A primeira impressão de quem integra a 8ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e vai conferir a mostra é ser mais um na multidão. É um pequeno embate: afinal, figurar entre os 309 selecionados, dentre um número de inscrições – pagas – que a cada edição bate seu próprio recorde estimula a vaidade. No entanto, no momento seguinte, podemos crer que estamos somente em boa companhia. O eixo que percorre grande parte da mostra, segundo a comissão curatorial, corresponde aos trabalhos que se firmaram como produtos de excelência. Há ainda aqueles que foram considerados inovadores, em relação à pesquisa de linguagem.
Uma outra ida à mostra, a leitura do catálogo e uma visita rápida aos websites dos designers revelam que a produção é intensa, realmente. E, sem dúvida, a visibilidade dessa produção é resultado dos 16 anos de Bienal da ADG. Acompanho a Bienal desde que ocupava as paredes do MIS – Museu da Imagem e do Som –, e, de lá para cá, muita coisa mudou, além de seus números fabulosos. Nessa edição, em especial, amadureceu e ficou mais arrojada. Esse ano as peças gráficas já selecionadas pelo júri foram identificadas e agrupadas pelos curadores em núcleos de tendências, e não mais em categorias de produtos (marcas, livros, websites, tipografias), o que é extremamente significativo.
Os 12 “conceitos” surgidos nomeiam os núcleos que organizaram a mostra e propõem novo enquadramento do trabalho realizado pelo designer que visto agrupado com seus pares, favorece novas leituras e a fortalece a percepção de que uma peça de design gráfico pode revelar várias facetas de sua natureza plural. Mas, sobretudo, a bienal incentiva o comprador de design à análise, à comparação, à discussão e, finalmente, à interlocução, fator imprescindível para o amadurecimento do nosso mercado.
Isso significa, mais exatamente, que o investimento em design gráfico existe – algo que já havia sido concluído em bienais passadas. O que parece novo é a possibilidade de acesso do empresariado às discussões dos designers quanto à pesquisa de linguagem, à consagração ou ruptura de procedimentos e métodos, e ainda à excelência tecnológica que tanto nos envolve e nos motiva. Os empresários, infelizmente, não irão ao Memorial da América Latina visitar a bienal, mas o fato de as peças serem apresentadas em categorias tais como “renovando o mercado”, “ampliando o moderno”, “investigando o Brasil” ou “acumulando signos” demonstram que há algo a ser aprofundado na hora de aprovar (comprar) um projeto gráfico (em tempo: os verbos no gerúndio respondem à questão “o que a produção contemporânea de design gráfico brasileiro vem fazendo?”).
Assim, a 8ª edição dessa bienal cumpre seu papel de promover a formação da cultura do design entre seus fazedores – clientes e designers, que juntos abordam um problema, transformam-no em solicitação, e, finalmente, em proposta – e o público em geral. Este desempenha não só seu papel de cliente final, consumidor e público-alvo de uma ação específica, mas também de cidadão, de usuário, que com mais recursos e reflexão exerce conscientemente seu papel de agente nesse processo. Afinal, toda ação de comunicação inicia-se pautada pelo repertório do intérprete.
Outros aspectos acertadíssimos dessa edição são também o alcance nacional, com muitos trabalhos de cidades como Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife; a inclusão de projetos de final de curso das escolas de design; e trabalhos reflexivos, cujo objeto de estudo é o próprio design. além da legítima homenagem a Rubem Martins.
Particularmente, senti falta dos trabalhos de grandes escritórios (o decano Cauduro Martino, o avassalador Gad e a Oz), embora em uma mostra seus projetos sempre pareçam já esgotados pela superexposição midiática. O contraponto dessa situação é a presença da novíssima geração de designers e projetos idealizados para clientes de pequeno porte, de modo geral, sinônimos de frescor. já os destaques, ou seja, trabalhos agraciados com a atenção especial do júri – o que alimenta nosso momento Oscar, na cerimônia de abertura –, apontaram lugar ainda para os consagrados Kiko Farkas, Vicente Gil, Rico Lins e Simone Mattar, para deleite visual do público que visita a bienal.
notas
[publicação: agosto 2006]
sobre o autor
Marise De Chirico é designer gráfico, sócia do estúdio Estação Design Gráfico e professora de projeto no curso de Design da ESPM
Marise De Chirico, São Paulo SP Brasil