O hospital como o mar: esperança ou pesadelo
Joseph Conrad, “The Shadow-Line”
Esta coleção de livros sobre o tema da saúde é a mais ambiciosa iniciativa desenvolvida no Brasil neste século XXI, visando à elaboração em profundidade de uma tipologia arquitetônica e o seu relacionamento com a história social e urbana. Desde o ano 1994 uma equipe de pesquisa da Casa Oswaldo Cruz da Fiocruz – Benedito Tadeu de Oliveira, Jaime Benchimol, Ângela Porto e Renado da Gama-Rosa Costa – iniciaram um levantamento do patrimônio cultural da saúde, relacionado com as instituições e o acervo arquitetônico. O estudo culminou no ano 2007 com o inventário nacional do patrimônio cultural da saúde, integrando os bens edificados e os acervos disponíveis na Biblioteca Virtual da Saúde (BVS). As pesquisas se relacionaram com propostas semelhantes desenvolvidas na América Latina que tiveram o apoio da Unesco, associados à criação de uma Rede Latino-americana de História e Patrimônio Cultural da Saúde. No Brasil, por iniciativa da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, formou-se uma rede constituída por onze capitais estaduais: Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo, Florianópolis, Goiânia, Curitiba, Belém, Manaus e Recife. Depois de publicados os inventários de Porto Alegre – Editora Ideograf, com patrocínio do Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Sul –; e do Rio de Janeiro – Editora Fiocruz, 2008, com apoio da Cobra Tecnologia –; a editora Manole de São Paulo em colaboração com editora Fiocruz e o patrocínio da Pfizer; concretizaram a publicação dos quatro volumes aqui em resenha: São Paulo, Bahia, Santa Cataria e Minas Gerais. A ideia é que se publiquem os demais inventários a partir de iniciativas locais: no ano 2013 está previsto o volume sobre Curitiba, e estão sendo elaborados os de Recife e Manaus.
A maior contribuição da coleção se baseia no fato de não ser somente livros especializados em arquitetura; já que neles se procura interpretar a significação das doenças, as intervenções da iniciativa privada e do estado na construção dos conjuntos assistenciais; a participação dos políticos e dos médicos na definição dos projetos hospitalares; a resposta dos engenheiros e arquitetos às novas funções exigidas pelo sistema nacional da saúde, e o relacionamento dos edifícios com o contexto urbano e rural. Finalmente, cada livro contém um CD com uma detalhada coleção de imagens dos principais prédios de cada cidade, com o seu correspondente verbete explicativo.
Porque o tema da saúde não teve uma preeminência nos estudos das tipologias arquitetônicas, como aconteceram com a moradia, os prédios públicos, os escritórios, as instalações esportivas e de lazer? Em primeiro lugar, porque é um tema relativamente novo: se pode falar de hospitais baseados em funções específicas recém nos finais do século XVIII. Apesar de que o tratado de Vitruvio elaborado no século I DC definiu a necessidade de estudar a salubridade dos assentamentos humanos para evitar as doenças – princípios que apareceram na América Latina nas Leis de Índias de Felipe II de Espanha –; nesses documentos estava ausente a função hospitalar. Por enquanto, durante vários séculos ela ficou absorvida nos prédios religiosos, também aconteceu certa rejeição desse tema no imaginário social porque o hospital é um edifício associado à morte – contraditoriamente, mais que com a vida. Na realidade se nasce no hospital, ali começa a vida da maioria das pessoas e nele se permite o seu prolongamento com o combate e a eliminação das doenças. Mas, constitui ao mesmo tempo, na visão atemorizada dos pacientes, a antessala da morte, assumido como um espaço impessoal definido pela rígida disciplina militar, semelhante a um campo de batalha nessa guerra travada entre a vida e a morte. Porque ali, o ser humano se sente desamparado, perde a sua individualidade na homogeneização do sistema funcional do hospital; e a predominante posição deitada da pessoa, constitui uma representação de fragilidade, da sua dependência dos outros. O paciente não tem nenhuma capacidade de decisão nesse fragmento de vida, e tudo o que acontece está nas mãos dos médicos e nas persistentes incógnitas contidas nas frias tabelas dos diagnósticos. Tentar compreender os mecanismos internos da vida nos hospitais foi à justificativa dos recentes seriais da TV, como House e Grey´s Anatomy que procuraram revelar a psicologia dos médicos e a complexa dinâmica dos salões de operações. Além disso, a definição da particularidade do edifício pouco teve a ver com as decisões dos usuários; no caso, a organização funcional foi sempre determinada pelos médicos, e a forma condicionada pela cultura arquitetônica de cada período.
Até o século XX o hospital não teve uma personalidade formal própria, já mimetizado com outras funções – em particular os conventos –, ou caracterizado pelos estilos acadêmicos dominantes. Com a valorização expressiva da funcionalidade, o Movimento Moderno conseguiu identificar neste difícil tema uma linguagem tipológica com certa liberdade formal e espacial que superasse as rígidas determinações da estrutura interna definida pelos médicos, como aparecem no tratado de arquitetura do alemão Ernst Neufert, A Arte de Projetar na Arquitetura. Mas poucos arquitetos de renome internacional desenvolveram obras formalmente significativas. Um dos primeiros foi o sanatório Zonnestraal em Hilversum, Holanda (1926-1928), projetado por Johannes Duiker e Bernard Bijvoet, que começou a utilizar as fachadas de vidro para aproveitar a luz solar. O hospital de Alvar Aalto em Paimio, Finlândia (1929-1933) teve uma significativa influência nos sanatórios para tuberculosos ao aplicar o modelo das varandas horizontais contínuas que facilitavam aos pacientes o contato solar. A solução do prédio alto vertical, que já tinha sido utilizada nos Estados Unidos desde o início do século XX, foi assumida por Paul Nelson na Cité Hospitalière de Lille (1932), quem abandonou os estilos acadêmicos e a projetou com os elementos tipológicos do Movimento Moderno. E também são conhecidos os hospitais do arquiteto alemão Erich Mendelsohn, construídos em Jerusalém e Haifa em 1937, sendo o Maimonides em São Francisco, Califórnia (1946-50), o mais difundido nas histórias da arquitetura moderna, com o sistema de varandas curvas alternadas ao longo da fachada. No Caribe, tiveram uma influência na arquitetura da América Latina os desenhos de hospitais propostos nos anos quarenta por Richard Neutra em Porto Rico, adaptados ao clima tropical. O mais recente, que voltou ao sistema horizontal dos pavilhões, foi o hospital de Veneza (1964-1965), projetado por Le Corbusier, pouco antes do seu falecimento. E nos textos sobre arquitetura brasileira – de Henrique Mindlin; Yves Bruand, Hugo Segawa, Roberto Montezuma, Renato Anelli, o tema obteve uma presença reduzida em comparação com as outras funções sociais.
Seria impossível no breve espaço desta resenha comentar o conteúdo de cada um dos cinco volumes no período compreendido entre a chegada da Corte portuguesa em 1808, até a criação do Ministério da Saúde em 1953 e a consolidação da estrutura sanitária no país; mas cabe acompanhar o panorama do sistema hospitalar brasileiro com as particularidades que assume em cada região, identificadas em cada um destes volumes. Até finais do século XIX os cuidados médicos das classes abastadas aconteciam nas residências privadas; e o Estado pouco assumia esta função social, basicamente desenvolvida pelas irmandades religiosas. O modelo da Santa Casa da Misericórdia portuguesa (Lisboa, 1498), foi transladado ao Brasil e constituiu o principal centro de cuidados dos doentes pobres nas primeiras cidades coloniais: são citadas as de Olinda (1540), Salvador (1549), Ilhéus (1564), e Maragogipe (1680). As principais edificações destes primeiros séculos estiveram localizadas no Rio de Janeiro: o hospital de três andares da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência no Largo da Carioca (1763); e a Santa Casa da Misericórdia – um dos maiores prédios da cidade no século XIX – reformada em 1865 por José Maria Jacintho Rebello. Em geral predominava o sistema de locais distribuídos em volta de um pátio central que caracterizava os conventos da tradição religiosa medieval. Curiosamente no Brasil, não foi aplicada a tipologia do hospital com planta em cruz – que tinha o altar no cruzamento das quatro asas –, surgido em Florença no século XV e utilizado na Espanha e na América Latina, onde foi conhecido o primeiro hospital fundado por Hernán Cortés na Cidade do México em 1524.
No século XVIII, com o início da Revolução Industrial o aumento acelerado da população urbana na Europa e a concentração de operários pobres nas cidades, ficou indispensável à solução dos problemas higiênicos que evitassem a propagação das epidemias – lepra, peste bubônica, varíola, gripe, febre amarela –, doenças comuns nessa época. Surgiu o movimento internacional dos “Higienistas” formado por técnicos, médicos, urbanistas, e políticos progressistas, que lutavam pela intervenção do Estado na criação das infraestruturas técnicas e normativas urbanísticas que permitissem a vida saudável dos habitantes das grandes cidades. Ações acompanhadas pelo pensamento laico dos Iluministas – resumidas nos volumes de L´Énciclopédie de Diderot, e pela importância assumida pela ciência separada definitivamente dos controles restritivos da religião. O estudo e identificação das diferentes doenças levaram à definição, não somente dos tratamentos médicos, mas também à necessidade de espaços físicos com características específicas. Nesse século, surge o tema do hospital como tipologia arquitetônica, quando na França, o cientista Jean Baptiste Le Roy e o arquiteto Charles François Viel elaboram em 1773, a solução do hospital organizado em pavilhões ao longo de um pátio central. Este esquema planimétrico se manteve até o início do século XX e representou a primeira presença do tema do hospital nos tratados de arquitetura do século XIX: ele aparece na seleção de edifícios antigos e “modernos” de Jean Nicolas Louis Durand, que servia de base para o ensino de arquitetura na Escola Politécnica de Paris, e posteriormente na École des Beaux-Arts de Paris. O aperfeiçoamento desta solução foi elaborado na França por H. Laribosière em 1839, e posteriormente na Inglaterra por Florence Nightingale. Também incidiu na atenção ao tema do hospital à importância cada vez maior das guerras e o tratamento dos feridos em grande escala, cujo momento mais dramático aconteceu na Primeira Guerra Mundial (1914-1918).
Até a chegada da Corte portuguesa no Brasil em 1808, a situação da salubridade nas cidades coloniais era bastante precária. Assim, ao longo do século XIX, desde D. João VI até D. Pedro II, se aceleraram as medidas para criar condições mínimas de atenção médicas, em particular nas principais capitais. Também se iniciaram as academias de medicina para o ensino dessa especialidade. Se a tipologia dos pavilhões era utilizada para o isolamento dos doentes fora das áreas urbanas, nas cidades se constroem edifícios de grande porte, em geral identificados pela utilização do estilo neoclássico: em Salvador o Hospital Santa Izabel (1840) e o Abrigo D. Pedro II (1862); no Rio de Janeiro o Hospício Pedro II (1842-1852) e o Hospital da Beneficência Portuguesa (1858). Com a difusão dos estilos historicistas na Europa, no Brasil, na segunda metade do século XIX, eles começam a ser aplicados nos novos hospitais que surgem na mudança do século: os edifícios em Ouro Preto e Mariana; o Hospital Espanhol em Salvador (1897); o Hospital Central do Exército em Rio de Janeiro (1892-1902). Um conjunto de edifícios é desenvolvido em São Paulo por um arquiteto de renome: Francisco de Paula Ramos de Azevedo projeta o Hospital da Santa Casa da Misericórdia (1885), como o sistema de pavilhões; e posteriormente os hospitais de Alienados, Militar, e de Crianças da Cruz Vermelha Brasileira. O paroxismo do ecletismo culmina no Rio de Janeiro com a arquitetura mourisca do Instituto Oswaldo Cruz (1905-1918); e na identificação com as tradições locais do estilo Neocolonial no Hospital Gaffrée & Guinle (1924-1929). Menos expressivos na sua simplicidade formal, são as colônias de leprosários que se constroem em Santa Catarina e Minas Gerais no século XX: as colônias Sant´ana e Santa Teresa em Florianópolis; a Colônia Santa Isabel em Betim.
Se por uma parte na Europa se desenvolveu o modelo do hospital horizontal por pavilhões, nos Estados Unidos se privilegiou o bloco concentrado de grandes dimensões; e desde o início do século XX o edifício alto para conter mais de mil leitos. Já desde 1811, o arquiteto Charles Bulfinch projetou o Massachusetts General Hospital de 905 leitos. Também, foi importante o relacionamento estabelecido entre os hospitais e as universidades que os aproveitavam para o ensino da medicina: as primeiras foram Yale, Columbia, Harvard e Cornell. Com o surgimento das classes médias urbanas aconteceu à pressão sobre os governos para que assumissem a responsabilidade da saúde pública. Esse foi um processo lento, já que até os anos trinta na América Latina, as elites no poder não se interessavam nestes gastos sociais. Com a chegada dos regimes democráticos e populistas, entre os anos trinta e cinquenta, mudou radicalmente a postura do Estado frente às necessidades básicas da população, também em coincidência com a importância outorgada pelo Movimento Moderno à arquitetura de conteúdo social. Com o intenso processo imigratório proveniente da Europa criou-se um movimento de proteção da saúde dos membros de cada nacionalidade: surgiram assim os hospitais das comunidades espanholas, italianas, sírio-libanesas, israelitas, entre outros.
O aprofundamento dos conteúdos científicos da medicina e a identificação das características das diferentes doenças, originou os hospitais especializados, dedicados ao câncer, ao coração, às doenças venéreas, infantis, e nas primeiras décadas do século vinte, à tuberculose. Esse tema teve particular significação em Minas Gerais devidas ás condições favoráveis do clima na região de Belo Horizonte, que foi chamada a “Suíça Mineira”. O principal hospital de quase mil leitos, ainda projetado no sistema horizontal de pavilhões, foi inaugurado por Juscelino Kubitschek com o nome da sua mãe, Júlia. E curiosamente, a influência de Aalto no Brasil apareceu nas formas puras de faixas horizontais das galerias em balanço do Sanatório de Santa Teresinha em Bahia (1941), mas também dos sanatórios Santa Maria (1945) em Jacarepaguá, Rio e Azevedo Lima (1945), em Niterói. A presença da modernidade europeia também foi evidenciada na Pupileira de Salvador (1935), cuja fachada curva e contínua de vidro, lembra os projetos de J.J. P. Oud em Rotterdam.
Mas, o grande momento da história dos hospitais modernos aconteceu entre as décadas dos anos trinta e os anos cinquenta, não somente no Brasil com a Revolução de Getúlio Vargas, mas também na maioria dos países da América Latina. Por uma parte, se assimilou a influência dos Estados Unidos através da Fundação Rockefeller, que desempenhou um papel significativo na modernização da medicina brasileira com antecedência à Segunda Guerra Mundial. Foi marcante a sua presença na Escola de Enfermagem da USP (1943), projetada pelo arquiteto alemão Peter Pfisterer, que residia nos Estados Unidos e participou no escritório de Richard Neutra. E, também, pelo relacionamento estabelecido entre as Faculdades de Medicina e os Hospitais das Clínicas de grande porte, sempre concebidos com mais de mil leitos. Nos anos quarenta se constrói o Hospital das Clínicas em Buenos Aires, em estilo Art Déco; mas já alguns dos arquitetos da vanguarda, elaboram projetos com a linguagem racionalista: citemos na Argentina, Eduardo Sacriste, Jorge Vivanco, Antonio e Carlos Vilar, Mario Roberto Álvarez e Eithel Traine, autor da Cidade Hospital de Tucumán (1953). No Uruguai, o arquiteto Carlos Surraco projeta, nos anos trinta, o principal hospital de Montevideu; e dentro da Cidade Universitária de Caracas, Carlos Raúl Villanueva coloca o Hospital das Clínicas presidindo o conjunto do Campus (1945-1954). Importância também assumida pelo Hospital Universitário nos projetos de Lúcio Costa e Le Corbusier para a Universidade do Brasil no Rio de Janeiro (1936); que se manteve na Cidade Universitária concretizada por Jorge Machado Moreira na Ilha do Fundão (1949-1952), cujo hospital de dois mil camas foi o maior do Brasil. Infelizmente nunca se completou e ficou abandonado na metade da sua superfície original de 200 mil metros quadros; sendo tragicamente decepado com a sua absurda derrubada em 2010. Sem dúvida, o principal desenvolvimento da saúde pública na America Latina aconteceu no México, pais que fez significativos investimentos em conjuntos hospitalares, especialmente na capital. Nos anos trinta emerge a obra do arquiteto Juan Villagrán García, com a obra do Hospital Infantil (1941-1943); e nos anos cinquenta, a figura de Enrique Yáñéz, autor, com Vilagrán, Mario Pani e Enrique del Moral, do Centro Médico da Cidade do México (1945-1954), com um conjunto de grandes edifícios especializados nas diferentes doenças.
Em conclusão, esta coleção de livros evidencia a importância adquirida pela saúde nas estruturas funcionais da sociedade brasileira. Ainda de maior interesse do ponto de vista da arquitetura, é a crescente participação de profissionais de renome na elaboração de projetos relacionados com o tema da saúde pública. Já nos anos trinta, alguns dos pioneiros do Movimento Moderno começaram a se interessar em projetar edifícios de conteúdo social: no Rio de Janeiro, em 1935, Paulo de Camargo e Almeida constrói o Asilo São Luís no Cajú; e Oscar Niemeyer, a Obra do Berço na Lagoa em 1937. Luis Nunes, um dos jovens agitadores da vanguarda dos anos trinta na ENBA, quando se estabelece em Pernambuco, projeta o Hospital da Brigada Militar em Recife (1935-1937) e o Leprosário de Mirueira (1936). A significação de São Paulo como capital econômica do Brasil, se evidencia no grande porte das construções hospitalares realizadas por Oscar Niemeyer, Rino Levi, Roberto Cerqueira Cesar Roberto Carvalho Franco, F.A. Pestalozzi,, entre outros, citemos o projeto para a Maternidade da Universidade de São Paulo (1946); o Instituto de Gastroenterologia, também da Universidade; o Instituto Central do Câncer (1954); e também, Siegbert Zanettini, realiza o Hospital e Maternidade de Vila Nova Cachoerinha (1968-1972). Em Minas Gerais, Cataguases, Francisco Bolonha constrói o Hospital de Maternidade (1951); e no Rio de Janeiro, Firminho F. Saldanha projeta o Hospital dos Marítimos (1955); e Oscar Niemeyer com Hélio Uchôa, o Hospital Sul America (1952-1959), que se transforma em um modelo nacional do bloco puro sobre pilotis.
Para além do conteúdo dos livros aqui resenhados, achamos importante refletir sobre outras possibilidades a serem exploradas em relação ao tema, especialmente trazendo-o para a contemporaneidade. No final do século XX, os arquitetos conseguiram escapar dos esquemas rígidos que genericamente caracterizavam os edifícios hospitalares e conseguiram desenvolver uma originalidade formal e espacial. Na Argentina, citemos o Hospital Naval de Clorindo Testa (1970), com as suas referências ao tema do barco; e a exuberância expressiva de Miguel Ángel Roca, aplicada no Hospital de Urgências na cidade de Córdoba (1979). A adaptação ao clima tropical foi pesquisada nos anos cinquenta por Amancio Williams, com a solução da dupla cobertura no projeto de hospitais na Província de Corrientes, logo aplicada pelos jovens profissionais Llauró e Urgel, no Hospital Regional de Orán na Província de Salta (1963-1977). Esses projetos argentinos seriam sem dúvida, os antecedentes dos estudos desenvolvidos por João Filgueiras Lima no Brasil na série de hospitais da Rede Sarah, cuja adaptação ao clima, o uso de materiais leves, o desenvolvimento de elementos pré-fabricados, e as soluções obtidas de iluminação natural, colocam suas obras, espalhadas em diversas cidades do Brasil, entre os melhores exemplos de hospitais a escala internacional na atualidade. E mais importante, evidencia-se o cuidado do arquiteto em estudar os ambientes com um conteúdo humanizado, adaptado aos diferentes tipos de pacientes – são significativas ás áreas de crianças e adolescentes –, com a intenção de criar um contexto espacial familiar, que rejeite a tradicional imagem fria e impessoal do hospital. Evidentemente com Lelé, o tema da arquitetura hospitalar no Brasil saiu definitivamente da linha da sombra.
sobre o autor
Roberto Segre, arquiteto e crítico de arquitetura, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro.