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DOURADO, Guilherme Mazza. Retrospectiva verde. Resenhas Online, São Paulo, ano 06, n. 070.01, Vitruvius, out. 2007 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/06.070/3103>.


Há menos de duas décadas, quem percorresse as melhores livrarias em buscar de publicações brasileiras de paisagismo já se daria por contente se encontrasse um ou dois títulos nas prateleiras. Eram tempos em que o paisagismo passava longe dos interesses do mercado editorial e também nem despertava a atenção dos estudiosos. Felizmente esse momento passou e hoje existem editoras que cada vez mais apostam na área – caso da Editora Senac. Um de seus recentes lançamentos é Rosa Kliass: desenhando paisagens, moldando uma profissão – primeiro livro sobre a obra de uma das figuras de frente da 2ª geração de paisagistas modernos brasileiros, escrito pela crítica de arquitetura Ruth Verde Zein, com a colaboração da jornalista Denise Yamashiro.

Já não era sem tempo haver uma publicação sobre Kliass, tendo em vista seu respeitável papel no cenário da cultura paisagística nacional, ao longo dos últimos cinqüenta anos. Basta recordar inicialmente que algumas propostas emblemáticas voltadas à qualificação ambiental em várias cidades brasileiras saíram de sua prancheta e, mais recentemente, da tela de seu computador. É o caso da Estação das Docas (1999-2000), que reabilitou uma antiga faixa portuária em Belém do Pará; o Parque do Abaeté (1992), que nasceu para proteger um dos cartões-postais de Salvador; o Plano Preliminar Paisagístico de Curitiba (1965-66), que influiu para que a capital paranaense encontrasse um modelo de crescimento sem descurar do verde; o Projeto Paisagístico da Avenida Paulista (1973-74), que ofereceu um dos mais belos passeios em mosaicos que São Paulo conheceu, mas que infelizmente foram corrompidos ao longo dos anos e, hoje, o pouco que restou está com os dias contados, por força de um despautério da prefeitura.

Essa disposição de abraçar desafios peculiares não foi impulso circunstancial ou inclinação temporária que despontou e depois feneceu em algumas etapas do percurso de Rosa Kliass. Ao contrário, revelou-se marca-registrada de toda sua carreira, manifestando-se desde as vésperas da formação. Na contramão das perspectivas de futuro alimentadas pela maioria de seus colegas da FAU-USP, Kliass abraçou o caminho mais improvável - foi ser arquiteta paisagista. Encantou-se pela profissão no convívio com o paisagista norte-americano Roberto Coelho Cardozo, que ministrava uma recém-criada disciplina de noções gerais de paisagismo na faculdade, em 1954. Figura marcante nesta etapa inicial de sua formação intelectual, Cardozo foi artífice de outra significativa descoberta que marcará o futuro da jovem: apresentou-lhe a escola californiana, com seus repertórios plásticos de matriz abstrata geométrica (especialmente os de Garrett Eckbo), com suas composições vegetais privilegiando bem mais a expressão de formas e texturas das folhas do que o cromatismo pronunciado de maciços de flores, com sua ênfase no cuidadoso desenho dos elementos tectônicos (muros, pisos, volumes, pérgulas, espelhos d’água e piscinas).

No final da década de 1960, chegou o momento em que Kliass pode examinar ao vivo a produção californiana e inteirar-se, pela experiência direta, sobre o que de melhor acontecia em paisagismo nos EUA. Dispondo de uma bolsa do governo de lá obtida com a ajuda de Francis Violich e municiada com contatos e roteiro por ele preparados, Kliass viajou de costa a costa do país, entre setembro e novembro de 1969. Excursionou por Washington, Baltimore, Filadélfia, Nova York, Boston, Detroit, Louisville, Saint Louis, Los Angeles, San Francisco, entre outras cidades. Visitou obras, escritórios, faculdades e organismos públicos de paisagismo, como o National Park, em Washington.  Esteve com a nata da intelectualidade paisagística norte-americana: Thomas Church, Garrett Eckbo, Lawrence Halprin, Paul Friedberg, Robert Royston, todos sócios titulares de alguns dos mais importantes escritórios do país, Ian MacHarg, uma das autoridades em planejamento paisagístico, e Grady Clay, editor da Landscape Architecture Magazine (1).

Difícil avaliar o saldo completo das experiências e idéias que essa peregrinação trouxe à etapa madura da obra da paisagista. No entanto, é possível rastrear alguns desdobramentos. O trabalho de MacHarg forneceu uma visão sistêmica das questões ambientais e uma metodologia de coleta, cruzamento e avaliação de dados para planejamento paisagístico que se tornou instrumental constante nas propostas de grande escala de Kliass, como no Plano da Paisagem Urbana de São Luís (2003). Justaposta à influência anterior de Eckbo, a obra de Halprin trouxe-lhe outras possibilidades de experimentação plástica, manifestando-se no desenho de pisos e volumes com formas angulosas, por exemplo, no Vale do Anhangabaú (1981-1990) e nos pátios do Laboratório Fleury (1996-97), cujo projeto arquitetônico é dos escritórios de Eduardo Martins de Mello e Piratininga e não como registrado na página 43, conforme me informou Ruth Verde Zein. O contato com faculdades, professores e associações profissionais daquele país também não passou em brancas nuvens para Kliass. Foi ele que inspirou certamente a busca pelo aprimoramento do ensino e, sobretudo, pela regulamentação da arquitetura paisagística no Brasil, defendida pela paisagista a partir da década de 1970. Além disso, ainda é possível identificar como efeitos dessa viagem o germe que levou à criação da Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP), em 1976.

Rosa Kliass retornou outras vezes aos EUA. Mas a viagem de 1969 permaneceu como um momento especial e marcou o início de seu período criativo central, cujos frutos mais seletos estão reunidos e documentados nesta publicação. São 29 projetos que contemplam das maiores às menores escalas, apresentados individualmente por meio de textos e imagens, embora alguns careçam de mais desenhos técnicos para serem bem compreendidos. De todo modo, o livro é um registro ímpar para conhecer a obra e o pensamento da paisagista e simultaneamente alimentar a reflexão sobre o papel da geração posterior a Burle Marx.

notas

1
Entrevistas com Rosa Kliass realizadas pelo autor em 21/7/1998 e 11/8/1998.

sobre o autorGuilherme Mazza Dourado é arquiteto e historiador de paisagismo.

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