A professora Doris Kowaltowski nos brinda com esta obra, que é uma profunda reflexão sobre os meios contemporâneos de aprendizagem, especialmente no ensino fundamental e médio e as relações com a arquitetura escolar.
O tema central deste livro – o edifício escolar, o contexto urbano em que esse se insere e os projetos pedagógicos para o ensino público vigentes no país, particularmente no estado de São Paulo – está presente na sólida carreira acadêmica desta arquiteta e professora titular da UNICAMP, desde os tempos de seu doutorado na Universidade da Califórnia em Berkeley, EUA. A tecnologia da arquitetura é o seu principal eixo de pesquisa e de ensino, porém sem perder de vista o caráter interdisciplinar da arquitetura e as contribuições de outras áreas do conhecimento, como a engenharia civil e a psicologia ambiental.
No Brasil, em anos recentes, a autora reuniu, com seu grupo de pesquisadores, professores especialistas e estudantes e apoio da Fundação para a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), bibliografia nacional e internacional de referência sobre a evolução da arquitetura escolar como um dos mecanismos, especialmente nos países desenvolvidos, para fazer frente às transformações das relações de trabalho e da competitividade econômica e aos avanços da tecnologia da informação. Assim, este livro apresenta um conjunto consistente de resultados de pesquisa sobre a qualidade do processo de projeto e sobre avaliações pós-ocupação (APOs), onde estão refletidas as dificuldades que arquitetos, engenheiros, designers, educadores e gestores do edifício enfrentam cotidianamente na tarefa de superação do ideário do edifício escolar público, de orçamento reduzido, durável porém, na maioria das vezes, pouco atraente para a finalidade a que se destina. Nos últimos dez anos, o projeto e a construção desses edifícios tem se dado em terrenos compactos e sem diferenciações programáticas para atendimento aos anseios de comunidades diversificadas e por tudo isto, raramente apresentam ambientes instigantes para o aprendizado ou áreas livres para experimentações lúdicas.
Diante deste contexto é que “Arquitetura Escolar” apresenta as possibilidades de superação deste ideário, de forma didática e convidativa ao leitor, não só por meio das teorias pedagógicas e dos benchmarks – estudos de caso nos EUA e na Europa – mas também, por meio da organização e descrição dos principais aspectos de desempenho deste tipo de edifício, de grande relevância na formação cidadã, e de sua arquitetura. Desta forma, a autora discute as questões sobre as quais projetistas e gestores devem efetivamente se debruçar, do programa de necessidades à APO. Por meio de mecanismos de realimentação continuada do processo de projeto, se pretende criar a escola do presente e do futuro, estimulante para estudantes, professores, funcionários, pais e tutores e também para a comunidade local.
A Professora Doris reforça e reitera, desta feita, e com exemplos brasileiros e sobre tudo paulistas, idéias sobre o ambiente escolar e seu impacto na aprendizagem, há muito praticadas e reconhecidas nos países desenvolvidos. No Brasil, salvo algumas exceções, essas idéias são pouco encontradas nos edifícios projetados e construídos, embora pesquisas em arquitetura que demonstram esta necessidade venham se avolumando em universidades como a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade de Campinas (UNICAMP), a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), dentre outras.
O livro tem projeto gráfico cuidadoso e um prefácio criteriosamente elaborado pela professora e arquiteta Cibele Haddad Taralli da FAUUSP - ela mesma grande estudiosa da chamada “interlocução entre arquitetura e educação”, estabelecendo sempre elos entre ambiência e design de mobiliário escolar. Seguem seis capítulos, além de uma lista de leituras adicionais recomendadas pela autora e da referência bibliográfica, onde não faltam autores do peso de Zeisel, Sanoff, Preiser e Van der Voordt, dentre outros, além das normas técnicas (ABNT) de referência, especialmente as de conforto ambiental e de ergonomia de mobiliário escolar.
O capítulo 1, intitulado Educação: processo de ensino e aprendizagem, apresenta de forma sucinta e extremamente didática, a formação e evolução histórica do processo e do espaço de aprendizagem e um resumo das teorias pedagógicas. O segundo capítulo, O Ambiente escolar: componente e qualidade, por sua vez, levanta discussões sobre as relações entre as características físicas do ambiente escolar e o comportamento dos seus usuários (alunos, professores, comunidade local, etc.), até questões de compatibilidade entre usuário, ambiente e mobiliário, sem deixar de considerar outros fatores de caráter econômico e social que podem influenciar no aprendizado. Já o capítulo 3, Arquitetura escolar, traz uma discussão sobre o programa escolar e a organização espacial da escola, com exemplos de arquitetura escolar de vários países, inclusive com um resgate histórico desta arquitetura no Brasil, do final do Século XIX até os dias atuais, enfocando as principais iniciativas do poder público na padronização do edifício para reprodução em escala industrial. No capítulo seguinte, Desempenho e conforto no ambiente escolar, é abordado um dos temas mais discutidos no meio acadêmico quando se trata de qualidade do ambiente escolar, que é a falta de conforto (principalmente o térmico, acústico, lumínico e antropométrico) dos usuários do ambiente escolar, líder no ranking de insatisfação em pesquisas de Avaliação Pós-Ocupação. Neste capítulo, a autora discute questões conceituais sobre conforto ambiental em ambientes de aprendizagem e sua relação com o desempenho escolar dos alunos.
Dentre os seis capítulos, chama a atenção, em especial, o capítulo 5. Conceitos e tendências da arquitetura escolar. Nesse, a autora conceitua e desenvolve diretrizes para 32 parâmetros de projeto, a começar pela sala de aula, passando por ambientes para a arte e a música, a conexão entre espaços externos e internos, aspectos de conforto ambiental, sustentabilidade, acessibilidade até o último parâmetro denominado, acertadamente, “Síntese dos parâmetros anteriores” ou aquilo que a Professora Doris, bem humorada, denomina “colocar tudo junto”, aliás, o grande desafio para os arquitetos.
Finalmente, no Capítulo 6, Arquitetura escolar e seu processo de projeto, a autora coloca a discussão sobre os métodos de desenvolvimento de projetos de edifícios escolares e os agentes envolvidos nesse processo diante da importância reconhecida da qualidade do ambiente construído na aprendizagem.
Por tudo isto, esta obra é leitura imprescindível não só para estudantes, pesquisadores e professores de arquitetura, mas também para gestores que sabem que o ambiente escolar é muito mais do que salas de aula seriadas. O livro se apresenta como uma forma de entender quais as necessidades de um edifício público para a educação voltado a multiusuários e situado, muitas vezes, em comunidades carentes e, daí, a expectativa da população local que este elemento arquitetônico se transforme num motivo de orgulho além de seu obrigatório caráter educador.
sobre as autoras
Sheila Walbe Ornstein, professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP) e pesquisadora bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Rosaria Ono, professora associada da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.