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architexts ISSN 1809-6298


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Cristiano Nascimento destaca o francês Focault por seu interesse na relação entre sociedade e espaço edificado. Apesar de o foco não ser arquitetura, surge como suporte à construção de sua genealogia do conhecimento


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NASCIMENTO, Cristiano. O edifício como espaço analítico. Uma discussão das idéias de Foucault sobre a arquitetura. Arquitextos, São Paulo, ano 08, n. 093.04, Vitruvius, fev. 2008 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/168>.

Dentre os autores do campo das ciências humanas e sociais que têm demonstrado interesse pela relação entre sociedade e espaço edificado destaca-se o francês Michel Foucault. Ao construir uma história do conhecimento ocidental, Foucault se detém constantemente nos momentos de ruptura em que instituições sociais de origens medievais cedem lugar a novas práticas e sistemas de organização. Tal preocupação fica evidente quando o autor trata da emergência de campos do saber especializados, como medicina, psiquiatria, educação e instituições de justiça e punição.

Esses campos viriam a organizar novas instituições disciplinares que, por conseqüência, precisariam se abrigar em novos edifícios – específicos para cada função emergente (o asilo, o hospital, as escolas, as prisões) – e essas mudanças constituíram uma revolução na maneira como o poder é exercido sobre os indivíduos.

No campo da arquitetura, Foucault adquiriu particular popularidade com a obra “Vigiar e Punir”, principalmente pelo tratamento dado aos edifícios carcerários, mas não é raro que referências à obra sirvam tão somente como relato histórico dos edifícios ou como subsídios para a crítica das práticas opressivas das instituições de justiça.

A utilização das idéias de Foucault é ainda superficial. O seu discurso sobre a arquitetura apresenta consistência e autonomia. Pode ser lido como um modo de entender a relação dos indivíduos com os edifícios em geral – não é restrito somente aos casos utilizados pelo autor ou a um contexto histórico particular.

O foco das obras de Foucault certamente não é a arquitetura – ela surge como suporte à construção de sua genealogia do conhecimento. Acredita-se, entretanto, que é possível uma sistematização das interpretações do autor sobre os edifícios e que, a partir dela, é possível construir um lastro conceitual voltado à análise do processo de produção e do desempenho social de exemplares de arquitetura que lidem com a noção de ordem e poder.

1. A arquitetura e a especialização do poder

Foucault promove freqüentes discussões epistemológicas sobre as origens do poder disciplinar na sociedade ocidental, concluindo que esse tipo de poder é alcançado pelo ordenamento e manipulação das atividades dos indivíduos – ou mais precisamente, dos corpos – no tempo e no espaço (1). Ele é associado à emergência de novas organizações disciplinares na Europa do século XVIII e, como conseqüência, da elaboração de novos edifícios para abrigá-las adequadamente.

1.1 Classificação, ordem e disciplina pós-revolucionárias

Para Foucault, o processo de modernização que as nações ocidentais viveram após as revoluções do século XVIII (Revoluções Francesa e Industrial) afetou as suas estruturas sociais de maneira nunca antes vista. Diferentemente do que acontecia até então, tornava-se possível uma maior mobilidade social entre as classes. Os hábitos que até então eram regulados pelas instituições medievais – a igreja e a nobreza – finalmente davam lugar a novas estruturas de pensamento e de práticas sociais.

(...) As formas de administração associadas às organizações disciplinares que proliferaram no século XVIII em diante são diferentes da mobilização maciça de força de trabalho verificada nos projetos em grande escala nas civilizações agrárias. (...) (2)

Também as ciências e a filosofia procuravam se tornar independentes da formação eclesiástica e atuar em áreas cada vez mais especializadas, com a preocupação de difundir os novos conhecimentos no meio da sociedade comum. Os novos estados burgueses tomavam para si a tarefa de ordenar a sociedade. Como precisavam se afirmar como novos modelos de governo, negavam a cultura dogmática e prezavam pela racionalização e sistematização do conhecimento, fazendo uso de campos científicos emergentes (as ciências naturais, a mecânica racional, etc.) para subsidiar suas ações.

Soma-se a esse cenário a instauração de uma nova divisão do trabalho – consolidação do modo de produção capitalista industrial – que exigia a especialização dos produtos, dos meios de produção e da mão-de-obra. Em paralelo, decorre o acelerado crescimento das cidades, inchadas pela explosão da natalidade nas suas camadas mais pobres.

Os novos governos e suas novas instituições precisavam ordenar com urgência a multidão urbana e viabilizar o sistema como um todo. Exercer a caridade e simplesmente retirar do convívio alguns poucos indivíduos que se desviavam da moral cristã, a função da igreja no sistema medieval, não era mais suficiente. Mais eficiência no controle social demandava uma precisa sistematização de informações sobre os indivíduos.

O processo de contínua especialização exigia que a população fosse racionalmente classificada segundo suas capacidades ou incapacidades e educada, transformada em força produtiva; se necessário, deveria ser eficazmente punida. No entanto, punições físicas e penas de morte deixavam de fazer sentido ante os novos estudos sobre o comportamento humano e a moral iluminista (3). Aqueles que necessitassem ser afastados da sociedade passariam agora por um processo de reeducação – não mais de simples castigo ou encarceramento.

As soluções para o ordenamento dessa sociedade se dão em todos os níveis de prestações de serviço social, público ou privado – educação primária, medicina, sistema penal, processos de produção industrial.

Percebe-se a construção de uma idéia muito particular à Foucault – as estruturas de poder extrapolam o Estado e permeiam, de forma difusa e pouco explícita, as diversas práticas sociais cotidianas. As organizações disciplinares instauravam uma estratégia de controle silenciosa, onde a hierarquia de poder social deveria der definida, consolidada, reproduzida e realimentada (4).

1.2 Os dispositivos de organização disciplinar

Para se proceder à categorização dos seus indivíduos deveria ser possível apontar objetivamente as patologias sociais, identificar quais indivíduos poderiam conviver segundo as normas e quais precisariam ser excluídos desse direito por desrespeitá-las (5).

Foucault afirma, porém, que até o século XVIII a separação física entre indivíduos “especiais” e a sociedade “normal” era pouco organizada. A distinção entre os vários indivíduos e seus diversos desvios de conduta era ainda menos precisa (6).

Ele dá alguns exemplos. Na Idade Média, era nos mosteiros onde se praticava a caridade de acolher aqueles que não se desejava ter no convívio, que manifestassem alguma anormalidade em relação à saúde pública ou aos ideais cristãos. Já os criminosos eram segregados não espacialmente, mas de modo definitivo, através da pena de morte. A morte punitiva era normalmente precedida por um detalhado suplício do corpo – curiosamente realizado em praça pública, um espaço urbano não especializado (7).

Já na sociedade moderna, a situação de complexidade sem precedentes e a necessidade de organização e classificação científica dos indivíduos desencadeou uma fase de maior elaboração dos métodos de segregação. Cada anormalidade deveria ser enquadrada em um edifício diferente. A pena de morte e as torturas, consideradas práticas antiquadas e desumanas, são substituídas por critérios científicos de abordagem dos criminosos:

A eliminação pelo suplício é, assim, substituída por métodos de assepsia: a criminologia, a eugenia, a exclusão dos “degenerados”... (8)

Dentro de cada um desses edifícios, fazia-se necessário agrupar os casos semelhantes em compartimentos específicos (9). As estruturas espaciais tornam-se mais complexas no mesmo ritmo que os estratos da sociedade passam a ser enxergados com mais precisão – mais graus hierárquicos, maior grau de compartimentação no interior das edificações.

Em paralelo, o autor identifica a arquitetura como a interface necessária para que uma nova relação entre as instituições modernas formalmente constituídas e a massa de cidadãos comuns se estabeleça. Os novos edifícios, ou novos padrões de organização espacial, são instrumentos para instaurar modelos de comportamento sobre os indivíduos, principalmente quando as estrutura precedentes já não mais atendiam a tais expectativas.

Parece-me que, no final do século XVII, a arquitetura começa a se especializar, ao se articular com os problemas da população, da saúde, do urbanismo. Outrora, a arte de construir respondia sobretudo à necessidade manifestar o poder, a divindade, a força. O palácio e a igreja constituíam as grandes formas, às quais é preciso acrescentar as fortalezas; manifestava-se a força, manifestava-se o soberano, manifestava-se Deus. A arquitetura durante muito tempo se desenvolveu em torno dessas exigências. Ora, no final do século XVIII, novos problemas aparecem: trata-se de utilizar a organização do espaço para alcançar objetivos econômico-políticos. (10)

Algumas das obras de Foucault que tratam do surgimento de modernas instituições sociais têm associação direta com o surgimento de determinados tipos de edifícios da atualidade. É o caso, por exemplo, do hospital em “O Nascimento da Clínica”, do asilo em “História da Loucura” e do presídio em “Vigiar e Punir”.

1.3 Cada um no seu devido lugar

Foucault apresenta uma visão muito particular da utilização do espaço pela sociedade, descrevendo o processo de concepção de novos tipos de edifícios como forma de ilustrar e representar as próprias modificações na estrutura de pensamento ocidental nos séculos XVIII e XIX. Todavia, mesmo na relação indivíduos X instituições X edifícios, algumas peculiaridades se destacam.

Se em princípio parece evidente que a atitude de isolar indivíduos de um corpo social necessita do seu fechamento em uma estrutura física que garanta o confinamento e restrição ao livre convívio coletivo, para Foucault, esse fechamento genérico (apenas a diferenciação entre aqueles que ficam dentro dos muros e aqueles que ficam fora) não é suficiente para que se possa administrar detalhadamente os movimentos dos corpos nele confinados.

Um exemplo claro das novas condições de especialização que passam a ser impostas é a sua descrição da manufatura de Oberkampft, em Jouy:

Nas fábricas que aparecem no fim do século XVIII, o princípio do quadriculamento individualizante se complica. Importa distribuir os indivíduos num espaço onde se possa isolá-los e localizá-los; mas também articular essa distribuição sobre um aparelho de produção que tem suas exigências próprias. (...) Percorrendo-se o corredor central da oficina, é possível realizar uma vigilância ao mesmo tempo geral e individual; constatar a presença, a aplicação do operário, a qualidade do seu trabalho; comparar os operários entre si, classificá-los segundo a sua habilidade e rapidez; acompanhar os sucessivos estágios de fabricação. (11)

A viabilidade das organizações disciplinares modernas depende do exercício de controle pleno sobre os indivíduos que as compõem. Nos edifícios, passa a ser necessário proceder a uma subdivisão interna aos muros de delimitação do exterior. Estabelece-se uma diferenciação entre os lugares que cada classe de indivíduo pode ocupar e, mais ainda, uma definição clara de qual deverá ser a posição relativa entre essas classes de indivíduos, ou entre os seus respectivos compartimentos para que se possa garantir a eficiência da iniciativa.

(...) A disciplina é, antes de tudo, a análise do espaço. É a individualização pelo espaço, a inserção dos corpos em um espaço individualizado, classificatório, combinatório. (12)

Como exemplo da especialização espacial das edificações, Foucault explicita as diretrizes para o projeto de hospitais surgidos na França no século XVIII por solicitação oficial do governo. Nos documentos escritos não se percebe interesse pelo caráter monumental ou simbólico do hospital. O que os estudiosos da medicina estipulavam eram regras de separação entre determinados tipos de doentes; a possibilidade de aproximação entre outros; e, o mais importante, a garantia de que seria o médico o detentor do domínio sobre todo o sistema, controlando os acessos aos vários compartimentos através de extensos corredores de circulação.

Foucault procura explicitar a diferença entre o hospital moderno, compartimentado e com posições bem definidas para os seus ocupantes, “uma máquina de curar”, e os hospitais medievais, “depósitos de doentes” onde, já se sabia, “ia-se para morrer, não para se curar”. Os novos hospitais, precisamente definidos em suas atribuições de separar, reunir e permitir a circulação plena dos médicos eram, eles próprios, “instrumentos terapêuticos” da nova medicina (13).

(...) Tudo isso mostra como, em sua estrutura espacial, o hospital é um meio de intervenção sobre o doente. A arquitetura do hospital deve ser fator de cura. O hospital-exclusão, onde se rejeitam os doentes para a morte, não deve mais existir. A arquitetura hospitalar é um instrumento de cura de mesmo estatuto que um regime alimentar, uma sangria ou um gesto médico. O espaço hospitalar é medicalizado em sua função e seus efeitos. Esta é a primeira característica do hospital do século XVIII. (...)

(...) A partir do momento em que o hospital é concebido como um instrumento de cura e a distribuição do espaço torna-se um instrumento terapêutico, o médico passa a ser o principal responsável pela organização hospitalar. (...) a presença do médico se afirma, se multiplica no interior do hospital. (...) (14)

Falando de edifícios para falar de instituições de poder disciplinar, Foucault estabelece um modo de interpretar a arquitetura diverso ao da historiografia da arte – a descrição de estilos, de elementos compositivos ou aspectos plástico-tectônicos. Ele chama atenção para um fator anterior à definição física dos objetos arquitetônicos, mas que, em essência, justifica a sua existência: o sistema de espaços interiores à edificação, principalmente a relação que cada compartimento guarda com os demais. Mais profundamente, o que interessa a Foucault nos edifícios são as relações que podem ser estabelecidas entre os indivíduos que ocuparem os seus compartimentos e tentarem se movimentar no sistema de unidades espaciais.

No uso do edifício com organização espacial especializada, determina-se quando o indivíduo pode passar de uma a outra unidade diretamente, ou quando necessita atravessar outros compartimentos que controlem a circulação e o seu acesso. Da mesma forma, define-se quando um indivíduo pode, ou não, ter ciência da presença de outros nos demais compartimentos, controlando-se os contatos visuais ou sonoros entre as unidades.

Essa descrição da arquitetura, tomando por base os tipos de relações entre indivíduos, fica mais evidente quando Foucault se detém particularmente em um modelo de edifício concebido unicamente para o exercício do controle pleno de uma instituição disciplinar sobre os seus subordinados: o Panóptico, de Jeremy Bentham.

2. Aquele que tudo sabe, tudo ouve e tudo vê

O discurso de Foucault sobre a arquitetura pode ser sintetizado na descrição e nas discussões que ele realiza sobre o Panopticon: um modelo arquitetural proposto pelo inglês Jeremy Bentham em 1787 com o objetivo de estabelecer uma clara hierarquia entre indivíduos dentro de uma dada instituição (15).

Para o autor, o Panóptico se transforma em paradigma para o surgimento de uma nova ordem social baseada na vigilância constante do indivíduo pelas estruturas de poder que seria vigente até hoje.

2.1 Sempre poder ver, sem nunca poder ser visto

Foucault dedica um dos capítulos de “Vigiar e Punir” ao que ele chama de “Panoptismo”, termo derivado do Panopticon (Panóptico) de Bentham, modelo realizado através de uma “simples idéia de arquitetura”. Bentham prometia que, através do arranjo espacial de uma edificação circular, era possível resolver os problemas da atividade de inspeção de uma instituição disciplinar qualquer – reduzir a quantidade de inspetores necessários para comandá-la, ainda que se ampliasse o número de indivíduos inspecionados (16).

Devido à disposição das celas no perímetro do círculo (ou anel), era possível que um só inspetor, posicionado no centro do conjunto numa torre de observação, vigiasse todas as celas, inclusive não apenas as de um pavimento, mas de dois, ao mesmo tempo.

Bentham ainda definia sistemas de controle de iluminação para que as celas fossem atravessadas pela luz enquanto a torre se mantinha na penumbra, e de tubos metálicos para que o inspetor ouvisse tudo o que fosse falado pelos inspecionados. Não era necessário que a torre fosse ocupada pelo inspetor todo o tempo, pois tendo ciência de sempre poder estar sob vigilância, o inspecionado ficaria em situação de constante submissão.

Embora tenha ficado célebre como princípio carcerário, Bentham afirma que o Panóptico não se restringe só a essa finalidade, podendo ser aplicado a qualquer programa que necessite da vigilância para tornar o seu desempenho mais eficiente –fábricas, escolas, workhouses, hospitais, asilos e tantas outras instituições em que os “donos” do edifício desejassem exercer controle sobre as atividades dos “visitantes” (17).

Se em “Vigiar e Punir” Foucault trata do Panóptico essencialmente como estrutura carcerária, em textos subseqüentes afirma que a inovação da proposta consistia na instituição de dois sentidos: um geral – a espacialização de uma situação de vigilância ininterrupta do indivíduo por uma instituição formalmente estabelecida; e outro bastante específico:

Ele (Bentham) coloca o problema da visibilidade, mas pensando em uma visibilidade organizada inteiramente em torno de um olhar dominador e vigilante. Ele faz funcionar o projeto de uma visibilidade universal, que agiria em proveito de um poder rigoroso e meticuloso (...) (18)

Foucault entende que o uso da visibilidade controlada é a grande inovação da proposta. Não era mais necessário o inspetor dividir o espaço com os funcionários da fábrica ou o médico ter que percorrer longos corredores para examinar o doente. O Panóptico possibilitava uma nova e mais eficaz estratégia de dominação, tudo através da visibilidade, que “comanda toda a tecnologia do poder desde o século XIX” (19).

Assim, a idéia do Panóptico vai além da estrutura de separação hierárquica e do eficiente sistema de vigilância. O fato de servir a mais de um programa edilício só reforça o argumento de Foucault de que o poder é algo que se torna, de forma difusa, onipresente em meio às diversas instituições que moldam a sociedade (20).

Do ponto de vista arquitetônico, o mais curioso a se observar em Foucault é que, assim como Bentham, ele também deixa claro que a tal “idéia de arquitetura” se manifesta num sistema de relações entre indivíduos distribuídos em lugares precisos do edifício. O sentido e o funcionamento estão exatamente expressos na estrutura de espaços que se estabelece. Nenhuma alusão é percebida quanto à dimensão tectônica, que seria um suporte secundário às relações entre indivíduos – ou entre as posições relativas que eles ocupam – uma mera conseqüência das intenções de separação ou contato.

(...) nesta máquina (o Panóptico) ninguém ocupa o mesmo lugar; alguns lugares são preponderantes e permitem produzir efeitos de supremacia. (...) (21)

Finalmente, é possível afirmar que a análise do Panóptico é uma síntese do raciocínio que Foucault desenvolve sobre a arquitetura como um todo:

  • o edifício nasce de uma detalhada prescrição de ordenamento das atividades dos indivíduos que o vão ocupar;
  • descrição do edifício fundamentalmente a partir das relações entre indivíduos que podem ocorrer no seu interior;
  • cada classe de indivíduo ocupa uma posição determinada dentro do edifício;
  • o edifício é formado e definido por um conjunto de compartimentos, ou espaços interiores ao seu limite com o exterior, cada compartimento corresponde a uma categoria de indivíduo;
  • cada um desses compartimentos assume uma determinada posição dentro da hierarquia do sistema espacial do edifício;
  • cada indivíduo, em sua respectiva posição dentro do conjunto, tem mais ou menos facilidade de acesso às outras posições, dependendo das relações de permeabilidade ao movimento e de visibilidade que mantém com elas – essas condições refletem o grau hierárquico prescrito no programa inicial de ordenamento das atividades.

2.2 Vigiar, para saber e poder

Até então, procurou-se caracterizar o raciocínio desenvolvido por Foucault sobre a arquitetura em dois momentos: (a) quando motivações de ordem e disciplina fomentam a produção do edifício; e (b) quando a ordem e a disciplina são efetivamente implantadas no sistema de espaços dos dispositivos arquitetônicos.

Porém, outro aspecto da abordagem de Foucault sobre os edifícios merece destaque – o que diz respeito aos efeitos e conseqüências geradas pelos seus usos, os rebatimentos sobre a sociedade que os formulou e utilizou. Mais uma vez, Foucault atribui importância central à implantação da vigilância.

Para o autor, a instauração da vigilância, per se, se constitui em uma inovação da sociedade moderna. Se num primeiro momento ela viabiliza a emergência da ordem e controle por parte das instituições disciplinares, num segundo irá possibilitar o desenvolvimento dessa mesma sociedade. A vigilância transforma-se em observação, exame e aprendizagem.

O Panóptico funciona como uma espécie de laboratório de poder. Graças a seus mecanismos de observação, ganha em eficácia e em capacidade de penetração no comportamento dos homens; um aumento de saber vem se implantar em todas as frentes do poder, descobrindo objetos que devem ser conhecidos em todas as superfícies onde este se exerça. (22)

Ela permite a pesquisa social constante na prisão, a clínica médica no hospital, o monitoramento das técnicas de produção nas fábricas, a análise do processo de aprendizagem infantil nas escolas. Além de separação e submissão, o Panoptismo desenvolve uma nova capacidade nas instituições dominantes – a de saber cada vez mais sobre os seus objetos de dominação – é o estabelecimento do que Foucault chama de “o espaço analítico” (23), uma das maiores contribuições dadas à sociedade moderna.

(...) Pido disculpas a los historiadores da la filosofia por esta afirmación pero creo que Bentham es más importante, para nuestra sociedad, que Kant o Hegel. (...) pues fue él quien programo, definó y describió de manera precisa las formas de poder em que vivimos, presentándolas em um maravilloso y célebre modelo de esta sociedad de ortopedia generalizada que es el famoso Panóptico... (24)

Ele caracteriza o Panóptico como o “oposto da masmorra”, um “teatro invertido” onde estão expostos os indivíduos e onde qualquer um pode eventualmente assumir o posto do inspetor na torre de observação e analisar o desenrolar da vida humana. Não é mais necessária a inquisição, o Panoptismo permite que práticas de interrogatório sejam trocadas pelo exame científico para se extrair a verdade do indivíduo (25).

Se foram as ciências naturais, principalmente a medicina, que fomentaram a emergência de edifícios com capacidade de classificação de indivíduos, este segundo momento do exame vai terminar por propiciar o nascimento da clínica, dos novos conhecimentos da medicina e, em última instância, das ciências humanas que conhecemos atualmente:

Tenemos así, a diferencia del gran saber de indagación que se organizó en la Edad Media, (....) um nuevo saber totalmente diferente, um saber de vigilancia, de examen (...) Esta es la base del poder, la forma del saber-poder que dará lugar ya no a grandes ciencias de observación como en el caso de la indagación sino a lo que hoy conocemos como ciencias humanas: Psiquiatría, Psicología, Sociología, etcetera. (...) (26)

Colocando o Panoptismo como condição para se construir uma relação entre o saber e o poder, fica clara a importância atribuída por Foucault ao papel da arquitetura para a sociedade, além da importância da sociedade para a arquitetura. Se antes o edifício aparecia como produto fechado, uma estrutura rígida, agora se revela também como agente. Mas, para Foucault, a arquitetura dos edifícios que lidam com a noção de poder e saber são estrutura e agência ao mesmo tempo, não tendo papéis estáticos, mas exercendo inter-influência mútua de forma constante (27).

3. “O espaço é o mecanismo” (28)

Existe em Foucault uma construção lógica sobre edifícios particular e válida para o próprio campo teórico da arquitetura, extrapolando os limites da filosofia, história e epistemologia onde aparecem originalmente.

O argumento é confirmado ao se confrontar o discurso de Foucault com formulações de um grupo de estudiosos da morfologia da arquitetura que tem interesse específico na descrição e análise dos edifícios com base nas relações entre espaço e sociedade. Mesmo trilhando caminhos diferentes, este grupo chega a conclusões similares às expressas por Foucault.

3.1 Teorias analíticas do espaço

Historicamente, a teoria da arquitetura tem se caracterizado mais como prescritiva do que como analítica. É muito comum que o discurso arquitetônico se preocupe em definir como se pode imprimir determinada ideologia através da forma edificada. Não é de admirar que se espere que essa transmissão se dê no seu nível de percepção mais imediato: a dimensão física tectônica e plástica da arquitetura.

Contudo, é interessante observar que nas situações em que Foucault usa edifícios, trata-os como exemplos de fatos sociais: nada se percebe quanto a aspectos artísticos, como é comum no discurso tradicional sobre a arquitetura. Na verdade, volta-se para as suas questões eminentemente espaciais.

Foucault desenvolve um enfoque descritivo do espaço, o que o aproxima de uma certa vertente da produção teórica sobre a arquitetura que tem por base a descrição de edifícios a partir das intenções sociais subjacentes à forma – a relação entre indivíduo e meio e entre indivíduo e indivíduos.

Hillier e Hanson, por exemplo, afirmam que é na dimensão espacial da arquitetura que reside a sua finalidade e que o espaço não é mero cenário das relações sociais, mas desempenha um papel importante sobre elas (29). Segundo Hillier, existem leis que subjazem a forma arquitetônica que são de três tipos: (a) leis do objeto – referem-se aos princípios que governam a forma em si e constituem um determinado padrão espacial; (b) leis da sociedade para a forma edificada – referentes às maneiras como os indivíduos usam e adaptam as leis do objeto para espacializar diferentes tipos de relações sociais: são princípios pelos quais categorias sociais podem ser identificadas na forma edificada, caracterizando o que ele chama de vida espacial; e (c) leis da forma para a sociedade – de como o sistema espacial edificado tem efeitos sobre os indivíduos: são princípios pelos quais a forma tem conseqüências sociais para além daquelas originalmente programadas ou conscientemente atribuída pela vida social efetivamente operante (30).

Os autores elaboram o conceito de um “edifício elementar” para explicar o mecanismo de produção e funcionamento mais primário da arquitetura – de mediadora de relações sociais. A sua estrutura é composta apenas da delimitação de uma unidade espacial, acessível ao ambiente exterior por uma só abertura. Neste modelo, a função essencial do espaço é promover a interface entre aqueles que “habitam” (controlam) o edifício e aqueles que o “visitam”. Os primeiros se situam na zona mais distante em relação ao exterior, e estariam mais segregados na relação; os últimos são mantidos nos espaços mais próximos em relação ao exterior, e estariam mais integrados ao sistema como um todo (31).

Considerando o caráter do evento que se deseja promover, edifícios com mais alto nível de complexidade programática podem subdividir, multiplicar ou mesmo inverter aquele padrão de relação entre usuários do edifício elementar. Sendo assim, a depender de como e onde ocorrem tais diferenciações, diferentes tipos edilícios são elaborados. O raciocínio dos autores sugere um caminho para que se descreva a arquitetura a partir do conjunto de relações geradas pela organização espacial, não pelo seu aspecto físico-material.

Para Hillier e Hanson, o Panóptico é um exemplar paradigmático da utilização do espaço como interface para relações sociais. É o exemplo que melhor ilustra a inversão da relação primordial do edifício elementar. A idéia de “edifícios reversos” (32) é muito próxima da análise que Foucault faz da estrutura dos hospitais franceses do século XVIII, quando os pacientes “visitantes” passam a ocupar os compartimentos mais segregados e os médicos “habitantes” passam a controlar os corredores que integram todo o sistema. É ainda mais clara no próprio Panóptico, o “teatro invertido”, em comparação aos esquemas espaciais de edifícios pré-modernos – cujo padrão de mediação de relações entre indivíduos estaria mais próximos daquele do edifício elementar (33).

Outro autor que muito se aproxima da análise da arquitetura de Foucault é Thomas Markus, que estuda um conjunto de edifícios produzidos durante a Revolução Industrial para abrigar programas emergentes àquela época e apresenta uma classificação tipológica extensiva desses edifícios (34).

Markus compreende o edifício como um dispositivo capaz de classificar usuários (classifying devices) (35) através do ordenamento do espaço. Ele organiza uma taxonomia fundamentada no modo como cada tipo de edifício opera as demandas da sociedade – como ordem, controle e hierarquia são concretizados no espaço. O autor divide os exemplares que analisa em edifícios que relacionam: (a) pessoas a pessoas (para formação, reformação, asseio ou recreação); (b) pessoas a conhecimento (material e efêmero); e (c) pessoas a coisas (em processos de produção ou de troca) (36).

As descrições de funcionamento dos edifícios utilizados por Foucault coincidem com as interpretações de Markus. A fábrica, que para Foucault era determinada pela eficiência e monitoramento do processo produtivo, pertenceria ao terceiro grupo – pessoas a coisas, edifícios de produção.  O hospital do século XVIII e o próprio Panóptico são considerados por Markus como pertencentes ao primeiro grupo – pessoas a pessoas, edifícios de reformação. Mas é o princípio de controle visual total do modelo de Bentham que Markus identifica como ponto de partida para diversos exemplares pertencentes aos seus grupos taxonômicos emergentes da modernidade, todos vinculados ao cenário descrito por Foucault (escolas, prisões, workhouses, asilos, casas de caridade, bibliotecas, etc.).

Outra idéia fundamental em Markus é da existência de uma relação direta entre arquitetura e texto. O argumento é de que existe uma correspondência entre estrutura espacial edilícia e o texto prescritivo que a precede, sendo necessário abordar o próprio edifício como um discurso social. Como se percebe, tal interpretação também se associa diretamente com a estruturação do discurso de Foucault para explicar o surgimento das instituições disciplinares e dos seus dispositivos de aplicação – o caráter do edifício é definido na programação precisa dos seus espaços para viabilizar uma série de relações entre os indivíduos.

3.2 Determinismo ou dualidade?

A discussão da arquitetura a partir de relações de controle, vigilância e poder no uso dos edifícios tende a suscitar uma questão epistemológica recorrente na teoria da arquitetura: o determinismo arquitetônico – ou até onde vai a capacidade da arquitetura de interferir no comportamento do indivíduo.

De fato, os exemplos de edifícios utilizados por Foucault foram elaborados sob um ponto de vista positivista, como seria de se esperar diante das necessidades que deveriam suprir – organização e disciplina de indivíduos/sociedade – e da época em que foram concebidos – finais do século XVIII. Essa postura, típica na arquitetura moderna subseqüente, sofreu diversas críticas tanto quanto à ideologia empregada no fazer arquitetônico como quanto à forma de analisar edifícios já existentes. Diante dos estudiosos das ciências humanas e sociais e dos teóricos da arquitetura que a elas se aproximaram, tal postura parece ter um viés ainda mais determinista quanto ao poder da arquitetura sobre os hábitos da sociedade (37).

Os quatro autores discutidos – Hillier, Hanson, Markus e Foucault – são unânimes quanto ao papel do edifício para a com a estrutura social: edifícios são criados a partir de prescrições e programações de uso que atendem a demandas de uma sociedade. Posteriormente, tanto Foucault como Hillier afirmam que edifícios têm, também, a capacidade de atuar como potencializadores ou restritores a determinadas utilizações – exercem certo grau de influência sobre o comportamento dos indivíduos.

A influência do espaço sobre o indivíduo, para ambos os autores, dá-se em uma etapa posterior, já na apropriação do espaço pela sociedade. Nesta segunda etapa da relação edifícios X indivíduos, de acordo com as próprias leis defendidas por Hillier, podem se manifestar certas utilizações, e conseqüências dessas utilizações, não necessariamente previstas nas prescrições programáticas originais para o edifício. Essas capacidades de apropriação é que seriam efetivamente dependentes das possibilidades oferecidas pelo espaço.

Verificada a convergência dos estudos histórico-epistemológicos de Foucault com as linhas de pesquisa sobre a forma arquitetônica de Hillier, percebe-se que em nenhuma das abordagens da relação espaço X sociedade aponta-se a prevalência de um componente da relação sobre o outro. Na verdade, constrói-se a visão de uma inter-relação contínua, biunívoca e interdependente entre sociedade e espaço arquitetônico.

Pode-se ainda fazer uma interpretação mais profunda da contribuição de Foucault ao entendimento daquela relação. É possível afirmar que o espaço é um elemento constituinte da sociedade e que um não existe sem o outro. A arquitetura não é um produto isolado nem há viabilização de relações sociais sem o espaço edificado – há uma dualidade nos papéis desempenhados por um e ou por outro, e não um direto determinismo.

Em Foucault, o espaço não é um mero produto ou cenário de práticas sociais, ele é parte integrante e fundamental dessas práticas, observando-se a importância que atribui ao aprofundamento no tema:

(...) Seria preciso fazer uma “história dos espaços” – que seria ao mesmo tempo uma “história dos poderes”... (38)

Reconhecer a complexidade do discurso arquitetônico de Michel Foucault é válido não só para o campo da arquitetura ou das ciências sociais – ele estabelece a inter-relação e interdependência entre estrutura social e estrutura espacial, postura que atende indistintamente aos dois campos. (39)

notas1
GIDDENS, A. A constituição da sociedade. São Paulo, Martins Fontes, 2003.

2
GIDDENS, A.  Op. Cit. p. 171.

3
FOUCAULT, M. Vigiar e punir. Petrópolis, Editora Vozes, 2005.

4
FOUCAULT, M. Microfísica do poder. São Paulo, Graal, 2006.

5
FOUCAULT, M. 2005 Op. Cit.

6
FOUCAULT, M. La verdad y las formas juridicas. Barcelona, Gedisa; 1978.

7
FOUCAULT, M. 2005. Op. Cit.

8
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 145.

9
FOUCAULT, M. 2005. Op. Cit.

10
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 211.

11
FOUCAULT, M. 2005. Op. Cit. p. 124.

12
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 106.

13
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 100-106.

14
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 109.

15
MILLER, J. A. “A máquina panóptica de Jeremy Bentham”. In: SILVA, T. T. (org.). O panóptico. Belo Horizonte, Autêntica Editora, 2000, p. 11 – 74.

16
BENTHAM, J. “O panóptico ou a casa de inspeção”. In: SILVA, T. T. (org.).Op. Cit.

17
BENTHAM, J. Op. Cit.

18
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 215.

19
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 211.

20
WHITAKER, R. The end of privacy: how total surveillance is becoming a reality. Nova Iorque, The New Press, 1999.

21
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 219.

22
FOUCAULT, M. 2005. Op. Cit. p. 169.

23
GIDDENS, A. Op. Cit. p. 172.

24
FOUCAULT, M. 1978. Op. Cit. p. 78.

25
FOUCAULT, M. 2005. Op. Cit.

26
FOUCAULT, M.1978. Op. Cit. p. 100.

27
GIDDENS, A. Op. Cit.

28
Livre tradução de “Space is the Machine”, título do livro de Bill Hillier, de 1996.

29
HILLIER, B.; HANSON, J. The social logic of space. Cambridge, Cambridge University Press, 1984.

30
HILLIER, B. The Architecture of the Urban Object. Ekistics 56, 5-21. 1989.

31
HILLIER, B.; HANSON, J. Op. Cit.

32
HILLIER, B.; HANSON, J. Op. Cit.

33
LOUREIRO, C. Classe, controle, encontro: o espaço escolar. 2000. Tese (Doutorado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2000.

34
MARKUS, T. A. Buildings and power: freedom & control in the origin of modern building types. Londres, Routledge, 1993.

35
Markus, T. Buildings as classifying devices. Environment and Planning B: Planning and Design. 14: 467-484. 1987.

36
MARKUS, T. 1993. Op. Cit.

37
LOUREIRO, C. Op. Cit.

38
FOUCAULT, M. 2006. Op. Cit. p. 212.

39
O autor agradece especialmente a Virgínia Pontual, Claudia Loureiro e Luiz Amorim, professores doutores do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPE, pelas observações e discussões durante a produção deste trabalho.

sobre o autor

Cristiano Nascimento é arquiteto e urbanista, mestrando do Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Urbano – MDU e pesquisador no Laboratório de Estudos Avançados em Arquitetura – lA2, ambos do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, no Recife.

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