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research

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drops ISSN 2175-6716

abstracts

português
Este breve artigo trata sobre os primeiros resultados da atual pesquisa acadêmica que está sendo desenvolvida na dissertação de mestrado cuja temática envolve a identificação de hábitos de morar na cidade de Maceió, Alagoas.

english
This work presents the first results of the current academic research is being developed into dissertation at the master’s degree, the theme is the identification of living habits in different housing profiles in the city Maceió, AL.

español
Este breve artículo analiza los primeros resultados de la investigación académica actual que está siendo desarrollado en la tesis cuyo objeto consiste en la identificación de hábitos de vida en Maceió, Alagoas.

how to quote

BARROS, Alice de Almeida. Hábitos no habitar. Hábitos de morar e a criação do espaço arquitetônico. Drops, São Paulo, ano 12, n. 057.04, Vitruvius, jun. 2012 <https://vitruvius.com.br/revistas/read/drops/12.057/4386>.


Os indivíduos se relacionam com suas habitações construindo diferentes hábitos de morar que são reflexos de como vivem. Enquanto palco das diferentes manifestações da vida humana com toda a sua diversidade social, cultural e econômica, a arquitetura passa a produzir sensações e significados, assumindo também uma dimensão simbólica, como resultado de um sentimento de pertencimento do indivíduo com seu lugar de moradia. Neste sentido o espaço arquitetônico se faz presente como abrigo de experiências, e dos hábitos inerentes às diversas formas de morar.

A arquitetura é o espaço físico, concreto e palpável que cria um elo entre o homem e o mundo. Dentro desse espaço a vida de cada indivíduo se desenrola no percurso do tempo em meio a atividades do cotidiano. Para o arquiteto Juhani Pallasmaa (1) “a arquitetura é nosso principal instrumento de relação com o espaço e o tempo (...) ela domestica o espaço ilimitado e o tempo infinito, tornando-o tolerável, habitável e compreensível para a humanidade”.

Recorta-se um território e nele são erguidos elementos que o limitam, em seguida este espaço é preenchido de objetos e pessoas, a casa passa então a existir. Um abrigo, lar, a segunda pele do homem, é a propriedade do indivíduo que nela acolhe seus bens e suas histórias. Ao entrar em contato com este lugar o corpo passa a captar impressões e vivenciar diferentes experiências. “A ideia de lugar diferencia-se da de espaço pela presença da experiência por parte do corpo humano” (2).

A casa vai além da estrutura física que combina piso, paredes e teto, ela é a extensão da vida de quem nela habita. Cada indivíduo vivencia histórias no interior do espaço construído, o que torna a arquitetura um lugar repleto de significado. “Pertencemos muito mais às nossas casas do que elas nos pertencem” (3). A casa é onde o indivíduo passa a existir, onde pode abrigar-se e realizar diferentes ações. “A casa abriga o devaneio, a casa protege o sonhador, a casa nos permite sonhar em paz” (4).

A casa é um “rizoma, uma multiplicidade” de espaços, funções, hábitos, que ultrapassa os limites das paredes devido às diferentes “linhas de fuga” (5). No mundo contemporâneo atividades antes reservadas ao espaço privado da moradia extrapolam os limites físicos e chegam à rua. “É nesse sentido que a sociedade desterritorializa (...) inventa o trabalho, a residência secundária, os deslocamentos, os lazeres” (6). Assim a casa faz rizoma com o mundo.

No momento que a casa se conecta ao mundo, os indivíduos vão além do espaço interior da moradia e a relação amplia para o exterior, as atividades vividas dentro da habitação, os hábitos construídos no dia a dia passam a dialogar com o exterior extrapolando o espaço da casa. Assim surge o interesse de compreender o que são os hábitos de morar, como eles surgem, onde acontecem e como se modificam. Para tanto o objeto empírico é a cidade de Maceió e seus diferentes perfis de habitações (condomínios horizontais fechados de alto padrão e conjunto habitacional de interesse social).

O que são os hábitos de morar?

Hábito é o uso, costume, uma maneira de viver, o modo constante de comportar-se e de agir. É praticado por indivíduos ao longo de suas vidas nos mais diversos lugares, em casa, no trabalho, no local de lazer. A vida do homem é repleta de hábitos que ele realiza em diferentes momentos, individualmente, em comunidade e sociedade. São necessários para a sobrevivência biológica (comer, dormir, por exemplo) de sua espécie (relação sexual, reprodução, por exemplo) e social (relacionamento com os outros indivíduos).

Os hábitos de morar refletem a experiência do homem com sua moradia, os usos e costumes vividos no espaço privado da casa. Na medida em que se modificam os perfis familiares, os momentos de vida, as condições socioeconômicas, o padrão cultural os hábitos também sofrem modificações visando se ajustar aos modos de viver da família. Os hábitos fazem parte do dia a dia dos indivíduos e influenciam a maneira como se vive dentro de casa, os usos que se faz do espaço doméstico.

Segundo Lucrécia Ferrara (7) é o uso que dinamiza o espaço e o concretiza como modo de viver. É necessário ultrapassar aquela totalidade homogênea do espaço para descobrir que o comportamento humano se traduz em usos e hábitos. Cada indivíduo possui um comportamento particular que estará refletido no seu lugar de moradia, na forma como organiza os ambientes, nos objetos presentes, etc. A casa passa a ser espelho da personalidade dos moradores e assim estes se reconhecem nela.

Os hábitos são vividos no cotidiano de cada indivíduo. Cotidiano é o movimento da vida, conjunto de atos, atividades realizadas, onde cada pessoa se localiza dentro de uma dinâmica de acontecimentos e onde ela se encontro com o outro, aquele com quem tem relação familiar, de trabalho ou um estranho. Segundo Agnes Heller (8) “a cotidianidade começa dentro de diferentes grupos, na família, escola, comunidade onde se aprende elementos da cotidianidade: as formas de comportamento, como agir, o que evitar, o que discordar ou aceitar na sociedade”.

Os hábitos no espaço privado da casa

A esfera pública e a privada já se manifestam na casa, há os espaços de maior publicidade (sala de estar, por exemplo) e aqueles de intimidade (banheiro, por exemplo). No espaço privado da casa o indivíduo se enxerga como “um” e como parte de uma comunidade que é a sua família. Ao atravessar seus limites, chega-se à rua, aos espaços públicos e o indivíduo passa então a se reconhecer como parte de uma sociedade, onde há as relações de produção, de consumo e de lazer.

A casa é um espaço particular onde os indivíduos realizam seus hábitos. Quanto mais a sociedade cresce e se expande mais se busca um território próprio para proteger a vida individual, da família e os bens daqueles que ameaçam. “Foi dentro da família que os indivíduos conquistaram o direito de ter uma vida privada autônoma. De certa forma, a vida privada se desdobra: no interior da vida privada da família surge agora uma vida privada individual” (9). Cada membro da família ganha maior intimidade nos ambientes da casa.

No interior da privacidade da moradia os indivíduos vivem individualmente ou em família hábitos próprios de cada ambiente que a compõe, dormir nos quartos, banho nos banheiros, refeições na cozinha, reunião familiar e visitas na sala. Porém com as alterações vividas na contemporaneidade no que se refere às formas de viver (ocupação do tempo com muitas atividades) e de morar (apartamento, condomínio fechado) de grupos da sociedade, os hábitos e os espaços que lhe eram próprios sofreram mudanças.

As mudanças ocorridas nos hábitos antes reclusos à privacidade do lar têm como exemplo: as refeições que são intensamente feitas em restaurantes, shopping centers; muitas pessoas realizam atividades profissionais dentro de suas casas; utilizam a academia para o banho. Apesar das alterações percebidas no que se referem aos hábitos, alguns devem permanecer experienciados no interior das habitações e não no seu exterior:

“Não se pode misturar o espaço da rua com o da casa sem criar alguma forma de grave confusão ou até mesmo conflito. Sabemos e aprendemos muito cedo que certas coisas só podem ser feitas em casa e, mesmo quando em casa, dentro de alguns dos seus espaços (10)”.

Primeiros resultados

A cidade de Maceió, Alagoas apresenta uma diversidade de configurações espaciais para a moradia de sua população. Há os edifícios de apartamento, os condomínios fechados de casas, os conjuntos habitacionais de interesse social vertical e horizontal. Em todos estes exemplos os hábitos de morar da família interferem no espaço de suas casas, nas formas que utilizam os ambientes.

Foram realizadas visitas e entrevistas em dois perfis habitacionais, um condomínio fechado de casas e um conjunto habitacional de interesse social também formado por casas. No primeiro caso devido às condições econômicas privilegiadas das famílias, os hábitos dos moradores estão refletidos nas casas projetadas por arquitetos, cada cômodo foi idealizado para responder às necessidades da família e para que pudessem viver seus hábitos diários.

No segundo caso, o conjunto habitacional de interesse social para famílias carentes mostra que as casas padronizadas, um modelo único de projeto para todas as famílias, não levam em consideração os hábitos particulares de cada uma delas. Diante disso cada família tenta modificar a casa que habita para responder suas necessidades, por exemplo, amplia a área de serviço para lavar o grande volume de roupas da família.

No condomínio fechado o quarto de hóspede é um cômodo presente nas casas devido o hábito de receber visitas, amigos e parentes. No conjunto habitacional as famílias que possuem o mesmo hábito vêem suas visitas dispersas pelo chão da casa. Em casas produzidas para abrigar a população carente a partir do investimento do governo é impossível levar em conta a necessidade de cada família, por diversos motivos: grande número de abrigados, baixo orçamento, quanto maior o número de habitações menor a área construída.

Considerações finais

O que pretendo com este breve artigo é expor a necessidade de se compreender o que são os hábitos de morar vividos no espaço da casa. Mostrar que os hábitos de morar têm papel fundamental na idealização do espaço arquitetônico e na forma como as pessoas se utilizam e modificam este espaço. Os hábitos de morar são responsáveis pelo desenho do espaço arquitetônico de modo a interferir na manutenção tradicional de cômodos e na criação de outros de acordo com as necessidades da família.

notas

NA
A autora realiza mestrado na Universidade Federal de Alagoas, sendo orientada por Maria Emília de Gusmão Couto.

1
PALLASMAA, Juhani. Os olhos da pele: A arquitetura dos sentidos. Porto alegre: Bookman, 2011, p. 17.

2
MONTANER, Josep M. A modernidade superada: arquitetura, arte e pensamento do século XX. Barcelona: Gustavo Gili, 2001, p.37.

3
BRANDÃO, Ludmila Lima. A casa subjetiva: matérias, afectos e espaços dométicos. São Paulo: Perspectiva, 2002, p.32.

4
BACHELARD, Gaston (1989). A poética do espaço. 7ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p.201.

5
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol.1. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1980.

6
ROUX, Michel. “O Re-encantamento do território (O Território nos Rastros da Complexidade)”. In: SILVA, Aldo Aloísio Dantas da; GALENO, Alex (Orgs.). Geografia: ciência do complexus. Ensaios Transdisciplinares. Porto Alegre: Sulina, 2004, p.53.

7
FERRARA, Lucrecia D´Alessio. Olhar periférico. São Paulo: Edusp, 1993.

8
HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. São Paulo: Paz e Terra, 2008, p.34.

9
PROST, Antoine; VINCENT, Gérard (Org.). História da vida privada, 5: da Primeira Guerra a nossos dias. São Paulo: Companhia das Letras, 1992, p.61.

10
DAMATTA, Roberto. “A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e morte no Brasil”. In: DAMATTA, Roberto. Espaço: casa, rua e outro mundo: o caso do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1985, p.43.

bibliografia complementar

CARLOS, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: Hucitec, 1996.

sobre a autora

Alice de Almeida Barros é arquiteta e urbanista, aluna do Mestrado Dinâmicas do Espaço Habitado – UFAL.

Vista geral do bairro de Guaxuma, Maceió, AL
Foto Pablodarioo [Wikimedia Commons]

Vista do bairro Jatiuca, Maceió, AL
Foto Aleposta [Wikimedia Commons]

Vista da orla de Maceió, AL
Foto Adriano Ribeiro [Wikimedia Commons]

 

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