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my city ISSN 1982-9922

abstracts

português
Descrição técnica da causa do repentino desmonte ocorrido às vésperas das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro, por uma onda do mar, de ciclovia apresentada como uma das obras urbanas pertencente ao pacote de melhorias de infraestrutura.

english
In April 2016, the eve of the 2016 Olympics in Rio de Janeiro, one of the urban construction that was part of the set of infrastructure improvements for this city had a part destroyed by a wave of the sea, causing deaths.

how to quote

BUENO, Francisco Caparroz. Tragédia na ciclovia e a determinação de responsabilidade. Uma análise da lei. Minha Cidade, São Paulo, ano 16, n. 191.04, Vitruvius, jun. 2016 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/minhacidade/16.191/6043>.


Desabamento de parte da Ciclovia Tim Maia, em abril de 2016
Foto Fernando Frazão [Agência Brasil]


A Ciclovia Tim Maia na cidade do Rio de Janeiro, no dia 21 de abril de 2016, teve um trecho atingido e derrubado pelas ondas do mar, devido à uma ressaca (1). A ressaca, apesar de ser um fenômeno frequente em grande parte do litoral brasileiro e, sobretudo no Rio de Janeiro, desta vez “surpreendeu”. Busca-se entender os fatos, na busca os responsáveis pelo acidente envolvendo a estrutura da ciclovia que, não resistiu à força das águas. Há indícios de graves falhas, do ponto de vista projetual e político-administrativo, ou seja, do projeto básico (2) que antecede a licitação de obras, evoluindo ao projeto executivo apresentado pela construtora vencedora da licitação. Projeto este que foi aprovado e fiscalizado durante as obras, e uma vez construído foi liberado ao público pelos respectivos órgãos competentes.

Após três meses de sua inauguração, a ciclovia Tim Maia recebeu a atenção da mídia devido à tragédia, onde, e parte da estrutura da ciclovia foi “arremessada” pela ação das águas que, gerou vítimas fatais. Em reportagem pelo jornal O Globo, o especialista em pontes e conselheiro do Crea-RJ, o engenheiro civil, Antônio Eulálio, levanta a hipótese de que não foi considerada a ação das ondas, que fizeram a estrutura tombar. Hipótese confirmada no processo determinando a interdição da ciclovia, decidida pelo juiz Marcelo Martins Evaristo da Silva, dias depois.

A reportagem, realça ainda, o fato da ausência de ancoragem da pista aos pilares o que, em outras palavras, seria uma “amarração” entre as partes, solução que evitaria que a estrutura ficasse “solta”, evitando o acidente.

Sob a ótica de que a onda foi capaz de arremessar uma estrutura de concreto de 50 metros de extensão e com peso estimado de dez toneladas, surge uma pergunta: teriam as vítimas, (com aproximadamente 80 quilos cada uma), sobrevivido, mesmo que a estrutura suportasse a força das ondas? A resposta provável é: não. O fato de ter havido vítimas, além de lamentável, é relevante para o estudo, pois a fatalidade de terem sido arrastada pelas águas, também foi a mesma da estrutura que caiu. Em outras palavras: caso a ciclovia ficasse intacta, não teriam as pessoas sido levadas pela onda, da mesma maneira?

A “Lei de licitações” (Lei federal nº8666, de 21 de junho de 1993 no seu artigo 6º), compreende o objeto como “empreitada integral”, ou seja, que a parte contratada será responsável do início ao fim dos trabalhos, direta ou indiretamente, portanto, sendo de sua responsabilidade todos os serviços prestados, mesmo que terceirizados e que tenha “requisitos técnicos e legais para sua utilização em condições de segurança estrutural e operacional [...] adequadas às finalidades que foi contratada” (3). Pode-se constatar, em nosso caso, que a construtora foi responsável por infringir a lei e seu contrato, por não prever as “condições de segurança estrutural”, causados por eventos naturais previstos com frequência para região.

Também se prevê no artigo 12, da mesma lei, a “segurança” como o primeiro item a ser considerado em projetos básicos e executivos. Essa premissa, apesar de óbvia sobre os termos de compromissos profissionais dos agentes envolvidos no processo licitatório e construtivo, aponta uma raiz para o caso anteriormente descrito. Significando ser função do autor do projeto, a previsão de soluções que garantam segurança do sujeito que fará uso da obra (4), sob condições normais de uso e intemperes do tempo.

A comprovação destes itens foi apontada no relatório apresentado pelo CREA-RJ (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio de Janeiro), no dia 30 de maio, aponta como evidencias o descumprimento destas diversas ordens: das falhas projetuais, na licitação, fiscalização e a falta de ética do exercício profissional (5).

Das falhas de projeto aponta a ausência dos estudos oceanográficos, da licitação e fiscalização do contrato aponta que foi retirado o item de comprovação de experiência no projeto executivo de obras-de-arte especiais pelas empresas contratantes, no descumprimento da lei de licitações por não considerar cargas que possam comprometer a estrutura e a ausência dos registro de ART (Anotação de Responsabilidade Técnica), juntamente ao CREA-RJ, que são determinados pela NBR 6118/2014  a Norma Técnica Brasileira de Projeto de Estruturas de Concreto-Procedimentos (6).

Estas responsabilidades técnicas deveriam estar anexadas aos projetos básicos e executivos em documentos específicos, as ausências demonstram a omissão profissional dos órgãos de fiscalização ou refletem uma profunda artimanha política de esconder as falhas de um projeto na intenção de executá-lo a qualquer custo. Independente do motivo, a consequência é o descaso do exercício profissional sofrido por engenheiros e arquitetos frente a tais projetos.

No tangente a falha de ética do exercício profissional, nos aprofundaremos nos termos, projeto, projeto básico e projeto executivo. Consideremos a definição da palavra “projeto”, segundo resolução do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, emitida em 2012:

“criação do espírito, documentada através de representação gráfica ou escrita de modo a permitir a sua materialização, podendo referir-se a uma obra ou instalação, a ser realizada através de princípios técnicos e científicos, visando à consecução de um objetivo ou meta e adequando-se aos recursos disponíveis e às alternativas que conduzem à viabilidade de sua execução” (7).

Pode-se apoiar ao termo “viabilidade de sua execução” com finalidade de reforçar a premissa: o autor do projeto torna-se responsável pela solução adotada, assim como por assegurar ao usuário da edificação, não sofra nenhum dano ou prejuízo físico, em outras palavras, que a edificação não “cairá sobre sua cabeça”.

O termo “projeto básico”, podemos observar na produção legal e resolutiva desse mesmo conselho profissional que se trata de:

“Subetapa opcional destinada à concepção e à representação das informações técnicas da edificação e de seus elementos, instalações e componentes, ainda não completas ou definitivas, mas consideradas compatíveis com os projetos básicos das atividades técnicas necessárias e suficientes à licitação (contratação) dos serviços de obra correspondentes” (8).

Embora defina o termo como “suficientes à licitação”, a determinação desta etapa de projeto é colocada como “subetapa opcional”, pois a mesma oferece margem para alterações futuras, pois já está implícito que haverá uma etapa posterior e complementar a esta. Assim é posto a dúvida da pertinência de utilizar-se de um “Projeto Básico” para a licitação de obras da construção civil, incluindo as realizadas pelo poder Público.

E mergulhado sob esta mesma perspectiva, para justificar a afirmação, a definição segue:

“Apesar da previsão legal (Lei nº 8.666/93), este documento recomenda que a realização de orçamentos, que servirão para licitações de obras, utilize como base somente o Projeto para Execução, e não o Projeto Básico. Tal recomendação visa garantir maior exatidão e transparência nos contratos de construção” (9).

Este documento elucida uma preocupação por parte da entidade, apontando uma brecha na “Lei de Licitações, nº 8.666/93” permitindo que empresas sejam contratadas para execução de obras apenas com o “ Projeto Básico” e não com o “ Projeto para Execução”, o qual por definição é “à representação final” e “definitivas” “à execução dos serviços” (10). Ele ainda ressalta que os orçamentos exigidos no processo de licitação de obras, apoiados sob o “Projeto Básico” são insuficientes para garantir a vitalidade do início ao fim das obras.

Postas definições e observações, apontou ainda o relatório do CREA-RJ (11) que não foram encontrados os registros de ART de projeto básico, do orçamento da obra e da fiscalização da obra pelo contratante e órgão de controle-TCM, os autores e responsáveis técnicos não são identificados nos desenhos técnicos do projeto e a autorização para liberação para execução também é ausente. Não seria estas, portanto, evidencias suficientes para a demonstração de corrupção neste setor? Incompreensível é a execução de uma obra sem liberação para tal e ainda, um projeto sem autoria.

Sob a ótica da corrupção, as leis precisam ser mais claras, objetivas e com menor burocracia, com a finalidade de não obscurecer os fatos e responsáveis por eventuais tragédias, mas com o intuito de evidenciá-los. As investigações estão avançando, mas inda longe de punir os culpados.

Das vítimas, não desmerecemos a força das águas. Da estrutura arremessada, o que interferiu a segurança da construção, soluções deveriam ter sido previstas, mas sobretudo, considera-se ato falho e primário, a ausência do estudo da carta das marés do local, o qual deveria constar no “Projeto Básico”, este estudo é parte do conjunto de “princípios técnicos e científicos” previstos na definição da palavra “projeto”. O prazo para a punição dos responsáveis pode estar longe, mas a responsabilidade dos arquitetos e engenheiros, ao elaborar um projeto está evidenciada pela “surpresa” das ondas.

notas

1
Sobre o acidente envolvendo ponte da ciclovia, ver: BACELAR, Carina. Justiça determina a interdição total da Ciclovia Tim Maia. O Globo, Rio de Janeiro, 6 maio 2016 <http://oglobo.globo.com/rio/justica-determina-interdicao-total-da-ciclovia-tim-maia-19250551>; EDITORIAL. Evidências de falhas em série na queda da ciclovia. O Globo, Rio de Janeiro, 27 abr. 2016<http://oglobo.globo.com/opiniao/evidencias-de-falhas-em-serie-na-queda-da-ciclovia-19173102>; G1 RIO. Especialista diz que projeto básico de ciclovia não previu força das ondas. O Globo, Rio de Janeiro, 25 abr. 2016 <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/04/especialista-diz-que-projeto-basico-de-ciclovia-nao-previu-forca-das-ondas.html>; O ESTADO DE S. PAULO. Perícia aponta que ciclovia no Rio caiu por estar só encaixada em pilares. Estadão, Rio de Janeiro 29 abr. 2016 <http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/agencia-estado/2016/04/29/pericia-aponta-que-ciclovia-caiu-por-estar-so-encaixada-em-pilares.htm>; O GLOBO. Onda derruba ciclovia, mata dois e expõe falha em obra. Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP, São Paulo, 22 abr. 2016 <www.antp.org.br/noticias/clippings/onda-derruba-ciclovia-mata-dois-e-expoe-falha-em-obra.html>; VETTORAZZO, Lucas. Prefeitura do Rio questiona cálculo em projeto de ciclovia que desabou. Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 abr. 2016 http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/04/1763495-prefeitura-questiona-calculo-estrutural-da-concremat-em-projeto-de-ciclovia-que-desabou.shtml>.

2
LOBATO, Marcelo Costa e Silva. A importância do projeto básico nas licitações públicas de obras civis. Conteúdo Jurídico, Brasília, 21 nov. 2012 <www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-importancia-do-projeto-basico-nas-licitacoes-publicas-de-obras-civis,40719.html>.

3
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Brasília, Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos, 1993 <www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666compilado.htm>.

4
Sobre o assunto, ver também: CREA/PR. Projetos de obras públicas. Curitiba, 07 jan. 2014 <www.crea-pr.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2928&Itemid=183>.

5

Sobre o relatório de investigação para causas do acidente, apresentado pelo Crea-RJ <https://www.crea-rj.org.br/blog/crea-rj-apresenta-resultados-sobre-desabamento-da-ciclovia-tim-maia/>

Sobre a repercussão do relatório, ver também: <https://www.crea-rj.org.br/blog/relatorio-do-crea-rj-sobre-ciclovia-repercute-na-imprensa/>

6
Sobre o relatório de investigação para causas do acidente, apresentado pelo Crea-RJ <https://www.crea-rj.org.br/blog/crea-rj-apresenta-resultados-sobre-desabamento-da-ciclovia-tim-maia/>

7
CAU/BR. Resolução CAU/BR-21, de 5 de abril de 2.012. Brasília, Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, 2012 <www.caubr.gov.br/anexos/resolucao/RES-21_CAUBR_16_2012.pdf>.

8
CAU-BR. Tabela de honorários de serviços de arquitetura e urbanismo do Brasil. Módulo I - remuneração do projeto arquitetônico de edificações. 1ª edição aprovada pela Resolução 01/138-COSU- São Paulo, de 31.10.2011, do 138º Encontro do Conselho Superior – COSU do Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB, realizado em São Paulo SP, p. 16 <http://honorario.caubr.gov.br/doc/TAB-livro1-final.pdf>.

9
Idem, ibidem, p. 46.

10
Idem, ibidem, p. 19.

11
Sobre o relatório de investigação para causas do acidente, apresentado pelo Crea-RJ, ver: CREA-RJ. Crea-RJ apresenta resultados sobre desabamento da Ciclovia Tim Maia. Rio de Janeiro, Conselho Regional de Engenharia e Agronomia, 30 maio 2016 <https://www.crea-rj.org.br/blog/crea-rj-apresenta-resultados-sobre-desabamento-da-ciclovia-tim-maia>.

sobre o autor

Francisco Caparroz Bueno é arquiteto e urbanista graduado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie e sócio fundador do escritório Samba Arquitetura. Atualmente é mestrando no programa de pós-graduação em arquitetura e urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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