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my city ISSN 1982-9922

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Este artigo busca ressaltar alguns dos aspectos conceituais do Plano Preliminar de Urbanismo de Curitiba (1965), de modo a enfatizar a importância do pensamento do arquiteto Jorge Wilheim, a partir de uma breve apreciação de sua obra.

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BORBA VIANNA, Fabiano. Jorge Wilheim. 50 anos do Plano de Curitiba. Minha Cidade, São Paulo, ano 16, n. 181.01, Vitruvius, ago. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/16.181/5630>.


IPPUC, criado em 1965 e instalado na sede da Rua Bom Jesus
Foto Fabiano Borba Vianna


Em julho de 1965, uma equipe de trabalho coordenada pelo arquiteto Jorge Wilheim entregou ao então prefeito de Curitiba, o engenheiro Ivo Arzua, um documento de grande importância para a história da cidade. Trata-se do Plano Preliminar de Urbanismo de Curitiba (1), um volume e mapas contendo uma análise da situação da cidade, uma proposta do plano preliminar, a estrutura para a elaboração do Plano Diretor, e um programa de ação. O material todo foi elaborado em um período de quatro meses, fruto do trabalho coordenado pelo arquiteto Jorge Wilheim, autor da proposta projetual, porém, com a peculiaridade de ter sido desenvolvida com o apoio de uma equipe local de profissionais. Este período de desenvolvimento do plano junto com o grupo local de acompanhamento se constitui em um trabalho e discussões de arquitetura e urbanismo que desencadeou uma sequência de eventos importantes para o futuro da cidade de Curitiba, em que o elemento estruturante estava contido na força do desenho, num projeto de cidade no qual o grupo acreditava. Trata-se de um período de interação e, também importante, de retroalimentação entre o arquiteto Jorge Wilheim e de jovens arquitetos locais recém-formados, que por sua vez possuíam, naquele momento, uma sensibilidade projetual latente sobre a cidade de Curitiba.

A análise do pensamento e da obra do arquiteto Jorge Wilheim, aliada ao exame de sua biografia, permite afirmar o seu protagonismo no campo da arquitetura e urbanismo no Brasil. Desde os anos 1950, Wilheim participou da elaboração de diversos planos urbanísticos, projetos de arquitetura de diferentes tipologias e escalas, recebeu premiações em concursos de arquitetura, atuou no setor público na área de planejamento, foi representante na comissão de urbanismo da União Internacional de Arquitetos (UIA), tendo ainda publicado diversos livros. Além do plano de Curitiba, o arquiteto desenvolveu planos para Angélica (1954), concurso para Brasília (1956), planos para Joinville (1965), Osasco (1966), Vale do Tietê (1966), Natal (1967), Goiânia (1968), entre outros. Deve-se citar ainda o projeto do complexo Parque Anhembi (1968), o projeto de reurbanização do Páteo do Colégio em São Paulo (1974), e o projeto de reurbanização do Vale do Anhangabaú (1981), vencido em concurso público promovido pelo IAB.

Em termos conceituais, as teorias desenvolvidas por Wilheim, aplicadas no Plano de Curitiba, possibilitam observar a vanguarda de seu pensamento que abrangia, já nos anos 1960, o domínio do estado da arte no campo da arquitetura e urbanismo. Conforme se observa no seu livro intitulado Urbanismo no subdesenvolvimento, o arquiteto criticava os chamados “planos tradicionais”, ou seja, planos que são apenas quantitativos e desintegrados, que se alienam da realidade por não se dedicarem à sua compreensão e sim à sua quantificação, e que são inoperantes porque não objetivam iniciar processos de transformação. Afirma o autor: “Planejar é implantar um processo de transformação” (2). Em continuidade ao raciocínio, o arquiteto propõe as seguintes questões: “Por que deveriam as atividades urbanas se encaixar nesta visão idealista proposta pelo urbanista?” Ou ainda: “A disciplina de um zoneamento rígido é o melhor palco para as atividades urbanas ou é uma segregação classista?” (3)

Wilheim desenvolve esta crítica ao que denomina de métodos tradicionais e sustenta que não se compreende urbanismo sem pensar nas relações da vida urbana, portanto, em consciência social, na importância da compreensão do conteúdo humano, e não em esquemas idealizados e com demasiada crença no cientificismo. Quando se pensa em cidade, escreve o autor, pensa-se em “vida urbana”. Para garantir a viabilidade de um plano, duas medidas principais são elencadas em seu método. Em primeiro lugar, o autor defende que o plano deve ser breve e realizado no menor tempo possível. Em segundo lugar, deve-se criar um grupo local de acompanhamento. Objetiva-se com isto formar quadros técnicos, capacitá-los, de modo a que possam constituir um núcleo inicial do órgão permanente de planejamento, fato que representa a garantia da continuidade do processo de transformação, a garantia de que o plano representa o início do processo, e não o seu fim.

Sob estes argumentos o arquiteto projetou um desenho para Curitiba como alternativa ao sistema de anéis viários, procedimento muito comum em cidades do Brasil e de diversos outros países. O próprio plano elaborado para Curitiba em 1943, de autoria do urbanista francês Alfred Agache, seguia este princípio de anéis. Wilheim compreende que o sistema de anéis viários impede a expansão do centro da cidade, de modo que os anéis seriam rapidamente superados pelo crescimento do tecido urbano, não sendo adequados para criar um desenvolvimento integrado (4). O arquiteto cria em Curitiba, então, o que ele denomina de “Estrutura Urbana”, cujo desenho representa dois ganchos tangenciais ao centro da cidade, de modo a preservar o centro histórico, porém, prevendo sua expansão, com duas grandes estruturas lineares de adensamento e circulação, a funcionar como vetores de desenvolvimento da cidade. A partir de uma leitura da condição própria da cidade, esta Estrutura Urbana emerge da identificação e ligação de traçados existentes, que passam a conectar polos de bairros, subcentros espontâneos da cidade. Percebe-se, pela leitura do projeto, a preocupação do autor em vincular o desenvolvimento da cidade à maior densidade, concentrando infraestrutura e o custo global das intervenções urbanas, conceito que hoje se pode chamar de cidade compacta.

Segundo Wilheim, a criação dos eixos estruturais tangenciais ao centro seriam a garantia da manutenção da Rua XV de Novembro, que era a rua comercial mais importante de Curitiba, como centro de convivência, em oposição a um sistema de anéis perimetrais e vias radiais. Conforme mencionou:

“Em vista do enorme crescimento demográfico previsto é necessário evitar cercar a cidade por um sistema de avenidas perimetrais rapidamente ultrapassadas, assim como, evitar levar avenidas radiais a um único centro. Ao contrário, deve-se procurar uma expansão linear ao longo de diretrizes dominantes. O desenvolvimento do centro na direção de sua rua principal, a XV de Novembro, responde a esta preocupação, bem como garante a manutenção do principal centro de convivência do curitibano. Este centro seria tangenciado por vias estruturais” (5)

Estas linhas de desenvolvimento tangenciais ao centro da cidade possibilitam preservá-lo da destruição provocada pelo automóvel. No centro, pretende-se evidenciar a história da cidade, com preferência ao pedestre, de modo a valorizar o convívio e a energia da área mais adensada e vibrante do território, o centro comercial e institucional, o coração da cidade. Por fim, Wilheim propõe ao prefeito Ivo Arzua a criação de um grupo local de planejamento, com objetivo de detalhar e implantar o plano, que será composto pela equipe que colaborou no desenvolvimento deste trabalho. Primeiramente formado como uma assessoria ligada diretamente ao executivo municipal, em dezembro de 1965 é criado o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), que nasce, portanto, em decorrência do desdobramento do próprio plano.

A despeito da atualidade de alguns conceitos desenvolvidos e aplicados no plano, esta breve análise da obra e do pensamento do arquiteto Jorge Wilheim permite demonstrar, em síntese, uma ideia de cidade que procura vincular o desenvolvimento de uma vida urbana com o aumento da consciência social; o método contextualista dos projetos; os valores humanistas que determinam o privilégio dos pedestres nas intervenções urbanas; a criação de uma estrutura urbana como elemento ordenador do desenvolvimento da cidade; o contexto aberto e vinculado à possibilidade de um contínuo desenvolvimento dos projetos urbanos com envolvimento de equipes profissionais de planejamento. São considerações que sugerem aproximações conceituais do pensamento de Wilheim com algumas vanguardas europeias dos anos 1960. Deve-se destacar, ainda, o distanciamento deste modo de pensar a cidade de propostas que exaltam a mera planificação funcionalista, ou ainda, com modelos de propostas utopistas, também característicos do período, em razão da ênfase de Wilheim em iniciar processos efetivos de transformação das cidades.

A partir dos argumentos expostos, aproveita-se a efeméride dos 50 anos de existência do Plano Preliminar de Urbanismo de Curitiba para ressaltar alguns de seus princípios fundamentais, cuja fundação do instituto de pesquisa e planejamento urbano da cidade está diretamente vinculada, e destacar a memória de um de seus mais importantes personagens, o arquiteto Jorge Wilheim, que faleceu em fevereiro de 2014.

notas

1
WILHEIM, Jorge; SERETE, Sociedade de Estudos e Projetos Ltda. Plano preliminar de urbanismo de Curitiba. Curitiba, Prefeitura Municipal de Curitiba: IPPUC, 1965.

2
WILHEIM, Jorge. Urbanismo no subdesenvolvimento. Rio de Janeiro, Saga, 1969, p. 102.

3
Idem, ibidem, p. 86.

4
WILHEIM, Jorge. Entrevista concedida ao autor. São Paulo, 16.out. 2013.

5
WILHEIM, Jorge; SERETE, Sociedade de Estudos e Projetos Ltda. Op. cit., p. XIV.

sobre o autor

Fabiano Borba Vianna é doutorando e mestre em arquitetura e urbanismo FAUUSP, especialista em meio ambiente e desenvolvimento UFPR, é professor na PUCPR e arquiteto e urbanista do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba IPPUC.

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