Esse guia tem como finalidade propor uma série de pequenos passeios para ser feitos na cidade que tem o caminhar como sua última opção. Turistas e moradores se veem sempre presos às grandes distâncias e, principalmente, ao Eixo Monumental como única atração turística da cidade. Brasília tem mais, muito mais, e são pequenas joias escondidas que se descobrem da forma mais inesperada: andando! Vamos lá?
O primeiro guia será, possivelmente, o mais simbólico dessa série. Transita por algumas das escalas propostas por Lucio Costa e confere, além de monumentos, e mostra as pequenas tradições dessa jovem cidade.
Guia 1: passeio bucólico
O início do passeio se dá pela já tradicional Igreja Nossa Senhora de Fátima, a famosa Igrejinha, que fica na entre quadra da 307/308 Sul. O conjunto formado pelas quadras 107, 307, 108 e 308 formam a Unidade de Vizinhança modelo, descrito por Lucio Costa. A ideia era que essas pequenas unidades fossem praticamente autônomas, com todos os serviços necessários para que os moradores não precisassem percorrer longas distâncias. Cada unidade teria uma escola, um comércio local com itens do cotidiano como padarias, farmácias, restaurantes e utilidades, uma igreja e uma biblioteca, além de um posto de saúde próximos. Tudo isso se subverteu ao longo dos anos, mas a maior parte dessas características foi mantida, especialmente nesse conjunto de quadras. A Igrejinha, projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, é famosa por sua simplicidade e pelo painel externo do artista plástico Athos Bulcão. Nos últimos anos, cresceu muito o número de casamentos realizados na Igrejinha e você pode dar a sorte de presenciar um ao vivo durante o passeio.
Depois de apreciar essa obra de grandes mestres, é hora de seguir andando: um passeio para a parte posterior da Igrejinha vai revelar o belíssimo paisagismo de Roberto Burle Marx para a quadra 308 sul e nos pilotis dos prédios será possível ver mais alguns painéis de Athos.
A dica é caminhar sem pressa, atravessar os pilotis livres e apreciar a paisagem, se dirigindo à avenida W3. Uma das avenidas mais movimentadas de Brasília, mas em estado de decadência, a W3 esconde um lugar inexplorado e bastante diferente: o Espaço Cultural Renato Russo. Com uma fachada tomada por grafites de artistas locais, o Espaço abriga amplas salas de teatro, salas de dança, salas expositivas e uma das maiores gibitecas do Brasil. De lá, retome o caminho de volta para a Igrejinha prestando atenção à Escola Parque da 308 Sul, projeto também de Oscar Niemeyer e patrimônio tombado pelo Iphan. No comércio local da 107 uma pausa muito bem vinda: a pizzaria Dom Bosco. Fundada em 1980, a pizzaria é famosa por servir apenas um sabor de pizza e o famoso mate, bebida muito popular entre os cariocas que foram para Brasília. A dica na pizzaria é pedir uma “dupla”: dois pedaços de pizza formando um sanduíche, para serem devorados em pé no balcão com um copo de mate gelado. A pizzaria mantém suas estruturas originais desde a inauguração e é um patrimônio imaterial e (ainda) não oficial da cidade. Mais uma dica: além da pizzaria Dom Bosco, na 107 sul fica também o restaurante Xique-xique, tradicional restaurante de comidas típicas nordestinas. Comida farta e preços justos!
Com as energias recarregadas, vale esticar o passeio até o cine Brasília, entre as quadras 107 e 106 sul. O projeto também é de Niemeyer e recebe, todos os anos, um festival de cinema. Pode conferir a programação antes de ir e aproveitar os jardins que ficam atrás do cinema para encerrar a caminhada.
Na 108 sul existe uma banca de jornal que é uma atração à parte: além de super antiga, a banca é uma miscelânea de produtos e até aluga DVD! Fica perto de uma árvore frondosa lindíssima e muito fotogênica!
Indo para os lados da 309, existe uma biblioteca pequena e escondida. E ao lado, fica o Clube de Vizinhança, que era pra ser replicado em todas as Unidades de Vizinhança, mas acabou sendo o único.
sobre a autora
Luiza Campos, brasiliense, Arquiteta e Urbanista com especialização em Museologia. Trabalha e vive atualmente em São Paulo.