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FARIA, Rodrigo. Arquiteturas e dinâmicas urbanas na interpretação sobre a construção metropolitana. Resenhas Online, São Paulo, ano 07, n. 076.02, Vitruvius, abr. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/07.076/3080>.


“Não há como pesquisar a arquitetura metropolitana à distância. É preciso abordá-la submersa na congestão urbana, inscrita em relações dinâmicas, mensurada com escalas que se modulam em quantidade, extensão e qualidade de variáveis múltiplas. A realidade da arquitetura metropolitana só pode ser percebida em um mergulho. É necessário tornarmo-nos mais um elemento interferente nessa complexidade congestionada” (1). Este breve fragmento textual pinçado no livro Arquiteturas metropolitanas não é somente explicitação metodológica de construção da pesquisa acadêmica realizada por Denise Xavier, mas fundamentalmente um processo inerente e consubstanciado na própria trajetória profissional da autora. Neste sentido, os processos de interpretação e pensamento sobre a arquitetura não são descolados ou indistintos dos processos de produção da sua própria arquitetura. Em ambos processos, Denise Xavier empreende um mergulho comprometido com dimensões do mundo social, que estão absolutamente associados aos denominados idealistas e ingênuos: a dimensão ética, a dimensão estética e a dimensão política.

No mergulho que cada leitor realizar pelas páginas do livro “Arquitetura Metropolitana”, certamente encontrará o comprometimento da autora com as premissas de um ofício profissional que está na base da estruturação física das cidades: a arquitetura, ou, como em alguns momentos surge no livro, arquiteturas. Uma estruturação determinante das relações simbólicas e de identidades que são constitutivas da vida em sociedade, da vida pública, da vida que deveria se manter repleta de urbanidade: em tudo que esta vida nas cidades aglutina de diferenças e divergências. As arquiteturas selecionadas pela autora para a compreensão do processo de construção da identidade metropolitana da cidade de São Paulo, a partir da década de 1950, estavam absolutamente integradas nesta construção.

O edifício do jornal O Estado de São Paulo, o Copan, o edifício Itália e o Conjunto Nacional são realizações que não somente exploram qualitativamente as possibilidades formais, estruturais e espaciais específicas a cada empreendimento, mas também permitem, proporcionam e ampliam os espaços da vida pública. São arquiteturas cujas concepções não renegaram as dinâmicas urbanas, as relações entre os ambientes públicos e privados, as interações entre os sistemas de áreas livres e as áreas passíveis de edificação. A compreensão destes aspectos é o ponto nevrálgico do trabalho realizado por Denise Xavier em Arquiteturas metropolitanas : entender que as arquiteturas não estão desconectadas da cidade, que para pensar arquitetura é preciso pensar a produção da cidade – condição ainda pouco enunciada e enfrentada na historiografia da arquitetura no Brasil.

A estrutura organizacional do livro evidencia este entendimento entre a interpretação da produção arquitetônica e a produção da cidade. Nos dois primeiros capítulos, que em verdade entendo como sendo um único, pela problemática central que os amalgama, qual seja, a da construção da metrópole ao longo do século XX, a autora apresenta as bases urbanísticas, econômicas e políticas desta construção. São Paulo metropolitana tem suas origens instituídas na concepção de cidade pensada por Prestes Maia e Ulhoa Cintra em artigos escritos para o Boletim do Instituto de Engenharia, no ano de 1924. A década de 1950 entra no texto como recorte temporal privilegiado, ápice do processo contínuo de mudanças, sobreposições, apagamentos que reflui da dinâmica de uma cidade em movimento. Para a autora, a cidade se reconhece como metrópole, centro econômico propulsor e condensador das ações que instituem o novo, uma nova ordem urbana e uma nova ordem arquitetônica revelada especialmente nos aspecto vertical das arquiteturas analisadas no livro.

Entretanto, capítulo(s) que pouco ainda reverbera(m) a sensibilidade do olhar objetual-arquitetônico-formal da autora, em sua aguda e instigante capacidade de análise das arquiteturas selecionadas, ou melhor, de qualquer outra arquitetura. Este olhar será enunciado no capítulo dedicado à leitura dos projetos. Leitura e não análise, como está proposto na estrutura do livro. Leitura, pois, no mais puro sentido da palavra, aquele em que se lê decifrando significados construtivos e formais de cada palavra em um texto escrito. Portanto, significados construtivos e formais de cada arquitetura desde a sua concepção-representação (aquela delineada cuidadosamente no papel vegetal à tinta nanquim), até sua instauração como elemento constitutivo das dinâmicas da metrópole em construção. No capítulo dedicado ao estudo dos projetos existe uma articulação entre cada uma das arquiteturas, cuja especificidade torna evidente o entendimento das suas relações com a cidade: a articulação pelos sistemas de circulação que articulam a cidade ao edifício em questão. Sobretudo em uma metrópole capitalista efervescente da década de 1950, os indícios de deslocamento, de movimento, estão impregnados em todos os elementos que perfazem a cidade: nos trens, nos carros, nos relógios, nas pessoas, nas ruas, nas avenidas, na infra-estrutura urbana. Os arquitetos autores dos projetos souberam compreender esta informação, esta transformação, esta incorporação no cotidiano da metrópole. Denise Xavier soube realizar uma leitura atenta à interface dos objetos com os sistemas de circulação vertical e horizontal, respectivamente, o sistema que articula as esferas privadas dedicadas ao trabalho, à moradia, ao lazer, à alimentação, com o sistema que agrega aos edifícios uma importante dimensão urbana.

O primeiro sistema estava intimamente relacionado às novas tecnologias construtivas e mecânicas, atuava e atua como elemento estruturante no processo de verticalização das cidades por possibilitar o deslocamento vertical: o elevador – elemento cuja espacialidade e produção industrializada não apresentava maiores distinções nos edifícios. O segundo sistema, por outro lado, está associado aos aspectos instituídos de positividade que a vida urbana representava. É distinto formal-espacialmente para cada arquitetura, empreende relações particularizadas e articuladas aos edifícios em estudo com a cidade, e estrutura a inquestionável associação do objeto aos espaços livres: são passagens internas, galerias e verdadeiras ruas que adentram, intercambiam, articulam cidade e arquitetura. Talvez em menor intensidade no edifício do jornal O Estado de São Paulo, nos outros edifícios a dinâmica urbana adentra sem barreiras, sem receios os espaços de uso coletivo dos edifícios, os “espaços urbanos das edificações”, do urbano arquitetônico. O olhar sensível da autora para a leitura da arquitetura, associado ao procedimento metodológico enunciado naquele texto pinçado do livro – que integra a parte do livro escrita em parceria com Kazuo Nakano –, especialmente quando afirma que “não há como pesquisar a arquitetura metropolitana à distância. É preciso abordá-la submersa na congestão urbana, inscrita em relações dinâmicas, mensurada com escalas que se modulam em quantidade, extensão e qualidade de variáveis múltiplas”, fazem desse capítulo de estudo dos edifícios o eixo convergente e central de todo livro, de toda a narrativa.

Uma narrativa encerrada num texto em que a autora propôs pensar o contínuo do movimento de metropolização pela contraposição destas arquiteturas analisados com edificações que representam o absoluto esvaziamento da vida urbana, da vida pública, da urbanidade: edificações destituídas de uma essência de lugar, espaços controlados, vigiados, consensuais e homogeneizados em sua abstração estéril. A própria narrativa enuncia a distinção pela oposição das experiências possíveis em cada situação. De um lado a cidade em suas diferenças, seus agentes, suas arquiteturas, seus símbolos, cheiros, luzes, sons, ou seja, a dinâmica que perfaz a vida urbana. Uma cidade que ainda hoje não consubstancia níveis mínimos de qualidade de vida para uma grande maioria dos que nela habita. Entretanto, uma cidade que não esconde as indesejadas diferenças, pois nela estão a perscrutar suas vidas por todos os lugares, sejam praças, viadutos, calçadas, ruas, marquises e favelas.

Por outro lado, espaços que pouca apreensão permitiram aos seus interlocutores na tentativa de mergulhar em suas especificidades. Conjunturas construtivas envidraçadas, muradas e climatizadas que enunciam os novos interesses do capital na metrópole. Para estas conjunturas as cidades são vazios de interligação entre pontos de concentração financeira internacional, circundadas por um conjunto de equipamentos complementares: condomínios fechados, shoppings e aeroportos. A crítica a estas conjunturas é sensivelmente enunciada pela insensibilidade que delas emana. Preocupante é a constatação da transformação e adequação daquelas “arquiteturas metropolitanas” aos preceitos que processam a indiferença e a exclusão com os indesejados que habitam a cidade.

Opor-se a estes processos é parte daquelas três dimensões que perfazem a trajetória profissional de Denise Xavier: a dimensão ética, a dimensão estética e a dimensão política. Seu livro não é algo isolado na ação desenvolvida como arquiteta e urbanista, mas consubstancia e amplia sua inserção crítica na metrópole paulistana em contínua construção. Nesse sentido, seu livro não é sobre um conjunto de edifícios importantes para a história da arquitetura no Brasil, especialmente para a arquitetura paulista. Seu livro é sobre a construção da cidade, sobre a construção da cidade de São Paulo como metrópole. Sua importante particularidade passa pela compreensão de que a arquitetura é parte da cidade, integra todo o conjunto de dinâmicas com as quais a sociedade se mantém ativa e em transformação.

Seu livro é sobre a necessidade de retomarmos a consciência de que o esvaziamento da cidade, a negação da cidade é a negação da própria sociedade como agente transformador. Ao arquiteto cabe a responsabilidade, ou melhor, deveria caber a responsabilidade pela produção de arquiteturas comprometidas com a vida urbana em todas as suas diferenças e antagonismos. Porém, em Arquiteturas metropolitanas constatamos que os processos contemporâneos de construção da cidade estão exclusivamente pautados pelos interesses do capital na (re)produção dos espaços homogêneos e consensuais cuja valorização ocorre pela indiferença ao entorno, à paisagem, à dinâmica da cidade. Uma constatação que deve gerar uma indagação autocrítica que passa primeiramente pela formação dos quadros profissionais no país: qual arquiteto estamos formando, qual arquiteto queremos formar? Certamente a despolitização do processo de formação pautado exclusivamente por sistemas técnico-informacionais contribui intensamente com o esvaziamento dos significados sociais, culturais e políticos da profissão de arquiteto e urbanista, da própria arquitetura.

Como afirmara Christian Topalov, “as ciências da racionalização urbana e das finalidades sociais são radicalmente colocadas em questão pelas ciências da celebração do mercado e da ‘revolução liberar’. Os especialistas de umas e de outras não são do mesmo mundo. Nosso saber está, aberta ou secretamente, a serviço do Estado, o deles está, sem complexos, a serviço da empresa. Quaisquer que sejam nossas inclinações políticas, nossas definições disciplinares ou nossas preferências teóricas, temos talvez algo em comum: os adversários” (2). Em Arquiteturas metropolitanas Denise Xavier não se esquivou da necessária crítica aos “adversários” que ela bem sabe quais são. Convém, no entanto, enunciar uma discordância com Denise Xavier, quando afirma que “não há como pesquisar a arquitetura metropolitana à distância”. Não há como pesquisar qualquer arquitetura à distância, pois, como parte integrante da cidade, seria como pesquisar a cidade estando distante dela, estando deslocado dela. Aliás, o distanciamento é um dos principais instrumento utilizados pelos nossos “adversários” na desconstrução das cidades, na desconstrução da vida urbana, seja ela metropolitana ou não.

notas1
XAVIER, Denise. Arquitetura metropolitana. São Paulo, Annablume/Fapesp, 2007, p. 146-147.

2
TOPALOV, Christian. “Os saberes sobre a cidade: tempos de crise?”. Espaço & Debates, Revista de Estudos Regionais e Urbanos, Ano XI, n. 34, 1991, p. 37.

leia também

"São Paulo metrópole. A arquitetura e seus habitantes", de Fernanda Fernandes sobre o livro de Denise Xavier

sobre o autor Rodrigo Faria, arquiteto e urbanista, mestre e doutor em História pelo Departamento de História do IFCH-UNICAMP, Pesquisador do Centro Interdisciplinar de Estudos da Cidade do IFCH-UNICAMP, Becário Fundación Carolina/Universidad Politécnica de Madrid.

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Arquitetura metropolitana

Arquitetura metropolitana

Denise Xavier

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