janeiro, Colibris,1956.

5
BRUAND, Yves. Arquitetura Contemporânea no Brasil. São Paulo, Perspectiva, 1981.

6
LEMOS, Carlos. Arquitetura Brasileira. São Paulo, Melhoramentos/EDUSP, 1979.

leia também"Uma oportuna recuperação das origens do pensamento moderno brasileiro", de Mônica Junqueira de Camargo, sobre o livro de Gregori Warchavchik; e "O elogio da plástica", de Luiz Armando Bagolin, sobre o livro de Ozenfant e Jeanneret

sobre o autorRenato Luiz Sobral Anelli, arquiteto e professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo, USP-São Carlos

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Depois do cubismo

Depois do cubismo

Amedée Ozenfant and Le Corbusier

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