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drops ISSN 2175-6716

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Veja o artigo de Agnaldo Farias sobre as fotografias da artista plástica Rosângela Dorazio. Essse trabalho se diferencia das exposições de fotografias em geral, por receber a intereferência da artista por cima do registro fotográfico.

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FARIAS, Agnaldo. Fotografar, desenhar, gravar: dilacerar. Drops, São Paulo, ano 12, n. 055.04, Vitruvius, abr. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/12.055/4322>.



A pretensão da fotografia, já se sabe, é a suspensão do tempo ou, o que dá no mesmo, a condenação à morte de uma paisagem, do rosto de uma pessoa, de uma cena, coisas e acontecimentos banais ou singulares, não importa, algo que a câmera, simples ou sofisticada mas sempre uma câmera mortuária, fixa em seu interior, subtraindo o movimento que obstinadamente leva de roldão tudo o que há para os confins dos dias e noites;

E não pode haver beleza no movimento, já que essa, senão em ao menos no princípio, confinaria com a estabilidade, com a rigidez própria a arquitetura, aos retratos realizados em telas e nas primeira fotografias, aquelas que demandavam aos modelos horas intermináveis em poses paralisadas; o problema é que necessitamos de beleza e, na medida em que somos o que olhamos, conservamos algo da crença milenar, relembrada por Brodsky em seu livro sobre Veneza, que aconselhava a mulher grávida a olhar para belos objetos caso desejasse beleza ao seu filho;

Como tudo que há no mundo se movimenta, criamos a arte como recurso à necessidade de instância, ao coágulo do tempo e, consequentemente, à calma; arquitetura, pintura, escultura podem ser formas de produção de imagens fixas; a fotografia também, muito embora, diversamente das outras três, pode demandar nada mais do que um simples instantâneo para a captura de algo que lhe é exterior; sendo assim haveria possibilidade da beleza habitar um fenômeno de superfície como esse? para servir de morada à beleza não seria necessário mais tempo de produção sob risco de uma queda no vácuo? por outro lado, quem disse que a beleza seja, afinal, necessária?

As fotos/desenhos/gravuras de Rosângela Dorazio comentam esses impasses;  sobrepassando a condição das fotos como espelho de imagens mortas, um plano de inflexão do mundo que atua como depósito de instantes, a artista risca parcialmente cada uma delas, ataca com uma ponta seca, um lápis que prefere sequer trocar grafite com a superfície, os renques de árvores e de prédios que margeiam lagos, parques e veredas; vai dilacerando o papel que serve de suporte aos arranjos orgânicos e geométricos, escarificando-os a maneira de um gravador que abre sulcos numa chapa de metal ou madeira através de estiletes e burís;

A artista destrói as imagens quase sempre deixando um rastro delas  nos reflexos silenciosos de lagos e poças; as imagens, agora flutuando em superficies líquidas, carregam consigo o eco de imagens que não mais existem, o que serve como demonstração da impossibilidade de reter o visível, de que toda fotografia fundada na lógica do documento e do registro acena uma ilusão tão concreta quanto a nitidez das imagens estampadas.

Não há nada lá agora, diz-nos Rosângela sobre suas fotografias, o que também vale para as fotografias em geral; havia e, no seu caso, a prova está em sombras e reflexos; e porque quer que haja, porque não se resigna a essa impassividade tão bela quanto ôca, a artista risca com violência as imagens, dilacera-as de modo a pretender vivificá-las, mesmo que o seu miolo seja essa matéria branca, inexpressiva, desimportante, agora encrespado, excitado pelos gestos, a beleza se desfaz, descongelada pela energia que volta a fluir.

sobre o autor

Agnaldo Farias é Arquiteto e urbanista, e atualmente Professor Doutor do Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da FAU USP. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Crítica da Arte.

Exposição Rosângela Dorazio
Foto divulgação

Exposição Rosângela Dorazio
Foto divulgação

 

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