Um projeto ecologicamente sustentável deve possuir profissionais com objetivos, ideologias e capacidades sustentáveis. O arquiteto responsável pela forma e funcionalidade da edificação passa a ter uma função a mais: gerenciador e fiscalizador de todos os demais projetos que uma edificação abrange, além de todos os profissionais envolvidos, de forma a garantir que o foco principal não se perca já na fase de planejamento.
O conceito do projeto é, normalmente, a primeira etapa de planejamento de uma edificação a ser construída. Geralmente expresso na forma de croqui e esboços. Esses desenhos carregam a ideia principal que o idealizador teve, além de seus conhecimentos adquiridos, vivências, experiências, estilo e etc.
“O processo de desenhar/modelar lenta, experimental e hipoteticamente revela a direção do projeto [...]. Por trás do primeiro croqui encontra-se valores, atitudes, pressuposições e conjuntos de conhecimento. Para melhor ou para pior, a arbitrariedade, a inspiração e outras influencias interferem quando menos se espera. Um forte senso de valores de projeto e valores ambientais pode ajudar a filtrar esses inúmeros impulsos” (1).
Levando em consideração a veracidade da citação acima. O conhecimento sobre arquitetura sustentável, sustentabilidade e todos os temas e subtemas relativos à importância de tais assuntos devem estar presentes no dia a dia, nos estudos e nas aspirações do profissional que trabalha com arquitetura sustentável, além de na sua metodologia de trabalho. Dessa forma o inconsciente e ações impulsivas desse profissional já serão direcionados e compatíveis com o foco de seu projeto.
“Aquilo que é pesquisado afeta o modo como o arquiteto vê o projeto e, consequentemente, o que faz com ele e o que pode ser feito” (2).
A intenção de desempenho da edificação deve também ser decidida na primeira etapa projetual. Esse fator definirá os rumos do projeto nas etapas seguintes além de ajudar a definir os membros da equipe com qualificações compatíveis com a intenção de trabalho. Sistemas de certificação, sistemas normativos e ISOs também entram no escopo e na definição das intenções de desempenho mínimo da edificação.
Estudos de casos de empreendimentos semelhantes ao do projeto em desenvolvimento são importantes para se analisar os colapsos e problemas que ocorreram entre a fase de projeto e o funcionamento da edificação. Esse processo de analise e realimentação de informações e dados permite um projeto assertivo e com menos falhas.
Os critérios definidos pelo cliente e/ou por alguma autoridade ligada ao contratante do projeto devem ser compatíveis com as prioridades do mesmo. As metas criadas pela equipe devem ser realistas e compatíveis com as demais premissas do empreendimento. Metas, critérios e prioridades devem ser previamente definidas e esclarecidas entre todas as partes envolvidas, uma vez concluídas e acordadas o projeto continuará a se desenvolver com essas bases. A alteração dessa etapa em uma fase posterior ou até mesmo na construção pode implicar na mudança de foco do projeto, afetando a eficiência almejada para o produto final.
O projeto integrado
Depois da revolução industrial se tornou comum e necessário a especialização de profissões a fim de obter maior resultado técnico em um menor período de tempo. Agilizando o processo construtivo desde a primeira etapa até a ultima. O projeto integrado é uma volta ao conhecimento holístico da edificação, onde os profissionais de áreas especificas conversam e compartilham seus conhecimento com a finalidade de melhorar a eficiência de cada edificação a ser projetada.
O processo se dá de forma investigativa, colaborativa e integrada. Onde cada projeto é único, com suas próprias particularidades referentes aos aspectos no terreno, solo, clima, usuária, orçamento, cliente e etc. Esses dados obtidos por investigação são compartilhados entre os profissionais envolvidos de forma que cada um deles colabora, de forma integrada e comunicativa, as melhores soluções para o projeto.
Dessa forma o projeto integrado acaba não tendo uma seqüência rígida definida. Como todos os profissionais, de todas as etapas, estão envolvidos durante toda a fase do projeto, desde o estudo preliminar, o projeto executivo final até o acompanhamento da construção da edificação, não existe uma seqüência de profissionais a se manter, como no projeto convencional adotado atualmente.
Todos esses profissionais de diferentes área, experiências e atribuições devem ser gerenciados e liderados por um gerente de projetos. Em muitos textos sobre projeto integrado é atribuído ao arquiteto a função gerencial devido a sua experiência holística e ao seu entendimento sobre o principal foco do projeto. Contudo, qualquer outro profissional que possui o entendimento holístico do sistema projetual especifico pode gerenciar a equipe de profissionais do projeto integrado.
“O projeto integrado examina o modo como todas as partes do sistema interagem e utiliza esses conhecimentos para evitar armadilhas e encontrar soluções com benefícios múltiplos” (3).
Situação brasileira
Apesar de ser um método de gerenciamento muito defendido pela comunidade de profissionais ligados à construção sustentável, no Brasil, essa metodologia não é muito empregada dentro dos escritórios, construtoras e outras instituições da construção, e quando é empregado não consegue ser seguido à risca, não respeitando todos os procedimentos.
No Brasil a integração entre profissionais envolvidos no projeto e execução de uma edificação se dá de forma linear, ou seja, havendo o mínimo possível de realimentação de informações durante a fase de projeto. Esse procedimento visa a diminuição de custos projetuais, bem como na redução de tempo de projeto. Algo de extrema importância no mercado competitivo da construção nacional.
Em um artigo dois profissionais ligados a construção civil brasileira fizeram um estudo de casa em duas empresas que alegaram utilizar o processo de projeto integrado dentro da elaboração e execução da edificação, a conclusão do artigo foi à seguinte:
“Nos dois estudos de caso, constatou-se a presença parcial dos elementos metodológicos que caracterizam PPIs. Os elementos presentes foram essenciais para o alcance das metas definidas, mas os resultados positivos demandaram esforço e tempo muito superiores aos previamente estimados. As lições aprendidas sugerem que grande parte das dificuldades observadas poderia ser evitada, ou ao menos minimizada, pela incorporação dos elementos ausentes. A implementação completa do PPI leva a uma maior eficiência do processo, o que torna possível o alcance de metas mais agressivas de desempenho ambiental” (4).
Em território nacional a eficiência do PPI, de forma plena, é meramente teórica, tudo que sabemos de sua eficiência vêm de exemplos estrangeiros, onde a prática de integração do projeto é algo que faz parte do processo metodológico básico de todos os profissionais.
“exemplos de PPI dos Estados Unidos, com reduções no consumo anual de energia de 25% a 70%, documentados também em relatórios individuais, nos quais o desempenho energético das edificações foi avaliado pelo National Renewable Energy Laboratory (NREL), dos Estados Unidos” (5).
Conclusão
Apesar de ser inegável de que a aplicação do processo de projetos integrados é fundamental para garantir uma maior eficiência sustentável do edifício o Brasil ainda não possui a cultura e a disponibilidade de profissionais para realizar de forma plena tal processo.
Para que a adoção do PPI seja viável dentro do Brasil, uma mudança na cultura e na dinâmica do mercado da construção tem que ocorrer e assim como todas as mudanças apenas a necessidade financeira ou social é que irá impulsioná-la. Para isso os profissionais que almejam a excelência no projeto integrado devem se especializar e, aos poucos, inserir esse novo conceito no mercado.
notas
NA – Este texto é uma resenha do segundo capítulo do livro Arquitetura Ecológica.
1
KNOK, Alison G.; GRONDZIK, Walter T. Manual de arquitetura ecológica. 2a edição, Porto Alegre, Bookman, 2013, p. 12.
2
Idem, ibidem, p. 13.
3
Idem, ibidem, p. 19.
4
FIGUEIREDO, Francisco Gitahy de; SILVA Vanessa Gomes da. Processo de projeto integrado e desempenho ambiental de edificações: os casos do SAP Labs Brazil e da Ampliação do CENPES Petrobras. Ambiente construído, vol. 12, n. 2, Porto Alegre, abr./jun. 2012, p. 22.
5
Idem, ibidem, p. 2.
sobre a autora
Natalia Moura Gomes Leal é arquiteta (UFAL, 2014). Enquanto estudante atuou como colaboradora na área de patrimônio histórico no grupo de pesquisa Representações do lugar (RELU) e foi bolsista de desenvolvimento institucional da Universidade Federal de Alagoas no grupo de pesquisa em iluminação (GRILU) dando suporte aos usuários do software TropLux. Como profissional se dedica no desenvolvimento e gerenciamento de projetos de uso residencial e comercial, além de se dedicar a pesquisas voltadas a arquitetura sustentável.