Your browser is out-of-date.

In order to have a more interesting navigation, we suggest upgrading your browser, clicking in one of the following links.
All browsers are free and easy to install.

 
  • in vitruvius
    • in magazines
    • in journal
  • \/
  •  

research

magazines

architectourism ISSN 1982-9930

Ruínas na Missão de São João RS. Foto Victor Hugo Mori

abstracts

português
A cidade “luz” abriga periferias pobres, degradadas e pouco “iluminadas”. O Projeto “Grand Paris” tem promovido transformações urbanas em algumas dessas áreas periféricas (Clichy Batignolles), enquanto outras ainda permanecem marginalizadas (Saint-Ouen).

english
The “city of lights" has “darkness” poor and degraded peripheral neighborhoods. The project "Grand Paris" is promoting urban transformations in some of these outlying areas (Clichy Batignolles), while others remains marginalized (Saint-Ouen).

español
La ciudad de las luces tiene barrios pobres, degradados y poco “iluminados”. El proyecto "Grand Paris" ha promovido transformaciones urbanas en algunas de estas áreas periféricas (Clichy Batignolles), mientras otras todavía siguen marginadas (Saint-Ouen).


how to quote

JATOBÁ, Sergio. Novos bairros além das Portas de Paris. Arquiteturismo, São Paulo, ano 09, n. 104.03, Vitruvius, nov. 2015 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquiteturismo/09.104/5817>.


Bairro de Saint Ouen, periferia norte de Paris
Foto Sergio Jatobá

Há mais de uma Paris, além da cidade luz que os cartões postais mostram. Em setembro de 2015, visitei pelo menos três “cidades” diferentes no perímetro da “Grande Paris”. A primeira foi a Paris dos Arrondissements centrais, de qualidades urbanas já bem conhecidas e sobre a qual não caberão maiores comentários nesse texto.

Bairro de Saint Ouen, conjuntos habitacionais
Foto Sergio Jatobá

As outras duas estão localizadas na Paris menos "iluminada", na qual poucos visitantes e mesmo parisienses se aventuram, e são bem diferentes da Paris turística. É a dos bairros periféricos, situados para além das “Portes” de Paris, fora do anel viário definido pelo traçado das antigas muralhas da cidade.

Bairro de Saint Ouen, entrada do Marché Jules Vallès
Foto Sergio Jatobá

Fui a um desses bairros, Saint-Ouen, em busca do famoso Mercado das Pulgas, local de comércio de antiguidades. Saint-Ouen, que pertence ao departamento Seine-Saint-Denis, está localizado na periferia norte de Paris, nos limites do 17º e do 18º Arrondissements.

Bairro de Saint Ouen, prédio residencial
Foto Sergio Jatobá

É a maior concentração proporcional de imigrantes em uma localidade francesa. Tem a mais elevada taxa de mortalidade infantil (5,7%), a população mais jovem (14% entre 14 e 24 anos) e uma das mais altas taxas de desemprego na França, que chegou a 43% entre os jovens em 2011 (1).

Bairro de Saint Ouen, rua comercial
Foto Sergio Jatobá

Nas suas ruas sujas e sem glamour não se vê brasseires nem boutiques luxuosas. É um local inseguro, com ocorrências de muitos roubos, tráfico de drogas, crimes e a tipologia urbana e arquitetônica não é a da Paris do Champs Elyseès, do Marais ou do Quartier Latin.

Bairro de Saint Ouen, arte urbana em parque
Foto Sergio Jatobá

A predominância é de conjuntos habitacionais populares construídos nas décadas de 1960 e 1970. Em suma, uma Paris com cara de terceiro mundo, onde os descolados mercados de antiguidades são enclaves cult, escondidos em meio a centenas de barracas e lojas populares que mais parecem a região do Saara no Rio de Janeiro.

Bairro de Saint Ouen, rua comercial
Foto Sergio Jatobá

Mas há uma nova periferia, bem diversa, nascendo não muito longe de Saint-Ouen. Trata-se de Clichy Batignolles, um projeto de renovação urbana em implantação no 17º Arrondissement (área noroeste da Grande Paris) com previsão de construção de 500 mil metros quadrados no entorno de um parque urbano com 10 hectares: o Parque Martin Luther King, com dois terços da sua área já concluídos em 2015.

Bairro de Clichy Batignolles, periferia noroeste de Paris
Foto Sergio Jatobá

O novo bairro em implantação é vendido como o coração de um eco-distrito de uso misto que combina área residencial acessível, lojas e escritórios, com responsabilidade social e ambiental. O complexo terá 2 estações de metrô, a serem construídas na extensão da linha 14 e uma linha de tramway.

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Quando completo, em 2019, abrigará 3400 unidades residenciais, parte delas com destinação social para estudantes, idosos, jovens trabalhadores, como promete o release do empreendimento, e previsão final de 6500 habitantes. O gabarito da maior parte dos edifícios já construídos é de 8 a 10 pavimentos, mas está prevista a construção de um arranha-céu com 160 metros de altura com assinatura de Renzo Piano e outros prédios com mais de 50 metros de altura (aproximadamente 17/18 pavimentos).

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Clichy Batignolles está em vias de obter o certificado de bairro ecológico do governo francês, em função da previsão de projetos de economia energética, eletricidade produzida por painéis solares, uso de energias renováveis, coleta de lixo automatizada à vácuo e projetos de desenvolvimento de biodoversidade.  Faz parte de uma  intervenção maior, o projeto “Grand Paris”, que inclui revitalização, melhorias urbanas e desenvolvimento de novas centralidades em áreas periféricas da capital francesa, inclusive Saint-Ouen.

Bairro de Clichy Batignolles, Parque Martin Luther King
Foto Sergio Jatobá

Clichy Batignolles tem pouco em comum com Saint-Ouen, além do fato de serem periferias localizadas em um mesmo eixo de intervenção urbana. As diferenças vão da tipologia arquitetônica ao perfil dos moradores. Em Clichy Batignolles quase não se vê imigrantes, mas uma jovem classe média francesa que busca moradia com preços mais acessíveis do que os das áreas centrais, mas com qualidade urbana diferenciada.

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Na minha visita, em uma luminosa tarde de domingo, vi muita gente jovem, crianças e adolescentes usufruindo de lazer, esportes e atividades culturais no Parque. Em suma, um ideal de área residencial qualificada, habitada por gente que parecia feliz, empregada e sem grandes sacrifícios para sobreviver.

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Clichy Batignolles e Saint-Ouen espelham realidades sociais diferentes e uma situação de desigualdade, que embora muito comum nos países em desenvolvimento, era bem mais rara em uma Europa economicamente e socialmente mais igualitária.  Mas a Europa não é a mesma depois da crise de 2008 e do recebimento crescente de imigrantes e refugiados das regiões mais pobres do mundo.

Bairro de Clichy Batignolles, pista de skate
Foto Sergio Jatobá

Nas intervenções urbanas também se notam posturas diferenciadas. Em Saint-Ouen projetos de requalificação urbana podem esbarrar em dificuldades típicas de locais submetidos a progressiva degradação física e social, com o risco de que as melhorias tenham como efeito colateral os criticados processos de gentrificação.

Bairro de Clichy Batignolles, pista de skate
Foto Sergio Jatobá

O projeto de Clichy Batignolles, por sua vez, ocorre em uma área desativada de uma estação ferroviária, não implicando, em um primeiro momento, em desapropriações e remoção de  moradores locais. Evidente que com essas características é bem mais interessante para o mercado imobiliário.

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Na verdade, Clichy Batignolles é um típico “écoquartier” ou um bairro ecológico, modelo urbanístico que surge na Europa no início dos anos 2000 buscando inserir o conceito de “cidade sustentável” nos empreendimentos imobiliários.  Exemplos desse tipo de bairro são Hammarby, em Estocolmo; Bo01 (Vastra Hamnen) em Malmo, Suécia; Vesterbro em Copenhagen, Dinamarca e mais recentemente o East Village em Londres, construído inicialmente para ser a vila olímpica dos jogos de 2012.

Bairro de Clichy Batignolles, atividades culturais
Foto Sergio Jatobá

É um empreendimento do tipo “ganha-ganha” que, à princípio, gera benefícios para todas as partes envolvidas: os empreendedores, que obtém terrenos a custos mais baixos do que nas áreas centrais; o governo, que aumenta sua receita via impostos ou captura de mais valia urbana e ainda se promove politicamente; os clientes, que adquirem moradia de qualidade a preços mais acessíveis e com grande potencial de valorização imobiliária e mesmo a comunidade do entorno, que ganha espaços públicos de qualidade em substituição as áreas degradadas e sem uso de antes.

Bairro de Clichy Batignolles
Foto Sergio Jatobá

Contudo, essa equação positiva não inclui populações marginalizadas, como as de Saint-Ouen, que continuam pagando o preço da origem pobre e permanecem como pobres no país rico. Para Fernando Pinto Ribeiro (2) as mesmas cidades que promovem os ecobairros, festejados midiaticamente como empreendimentos sustentáveis e precursores de um novo urbanismo, também têm visto crescer exponencialmente o desemprego e a pobreza, como Paris.

Bairro de Clichy Batignolles, Parque Martin Luther King
Foto Sergio Jatobá

Para os habitantes de Saint-Ouen ter saído da periferia do mundo para tentar um lugar ao sol na cidade dos privilegiados ainda não resultou em melhorias efetivas no seu padrão de vida e a periferia urbana onde residem ainda mantém sua condição periférica e à margem dos benefícios que a outra periferia, de Clichy Batignolles, experimenta.

Bairro de Clichy Batignolles, crianças no Parque
Foto Sergio Jatobá

notas

1
MOURA, Miguel. O euro foi uma armadilha para os pobres. El Pais, Madri, 29 nov. 2011. Disponível em <www.ihu.unisinos.br/noticias/503902-o-euro-foi-uma-armadilha-para-os-pobres>.

2
RIBEIRO, Fernando Pinto. O fenômeno do Écoquatier na Europa: tendências do discurso sustentável na transformação do território. In Revista Eletrônica Scripta Nova, v. 18, n. 486, Universidad de Barcelona, 20 ago. 2014. Disponível em <www.ub.edu/geocrit/sn/sn-486.htm>.

sobre o autor

Sérgio Jatobá é arquiteto e urbanista (UnB, 1981). Doutor em Desenvolvimento Sustentável (UnB/Universidad de Valladolid, 2006). Gerente de Estudos Urbanos da Codeplan/GDF. Pesquisador do Núcleo de Estudos Urbanos e Regionais – NEUR e do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília. Foi pesquisador bolsista do IPEA.

comments

104.03 viagem cultural
abstracts
how to quote

languages

original: português

share

104

104.01 viagem de estudo

As casinhas populares nas Reduções Jesuíticas que encantaram Lúcio Costa

Victor Hugo Mori

104.02 viagem ficcional

Copenhague e Curitiba: Moziquinho e Guguzinha, e a alimentação sadia

Alexandre de Oliveira Périgo

104.04 quiz show

Quem sabe o nome do arquiteto e/ou artista plástico?

Michel Gorski

104.05 editorial

Largo da Batata

Michel Gorski

newspaper


© 2000–2024 Vitruvius
All rights reserved

The sources are always responsible for the accuracy of the information provided