Revitalização, reabilitação, revalorização, requalificação, reforma, não importa o nome que é dado ao processo que reúne capitais internacionais que se “especializaram” em uma certa arquitetura, associada a um certo urbanismo do espetáculo, superdimensionado, de máxima visibilidade, utilizando como álibi megaeventos esportivos, artísticos, tecnológicos ou culturais. Otília Arantes assim descreve esse fenômeno: “vive-se à espreita de ocasiões... para fazer negócios! Sendo que o que está a venda é um produto inédito, a própria cidade”.
Frequentemente as mesmas instituições financeiras, as mesmas mega-construtoras e incorporadoras, os mesmos arquitetos do star system, promovem um arrastão empresarial para garantir certas características a um pedaço da cidade, convertendo-o, no mais das vezes, a um parque temático. Endividamento, especulação imobiliária e gentrificação são marcas que acompanham essas transformações onerosas, embora venham comumente acompanhadas de promessas de incontáveis virtudes.
O planejamento urbano foi transformado no seu avesso pelas chamadas máquinas de crescimento urbano, e, ao invés de resolver os problemas das cidades, empenha-se em facilitar a construção de projetos faraônicos, verdadeiros “elefantes brancos”, que constituirão pesada herança destinada a ser, no futuro, apenas um fardo. Esse planejamento, por isto mesmo chamado “estratégico”, nasceu sob a marca das parcerias público-privadas e sobre as ruínas do Estado Providência.
Otília, autora reconhecida no manejo hábil da palavra escrita, de texto elegante e erudição inquestionável, analisa aqui os casos de Barcelona e Berlim. No entanto os leitores poderão perceber na descrição dessas intervenções urbanas, guardadas as especificidades, alguma premonição a respeito do que pode vir a ocorrer nas cidades do Brasil, por ocasião da Copa do Mundo de Futebol de 2014, ou das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro.
nota
NE
O presente texto foi publicado originalmente na “orelha” do livro de Otília Arantes.
sobre a autora
Erminia Maricato é arquiteta, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, foi coordenadora do programa de pós-graduação (1998-2002), secretária de Habitação de São Paulo (1989-1992) e secretária-executiva do Ministério das Cidades (2003-2005).